A crise ambiental mundial é um fato histórico que ganhou maior destaque no século XX. No entanto, o que se conhece dos debates acerca dessa irresponsabilidade humana é a postura dos chamados “países desenvolvidos” e sua tentativa de mitigar os efeitos de um fenômeno que, hoje, não se concentra apenas na destruição da teia da vida, mas, ainda, nos danos difusos que aparecem em diferentes locais do desenvolvimento civilizacional.
A pergunta que insiste em aparecer desde 1972 é: Qual o papel dos “países em desenvolvimento” nesse debate, como é o caso da América Latina? Por esse motivo, a leitura da obra “História do debate ambiental na política mundial 1945-1992: a perspectiva latino-americana”, de Fernando Estenssoro Saavedra, se torna fundamental para se verificar quais que são os fundamentos da crise ambiental, a partir do debate ambiental na política mundial, para que se compreenda a Sustentabilidade no cenário latino-americano.
O marco histórico inicial adotado se refere ao ano de 1945, indicando o término da Segunda Guerra Mundial (onde o panorama da política mundial cresceu vertiginosamente); e como final, o ano de 1992, que se trata do ano em que aconteceu a Conferência do Rio de Janeiro.
A crise ambiental está associada diretamente ao crescimento econômico, pelo elevado nível de desenvolvimento e padrão de vida alcançado pela civilização industrial – na qual o Primeiro Mundo é o exemplo emblemático - que gerou problemas de caráter ecológico e ambiental de significativa magnitude, pois, pela primeira vez na História, colocou-se em risco a continuidade de todas as vidas na Terra.
O desequilíbrio que se constata na Natureza não advém de sua metamorfose, mas sim causas antropogênicas. Percebe-se que um grupo específico de pessoas buscavam as soluções para a sua sobrevivência e essa postura exigiu maior exploração do Meio Ambiente natural, principalmente durante o período industrial. As assimetrias civilizacionais já existentes começam a se agravar.
Em virtude da crise se originar com causas antropogênicas, essas questões são inseridas em determinado meio social, elevando a discussão a um nível político (e, até mesmo, ideológico). As necessidades dos “países desenvolvidos” e dos “países em desenvolvimento” são muito diferentes, o que impede maior clareza na solução política de uma crise ambiental mundial.
A crise ambiental mundial, portanto, depende de uma decisão política. No entanto, frisa-se que não se trata de uma negação das Ciências Naturais ou da Terra, mas é que nenhum progresso técnico ocorre sozinho e nenhum diagnóstico de ecologia, isolado, vai resolver o problema dessa crise que se faz presente em todos os territórios do globo.
Para ilustrar esse argumento, verificação, por exemplo, que a elaboração do Tratado de Tordesilhas, entre Portugal e Espanha, dividiu o mundo em dois, e para o sujeito europeu daquele século, que começava a fazer suas expansões, o mundo era um território que necessitava possuir e administrar. Foi a partir desta visão de hegemonia que surgiu uma relação político-econômica que se dividiu entre Metrópole-Colônia. Essa relação era de exploração, pois a Colônia deveria abastecer a Metrópole com seus recursos naturais, produtos agrícolas, fornecimento de matérias-primas, mão de obra escrava. Sob outro ângulo, a Colônia funcionava como mercado para os produtos manufaturados que eram produzidos na Metrópole e vendidos a preços absurdos.
Ao se passar cerca de três a quatro séculos (do século XVI para o XIX, XX), essa relação de centro-periferia sobreviveu, a qual na figura dos países de centro está o chamado Primeiro Mundo, enquanto que as periferias são compostas pelos Estados que acabaram sendo colônias, chamados de Terceiro Mundo.
É a partir dessas relações de poder existentes neste mundo, nas quais se percebe que as mudanças nas estruturas sócio-políticas-econômicas não ocorreram, ou, são ínfimas próximo do esperado. Nesse caso, as relações de poder não se alteraram de forma substancial, confirmando a política expansionista europeia do século XV. Essa condição influenciou na forma de tratar politicamente o debate sobre a crise ambiental mundial.
