Se buscarmos pelas listas dos livros físicos mais vendidos no Brasil, veremos que há muito tempo sempre se encontram no elenco obras de fundo religioso e publicações que se voltam a ensinar sucesso por meio de autoajuda.
Religião, sobretudo as de orientação cristã, é o fundo de nossa cultura, é a ideologia mais consumida pela massa. Mas há um casamento de intenções, ou uma conjugação de interesses entre religião e autoajuda que merece destaque.
Se o “modo” católico de felicidade é uma promessa de vida eterna no além, sob o beneplácito do “Criador”, o pentecostalismo oferta satisfação garantida de imediato e do tipo terrena, material, conversível em moeda sonante.
Enquanto o catolicismo requer um compromisso, digamos ético, e remete tudo para o futuro, o evangelismo em voga, mediante o pagamento de quantia mais ou menos módica, garante ao interessado uma “mão divina” na sua conta bancária.
Um padre pede sacrifício; um pastor promete sucesso. A igreja de Pedro milita na passividade enquanto os pentecostais sugerem o protagonismo do indivíduo. Essa diferença de “método” é definitivamente atrativa para o povo.
Os católicos vêm da lógica medieval da servidão, da obediência aos senhores da terra e do céu. Os pentecostais incorporaram o espírito capitalista do “vai ao mundo buscar o que é teu”; é o self-made men brasileiro.
Os católicos têm com a sua Divindade uma relação hierárquica reverencial; os evangélicos puseram seu Deus na posição de sócio. Os padres pregadores estão perdendo terreno para os pastores corretores.
Retomando a “literatura” dos livros de religião e de autoajuda, as confissões religiosas chamadas pentecostais cumprem essa dupla função: oferecem fé, mas não uma fé abstrata, é uma fé promocional que encaminha à “autoajudação”.
E quem vai por qual caminho? Momento olímpico, recebimento de medalhas. Da equipe de futebol, mais da metade ostenta símbolos de referência a divindades ao receber o galardão marcador do sucesso.
Essa manifestação não acontece com os atletas da equipe de vôlei. Por que uma equipe comporta-se religiosamente e a outra comporta-se desportivamente? Suponho que essa conduta advenha do nível educacional dos jogadores.
Há diversos estudos que associam religião evangélica (mas não só) a precárias condições socioeconômicas, donde decorre concentração de pessoas com baixa renda e baixo nível educacional entre seus fiéis.
Talvez o mais completo estudo sobre a abrangência e os significados do fenômeno esteja em Evangélicos no Brasil: Perfil socioeconômico, afinidades ideológicas e determinantes do comportamento eleitoral, (Simone R. Boh, Opinião Pública).
Futebol, povo, religião e baixo nível educacional andam juntos há muito tempo: em 2000, 4,4% de brasileiros tinham nível superior completo. Ainda que alcançássemos 7,9% em 2010, temos 92,1% sem formação universitária.
Não obstante, entre a população jovem brasileira, a faixa etária que mais estudou: são católicos, 34,3%; ateus, 19,3%; evangélicos, 14,9%, espíritas, 9,4%; fé sem religião, 6,7%; agnósticos, 6,2% (http://migre.me/uX0u6).
Vale ressaltar: pessoas ateias, de fé difusa e agnósticas, portanto sem controle formal de alguma religião, somam 32,1%; os jovens ateus estão concentrados no Sul e Sudeste, estados mais ricos e mais escolarizados.
As pesquisas que conferem evangélicos na população total indicam percentual de 25%, mas o que chama a atenção é o crescimento exponencial de igrejas e crentes, 61% em 10 anos, segundo o IBGE.
O que assusta é a ocupação política que esse conservadorismo, na contramão do crescimento de jovens não crentes, está fazendo do Parlamento por todo o Brasil: vereadores, deputados estaduais e federais, senadores.
Bispos, pastores, leigos alinhados a dogmas religiosos. Parlamentares que unem política e religião elegeram um número recorde de representantes; fizeram a Presidência da Câmara pela primeira vez.
Esse grupo busca outros postos-chave em Brasília a fim de ampliar seu nível de influência. Para deixar o Parlamento à sua imagem e semelhança, tentam expandir-se sobre outros postos importantes (http://migre.me/uX0ZW).
Esses novos sócios dos rumos da Nação são militantes, expansivos, disciplinados, barulhentos. Sua causa desvia das bibliotecas universitárias e com elas não tem nenhum compromisso. Sua obra monofalante é “A Palavra”.
Anima saber que jovens estudiosos afastam-se disso, mas a massa dos faltos de escola ainda é grande. Ignorância, religião, divindades no futebol. Almejo que não alcancem, como querem, “endireitar” a legislação.
Imagem Ilustrativa do Post: Evangelical Church // Foto de: Miroslav Vajdic // Sem alterações
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