No estado atual da vida e das coisas, a criatividade e a inovação são fundamentais para o profissional do futuro. Na área do direito não poderia ser diferente, mas trabalhar em um cenário de complexidade legal e dos parcos estudos sobre os impactos de uma determinada norma enquanto editada, não é uma tarefa fácil, submetendo-se o caso concreto a uma necessária avaliação de risco.
O direito contratual continua revolucionando, dando norte aos negócios, não somente na esfera privada, mas também na pública. O uso da tecnologia da informação, do processamento e da proteção de dados e as ferramentas de vinculação eletrônica, aliados aos novos arranjos contratuais, aos negócios bilaterais e plurilaterais, inclusive com a formalização de acordos sobre regras processuais e de procedimento, dão impulso a um novo modo de realizar e orientar o direito e o processo decisório.
O regime jurídico de um país precisa responder ao mercado com previsibilidade e estabilidade das relações, constituindo-se os contratos como elo importante para que estes objetivos sejam alcançados, pois, ao elevar-se o grau de confiança, o mercado funcionará estável e seguro, atraindo investimentos de toda ordem.
A economia faz perceber o direito de uma nova maneira, de um lado como o clássico provedor de justiça e, de outro, como um conjunto de normas a estimular e a induzir comportamentos que favoreçam o alcance dos objetivos-fins de uma Nação, a partir de políticas públicas mais eficientes e distributivas, servindo, assim, portanto, ao profissional do direito. O direito serve, igualmente, aos economistas, na medida em que estes podem apropriar-se de técnicas e teorias, como, por exemplo, da complexa teoria do direito contratual, para criar modelos mais próximos da realidade, de maior taxa de previsibilidade[i].
Desta perspectiva bifocal pode-se perceber que o direito e a economia se encontram, servindo, esta, como uma ciência auxiliar. Os adeptos da Análise Econômica do Direito (AED) certamente perceberam a diferença competitiva, quando atuam no mercado, e a diferença de conteúdo das decisões quando na função de agentes públicos.
A AED é capaz de dar norte, orientar o processo decisório, pois ancorar-se em conceitos econômicos e perceber o direito de uma maneira diferente fazem toda a diferença quando se depara com um caso concreto, já que todo o processo decisório estará orientado por verdadeira gestão sobre os riscos, os custos de transação (processuais e extraprocessuais), as externalidades, as consequências e impactos deste ou daquele posicionamento, desta ou daquela decisão. De fato, praticar a AED no dia-a-dia de seu mister mostrará como são gratificantes os resultados que emanam desta primorosa convergência e da intimidade entre estes dois saberes.
É evidente que, neste pequeno espaço, não é possível tratar da teoria contratual e nem mesmo este é o objetivo. Também não se pretende tecer comentário ou criar argumentos contra a ilusória teoria da morte dos contratos, como se não fosse possível adaptá-los a uma realidade emergente, que submete ao mundo digital boa parte dos novos vínculos, ou seja, como se não fosse possível inovar, ou como se fosse possível tratar de variáveis, de circunstâncias e da complexidade de uma grande parte dos contratos em espécie a partir de modelos pré-prontos ou pré-formatados, sem uma avaliação dos riscos impostos pela imperfeição do mercado e sem ponderar sobre a construção de cláusulas inteligentes, capazes de inibir o inadimplemento e de induzir condutas pré, inter e pós-contratuais.
Os contratos de mera adesão, alguns conhecidos por se caracterizarem como sendo de massa ou de repetição, não demandam, de uma das partes, o socorro prévio ou preventivo, cabendo à pessoa aderente observar as vantagens que deterá a partir da adesão, pouco podendo o direito influir nesta primeira etapa, assegurando-se a liberdade de contratar e a autonomia privada. Por outro lado, o direito intervirá, socorrendo a parte inocente, no caso de inadimplemento das obrigações combinadas e ou diante da ineficiência do ajuste, mesmo que por adesão, adotando princípios protecionistas ao aderente, diante da inviabilidade de discutir e ponderar sobre a construção do conteúdo das respectivas cláusulas. O contrato continua válido e exigível, no entanto a interpretação se dará sob uma óptica principiológica diferente.
