Os benefícios previdenciários possuem o condão de garantir o mínimo existencial aos seus segurados e, por vezes, são concedidos em substituição ao salário que o trabalhador deixa de auferir em razão de alguma incapacidade, permanente ou temporária, que o impossibilite de trabalhar.
A priori, com fulcro na salvaguarda da dignidade humana desses indivíduos, por bem, o legislador infraconstitucional optou por conceder isenção de Imposto de Renda sobre determinados benefícios previdenciários em um rol taxativo de hipóteses.
Nesse sentido, o ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ministro Humberto Martins, deliberou que a isenção fiscal concedida aos portadores de doença grave tem por objetivo “abrandar o impacto da carga tributária sobre a renda necessária à sua subsistência e sobre os custos inerentes ao tratamento da doença, legitimando um ‘padrão de vida’ o mais digno possível diante do estado de enfermidade” (REsp 1.507.230).
Em especial, destaca-se que a Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, em seu artigo 6º, incisos IV e XIV, definiu a isenção de Imposto de Renda sobre as indenizações de trabalho e sobre os rendimentos relativos à aposentadoria, pensão ou reforma, desde que a pessoa física seja portadora de uma das doenças elencadas na referida norma.
Insta salientar que a Súmula nº 43 do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), aprovada pela 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), em 08 de dezembro de 2009, com acórdãos precedentes, Acórdão nº 104-21935, de 18/10/2006, Acórdão nº 104-21933, de 22/09/2006, Acórdão nº 106-15476, de 26/04/2006, Acórdão nº 102-47949, de 18/10/2006, Acórdão nº 104-20204, de 17/09/2004, dispõe sobre a dispensabilidade de que a moléstia profissional ou grave seja antecedente ao benefício:
Os proventos de aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, motivadas por acidente em serviço e os percebidos por portador de moléstia profissional ou grave, ainda que contraída após a aposentadoria, reforma ou reserva remunerada, são isentos do imposto de renda.
Para mais, a Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, elenca mais um rol de benefícios isentos, definindo:
Lei nº 8.541/1992, art. 48. Ficam isentos do imposto de renda os rendimentos percebidos pelas pessoas físicas decorrentes de seguro-desemprego, auxílio-natalidade, auxílio-doença, auxílio-funeral e auxílio-acidente, pagos pela previdência oficial da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e pelas entidades de previdência privada.
Frisa-se que a norma referência que a isenção abrange os benefícios pagos pela previdência oficial da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios e, ainda, a previdência privada. Por essa razão, a título de exemplo, tal como julgado pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região na Apelação Cível nº 753773520164013400, servidores públicos que possuem regimes próprios de previdência social, também têm direito à isenção.
Trata-se, portanto, de um direito cogente, diretamente relacionado com a ideia de mínimo existencial, constituindo o núcleo essencial dos direitos fundamentais, não sendo permitido, desse modo, o seu descumprimento pela autoridade administrativa. Sob a égide do princípio da legalidade, toda a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção deve ser interpretada de forma literal (CTN, art. 111, II).
Para a concessão de benefícios previdenciários, o interessado deve fazer o requerimento junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O processo administrativo é a via adequada para a solicitação de direitos previdenciários, sendo que, apenas se houver a negativa injustificada da autarquia federal, caracteriza-se o interesse em agir (condição processual), justificando a necessidade de ir a juízo.
Este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar o RE nº 631.240, paradigma do tema nº 350 de repercussão geral, que prolatou o acórdão cujos fundamentos defendem que a instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o artigo 5º, XXXV, da Constituição da República, não se configurando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. Por sua vez, essa exigência não prevalece quando é notório e reiterado o entendimento contrário da autarquia federal quanto ao que foi postulado pelo segurado.
A partir do deferimento do pedido dos benefícios elencados nos incisos IV e XIV, do artigo 6º, da Lei nº 7.713 e no artigo 48 da Lei nº 8.541/1992, o beneficiário já faz jus à isenção do Imposto de Renda sobre esses rendimentos. Contudo, não é incomum se observar o desconto indevido de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre valores recebidos, por exemplo, à título de aposentadoria por invalidez decorrente de acidente de trabalho ou moléstia grave, entre outros.
Diante disso, nasce para o segurado o direito potestativo de exigir a restituição do valor pago indevidamente nos últimos cinco anos (CTN, art. 168), a contar da data da extinção do crédito tributário (CTN, art. 168, I).
