Por Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth – 27/03/2017
“Contemporâneo é aquele que mantém fixo seu olhar no seu tempo, para nele perceber não as luzes, mas o escuro. Todos os tempos são, para quem deles experimenta contemporaneidade, obscuros. Contemporâneo é justamente aquele que sabe ver essa obscuridade, que é capaz de escrever mergulhando a pena nas trevas do presente.”
Giorgio Agamben
1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS
A partir de pesquisa empreendida por meio do “método” fenomenológico[1] – compreendido como “interpretação ou hermenêutica universal”, isto é, como revisão crítica dos temas centrais transmitidos pela tradição filosófica através da linguagem, como destruição e revolvimento do chão linguístico da metafísica ocidental –, o presente artigo tem por objetivo empreender uma análise da indistinção conceitual a que se chega contemporaneamente entre Direito Penal e guerra, como decorrência inafastável do processo expansivo vivenciado por este ramo do Direito nesta quadra da história. Para a consecução deste objetivo, o trabalho encontra-se dividido em duas partes.
No primeiro momento, discute-se o contexto histórico-sociológico no qual se produz referida indistinção conceitual. Busca-se, então, demonstrar as mudanças operadas no Direito Penal em decorrência do alarmismo em termos de segurança pública que passou a dominar o debate jurídico-penal após os atentados terroristas ocorridos em grandes centros urbanos no início deste século. Referidos eventos são considerados enquanto “mola propulsora” da nova doxa punitiva. O aporte teórico que dá sustentação a esse debate introdutório é buscado nas obras de Antonio Negri e Michael Hardt, Giorgio Agamben e Judith Butler.
No segundo momento, procura-se empreender uma análise das principais características que o Direito Penal, quando contaminado pela guerra, apresenta – daí a nomenclatura Direito Penal “de” Guerra. A partir da obra de Antoine Garapon, David Garland, Ana Isabel Pérez Cepeda e José Luís Díez Ripollés – dente outros –, a discussão centra-se, aqui, em aspectos do Direito Punitivo contemporâneo que reafirmam a indistinção conceitual defendida na primeira parte do trabalho.
2 DIREITO PENAL E GUERRA: (in)distinção conceitual?
No debate jurídico-penal contemporâneo, verifica-se a presença de um certo alarmismo em relação às novas formas assumidas pela criminalidade no contexto da globalização. Os atentados terroristas ocorridos em grandes centros urbanos no início deste século – a exemplo dos perpetrados em Nova Iorque em setembro de 2001 e em Madri em março de 2004 – deflagraram sinais de alerta nas políticas de segurança dos mais diversos países, suscitando a discussão sobre a capacidade dos poderes públicos em dar respostas efetivas a esses problemas.
Referidos eventos obrigaram ao reconhecimento, segundo Hardt e Negri (2005, p. 22-23), de que se vive na contemporaneidade uma situação de “guerra global”[2]: “não há como fugir ao estado de guerra” e “não há um fim à vista”, uma vez que a guerra é hoje uma condição geral, visto que “em determinados momentos e lugares, pode haver cessação das hostilidades, mas a violência letal está presente como potencialidade constante, sempre pronta a irromper em qualquer lugar.”
Uma análise da alteração verificada no emprego do conceito de guerra entre o fim do século XX e início do século XXI evidencia a veracidade dessa afirmação. Com efeito, a retórica da guerra passa a ser usada para fazer referência a atividades muito diferentes da guerra propriamente dita, ou seja, atividades que não envolvem violência letal ou derramamento de sangue. Usam-se as metáforas da guerra nos esportes, no comércio, na política interna de um país, etc, para indicar competição, mas uma competição que não se dá entre inimigos na acepção literal do termo, bem como para chamar a atenção para os riscos e conflitos envolvidos nessas atividades. Por outro lado, também se utiliza a retórica da guerra como manobra política para conseguir adesão de forças sociais em torno de um objetivo de união típico de um esforço de guerra, podendo-se citar como exemplo as “guerras contra a pobreza” (HARDT; NEGRI, 2005).
No entanto, a partir do momento em que a retórica da guerra passou a ser utilizada também para a mobilização social contra as drogas – no final do século XX – e contra o terrorismo – no início do século XXI –, ela começou a assumir um caráter mais concreto. Ainda que, como no caso da guerra contra a pobreza, os “inimigos” não são apresentados como Estados-nação ou comunidades políticas específicas, ou sequer como indivíduos, e sim como “conceitos abstratos ou talvez um conjunto de práticas”, essas guerras “não são assim tão metafóricas, pois, como no caso da guerra tradicional, envolvem combates armados e força letal.” Com isso, nessas guerras “é cada vez menor a diferença entre o exterior e o interior, entre os conflitos externos e a segurança interna”, razão pela qual se pode falar na passagem “das invocações metafóricas e retóricas da guerra para guerras reais contra inimigos indefinidos e imateriais.” (HARDT; NEGRI, 2005, p. 35).
Resultado disso, é que o estado de exceção – paradoxalmente – transforma-se na regra, fazendo com que se torne cada vez mais obscura a distinção tradicional entre guerra e política, dado que “a guerra vai-se transformando no princípio básico de organização da sociedade, reduzindo-se a política apenas a um de seus recursos ou manifestações.” (HARDT; NEGRI, 2005, p. 33).
De acordo com Agamben (2004, p. 13), o estado de exceção “tende cada vez mais a se apresentar como o paradigma de governo dominante na política contemporânea.” Isso ameaça transformar radicalmente “a estrutura e o sentido da distinção tradicional entre os diversos tipos de constituição”, dado que o estado de exceção se apresenta “como um patamar de indeterminação entre democracia e absolutismo.”
Para ilustrar o exposto, o autor utiliza as medidas adotadas pelos EUA no período pós-11 de setembro no “combate ao terrorismo” – como a “indefinite detention”, o processo perante as “military commissions”, bem como o “USA Patriot Act” –, argumentando que “a novidade da ‘ordem’ do presidente Bush está em anular radicalmente todo estatuto jurídico do indivíduo, produzindo, dessa forma, um ser juridicamente inominável e inclassificável.” (AGAMBEN, 2004, p. 14).
Isso porque os homens capturados no Afeganistão e presos em Guantánamo não gozam do estatuto de prisioneiros de guerra segundo a Convenção de Genebra[3], bem como não são considerados acusados pelas leis norte-americanas. Quer dizer: “nem prisioneiros nem acusados, mas apenas detainees, são objeto de uma pura dominação de fato, de uma detenção indeterminada não só no sentido temporal mas também quanto à sua própria natureza, porque totalmente fora da lei e do controle judiciário.” (AGAMBEN, 2004, p. 14).
Com efeito, em relação aos “terroristas” capturados em Guantánamo, parece haver uma completa desconsideração do fato de que “a superioridade política e moral de uma sociedade livre e democrática consiste, justamente, em tratar seus inimigos como pessoas com direitos mínimos e não se colocar no mesmo nível deles”, razão pela qual “não se leva a cabo uma ‘guerra’ contra terroristas, mas sim, procura-se combatê-los com os meios do direito penal do Estado de Direito”, uma vez que esta é a única forma de se prestar um serviço à justiça e se “criar a base para a superação do injusto terrorista.” (AMBOS, 2011).
