Este é um chamado à ação contra a escravidão na América - Tradução de Aline Passos e Fernando Henrique Cardoso

21/08/2016

Tradução de Aline Passos e Fernando Henrique Cardoso - 21/08/2016

Em uma só voz, que se ergue das celas de confinamento solitário de longa duração e ecoa pelos dormitórios e pavilhões da Virginia ao Oregon, nós, presos dos Estados Unidos, decidimos, finalmente, acabar com a escravidão em 2016.

Em 09 de setembro de 1971, presos tomaram e fecharam Attica, a prisão mais conhecida do estado de Nova York. Em 09 de setembro de 2016, nós vamos iniciar uma ação para fechar as prisões de todo o país. Não vamos apenas exigir o fim da escravidão carcerária, vamos acabar com ela deixando de ser escravos.

Nos anos 1970, o sistema prisional americano desmoronava. Em Walpole, San Quentin, Soledad, Angola e muitas outras prisões, as pessoas se levantaram, lutaram e retomaram, das colônias agrícolas, o controle sobre suas vidas e seus corpos.

Durante os últimos seis anos, nós relembramos e renovamos aquela luta. Neste ínterim, a população carcerária inchou e as tecnologias de controle e confinamento se desenvolveram como as mais sofisticadas e repressivas da história mundial. As prisões, para se manterem estáveis, tornaram-se mais dependentes da escravidão e da tortura.

Os presos são forçados a trabalhar em troca de pouco ou nenhum pagamento. Isso é escravidão. A 13ª emenda da Constituição dos Estados Unidos mantém uma exceção legal para a continuidade da escravidão nas prisões do país.  Ela diz: “nem escravidão, nem servidão involuntária, salvo como punição por um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado, deve existir nos Estados Unidos”.

Capatazes vigiam nossos movimentos e, se não executarmos as tarefas que nos foram designadas da forma que eles querem, somos punidos. Eles podem ter substituído o chicote pelo spray de pimenta, mas muitos dos outros tormentos permanecem: isolamento, posições constrangedoras em que arrancam nossas roupas e revistam nossos corpos como se fossemos animais.

No dia 09 de setembro de 2016, iniciaremos uma ação para fechar todas as prisões do país. Não vamos apenas exigir o fim da escravidão carcerária, vamos acabar com ela deixando de ser escravos.

A escravidão está viva e passa bem no sistema carcerário, mas até o final desse ano, não estará mais. Este é um chamado para acabar com a escravidão na América.

Este chamado é endereçado aos próprios escravos. Nós não estamos fazendo exigências ou pedidos aos nossos carcereiros, estamos convocando nós mesmos para a ação.

Nós convocamos cada preso, em cada instituição estadual e federal deste país, a deixar de ser escravo, a deixar as plantações apodreceram nos campos, a fazer greve e parar de reproduzir as instituições que nos encarceram.

Este é um chamado a uma paralisação nacional do trabalho carcerário para acabar com a escravidão prisional, a ser iniciada em 09 de setembro de 2016. Eles não podem fazer essas instituições funcionarem sem nós.

Protestos não-violentos, paralisações, greves de fome e outras recusas à participação nas rotinas e necessidades das prisões aumentaram nos últimos anos. A greve de 2010 na prisão da Georgia, as massivas greves de fome que vêm acontecendo na Califórnia, o movimento de paralisação do trabalho “Alabama Livre”, em 2014, foram os que chamaram mais atenção, mas estão longe de serem as únicas demonstrações de poder dos presos.

Grandes greves de fome, às vezes efetivas, eclodiram na Penitenciária Estadual de Ohio, no Centro de Readaptação Menard, em Illinois, em Red Onion, na Virginia, assim como em várias outras prisões. O nascente movimento de resistência é diverso e interligado, e inclui centros de detenção de imigrantes, prisões para mulheres e instituições juvenis.

Este é um chamado a uma paralisação nacional do trabalho carcerário para acabar com a escravidão prisional, a ser iniciada em 09 de setembro de 2016. Eles não podem fazer estas instituições funcionarem sem nós.