O mesmo não ocorre com contratos de complexidade maior, destacando-se os de shopping center, built to suit (BTS), contratos de locação comercial, franquia, distribuição, agência, societários em geral, compra e venda, edificação de obras, parcerias industriais, transferência de tecnologia, intermediação, colaboração empresarial, dentre os quais, joint ventures, contratuais e societárias, os contratos atípicos, os acordos sociais e parassociais, os pactos médico-hospitalares para cirurgias de complexidade e estéticas, os convênios, os acordos operacionais, de gestão, de participação e renda, de cessão e licenciamento de marcas, patentes, aqui destacados dentre outros tantos, sejam interempresariais ou não.
Nesta particularidade, tratando-se de contratos complexos, o advogado, apoiando-se no direito, na economia, na neurociência e em outras ciências que estudam o comportamento, poderá criar estruturas jurídicas inteligentes enquanto as partes dialogam e cooperam, prevendo e prevenindo litígios, como, por exemplo, a cláusula de solução interna, a que cria um comitê para resolução de conflitos (Dispute Boards) para contratos de execução não imediata, dispensando-se a necessidade de socorro à jurisdição estatal ou arbitral, evitando-se, portanto, custos de transação não desejados, processuais e extraprocessuais. Além destas, as cláusulas de incentivo ao adimplemento, as formadoras de negócios jurídicos processuais prévios, como, por exemplo, a cláusula que dispensa a prestação de caução pelo locador para obter medida liminar, a que permite a liminar de desocupação fora do elenco legal, a cláusula que sistematiza a utilização de atas notariais, a que prevê a utilização de um profissional técnico, prévio à instauração do litígio, a que impõe ou submete a mediação, além daquelas que tratarem de todas as variáveis, pois cada negócio, em termos de complexidade, é único e assim deve ser interpretado, com personificação, mas na velocidade de um mundo digital, onde o direito e a tecnologia também caminham de forma indissociável.
Paula Forgioni diz que os contratos interempresariais, por exemplo, devem ser interpretados no contexto do mercado e são firmados entre empresas cujas atividades são movidas pelo lucro.[ii]
Deste modo, os contratos possuem um papel fundamental para a estabilização das relações, dando a estas, previsibilidade.
A ideia de enforcement (garantia de exequibilidade) dá aos negócios, a partir dos contratos — credibilidade — sem a qual não há incentivos para atrair investimentos e prover o desenvolvimento econômico de um país. A exigibilidade das obrigações que emanam dos contratos tem pautado discussões importantes, especialmente na presença de contratos interempresariais, em cujo modelo a intervenção do Estado é mínima, limitando-se aos aspectos corretivos e coercitivos para fazer cumprir o que foi convencionado pelas partes.
Fazer uma leitura do direito sob a óptica econômica não implica a sobreposição da ciência auxiliar, mas o uso dela para compreender melhor e de forma mais sutil a ação humana. Os pilares para qualquer leitura que envolve a íntima relação entre o direito e a economia estão concentrados na escassez, na escolha racional e na incerteza. As decisões estratégicas são mais bem orientadas a partir do entendimento destes pressupostos e de outros conceitos emprestados da ciência econômica, dos quais o profissional do direito não deve descuidar. Lembre-se que a todo instante, no dia-a-dia, tomam-se decisões, tais como: comprar um imóvel, aceitar um emprego, alugar um apartamento, matricular os filhos na escola, trocar de automóvel entre outras tantas relações vividas e vivenciadas.[iii] Estas decisões ou escolhas humanas estão orientadas, em relevante parcela, pelos contratos. Logo construí-los e orientá-los enquanto as partes cooperam é fundamental, para dar eficiência e efetividade ao direito pactuário.