Ao comentar as fotografias dos prisioneiros de Guatánamo divulgadas pelo Departamento de Defesa dos EUA, Butler (2009, p. 104) refere que eles se assemelham a animais enjaulados, o que, segundo a autora, representa um processo de “bestialización de lo humano”, corroborado pelas afirmações de Donald Rumsfeld no sentido de que os referidos prisioneiros não são como outros seres humanos em guerra, razão pela qual “no son ‘castigables’ para la ley, sino merecedores de una reclusión forzada inmediata y sustenida.” São, portanto, considerados “algo menos que humanos, que de algún modo asumen forma humana”, razão pela qual se pode afirmar que eles representam “una equivocación de lo humano, lo que explica en buena parte el esceptismo acerca de la aplicabilidad de leyes e derechos.”[4] Afinal, trata-se de vidas que não merecem ser lamentadas.[5]
A violência, nesses casos, é exercida contra sujeitos irreais, considerando-se que não há dano ou negação possíveis a partir do momento que se está tratando de vidas já negadas, de vidas que já estavam perdidas para sempre, ou que nunca “foram”, razão pela qual devem ser eliminadas por viverem obstinadamente nesse estado moribundo. Em um contexto tal, a “desrealização” do “outro” quer dizer que não está nem vivo nem morto, mas em uma interminável condição de “espectro”. Assim, a paranoia infinita que vê a guerra contra o terrorismo como uma guerra sem fim se justifica incessantemente em relação com a infinitude espectral de seu inimigo, sem considerar se há ou não bases firmes para suspeitar da existência de células terroristas em contínua atividade (BUTLER, 2009).
Ao se debruçar sobre o caso específico da “indefinite detention”[6] em Guantánamo, Butler (2009) assevera que em nome de alertas de segurança e de um estado de emergência, a lei acaba sendo suspensa em plano nacional e internacional e, juntamente com a suspensão da lei, impõe-se um novo estado de soberania que não somente se exerce fora da lei, mas por meio da criação de uma burocracia administrativa na qual os funcionários, além de decidir quem será julgado e quem será detido, são também os que têm a última palavra acerca da detenção indefinida de uma pessoa.
Neste casos,
la propia ley queda suspendida, o bien considerada como un instrumento que el Estado puede poner al servicio de constreñir y delimitar una población dada. El Estado no está sujeto al estado de derecho, pero la ley puede suspenderse o desplegarse táctica y parcialmente para cumplir con los requisitos de un Estado que busca cada vez más dotar de un poder soberano al Ejecutivo y a la administración. La ley se suspende en nombre de la ‘soberanía’ de la nación –entendida como la obligación de cualquier Estado de preservar y proteger su propia territorialidad–. Por este acto de suspender la ley, el Estado queda entonces desarticulado en un conjunto de poderes administrativos que en alguna medida se sitúan en el exterior del aparato del Estado mismo, mientras que las formas de soberania que resucitan en su interior señalan la persistencia de formas de poder para el Ejecutivo previas a la emergencia del Estado moderno (BUTLER, 2009, p. 85).
Por meio desse ato de suspensão da lei, o Estado “produce una ley que no es una ley, una corte que no es una corte, un proceso que no es un proceso”, quer dizer, o estado de emergência “retrotrae el funcionamiento del poder de un conjunto de leyes (judiciales) a un conjunto de normas (gubernamentales) que restablecen el poder soberano”, sendo que essas normas “no son obligatorias a causa de las leyes establecidas o de modos de legitimación, sino completamente discrecionales, incluso arbitrarias, ejercidas por funcionarios que las interpretan unilateralmente y que deciden las condiciones y la forma en que son invocadas.” (BUTLER, 2009, p. 91-92).
Nesse contexto, a lei não é aquilo a que o Estado está sujeito, tampouco representa um critério de aferição da (i)legitimidade de um ato de governo: ela é compreendida como um mero instrumento, ou seja, um dispositivo de poder que pode ser aplicado ou suspenso à vontade. Por isso, a soberania consiste hoje “na aplicación variable de la ley, en su tergiversación y en su suspensión. Bajo su forma actual, constituye una relación de explotación de la ley, instrumental, desdeñosa, sustitutiva, arbitraria.” (BUTLER, 2009, p. 114).
É o Executivo, nesses casos, que avalia que determinado indivíduo ou grupo constituem um perigo para o Estado. No entanto, dita “avaliação” é realizada em um contexto de emergência, no qual o Estado pode exercer prerrogativas de poder que compreendem a suspensão da lei. Assim, avaliar alguém como perigoso é suficiente para convertê-lo em perigoso e justificar sua detenção indefinida, ou seja, transformá-lo em um mero “objeto” nas mãos do Estado. Afinal, “si una persona es simplemente juzgada peligrosa, entonces deja de ser un problema decidir si cometió algún acto criminal.” (BUTLER, 2009, p. 106-107).[7]
A propósito, cumpre referir que muitos dos detentos de Guantánamo sequer possuíam ligação com o regime talibã. A jornalista americana de origem afegã Mahvish Rukhsana Khan (2008) relata o caso de homens afegãos (dentre eles um pediatra e um idoso de 80 anos com seqüelas de um derrame) que foram “vendidos” por desafetos seus – por meio de falsas denúncias, portanto – aos americanos como terroristas ligados à Al-Qaeda, em função do alto valor das recompensas pagas pelo governo americano, alardeadas por meio de panfletos que eram “pulverizados” de avião sobre o Afeganistão após os atentados de 11 de setembro. A partir de relatos da Anistia Internacional, Khan (2008, p. 74) denuncia o fato de que muitos dos homens apreendidos “eram ‘preparados’ nas prisões locais, para que suas barbas crescessem e parecessem mais com talibãs antes de serem vendidos aos militares americanos.”[8]
É por isso que Delmas-Marty (2010) assevera que os eventos terroristas de 11 de setembro de 2001 marcaram uma reviravolta:
aux Etats-Unis, la proclamation de l’état de guerre a permis de suspendre l’Etat de droit, ce qui a conduit à légitimer la torture et des formes extrêmes de déshumanisation : on se souvient de ces hommes enfermés dans des cages à Guantánamo, ou des prisonniers tenus en laisse à Abou Ghraib… Certes, l’état d’exception est supposé provisoire. Mais s’agissant d’un terrorisme global, qui n’a ni commencement ni fin, cet état tend à devenir permanent, d’autant que la “suspension” s’accompagne d’un “détournement” de l’Etat de droit, par transfert de pouvoirs à l’armée, voire à des sociétés militaires privées.
Tais constatações, para Agamben (2004, p. 131), não representam, no entanto, nenhuma novidade. A seu ver, o estado de exceção enquanto forma de governo continuou a funcionar quase sem interrupção a partir da I Guerra Mundial, por meio do fascismo e do nacional-socialismo, até nossos dias, quando atinge exatamente seu máximo desdobramento planetário[9]. Hoje, o aspecto normativo do direito pode ser “impunemente eliminado e contestado por uma violência governamental que, ao ignorar no âmbito externo o direito internacional e produzir no âmbito interno um estado de exceção permanente, pretende, no entanto, ainda aplicar o direito.”
É importante destacar que, em um contexto tal, cada vez mais – lembra Pérez Cepeda (2007) –, são criados “inimigos” com o objetivo único de eliminar toda resistência às estratégias das posições dominantes. A criação de uma atmosfera de medo desses inimigos – personificados ora pelo “terrorista”, ora pelo “criminoso contumaz”, ora pelo “imigrante” – converte-se, então, em um condicionante importante das políticas de segurança, sendo utilizado como escusa perfeita para evitar a perda de velocidade de projetos neoliberais hegemônicos de um Ocidente que, na linguagem de Chomsky (2002), sempre foi bastante eclético na sua escolha de inimigos, sendo os critérios de escolha, basicamente, a subordinação e o servilismo ao poder.