As bases epistemológicas que orientam as tentativas teóricas são fundadas em três principais ideias: a de catastrófico imaginário de autodestruição; em segundo lugar, a percepção de um planeta finito, e, por último, a substituição da ideia de progresso pela ideia de incerteza.
A primeira ideia, qual seja, a da autodestruição, revela que desde a Revolução Industrial e, particularmente, a partir da década de 1950, têm sido introduzidas quantidades grandes de gases nocivos que geram o efeito estufa, e as principais causas destes são a queima de combustíveis fósseis; o uso do clorofluorcarboneto em processos industriais; a agricultura e, por fim, o desmatamento.
A percepção de um planeta finito - segunda ideia - alerta que o planeta é a única fonte de recursos, além de ser o habitat natural da espécie humana, provendo os recursos para o sustento das pessoas. Para defender essa abordagem, têm-se utilizado de argumentos neomalthusianos dentro de um discurso ambiental, pois enquanto aumenta a população - e também o consumo e a demanda -, a principal fonte se mantém fixa.
A última colocação se refere à ideia da incerteza, que reflete a crítica da ideia de progresso, ao reconhecer o fato de que, enquanto o avanço científico e técnico produziu o desenvolvimento de uma civilização altamente industrializada, também trouxe consequências que não eram esperadas. A incerteza deixa de se tornar fonte de criatividade para fomentar medo, insegurança, violência no seu sentido mais amplo.
Já na esfera global, o debate sobre a questão ambiental ocorreu em virtude dos avanços na disseminação da ecologia como uma disciplina científica, com os primeiros escritos de grande divulgação por parte de membros da comunidade científica; o impacto da mídia sobre os primeiros acidentes que geram grandes desastres ecológicos; e, também, o interesse político, estratégico e econômico dos EUA.
No entanto, no “Terceiro Mundo”, também se iniciou essa preocupação com o Meio Ambiente, porém de forma diferente com que foi tratada nos países de Primeiro Mundo. Na América Latina, ao contrário dos “países de centro”, os principais problemas ambientais são enraizados em questões de pobreza e falta de desenvolvimento.
No panorama latino americano, buscou-se um desenvolvimento sustentado nas potencialidades ecológicas e culturais da região que emitisse não só a preservação e conservação de seu patrimônio ecológico e cultural, mas que também superasse os problemas de miséria, atraso, desigualdades sociais e a ausência de políticas civilizacionais.
Aqui cabe fazer uma referência ao desenvolvimento de uma cultura preocupada com o Meio Ambiente, principalmente desenvolvida a partir do Novo Constitucionalismo Latino Americano, que reforça ideias contra- hegemônicas como a preservação do Bem Comum, da Fraternidade, da Plurinacionalidade, da Natureza entendida como “ser-próprio”, como sujeito de direitos, entre outros. Ademais, ao tomar como exemplo as Constituições da Bolívia e do Equador, percebe-se essa preocupação com o meio ambiente, expressada pelos saberes dos povos andinos, e que se materializou com o reconhecimento da Natureza como sujeito de direitos, não obstante algumas atitudes exploratórias persistam e tragam a ausência de efetividade da linguagem constitucional.
Nessa linha de pensamento, o Novo Constitucionalismo Latino Americano, bem como a elaboração de uma cultura jurídica própria da América Latina, é possível o desenvolvimento de uma Sustentabilidade que atenda às necessidades destes países, que, conforme claramente enfatizado pelo texto, tem fundamentos extremamente diferentes daqueles dos países de Primeiro Mundo, auxiliando, principalmente, na superação da falta de desenvolvimento e da diminuição das desigualdades políticas e sociais.
REFERÊNCIAS
SAAVEDRA, Jaime Fernando Estenssoro. História do debate ambiental na política mundial 1945-1992: a perspectiva latino-americana. Tradução de Daniel Rubens Censi. Ijuí, (RS): Editora da UNIJUÍ, 2014.
Imagem Ilustrativa do Post: A harmless ball in the creek is just more #Trash. // Foto de: Steve Baker // Sem alterações
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