É certo que as partes contratam para obter alguma vantagem, não por mero prazer de declarar a sua vontade. O direito presta-se a criar estruturas contratuais eficientes, organizar, administrar e harmonizar conflitos, com a mínima intervenção do Estado. Por sua vez, a proteção estatal dos acordos de origem contratual dá funcionalidade ao direito, diante da previsibilidade, segurança e fluência das relações de mercado[iv].
Segundo Mackaay ,“o escopo do contrato é permitir obter ganhos recíprocos para as duas partes (ganho de Pareto), um resultado ganha-ganha ou win-win”. A intimidade entre o direito, a economia e os contratos revela-se a partir de outros pontos também fundamentais, pois, diante de algumas circunstâncias, não é possível dar garantias de ganhos recíprocos, uma vez que elas (as circunstâncias) podem interferir, de uma ou outra forma, no comportamento pré-contratual, inter e pós-contratual e se apresentam quando ocorrem falhas ou imperfeições no mercado, notadamente em quatro situações, a saber: externalidades causadas a terceiros, informações assimétricas, poder de mercado, capacidade e racionalidade limitada[v].
É certo que a interlocução entre o direito e a economia é cada vez mais necessária, o que se evidencia com maior ênfase nas questões contratuais, pois a eficiência dos contratos depende da vontade das partes e dos incentivos criados para dar atendimento às obrigações combinadas por diálogo e opiniões ou combinadas, porque aderidas.
Como visto, os desafios do direito contratual não são pequenos e, inevitavelmente, passam pela discussão sobre o vínculo de certeza e de segurança que o pacto tem a função de realizar, bem como pela pauta tecnológica de alcance capaz de dar velocidade aos negócios jurídicos em um mundo globalizado. Por um lado, a segurança jurídica derivada do princípio da autonomia privada e, de outro, a necessidade da utilização de ambientes virtuais, de contratos digitais e de métodos para prevenir e solucionar conflitos derivados do ajuste.
Por fim, cabe ressalvar que apenas ajustar a forma de construir contratos ou como eles serão dinamizados e ajustados na mesma velocidade em que os negócios se concretizam no mundo digital não bastará para dar eficiência ao acordo de vontades, pois um desafio ainda maior se apresenta.
É necessário capacitar pessoas para conciliar o uso da redação, da inteligência estratégica e da tecnologia em benefício de um bem maior, bem como inspirar a comunidade jurídico-acadêmica e as universidades, alterar currículos e refletir sobre competências e habilidades vocacionadas ao entendimento multidisciplinar aplicado, ou seja, como o profissional vai se posicionar, dialogar e criar uma solução ao deparar com o caso concreto, sem atropelo e sem deixar que conceitos rasos, pré-formatados e sem compreensão das variáveis sobreponham-se a uma análise mais detida, sobretudo com o uso da Análise Econômica do Direito (AED).
Como orientar o processo decisório com o menor risco possível, com o menor custo, com vantagens de parte a parte, assegurando-se a exigibilidade ancorada na lealdade e boa fé, em razão de um pacto bem construído e equilibrado, mostra-se fundamental, para que o mercado, de fato, traga o resultado esperado e contribua para a formação da riqueza das pessoas, melhorando a condição socioeconômica e, em última análise, impulsionando o desenvolvimento do País.
Notas e Referências
[i] COOTER, Robert e ULEN, Thomas. Direito e economia. 5ª ed. São Paulo: Bookman, 2010, p. 33.
[ii] FORGIONI, Paula. Teoria Geral dos Contratos Empresariais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 29.
[iii] MACKAAY, Ejan e ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Direito. 2ª ed. São Paulo: Atlas, p. 7, 25-26.
[iv] GRAU, Eros. Um novo paradigma dos contratos? file:///C:/Users/joaocarlos/Downloads/67510-Texto%20do%20artigo-88932-1-10-20131125.pdf
[v] MACKAAY, Ejan e ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Direito. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 408.
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