Afinal, deve-se recordar que o medo alimenta o medo e que há uma porosidade entre o medo que se ente em relação ao outro e o medo de um mudo que é percebido como sendo cada vez mais perigoso em escala global em função, dentre outros fatores, do terrorismo global, da cibercriminalidade, etc. Tudo isso se mescla para criar uma “sociedade do medo”, potenciada em função da fragilização do Estado: “l’Etat se trouve débordé, au sens propre (les risques devenus planétaires ne s’arrêtent évidemment pas à la frontière de chaque Etat), et au figuré (aucun Etat ne dispose de réponses efficaces à lui seul).” (DELMAS-MARTY, 2010).
E são exatamente esses fatores os determinantes para se afirmar que, na contemporaneidade, a guerra se transforma em um “regime de biopoder, vale dizer, uma forma de governo destinada não apenas a controlar a população, mas a produzir e a reproduzir todos os aspectos da vida social.” (HARDT; NEGRI, 2005, p. 34). Afinal, deve-se considerar o fato de que “uma guerra para criar ou manter a ordem social não pode ter fim. Envolverá necessariamente o contínuo e ininterrupto exercício do poder e da violência. (HARDT; NEGRI, 2005, p. 35).
Em outras palavras,
la guerra se convierte en un instrumento natural para preservar un orden igualmente natural que se identifica indisolublemente con los intereses neoliberales y con el instrumento decisório de su ideario político: el dominio del mercado mundial o la ideología del liberalismo, reduciendo la mundialización a una dimensión, la económica. (PÉREZ CEPEDA, 2007, p. 126).
Como conseqüência disso, tem-se uma indeterminação dos limites espaciais e temporais da guerra:
a guerra à maneira antiga contra um Estado-nação tinha claras delimitações espaciais, embora pudesse eventualmente disseminar-se por outros países, e seu fim geralmente era marcado por uma rendição, uma vitória ou uma trégua entre os Estados em conflito. Em contraste, a guerra contra um conceito ou um conjunto de práticas, mais ou menos como uma guerra de religião, não conhece limites espaciais ou temporais definidos. Tais guerras podem estender-se em qualquer direção, por períodos indeterminados. E com efeito, quando os dirigentes americanos anunciaram sua ‘guerra ao terrorismo’, deixaram claro que deveria estender-se por todo o mundo e por tempo indefinido, talvez décadas ou mesmo gerações inteiras. (HARDT; NEGRI, 2005, p. 35).
Em um contexto tal, o Direito Penal é eleito como instrumento privilegiado de resposta ao “conjunto de práticas” que se convencionou chamar de ora de “terrorismo”, ora de “crime organizado”, ora, simplesmente, de “imigração irregular”. E, no ambiente de “guerra global”, passou-se a preconizar a expansão do raio de intervenção do Direito Punitivo, bem como a destacar a importância de se relegarem ao segundo plano princípios e garantias que davam sustentação à sua teorização liberal, em nome de uma maior eficiência no “combate”.
Isso tem conduzido, como adverte Pérez Cepeda (2007), em âmbito global, a uma simbiose entre as noções e conceitos que outrora separavam o Direito Penal da guerra, o que fica claro a partir da análise de algumas das principais características que o Direito Penal contemporâneo passa a assumir, como se demonstrará na sequência.
3 DIREITO PENAL (D)E GUERRA: notas características
Como assevera Daunis Rodríguez (2005), contemporaneamente o legislador estatal encontra-se disposto a incorporar na legislação penal mais delitos, penas mais duras e regras mais severas, sem atentar para os princípios e garantias penais e processuais clássicos, com o objetivo simbólico de conseguir uma maior eficiência em face da criminalidade e uma maior “segurança cidadã”.
Intenta-se fazer a resposta punitiva mais eficiente e mais rápida, limitando ou suprimindo garantias substanciais e processuais estabelecidas a partir da tradição do Direito Penal liberal, o que representa, segundo Baratta (2000, p. 41), um retorno às formas de processo pré-modernas, onde “el proceso crea la prueba, el proceso crea el criminal, el proceso es la pena principal.”
Por conseguinte, na ótica do referido autor (2000, p. 41), a partir dessas mudanças, chega-se a um “modelo totalitário de política criminal”, a uma espécie de “suave inquisição”, em conflito com o sistema liberal e democrático correspondente à legalidade constitucional. Reflexos da acima referida indistinção conceitual entre Direito Penal e guerra, que permite falar em um modelo de Direito Penal “de” Guerra (por mais paradoxal que isto possa parecer), cujas características peculiares serão neste tópico analisadas.
3.1 O retorno (vindicativo) da vítima
Como primeira característica digna de nota do “novo” Direito Penal, pode-se salientar uma cada vez maior identificação/solidarização do Direito Punitivo com as vítimas do crime. Deixa-se de ver no Direito Penal um instrumento de defesa dos cidadãos em face do arbítrio punitivo estatal – ou seja, como Magna Carta do delinquente – e passa-se a percebê-lo como Magna Carta da vítima.
Isso implica um consenso restritivo quanto aos riscos admitidos. O sujeito que se considera vítima potencial de um delito não aceita a consideração de determinados riscos como permitidos, o que resulta em uma definição social-discursiva expansiva do âmbito de incidência do Direito Penal: a identificação social com as vítimas da criminalidade redunda na reivindicação por maior eficiência na sua aplicação e/ou na reparação dos efeitos do delito (SILVA SÁNCHEZ, 1999).
Silva Sánchez (1999) destaca, nesse sentido, o papel desempenhado pelas associações de vítimas e pelas ONG’s enquanto “gestoras atípicas da moral” que encabeçam movimentos que pugnam pela expansão punitiva para a proteção dos interesses que defendem (ecologistas, feministas, consumidores, etc).[10]
Em decorrência disso, o princípio da “neutralização da vítima” – segundo o qual o papel por ela desempenhado no Direito Penal deve ser limitado de forma a não condicionar o interesse público que subjaz à intervenção punitiva – é mitigado. Em parte, pelas pressões exercidas pelas ONG’s e associações acima referidas; em parte, porque se descobriu a “importância política” das vítimas.
Com efeito, uma população com “medo” do crime identifica-se antes com a figura das vítimas que com a figura dos delinquentes, razão pela qual, utilizando-se das vítimas como instrumentos de comunicação política, atende-se – de forma politicamente rentável, é claro – aos anseios da sociedade. Na análise de Garland (2005, p. 241),
si las víctimas fueron alguna vez el resultado olvidado y ocultado del delito, ahora han vuelto para vengarse, exhibidas públicamente por políticos y operadores de los medios masivos de comunicación que explotam permanentemente la experiencia de la víctima en función de sus proprios intereses. La figura santificada de la víctima que sufre se há convertido en un producto apreciado en los circuitos de intercambio político y mediático y se colocan individuos reales frente a las cámaras y se los invita a jugar ese papel, muchas veces conviertiéndose, durante el proceso, en celebridades mediáticas o activistas de movimientos de víctimas.