De acordo com Hugo de Brito Machado, “o direito à restituição do que tenha o contribuinte pago indevidamente tem inegável fundamento na Constituição, na medida em que esta garante que o tributo é devido na forma da lei”[1].
Assim, consoante o artigo 165, do Código Tributário Nacional, tem-se que “o sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento [...]”, quando da “cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido” (CTN, art. 165, I).
Além disto, em certos casos o direito de isenção só é concedido administrativamente tempo depois do início da moléstia. No entanto, consoante entendimento do STJ, o termo inicial da isenção do imposto de renda para as pessoas com moléstias graves, é a data da comprovação da doença mediante diagnóstico especializado.
Dessa forma, interpreta-se que o termo inicial do disposto no artigo 6º, XIV, da Lei nº 7.713/1988, não depende necessariamente da data de emissão do laudo oficial, mas da data de comprovação da doença realizada por profissional da saúde.
Como precedentes, destaca-se: AgRg no AREsp 312.149/SC, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 18/9/2015 e AgRg no REsp 1.364.760/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 12/6/2013.
Não obstante, observa-se que há decisões judiciais que desconsideram o laudo médico oficial, em favor do diagnóstico elaborado por médico assistente. Nesse sentido, a APL 9727520208172990 do TJ-PE julgou:
No caso, a despeito de a perícia médica oficial não ter entendido que a autora/apelada padece de cardiopatia grave, observo que foram acostados aos autos receituários, exames clínicos e laudos particulares subscritos por profissionais especialistas, os quais apontam no sentido da existência da moléstia grave afirmada. Sendo assim, havendo evidências suficientes de que a autora/apelada padece de cardiopatia grave, deve ser mantida a sentença de reconhecimento do direito à isenção de imposto de renda e de contribuição previdenciária sobre os proventos de pensão.
Assim, com base na Súmula 598 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento do direito à isenção do imposto de renda, desde que se demonstre por outros meios de prova.
Desse modo, apesar da confiança e da credibilidade do laudo pericial do serviço médico oficial, o AgRg no AREsp 81.149, no voto no Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgou que “[...] diante das demais provas produzidas nos autos, poderá concluir pela comprovação da moléstia grave”.
Além disso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece que não se faz necessário que a moléstia grave esteja ativa, conforme súmula nº 627:
O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade.
Quanto à restituição do indébito tributário (pagamento indevido), o artigo 165 do Código Tributário Nacional determina que o contribuinte tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo. Sendo possível pleitear o direito a restituição dos valores pagos indevidamente no prazo de 5 (cinco) anos, a contar da data da extinção do crédito tributário (CTN, artigo 168), desde que observada, evidentemente, a data de comprovação da doença.
Notas e referências
BRASIL. Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios (Código Tributário Nacional – CTN). Diário Oficial da União, Brasília, 25 de dez. de 1966. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm>. Acesso em: 04 de dez. de 2023.
BRASIL. Lei n.º 7.713, de 22 de dezembro de 1988. Altera a legislação do Imposto de Renda e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 22 de dez. de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7713.htm>. Acesso em: 04 de dez. de 2023.
BRASIL. Lei n.º 8.541, de 23 de dezembro de 1992. Altera a legislação do Imposto de Renda e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 23 de dez. de 1992. Disponível em: <https://legislacao.presidencia.gov.br/atos?tipo=LEI&numero=8541&ano=1992&ato=f94EzY610MFpWTcc6>. Acesso em: 04 de dez. de 2023.
BRASIL. Superior Tributal de Justiça. Recurso Especial: REsp 1507230 SC 2014/0344478-4. Relator: Ministro Sérgio Kukina. Data da publicação: DJ 05 de ago. de 2020. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/897114227?_gl=1*1aajrjo*_ga*NzM3ODYxOTQxLjE2ODUxMjA4MDk.*_ga_QCSXBQ8XPZ*MTcwMTY2MjUwNy44My4xLjE3MDE2NjI4OTQuNjAuMC4w>. Acesso em: 04 de dez. de 2023.
BRASIL. Superior Tributal de Justiça. Súmula n.º 67. DJe 17 de dez. de 2018. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/sumulas/sumula-n-627-do-stj/1289711236>. Acesso em: 04 de dez. de 2023.
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional, volume III. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 348-349.
[1] MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional, volume III. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 348-349.
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