Por Caroline Bispo – 13/10/2016
O encarceramento feminino nunca foi uma temática que se encontrava presente nas discussões e tampouco era objeto de estudo e preocupação, tendo em vista que se comparado aos presídios masculinos não existe a superlotação, tão somente, mas muito preocupante, a lotação de todas as unidades, até que essa realidade foi modificada ao tornar se alarmante a constatação do aumento de 567% de mulheres presas em 15 anos, no período do ano de 2000 até 2014, e essas informações somente foram possíveis por conta do primeiro relatório nacional sobre a população penitenciária feminina do País, o Infopen Mulher apresentado em novembro de 2015.
Ao analisar o grande aumento da população carcerária feminina o que se verifica principalmente é que as condições em que elas se encontram são totalmente desprezadas. Só o fato dessas mulheres terem um tratamento similar ao dos homens, sem acesso à cuidados básicos com a saúde e com a higiene que toda mulher necessita já por si só trás a problemática enfrentada por elas.
Somente após a entrada do código penal de 1940, é que foi estabelecida a separação física de homens e mulheres no interior das unidades prisionais, e mesmo que elas tenham sido feitas por homens e para homens meramente adaptadas para mulheres. A discussão dessa separação de corpos e gênero nas unidades simplesmente surgiu em 1937, e ainda assim mesmo com 79 anos de existência, ainda existem prisões mistas no Brasil, como o Sanatório Penal do Rio de Janeiro, unidade psiquiátrica mista.
A dignidade da pessoa humana, um dos principais basilares para nossa constituição é constantemente violada, e é necessário destacar que essas mulheres que lá se encontram foram condenadas a privação de liberdade de locomoção e não privação de dignidade.
A mulher gestante ao ser presa, não deveria ser inserida no sistema penitenciário e sim aguardar por julgamento em prisão domiciliar, conforme determina o código de processo penal, contudo não é o que encontramos e verificamos, apesar das audiências de custódias, a mulher gestante é considerada e tratada como uma criminosa violenta e assim é tratada pelas agentes penitenciarias até o momento de dar à luz, pois após esse momento ela deixa de ser enxergada como criminosa violenta pelo período de 6 meses e se torna mãe, até o momento do desligamento com seu bebê onde volta a ser tratada e considerada uma criminosa violenta.
No Rio de Janeiro, as gestantes ficam na unidade prisional Talavera Bruce juntamente com todas as outras presas, possuindo a mesma alimentação e os mesmos horários, tal como a última refeição ser servida ás 16:30 e a primeira ás 07:00. Ou seja, uma grávida que passa mais de 12 horas sem alimentação e sem cuidados básicos que qualquer gestante necessita.
O Estado do Rio de Janeiro, possui 5 unidades prisionais exclusivamente femininas, 1 unidade Materno Infantil, 1 hospital penal psiquiátrico misto e um total aproximado de 2.600 mulheres presas e 20 bebês encarcerados.
Observando que no Rio de Janeiro, a média de mulheres encarceradas é superior a média nacional, objetivando questionar e esclarecer com fatos, dados e informações reais os inúmeros erros que esse sistema prisional brasileiro ainda hoje age com relação as mulheres, criticar de forma direta a falta de cuidado em respeitar a dignidade da pessoa humana pura e simplesmente por serem mulheres surgiu no Estado do Rio de Janeiro o Grupo de Trabalho Elas Existem – Mulheres Encarceradas.
Elas Existem – Mulheres Encarceradas, surgiu em 7 de julho de 2016, coordenado pela Caroline Bispo e Nathalia Gaspar, visando lutar por essas mulheres mas também dar voz para todas as outras mulheres que trabalham com a temática através de eventos, palestras, arrecadação de doações, visita as unidades prisionais e também a unidade socioeducativa feminina para as adolescentes privadas de liberdade.
A luta por dignidade é uma luta constante, ainda mais numa sociedade tão punitivista e machista, por isso um grupo de mulheres e para mulheres veio para tentar combater essa realidade tão dolorosa que tantas milhares de mulheres estão vivendo no sistema prisional ainda hoje.
. Caroline Bispo é Advogada Criminalista, Pós Graduanda na UCAM-RJ, Coordenadora do Grupo de Trabalho e Estudo Elas Existem - Mulheres Encarceradas, Membro da Comissão de Política de Drogas da OAB/RJ e Membro da Comissão de Direito da Criança e Adolescente da OAB/RJ. .
Imagem Ilustrativa do Post: York Castle Museum - Prison Complex // Foto de: Historyworks // Sem alterações
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