Nesse sentido, é forte a tendência dos partidos políticos na “instrumentalização” das vítimas para anunciar e promulgar leis penais, as quais assumem, não raras vezes, os seus nomes. No cenário brasileiro, o exemplo mais recente e expressivo desta característica é a Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), que instituiu tratamento mais severo para os acusados de “violência doméstica”, tendo sido assim nomeada em homenagem a uma vítima deste tipo de violência, que, agredida pelo marido por anos a fio, acabou ficando paraplégica.[11]
Nesse contexto, a relação entre vítimas e delinquentes representa um jogo de soma zero, pois qualquer expectativa dos segundos, por exemplo, em relação a garantias processuais ou benefícios penitenciários, é compreendida como uma perda para as primeiras, que as veem como agravos ou formas de elidir as consequências da condenação. Por outro lado, todo avanço na melhora da atenção às vítimas do delito implica um agravamento das condições existenciais dos delinqüentes (DÍEZ RIPOLLÉS, 2007).[12]
Isso resulta, na ótica do sobredito autor (2007, p. 77-78), em uma inversão de papéis:
es ahora la víctima la que subsume, dentro de sus propios intereses, los intereses de la sociedad; son sus sentimientos, sus experiencias traumáticas, sus exigencias particulares los que asumen la representación de los intereses públicos; éstos deben particularizarse, individualizarse, en demandas concretas de víctimas, afectados o simpatizantes.
Garapon (2010, p. 122) reflete, a propósito do retorno da vítima ao centro do Direito Penal, que “le sens de la peine n’est plus référé à des valeurs substantielles partagées par tous mais à une attente de reconnaissance individuelle (dont la satisfaction est néanmoins une valeur commune).” Para o autor (2010, p. 125), a pena deixa de ser “sofrimento em retribuição” para se tornar “reconhecimento”, no sentido duplo de confissão dos fatos e de aceitação do outro: “puisque le mal est défection de l’imagination du semblable, la justice est la dramatisation de ce face-à-face, la mise en scène de cette ‘reconnaissance’.”
A esse respeito, deve-se considerar que não existem várias maneiras de regular a violência dentro de uma sociedade, mas essencialmente duas: ou uma integração moral elevada garantida por uma instituição central, ou, ao contrário, por uma grande autonomia deixada aos indivíduos que lhes dá a tarefa de restaurar a ordem. Um é o modelo retributivo, o outro o modelo restitutivo. Nesse sentido, ao encontrar seu centro de gravidade não mais dentro da lei, mas na reparação do ultraje feito à vítima, a pena neoliberal nos faz passar do primeiro modelo ao segundo, onde o essencial não é tanto pagar um tributo à lei ou assumir um compromisso de se reformar (porque o mal não é mais produto de uma má intenção) mas sim de restituir à vítima a parte que lhe foi tomada (GARAPON, 2010).
3.2 O legislador “cool” e a politização do Direito Penal
Uma outra característica do Direito Penal contemporâneo, que decorre da anterior, é a sua politização. Passa-se a utilizar politicamente a noção de segurança, o que pode ser visto como o resultado de um empobrecimento ou simplificação do discurso político-criminal, que passa a ser orientado tão somente por campanhas eleitorais que oscilam ao sabor das demandas conjunturais midiáticas e populistas, em detrimento de programas efetivamente emancipatórios (PÉREZ CEPEDA, 2007).
Como refere Garland (2005, p. 192).
el político, que suele ver las iniciativas de políticas públicas en términos de su atracción política y en relación con otras posiciones políticas, actúa en el marco del horizonte temporal de la competencia eleitoral, a la luz de la publicidad obsesiva de los medios masivos de comunicación y se basa fundamentalmente en un saber ‘político’- sobre la opinión pública, las preferências de grupos focales, las tácticas de la oposición y los resultados de la investigación científica. Las iniciativas de políticas públicas son frecuentemente reactivas, desencadenadas por eventos particulares y deliberadamente partisanas. Como consecuencia, tienden a ser apasionadas e improvisadas, construidas en torno a casos impactantes pero atípicos y a estar más preocupadas de ajustarse a la ideologia política y a la percepción popular que al conocimiento experto o a las capacidades comprobadas de las instituciones.
Afinal, nenhuma outra parcela do ordenamento jurídico é mais sensível às variações ideológicas do que o Direito Penal. A influência dos câmbios políticos nas leis punitivas é evidente com uma análise fugaz da história dos povos. O direito de castigar expressa, em grande medida, a ideologia e, por conseqüência, as convicções ou falta de convicções jurídicas de uma determinada sociedade. O Direito Penal se apresenta como um instrumento a serviço da política criminal e esta é uma parte da política geral do Estado, o que converte o Direito Penal em um instrumento político (CUEVA, 2002).
No contexto atual, o Direito Penal passa a ser visto enquanto “arma política”, ou seja, como um “instrumento de comunicação” por meio do qual os poderes públicos deixam de se preocupar com o que pode ser feito de melhor para se preocupar com o pode ser transmitido de melhor. Isso decorre do fato de que, caso os poderes públicos não admitam as demandas populares em prol do recrudescimento punitivo, correm o risco de perderem sua clientela eleitoral e/ou serem vistos como antiquados ou “fora de moda”. Agindo de acordo com as demandas, por outro lado, eles conseguem obter capital político por meio da demonstração exemplar da atividade da prática legislativa e da justiça penal – tornam-se, portanto, “cool”, na expressão de Zaffaroni (2007).
3.3 A criminologia do fim da história e a derrocada do ideal da reabilitação
Uma terceira característica apresentada pelo Direito Penal contemporâneo é a derrocada do ideal da reabilitação enquanto função da pena. Como assevera Garapon (2010, p. 118), a pena neoliberal não tem mais a ambição de reabilitar os criminosos:
peut-être parce que la perspective d’une transformation de l’individu est étroitement liée à um espoir collectif. Le Code pénal, a été redige par des révolutionnaires qui croyaient que la liberté rendrait les hommes meilleurs et qu’elle tarirait nombre de comportements vicieux. Le modèle thérapeutique a eté par l’essor de la médecine, de l’anthropologie et de la psychologie qui fondaient l’attente d’une possible guérison. Le néolibéralisme introduit une rupture par son pessimisme. Désormais c’est dans lês sciences cognitives et le capital génétique que l’on cherche la vérité d’un homme, sa predestination á la vilence, ‘car il n’y a destin que là oú il n’y a plus d’histoire.
É por isso que o autor (2010) refere que o modelo neoliberal é caracterizado por uma criminologia do fim da história, que perdeu toda a esperança de mudar o mundo, mas que demanda aos indivíduos apenas adaptação. Diferentemente do modelo disciplinar – que era ao mesmo tempo segregativo e assistencialista – o modelo atual repousa sobre um modelo adaptativo-eficientista. O controle preventivo não tem outro propósito além de impedir a ocorrência do evento criminoso. E, em razão disso, “toutes les perspectives d’amélioration des conditions de vie, de transformation de l’individu sont abandonnées, comme des chimères peut-être mais surtout comme des données non mesurables et donc aléatoires, sujettes toujours à discussion.” (GARAPON, 2010, p. 136).
Alguns exemplos disso podem ser mencionados. Em primeiro lugar, pode-se falar da Lei francesa que trata da Retenção por Segurança (Retention de sûreté), criada em 2008 pelo governo Sarkozy. Referida lei permite a prolongação indeterminada da pena de um criminoso reincidente quando pesa sobre ele a suspeita de “periculosidade”. Isso mostra, segundo Delmas-Marty (2010), que “on ne le punit pas pour sa faute mais on le neutralise comme on le ferait d’un animal dangereux.”
