Existe intimação por E - mail?

15/01/2016

Por Samuel Oliveira Cersosimo - 15/01/2016

A Lei 11.419/2006 (Lei de Informatização do Processo Judicial), em vigor desde março de 2007, não criou o chamado Processo Eletrônico. Este já existia e já era praticado por alguns tribunais, a exemplo dos Juizados Virtuais da Justiça Federal e de outros projetos pilotos.

Na verdade, além de trazer inovações, a lei terminou tanto por convalidar algumas práticas, como por evitar outras, e este é o caso da intimação por E-mail (correio eletrônico), prática que a lei afastou ao disciplinar expressamente as comunicações processuais eletrônicas, em seu CAPÍTULO II (artigos 4º ao 7º).

No art. 5ª, a LIP trata do portal próprio de intimações do advogado, disciplinando seu funcionamento e, dentre outras coisas, determinando um prazo de 10 (dez) dias corridos para que os advogados leiam as intimações recebidas neste portal (§ 3º).

Após este período, a intimação se dará como lida - leitura automática - e o prazo começará a correr conforme as regras do Código de Processo Civil. Trata-se, portanto, de uma modalidade de autointimação, com um mecanismo que garante seu sucesso mesmo em caso de não ocorrência da leitura voluntária.

É necessário frisar que a LIP não altera prazos processuais, ela apenas altera o termo inicial para a contagem dos prazos, termo este que poderá ser antecipado pelo advogado caso ele leia a intimação antes do final dos 10 (dez) dias corridos.

Caso opte pela leitura antes desse prazo, a intimação estará realizada no dia da leitura - ou será considerada como realizada no primeiro dia útil seguinte - e o prazo começará a contar também no primeiro dia útil seguinte, conforme a regra processual habitual.

Isto é, na sistemática da LIP, mantém-se a regra habitual de não se realizarem intimações em dia não útil e de não se computarem início ou fim de contagem de prazos em dia não útil. Assim, como visto, a lei altera apenas o momento da intimação.

Outra regra trazida pelo art. 5º é a que trata do E-mail de aviso (§ 4º), que é causa de muita confusão por aqueles que desconhecem o texto legal e lidam com feitos digitais. Tal confusão, inclusive, é o que motiva este texto.

Ocorre que tal dispositivo não trata de intimação por E-mail, uma vez que, conforme disciplinado no caput do artigo, a intimação ocorre num portal próprio de intimações e não no correio eletrônico do destinatário.

O que o § 4º determina é que os advogados podem optar por receber uma mensagem de E-mail a título de aviso, de caráter informativo, toda vez que receberem uma intimação em seu portal.

Logo, não se trata de uma intimação por E-mail. A intimação se dá num portal, que nada mais é do que uma página de Internet, acessada mediante identificação do advogado no sítio do sistema de tramitação processual.

Essa opção do legislador em extinguir as intimações por E-mail, que até eram praticadas antes da LIP, foi bastante producente e acertada, já que o correio eletrônico não é meio tecnicamente seguro para a prática de atos processuais.

No E-mail, não há garantia de que o destinatário receberá a mensagem. Além disso, o E-mail depende de disponibilidade de espaço na “caixa de entrada” do advogado, tratando-se de serviço geralmente fornecido por terceiro (Gmail, Hotmail, Yahoo!) e que foge ao controle do órgão judicial emitente.

Pode-se afirmar que uma mensagem de E-mail se equipara a uma correspondência aberta, uma vez que os dados transmitidos podem ser facilmente interceptados, alterados e novamente enviados (ataque conhecido como man-in-the-middle).

Tal vulnerabilidade possibilitaria a um cracker enganar o destinatário da mensagem, alterando seu conteúdo para, por exemplo, fazer o destinatário - advogado - perder o prazo processual para o qual estava sendo intimado.

Por essas e outras razões, preferiu o legislador atribuir aos tribunais a responsabilidade de assegurar a integridade e autenticidade das intimações eletrônicas, realizando-as em portal próprio, certificado digitalmente, de sorte a garantir que a mensagem chegue ao seu destinatário.

Como isso depende do acesso ao portal pelo advogado, criou-se também o prazo de 10 (dez) dias corridos para a leitura, resolvendo o problema da ausência de leitura voluntária por parte daquele que não quer ser intimado.

Por isso, toda vez que se fala em intimação por E-mail, comete-se erro crasso, que deve ser evitado, pois induz à ideia de que a intimação depende do recebimento de uma mensagem de aviso via E-mail (art. 5º, § 4º, da LIP), o que não é verdade.

Com efeito, o não recebimento da mencionada mensagem, a princípio, não gera nulidade da intimação. O recebimento desta mensagem contendo informação errada - como prazo diferente daquele fixado -, em tese, também não gera nulidade da intimação.

Ainda não é possível definir, com precisão, o alcance da mensagem de aviso por E-mail prevista no art. 5º, § 4º, da LIP, e suas consequências jurídicas ainda não foram analisadas pela jurisprudência. Assim, vale ainda a literalidade da lei e as cautelas do bom advogado.


A primeira versão deste artigo, com o título Não existe intimação por E-mail, foi publicada no Informativo TJ Notícias, Salvador, ano 2, n. 97, p. 7, 15 ago. 2009, e no Informativo ADV Advocacia Dinâmica: boletim informativo semanal, v. 29, n. 42, p. 755-754, 18 out. 2009, sendo posteriormente citada pela Secretaria de Documentação do Supremo Tribunal Federal - STF, na obra Processo eletrônico: bibliografia, legislação e jurisprudência temáticas, nov. 2010 e veiculado no site JusBrasil (http://samuelcersosimo.jusbrasil.com.br/artigos/141962299/existe-intimacao-por-e-mail).


Samuel Oliveira CersosimoSamuel Oliveira Cersosimo é servidor público do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (assessor de magistrado). Bacharel em Direito pela Universidade Salvador - Unifacs, Especialista em Direito e Magistratura pela Universidade Federal da Bahia - UFBA e Especialista em Direito Público pela Unyahna. Ministra aulas e palestras sobre Direito e Tecnologia da Informação e sobre Processo Judicial Informatizado (Processo Eletrônico).


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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