No último outono, prisioneiras da Peniteniciária de Yuba, na Califórnia, juntaram-se a uma greve de fome iniciada por mulheres detidas nos Centros de Imigração da Califórnia, do Colorado e do Texas.

Prisioneiros por todo o país, regularmente, engajam-se numa miríade de demonstrações de poder a partir do interior das próprias prisões. Isso é feito, na maioria das vezes, por uma convicção solidária que constrói coalisões entre raças e gangues para confrontar o opressor comum.

Quarenta e cinco anos depois de Attica, as ondas de mudança estão voltando às prisões da América. Neste setembro, esperamos coordenar e disseminar esses protestos como uma única maré a que o sistema penal americano não consiga resistir ou ignorar. Nós esperamos acabar com a escravidão carcerária tornando-a impossível, recusando-nos a sermos escravos.

Para atingir este objetivo, precisamos do apoio das pessoas de fora. Uma prisão é um ambiente que facilmente se isola, um lugar de controle e confinamento onde a repressão está em cada tijolo e corrente, em cada gesto e cada rotina.

Quando nos erguemos contra essas autoridades, elas partem para cima da gente, e a única proteção que temos é a solidariedade vinda de fora. O encarceramento em massa, seja nos presídios privados ou administrados pelo Estado, é um esquema segundo o qual capitães-do-mato patrulham nossas vizinhanças e monitoram nossas vidas. Ele exige criminalização em massa.

Nossas aflições do lado de dentro são uma ferramenta usada para controlar nossas famílias e nossas comunidades do lado de fora. Certos americanos vivem todo dia não apenas ameaçados de execução sumária – como os protestos sobre as mortes de Mike Brown, Tamir Rice, Sandra Bland e tantos outros chamaram atenção – mas também sob a ameaça de serem capturados, jogados nessas colônias agrícolas, algemados e forçados a trabalhar.

Quarenta e cinco anos depois de Attica, as ondas de mudança retornam às prisões Americanas.

Nosso protesto contra a escravidão carcerária é um protesto contra a continuidade entre escola e prisão, um protesto contra o terror policial, um protesto contra os controles pós-prisionais. Quando nós abolirmos a escravidão, eles perderão muito do seu incentivo para prender nossas crianças, eles não construirão mais armadilhas para prender novamente os que já foram soltos.

Quando nós acabarmos com a motivação econômica e o trabalho forçado, essa graxa que movimenta a máquina do sistema penal nos EUA, toda a estrutura dos tribunais e da polícia, do controle e da captura, deverá mudar para nos acomodar como humanos, não como escravos.

As prisões têm impacto sobre todo mundo, quando nos levantarmos e as recusarmos, em 9 de Setembro, precisaremos saber que nossos amigos, familiares e aliados do lado de fora estarão conosco. Esta primavera e este verão serão estações de organização, de disseminação das nossas palavras, de construção de redes de solidariedade e de mostrar que estamos falando sério e o que somos capazes de fazer.

Levante-se, dê um passo adiante, junte-se a nós.

Contra a escravidão carcerária.

Pela libertação de todos.


Encontre mais informações, atualizações e materiais de divulgação nos sites:

SupportPrisonerResistance.net

FreeAlabamaMovement.com

IWOC.noblogs.org


*Texto publicado originalmente com o título: This is a Call to Action Against Slavery in America. Disponível em: < https://iwoc.noblogs.org/post/2016/04/>.


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Aline Passos é advogada, professora de direito e processo penal, doutoranda em sociologia e uma das conteudistas da página Mulheres Abolicionistas.

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Fernando Henrique Cardoso é Abolicionista. Membro do TaCAP – Tamoios Coletivo de Assessoria Popular. Bolsista de Extensão no projeto Vivências no Cárcere. Graduando em Direito na Universidade Federal Fluminense..    .


Imagem Ilustrativa do Post:  // Foto de: julio ulanga // Sem alterações.

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/yourcrazymindisnotmine/8409309757/

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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