Da mesma forma, o bracelete eletrônico e a castração química, duas inovações recentes, conduzem àquilo a que Garapon (2010) denomina “coração da pena neoliberal”. O primeiro é visto como uma maneira de resolver a equação posta pelo aumento da repressão, por um lado e, de outro, para manter as prisões habitáveis, não muito lotadas, contendo, reflexamente, os orçamentos. Isso porque o referido equipamento permite acompanhar um detento em sua residência, além de traçar todos os seus deslocamentos.
A expressão “castração química” designa uma regulação medicamentosa da libido. A expressão tira sua força do cruzamento de dois fantasmas. De uma vingança arcaica, em primeiro lugar (olho por olho, dente por dente, castração dos violadores), que oferece uma revanche para aqueles que não se recuperaram da supressão da pena de morte. A dimensão restitutiva não está totalmente ausente, quer através da idéia de remover algo do delinquente, como se se operasse uma troca obscura entre a diminuição da capacidade de agir que ele infligiu à sua vítima e que agora lhe está sendo imposta. A pena consiste em inibir o centro do poder masculino, mas sem tocar o corpo, porque ela usa para isso – segundo fantasma – a ciência. Opera-se assim uma espécie de retração da pena democrática para a arcaica, mas um arcaico para saciar aos mais modernos. Em realidade uma neutralização máxima, a castração química cumula as funções repressiva e preventiva da pena: ela é ao mesmo tempo uma medida de segurança e punição (GARAPON, 2010).
Segundo o já referido autor (2010, p. 139-140)
la castration chimique revient à emprisioner le désir à l’interieur du sujet, et uniquement le désir; le strict minimum en quelque sorte. En étant censé neutraliser le siège de la pulsion, le médicament assume l’idée d’une altérité de la pulsion (qui n’est pás si éloignée de l’idée ancienne de possession). Agir sur le comportement, c’est agir sur le désir (comme le confirme le projet imaginé un instant, de lutter contre l’absentéisme scolaire en offrant une prime aus eleves assidus). La peine ne parle plus á la raison, ne fait plus appel au sens moral, mais localise le siège du mal qui sera aussi la cible de la prévention: le désir, mais ramené à sa composante biochimique: ou, plus exactement encore, la pulsion (ce qui montre un point supplémentaire de comparaison avec le vitalisme). La cause du comportement dengereux est recherchée dans um surplus de testostérone, ce qui induit une réponse d’ordre moléculaire. Il n’y a plus aucune dimension morale: le crime est ramené à une cause strictement physiologique. C’est tout à fait coherent avec le postulat néolibéral qui situe la determination du comportement dans l’organique voire la génétique.
Estas duas penas – bracelete eletrônico e castração química – seguem o rastro do indivíduo, elas aderem à sua pele e até mesmo penetram em seu organismo. São penas incorporadas. O sujeito não pode se separar de sua pena. Elas são penas não localizadas e ambulatórias, que seguem o indivíduo, que o acompanham o tempo todo. Elas tendem a otimizar a liberdade e a segurança. Podemos conciliá-las com a biometria: a securitização passa por uma incorporação, ou por uma biologização das medidas de controle (GARAPON, 2010).
Referida mudança no pensamento criminológico é acompanha da repristinação da “tese da escolha racional”, segundo a qual o crime é concebido como um problema de indisciplina, de falta de autocontrole ou de controle social deficiente:
el modelo da la elección racional considera los actos delictivos como una conducta calculada que intenta maximizar los benefícios, como consecuencia de un proceso simple de elección individual. Este modelo representa el problema del delito como una cuestión de oferta y demanda, en el marco de la cual el castigo opera como un mecanismo de establecimiento de precios. Considera a los delincuentes como oportunistas racionales o delincuentes profesionales cuya conducta es disuadida o desinhibida por la puesta en marcha de desincentivos, un enfoque que hace da las penalidades disuasivas un mecanismo evidente de reducción del delito. (GARLAND, 2005, p. 220).
Não há, portanto, discutir os motivos que levam alguém a delinquir, uma vez que “a justiça está aí para punir os culpados, indenizar os inocentes e defender os interesses dos cidadãos que respeitam a lei.” (MURRAY apud WACQUANT, 2001, p. 50).
3.4 A antecipação do risco (ou o Direito Penal no pretérito imperfeito do subjuntivo)
Do exposto no tópico precedente, outra característica que merece destaque é a cada vez maior instrumentalização do Direito Penal no sentido de evitar que os riscos se convertam em situações concretas de perigo. Assim, no lugar de um Direito Penal que reacionava a posteriori contra um feito lesivo individualmente delimitado, surge um Direito Penal de gestão punitiva dos riscos em geral, tornando-se possível falar em um processo de administrativização do Direito Penal, que traz em seu bojo uma supervalorização e o consequente incremento punitivo de infrações de deveres de cuidado, de forma a dar resposta não só aos delitos de perigo abstrato, mas também aos chamados delitos de acumulação[13], no marco da luta contra as novas formas de criminalidade (SILVA SÁNCHEZ, 1999).
Garapon (2010) destaca, a propósito, que não é mais o presente o tempo de referência, mas o futuro, um futuro antecipado e planejado nas suas mais negras possibilidades. Dá má intenção, o Direito Penal neoliberal “glisse vers l’imprudence, le défaut de vigilance, c’est-à-dire l’absence d’anticipation (vertu cardinale du néolibéralisme pour qui l’acteur de marche doit anticiper le comportement des autres).” (GARAPON, 2010, p. 115).
Neste contexto, se uma lei é transgredida, o dano objetivo a que visa o Direito Penal contemporâneo é um suposto resultado de uma má avaliação do risco, de uma falta de vigilância. E essa nova penalogia se funda sobre a criminologia atuarial que consiste em encontrar as características recorrentes de um comportamento humano para melhor prevê-lo. Se o perfil do predador sexual é predefinido por uma dezena de características objetivas, a polícia vai se concentrar sobre esses perfis e relaxar a vigilância sobre os outros (GARAPON, 2010). Nas palavras de Delmas-Marty (2010), organiza-se “la traçabilité des personnes sur le modèle de la traçabilité des marchandises. Nous pourrions tous devenir des suspects sous surveillance.”
Ocorre que o método atuarial é baseado em uma completa descontextualização e a-historicização dos eventos. Encontramos a dimensão especular do neoliberalismo que pretende simplesmente devolver de maneira mais fina a realidade do comportamento dos indivíduos. A criminologia atuarial homogeiniza e particulariza ao mesmo tempo. Os dados estatísticos que ela utiliza promovem a dimensão científica e sociológica desta “nova penalogia”, em detrimento do humanismo (GARAPON, 2010).
Como assevera Garland (2005, p. 52),
las teorías que ahora moldean el pensamiento y la acción oficial son teorías del control, de diversas clases, que consideran el delito como un problema, no de privación, sino de control inadecuado. Controles sociales, controles situacionales, autocontroles: éstos son ahora los temas dominantes de la criminologia contemporánea y de las políticas de control del delito a las que han dado origen.
Verifica-se que, ao contrário das teorias criminológicas que viam no delito um processo de socialização insuficiente e que, portanto, reclamavam do Estado a ajuda necessária para aqueles que haviam sido privados de provisões econômicas, sociais e psicológicas necessárias para uma conduta social respeitosa à lei, as teorias do controle partem de uma visão pessimista da condição humana, ao suporem que os indivíduos são atraídos por condutas egoístas, antissociais ou delitivas a menos que sejam inibidos por controles sólidos e efetivos (GARLAND, 2005).
