Coluna O Direito e a Sociedade de Consumo / Coordenador Marcos Catalan
As novas tecnologias têm crescido em velocidade exponencial. Entre elas, há ambientes virtuais que oferecem experiências imersivas e interativas para seus usuários, como o metaverso. Com o crescente aumento no uso dessas tecnologias, emerge debates e discussões que dizem respeito ao direito do consumidor e como são aplicadas nessas novas realidades.
Um dos principais desafios para o direito em relação às novas tecnologias é que muitas vezes elas se desenvolvem mais rapidamente do que as leis e regulamentos. Isso pode levar a um vácuo legal em que as práticas tecnológicas não são claramente regulamentadas, ou onde as leis existentes não são aplicáveis a novas tecnologias. O surgimento do metaverso é um exemplo desse fenômeno, uma vez que as leis e regulamentos vigentes não são suficientes para abordar muitas das questões legais associadas a esse novo ambiente virtual.
O metaverso é um ambiente virtual em que os usuários podem se conectar e interagir com outras pessoas e objetos digitais em tempo real. Foi criado por meio de combinações de novas tecnologias, como da realidade virtual, realidade aumentada, inteligência artificial e blockchain.
Esse termo foi utilizado pela primeira vez por Neal Stephenson, no ano de 1992, no livro Snow Crash. O livro descreve o metaverso como um espaço de três dimensões, desenvolvido por um computador e transmitido por óculos e fones de ouvido utilizados por uma pessoa[1]. Atualmente, o conceito de "metaverso" está em desenvolvimento.
Stylianos Mystakidis define metaverso como:
“o universo pós-realidade, um ambiente multiusuário perpétuo e persistente que funde a realidade física com a virtualidade digital. Baseia-se na convergência de tecnologias que possibilitam interações multissensoriais com ambientes virtuais, objetos digitais e pessoas como realidade virtual e realidade aumentada. Portanto, o Metaverso é uma teia interconectada de ambientes imersivos sociais em rede em plataformas de multiusuários. Ele permite a comunicação corpórea do usuário em tempo real e interações dinâmicas com artefatos digitais”[2].
O metaverso destaca-se como um modelo de referência em um cenário de progresso tecnológico constante e disruptivo, que afeta todos os setores da economia, bem como a aplicação dos conceitos e dispositivos legais vigentes, além da criação de novos que estão sendo desenvolvidos e definidos. Tem como foco oferecer uma experiência imersiva e interativa para os usuários, permitindo que eles criem e personalizem seu próprio mundo virtual.
Embora possam existir interpretações variadas e pouco claras sobre o que exatamente é o metaverso, é importante considerar a extensão, importância e impacto que essa tecnologia pode imprimir na sociedade como um todo. Por isso, muitos atores e empresas do setor de bens e serviços estão concentrados em ingressar nesse mercado, que já movimenta quantias expressivas de valores, em termos globais de consumo e que ainda tem um enorme potencial de crescimento.
Ocorre que pela popularização do metaverso, surgem várias questões relacionadas ao direito do consumidor, como se aplicam, disciplinam e se conectam a essa realidade virtual.
Uma das principais questões a se considerar é como garantir que os direitos dos consumidores sejam protegidos em um ambiente virtual, em que as transações e interações ocorrem em um contexto totalmente diferente do mundo físico. Por exemplo, como lidar com problemas como a garantia de produtos virtuais, a proteção contra fraudes, o direito à proteção de dados e privacidade, validação, execução e cumprimento de contratos entre fornecedores e consumidores (usuários).
Outro ponto que merece destaque, é com relação à publicidade dentro deste ambiente, já que fornecedores devem garantir que as informações sobre seus produtos e serviços sejam precisas e transparentes para os usuários, a fim de evitar práticas ilícitas, enganosas ou fraudulentas.
Ainda há lacunas de como será a responsabilidade das empresas que operam no metaverso, se serão responsáveis pelas ações de seus usuários e de terceiros, ou como serão quantificados os danos causados por produtos virtuais defeituosos ou por práticas comerciais abusivas.
As regulamentações pertinentes a cada tecnologia imersiva emergente têm dificuldades para acompanhar o ritmo acelerado de proliferação de novos modelos tecnológicos, o que acaba resultando em um “lapso temporal separando a popularização da utilização de novas dinâmicas disruptivas e a regulamentação legal e infralegal de tais práticas sociais e econômicas”[3].
Em que pese já existam marcos regulatórios importantes como o código de defesa do consumidor, código civil, lei geral de proteção de dados, entre outras, novas matrizes legais, certamente, surgirão e serão necessárias para fins de assegurar a proteção desses novos hábitos de consumo e uso tecnológico, visando a suprir e mitigar possíveis e prováveis litígios, oriundos e formados pelas interações imersivas desta nova realidade paralela.
Notas e referências
FEIGELSON, Bruno; SILVA, Luiza Caldeira Leite. Sandbox: um olhar prospetivo sobre o futuro da regulação. Advocacia 4.0. MALDONADO, Viviane da Nóbrega. Coord. Thomson Reuters. 2019.
MYSTAKIDIS, Stylianos. Metaverse. In: Encyclopedia. 1 ed.: MDPI, 2022. v. 2, p. 486-497. p. 1. Disponível em: https://www.mdpi.com/2673-8392/2/1/31. Acesso em: 20 mar. 2023.
STEPHENSON, N. Snow Chash. 1. Ed. New York: Bantam Books, 1992.
[1] STEPHENSON, N. Snow Chash. 1. Ed. New York: Bantam Books, 1992.
[2] MYSTAKIDIS, Stylianos. Metaverse. In: Encyclopedia. 1 ed.: MDPI, 2022. v. 2, p. 486-497. p. 1. Disponível em: https://www.mdpi.com/2673-8392/2/1/31. Acesso em: 20 mar. 2023.
[3] FEIGELSON, Bruno; SILVA, Luiza Caldeira Leite. Sandbox: um olhar prospetivo sobre o futuro da regulação. Advocacia 4.0. MALDONADO, Viviane da Nóbrega. Coord. Thomson Reuters. 2019. p. 25.
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