Assim, “mientras la antigua criminología exigía mayores esfuerzos en las partidas presupuestarias a la ayuda y el bienestar social, la nueva insiste en ajustar los controles y reforzar la disciplina.” (GARLAND, 2005, p. 53). Isso porque se parte da compreensão de que os delinquentes são atores racionais que respondem a desincentivos e são plenamente responsáveis por seus atos delitivos. Nessa lógica, os delinquentes apenas “aproveitam” as oportunidades que lhes são apresentadas para a prática delitiva, razão pela qual as soluções que se apresentam para essas “tentações” transitam por duas vias principais: a) pelo reforço dos efeitos intimidatórios e reafirmadores da vigência das normas, próprios de penas suficientemente graves, a fim de que os delinqüentes possam, por meio de um processo racional, incorporar esses “custos” em seus cálculos, desistindo, assim, da prática delitiva; b) pelo desenvolvimento de políticas de prevenção situacional que deslocam a atenção do delinqüente do delito, buscando reduzir as oportunidades delitivas e as tornar menos atrativas pela incorporação de medidas de segurança de todo tipo (DÍEZ RIPOLLÉS, 2007).
Sintetizando os argumentos centrais do novo pensamento criminológico, Garland (2005, p. 53) sustenta que
un rasgo importante de este enfoque es que impulsa que la acción publica desplace su focalización en el delito y el individuo delincuente hacia el evento delictivo. El nuevo foco de atención es la existencia de oportunidades delictivas y de ‘situaciones criminógenas’. El supuesto es que las acciones delictivas se darán habitualmente si no existen controles y hay blancos atractivos disponibles, tengan o no los individuos una ‘disposición delincuente’ (que, en el caso de que exista es, de todos modos, difícil de cambiar). Se debe centrar la atención no en los individuos sino en los hábitos de la interacción, el diseño espacial y la estructura de controles e incentivos que está presente en los mismos. La nueva orientación política intenta concentrarse en sustituir la cura por la prevención, reducir la disponibilidad de oportunidades, incrementar los controles situacionales y sociales y modificar las rutinas cotidianas. El bienestar de los grupos sociales desfavorecidos o las necesidades de los individuos inadaptados son mucho menos medulares para este modo de pensar.
Pérez Cepeda (2007) salienta, a propósito, que se vive na contemporaneidade uma autêntica “cultura preventiva”, na qual a prevenção acompanha o risco como uma sombra, desde os âmbitos mais cotidianos até os de maior escala, cujo exemplo maior são as guerras preventivas. Para a referida autora (2007, p. 321),
parece que hoy la preocupación social no es tanto cómo obtener lo que se desea, sino cómo prevenir de daños lo que se tiene. Esto desemboca en una intervención penal desproporcionada, en la que resulta priorita únicamente la obtención del fin perseguido, la evitación del riesgo en el ‘ámbito previo’ a la lesión o puesta en peligro, adelantando la intervención penal, o general, suprimiendo garantías en busca de la presunta eficacia.
Este adiantamento da intervenção do Direito Penal ao estágio prévio à lesão do bem jurídico é um dos traços mais marcantes da nova doxa punitiva. Na lição de Pérez Cepeda (2007, p. 313), configura-se uma legislação penal no pretérito imperfeito do subjuntivo, a partir da qual “los comportamientos que se van a tipificar no se consideran previamente como socialmente inadecuados, al contrario, se criminalizan para que sean considerados como socialmente desvalorados.” Com isso, há uma revitalização da ideia do Direito Penal enquanto força conformadora de costumes, ou seja, passa-se a ver no Direito Penal um mecanismo de orientação social de comportamentos.
Para adiantar a intervenção punitiva são utilizadas estruturas típicas de mera atividade, ligadas aos delitos de perigo abstrato, em detrimento de estruturas que exigem um resultado material lesivo (perigo concreto). Nesse sentido,
se generaliza el castigo de actos preparatórios específicamente delimitados, se autonomiza la punición de la asociación delictiva, cuando no se integra ésta dentro de las modalidades de autoria y participación, además se aproximan, hasta llegar a veces e neutralizarse, las diferencias entre autoria y participación, entre tentativa y consumación, de la misma manera se considera razonable uma cierta flexibilización de los requisitos de la causalidad o de la culpabilidad. (PÈREZ CEPEDA, 2007, p. 332).
Na linha do até aqui exposto, cumpre referir – em relação ao controle dos fluxos migratórios na União Europeia – o surgimento dos chamados “delitos de solidariedade”. Na França, o governo Sarkozy promoveu a inserção do artigo L 622-1 no Código de Entrada e Residência de Estrangeiros e do Asilo, prevendo que:
Toute personne qui aura, par aide directe ou indirecte, facilité ou tenté de faciliter l'entrée, la circulation ou le séjour irréguliers, d'un étranger en France sera punie d'un emprisonnement de cinq ans et d'une amende de 30 000 Euros.
Sera puni des mêmes peines celui qui, quelle que soit sa nationalité, aura commis le délit défini au premier alinéa du présent article alors qu'il se trouvait sur le territoire d'un Etat partie à la convention signée à Schengen le 19 juin 1990 autre que la France.
Sera puni des mêmes peines celui qui aura facilité ou tenté de faciliter l'entrée, la circulation ou le séjour irréguliers d'un étranger sur le territoire d'un autre Etat partie à la convention signée à Schengen le 19 juin 1990.
Sera puni de mêmes peines celui qui aura facilité ou tenté de faciliter l'entrée, la circulation ou le séjour irréguliers d'un étranger sur le territoire d'un Etat partie au protocole contre le trafic illicite de migrants par terre, air et mer, additionnel à la convention des Nations unies contre la criminalité transnationale organisée, signée à Palerme le 12 décembre 2000.
Les dispositions du précédent alinéa sont applicables en France à compter de la date de publication au Journal officiel de la République française de ce protocole.[14]
No mesmo sentido, o art. 318 bis do Código Penal espanhol, após redação conferida pela Lei Orgânica 11/2003, comina uma pena de quatro a oito anos de prisão a quem “directa o indirectamente, promueva, favorezca o facilite el tráfico ilegal o la inmigración clandestina de personas desde, en tránsito o con destino a España, o con destino a otro país de la Unión Europea”. Em comentário ao referido tipo legal, Martínez Escamilla (2007) refere que se trata de um claro exemplo de expansão do Direito Penal, uma vez que o legislador, dentre todas as condutas de favorecimento que poderia ter optado criminalizar pela sua gravidade – como, por exemplo, a concorrência de ânimo de lucro, a atuação no marco de uma organização delitiva, etc – levou a cabo uma regulação onicompreensiva, o mais ampla possível, com a finalidade de criminalizar, nos termos do dispositivo sob análise, qualquer comportamento relacionado com a imigração irregular que de alguma forma, “direta ou indiretamente” a favoreça. Notas características de um Direito Penal que se antecipa à efetiva lesão dos bens jurídicos!
3.5 A flexibilização/supressão das garantias e a busca pelas provas indiscutíveis
Paralelamente à antecipação da intervenção punitiva, verifica-se um desapreço cada vez maior pelas formalidades e garantias penais e processuais penais características do Direito Penal liberal, que passam a ser consideradas como “obstáculos” à eficiência que se espera do sistema punitivo diante da insegurança da contemporaneidade. A “célebre” afirmação de Donald Rumsfeld de que não se ocupava de aspectos legais, por não ser advogado – ao se referir às denúncias de violação aos direitos humanos dos prisioneiros de Guantánamo –, talvez seja a frase que melhor ilustre isso.
Com efeito, a partir do fenômeno expansivo vivenciado pelo Direito Penal, além do incremento dos comportamentos elevados à categoria delitiva por meio da antecipação da intervenção punitiva ao estágio prévio à efetiva lesão dos bens jurídicos, verifica-se um processo de flexibilização das garantias político-criminais materiais e processuais, mediante o desrespeito ao princípio da legalidade penal, à redução das formalidades processuais, à violação ao princípio da taxatividade na elaboração dos tipos penais e à violação ao princípio da culpabilidade.
Atenta a esta realidade, Pérez Cepeda (2007, p. 330-331) assevera que
aparecen significativas modificaciones en el sistema de imputación de responsabilidad y en el conjunto de garantías penales e procesales, en la medida en que se admiten ciertas perdidas en el principio de seguridad jurídica derivadas de la menor precisión en la descripción de los comportamientos típicos y del uso frecuente de la técnica de las leyes penales en blanco, que confia la delimitación del ámbito de lo prohibido a la normativa administrativa, con el consiguiente vaciamiento de la antijuridicidad, que pasa a ser puramente formal; se hace una interpretación generosa de la lesividad real o potencial de ciertos comportamientos, como en la punición de determinadas tenencias o en el castigo de desobediencias.[15]
Isso também resta evidente a partir da análise das novas formas de provas – indiscutíveis – buscadas na contemporaneidade, por meio dos avanços da ciência aplicados ao Direito Penal. Com efeito, a ciência tem melhorado muito a busca de provas, a começar pelo DNA que “inscreve” a presença de um indivíduo a partir de um cabelo, de uma lágrima ou de um vestígio de esperma. Por outro lado, a explosão das neurociências alimenta o sonho de uma verdade humana que pode ser lida a partir da ciência, como é o caso do detector de mentiras. Junte-se a isso a “medical imaging” e o “brain mapping”, que representam a esperança humana de poder fotografar os pensamentos (GARAPON, 2010).
Com a finalidade de identificar os autores de fatos delitivos têm sido criados bancos de dados genéticos em diferentes países, como nos Estados Unidos, Dinamarca, Noruega, Finlândia, Inglaterra, Escocia, Irlanda doNorte, Suécia, Holanda, França, Itália, Áustria, Eslováquia, República Tcheca, Bélgica, Hungria, Suíça, Croácia, Polônia, Alemanha e Espanha. As experiências até o momento realizadas nesses países em sede de investigação criminal têm apresentado resultados bastante positivos no que se refere à identificação de pessoas, tanto as desaparecidas, quanto de delinquentes e vítimas (GUERRERO MORENO, 2008).
Ocorre que, fora os problemas técnicos, notadamente a fiabilidade dos métodos utilizados, que estão na sua maior parte em estágio experimental, o Direito coloca numerosas outras questões em relação a este tema.
Em primeiro lugar, tem-se a questão da onerosidade da produção dessas provas. Ou seja, que pessoas terão condições de arcar com a produção de provas cada vez mais caras? Colocando-se a mesma questão sob outro viés, também se pode questionar: não serão esses meios de prova responsáveis pelo aumento da desigualdade entre as partes no processo?
Por outro lado, também se pode referir que ditas “provas indiscutíveis” não necessariamente servirão – como assevera Garapon (2010) – para “minguar” o debate judiciário. Isso porque, se elas podem trazer indicações preciosas, não permitirão jamais fazer economia do debate: elas no máximo trocarão o seu objeto, que será colocado sobre a fiabilidade dessas novas ciências. Isso, segundo a ótica do sobredito autor, permite um retorno à tragédia grega: Oreste nunca contestou ter matado sua mãe, mas isso não impediu um debate judiciário; ao contrário, é em “As Eumênides” que Ésquilo melhor o ilustrou.
Além disso, deve-se levar em consideração o fato de que os dados genéticos revelam questões intimamente ligadas ao núcleo da personalidade e da dignidade humana, sendo especialmente relevante sua incidência no exercício das liberdades. Afinal, como assevera Guerrero Moreno (2008, p. 224), a informação genética, juntamente com os avanços científicos, faz com que os seres humanos se tornem mais vulneráveis e transparentes, sendo que essa “transparencia posibilita claramente el control de los individuos, con el consiguiente menoscabo de su autonomía y derechos, fundamentalmente por las posibilidades de utilizar el perfil genético para discriminar a las personas en las más diversas facetas de su vida.”
Em função disso, se por um lado, o desenvolvimento das tecnologias da informação e de conhecimento sobre o genoma humano e sua aliança com o Direito Penal pode redundar em resultados positivos no que se refere à identificação de delinquentes e vítimas, por outro lado, se esses dados não forem utilizados de forma adequada, coloca-se em risco os direitos e garantias fundamentais do ser humano – em especial, frise-se, em um momento de expansão do raio de intervenção do Direito Punitivo, profundamente marcado pela flexibilização de garantias.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Procurou-se, ao longo do presente artigo, refletir a respeito dos câmbios sentidos pelo Direito Penal quando da sua aproximação conceitual com a guerra – o que se torna cada vez mais evidente. O Direito Penal de Guerra, orientado ao enfrentamento dos novos riscos, medos e inseguranças da contemporaneidade, configura um modelo de intervenção punitiva que representa um sério risco às liberdades e garantias fundamentais do cidadão, o que se evidencia a partir da análise de algumas características principais que passa a assumir.
Como primeira dessas características, ressaltou-se o fato de que, em decorrência do medo de tornar-se uma delas, verifica-se uma maior identificação da população com as vítimas da criminalidade; olvida-se, assim, do papel do Direito Penal como um instrumento de defesa dos cidadãos em face do arbítrio punitivo estatal para compreendê-lo como uma “Magna Carta da Vítima”.
Por outro lado, verifica-se um crescente processo de politização do Direito Penal, a partir de uma concepção política da noção de segurança; isso representa uma simplificação do discurso político-criminal, que passa a oscilar ao sabor das demandas conjunturais midiáticas e populistas, em detrimento de programas sérios e efetivos de política criminal.
Além disso, contata-se uma maior instrumentalização do Direito Penal no sentido de evitar que os riscos se convertam em situações concretas de perigo, ou seja, uma utilização do Direito Penal como instrumento preventivo em lugar de um Direito Penal que reacionava a posteriori contra um feito lesivo individualmente delimitado; assim, torna-se possível falar em uma gestão punitiva dos riscos em geral.
De outra banda, vislumbra-se uma crescente utilização, na elaboração legislativa, de estruturas típicas de mera atividade, ligadas aos delitos de perigo abstrato, em detrimento de estruturas que exigem um resultado material lesivo, como conseqüência da concepção do Direito Penal como instrumento de prevenção de riscos.
Por fim, constata-se um desapreço cada vez maior pelas formalidades e garantias penais e processuais penais características do Direito Penal liberal, que passam a ser consideradas como “obstáculos” à eficiência que se espera do sistema punitivo diante da insegurança que permeia as relações sociais na contemporaneidade.
Notas e Referências:
[1] O “método fenomenológico” aplicado ao Direito vem sendo desenvolvido no Programa de Pós-Graduação em Direito da UNISINOS, especialmente na obra Hermenêutica Jurídica e(m) Crise, de Lenio Luiz Streck.
[2] Segundo Hardt e Negri (2005, p. 21-22), em nossos dias “a guerra transforma-se num fenômeno geral, global e interminável”, uma vez que “inúmeros conflitos armados manifestam-se hoje através do planeta, alguns breves e limitados a um lugar específico, outros prolongados e expansivos.” Isso leva os referidos autores a argumentarem que esses conflitos não devem mais ser encarados como “casos de guerra”, mas sim de “guerra civil”, pois “enquanto a guerra, como tradicionalmente entendida pelo direito internacional, é um conflito armado entre entidades políticas soberanas, a guerra civil é o conflito armado entre combatentes soberanos e/ou não-soberanos dentro de um mesmo território soberano. Essa guerra civil já não seria entendida agora no contexto de um espaço nacional, pois deixou de ser esta a unidade efetiva de soberania, mas no ambiente global.” Como decorrência disso, “cada guerra local não deve ser encarada isoladamente, e sim como parte de uma grande constelação, ligada em graus variados tanto a outras zonas de guerra quanto a áreas que atualmente não se encontram em guerra.”
[3] Sobre o tema das “insuficiências” da Convenção de Genebra, uma interessante abordagem é feita por Butler (2007).
[4] É impossível, nesse ponto, não fazer pelo menos uma breve menção à obra do jurista alemão Günther Jakobs (2007; 2009), para o qual o combate efetivo a determinadas formas de criminalidade somente se viabiliza na medida em que haja uma diferenciação no trato daqueles que podem ser considerados – ainda que pratiquem eventualmente algum fato delituoso – como cidadãos, e aqueles que só podem ser enfrentados enquanto inimigos do Estado, pois das suas regras se afastaram definitivamente. Nessa perspectiva, defende o autor a idéia de que também devem existir duas formas de Direito Penal: um para ser aplicado especificamente aos cidadãos – marcado pelas garantias penais e processuais –, e outro para ser aplicado especificamente aos inimigos – no qual há uma extensa antecipação das proibições penais sem nenhuma redução da pena cominada, assim como uma grande restrição das garantias processuais características de um Estado Democrático de Direito. Isso porque, nesta perspectiva, os inimigos não podem ser tratados como pessoas, mas sim combatidos como não-pessoas, pois o tipo de criminalidade por eles levada a cabo denota que não aceitam participar de uma sociedade civilizada.
[5] Butler (2009, p. 58) reflete a propósito da diferença de tratamento dispensada às mortes provocadas pelos atentados terroristas nos EUA e as mortes perpretadas pelos EUA na luta contra o terrorismo, ou seja, discute o que conta como vida “vivível” e morte “lamentável”, afirmando que “la vida se cuida y se mantiene diferencialmente, y existen formas radicalmente diferentes de distribución de la vulnerabilidad física del hombre a lo largo del planeta. Ciertas vidas están altamente protegidas, y el atentado contra su santidad basta para movilizar las fuerzas de la guerra. Otras vidas no gozan de un apoyo tan inmediato y furioso, y no se calificarán incluso como vidas que ‘valgan la pena’.”
[6] A autora (2009, p. 97) considera a detenção indefinida “un ejercicio ilegítimo del poder” ao mesmo tempo que representa parte de “una táctica más amplia para neutralizar el estado de derecho en nombre de la seguridad.” A detenção indefinida, assim, não significa uma circunstância excepcional, mas sim o meio pelo qual o excepcional se converte em uma norma naturalizada.
[7] Butler (2009, p. 108) segue referindo que “si una persona o un grupo son considerados peligrosos, y no es necesario probar ningún acto peligroso para establecer la verdad de este hecho, entonces el Estado convierte a esa población detenida en peligrosa, privándola unilateralmente de la protección legal que le corresponde a cualquier persona sujeta a leyes nacionales e internacionales. Se trata ciertamente de personas no consideradas como sujetos, de seres humanos no conceptualizados dentro del marco de una cultura política en la que la vida humana goza de derechos legales y está asegurada por leyes –seres humanos que por lo tanto no son humanos–.
[8] Na obra em comento a autora relata casos de violação extrema dos direitos humanos dos detentos de Guantánamo, notadamente no que se refere à violência física e psicológica, que revitalizam, em pleno século XXI, o tratamento dispensado aos judeus nos campos de concentração nazistas.
[9] Já para Butler (2009, p. 84), “un tiempo histórico que pensábamos que había pasado vuelve para estructurar el campo contemporáneo con una persistencia que demuestra la falsedad de la historia como cronologia.”
[10] Sobre o papel das ONG’s e das associações Pérez Cepeda (2007, p. 311) refere que elas “actúan como lobbies de presión frente a los gobiernos, pero también sensibilizan a la opinión pública sobre determinadas situaciones que hasta el momento de forma interesada se mantienen invisibles.”
[11] Segundo Garland (2005, p. 241), “los nombres dados a las leyes y medidas penales [...] intentan honrarlas de este modo, aunque indudablemente exista en esto una forma de explotación, ya que el nombre del individuo se utiliza para neutralizar las objeciones a medidas que por lo general no son más que leyes que expresan el deseo de venganza que se aprueban para ser exhibidas públicamente y obtener ventajas políticas.”
[12] Sobre o tema, Garland (2005, p. 241) assevera que o “el juego de suma cero que existe entre unos y otros asegura que cualquier demostración de compasión hacia los delincuentes, cualquier mención de sus derechos, cualquier esfuerzo por humanizar su castigo, puede ser fácilmente considerado un insulto a las víctimas y sus familias.”
[13] Os delitos de acumulação são aqueles que, enquanto condutas individuais, não causam, por si sós, lesão ou perigo a bens jurídicos, mas que, considerados em conjunto – ou seja, se praticados por outros sujeitos –, conduzem a uma situação de lesão ao bem jurídico tutelado. Segundo Silva Sánchez (1999, p. 108-109), trata-se, aqui, “de casos en que la conducta individualmente considerada no muestra un riesgo relevante (es ‘harmless’), mientras que, por outro lado, se admite que ‘general performance would be harmful’ y que dicha realización por una pluralidad de personas no constituye simplemente una hipótesis, sino que es una realidad actual o inminente.”
[14] Disponível em: <http://www.legifrance.gouv.fr/affichCode.do;jsessionid=1AC7AE3B2EADB8C2DBBF3FB24778E324.tpdjo14v_1?idSectionTA=LEGISCTA000006147789&cidTexte=LEGITEXT000006070158&dateTexte=20080505>. Acesso em: 26 ago. 2010.
[15] Da mesma forma assevera Díez Ripollés (2007, p. 137), que “se admiten ciertas perdidas en el principio de seguridad jurídica derivadas de la menor precisión en la descripción de los comportamientos típicos y del uso frecuente de la técnica de las leyes penales en blanco; se hace una interpretación generosa de la lesividad real o potencial de ciertos comportamientos, como en la punición de determinadas tenencias o en el castigo de apologías; se considera razonable una cierta flexibilización de los requisitos de la causalidad o de la culpabilidad; se aproximan, hasta llegar a veces a neutralizarse, las diferencias entre autoría y participación, entre tentativa y consumación; se revaloriza el principio de disponibilidad del proceso, mediante la acreditación del principio de oportunidad procesal y de las conformidades entre las partes; la agilidad y celeridad del procedimiento son objetivos lo suficientemente importantes como para conducir a una sgnificativa redución de las posibilidades de defensa del acusado...etc.”
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. Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth é Doutor em Direito Público (UNISINOS). Professor dos Cursos de Direito da UNIJUÍ e UNISINOS. Professor do Mestrado em Direitos Humanos da UNIJUÍ. Editor-chefe da Revista Direitos Humanos e Democracia (Qualis B1). http://lattes.cnpq.br/0354947255136468 .
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