DIREITO DE VIZINHANÇA E RESPONSABILIDADE CIVIL: encontros e desencontros no direito brasileiro e no direito português

28/04/2021

 Coluna Direito Civil em Pauta / Coordenadores Daniel Andrade, David Hosni, Henry Colombi e Lucas Oliveira

A crescente complexidade da convivência comunitária demanda cada vez mais soluções satisfatórias do direito de vizinhança. Intuitivamente, invoca-se a responsabilidade civil como mecanismo jurídico para disciplinar adequadamente o contato entre os vizinhos. Essa tendência faz parte de um movimento mais abrangente, de alargamento e instrumentalização da responsabilidade civil para resolver os mais diversos tipos de problemas sociais1. A obscuridade dogmática dessas construções teóricas, entretanto, compromete seriamente a segurança jurídica. Sob a égide do Código Civil de 1916, a doutrina brasileira desenvolveu uma profícua bibliografia no campo do direito de vizinhança2. Após o advento do Código Civil de 2002, contudo, o tema motivou poucas investigações3. Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho é reavivar a problematização relativa à interface entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil. Afinal, quais são os encontros e desencontros entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil no ordenamento jurídico?

Nesse desiderato, acredita-se que o contraste com o direito português pode ser bastante proveitoso. No Brasil, o Código Civil de 2002 (CCBR) possui um capítulo específico para o direito de vizinhança (arts. 1.277 a 1.313). Já em Portugal, o Código Civil de 1966 (CCPT) trata do assunto dentro do capítulo referente a propriedade de imóveis (arts. 1344.º a 1384.º). Embora a previsão legislativa se assemelhe em diversos pontos, a interpretação doutrinária apresenta distinções significativas, principalmente no tocante à relação entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil.

O desenvolvimento abaixo estrutura-se da seguinte maneira. O segundo capítulo apresenta as linhas gerais da conformação da relação jurídica de vizinhança no Brasil e em Portugal. O terceiro capítulo, por sua vez, traz o entendimento brasileiro a partir da releitura contemporânea da sistematização de F. C. de San Tiago sobre os modos de composição dos conflitos de vizinhança. Já o quarto capítulo introduz o posicionamento português a partir da formulação de José de Oliveira Ascensão acerca dos fundamentos dos deveres no direito de vizinhança. O quinto capítulo, por fim, encerra o trabalho com as observações conclusivas.               

 

1 A RELAÇÃO JURÍDICA DE VIZINHANÇA

A relação jurídica de vizinhança é o objeto central do direito de vizinhança. Neste ramo do direito, portanto, qualquer investigação científica demanda uma prévia definição sobre os diferentes aspectos dessa relação especial. Afinal, qual é a natureza jurídica, quem são os sujeitos e qual é a abrangência da relação jurídica de vizinhança? A resposta para essas perguntas constitui o pano de fundo para a análise ora proposta da interface entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil.

O CCBR e o CCPT não definem a natureza jurídica da relação jurídica de vizinhança. A doutrina de ambos os países, por sua vez, apresenta propostas bastante controversas. Em um primeiro momento, é comum a afirmação de que o direito de vizinhança constitui uma limitação ao direito de propriedade4. Ocorre que, superando o âmbito do direito de propriedade, autores brasileiros e portugueses lecionam que as relações jurídicas de vizinhança são compostas por obrigações propter rem, ou seja, preconizam que as situações jurídicas de direito de vizinhança são determinadas mediatamente pela titularidade de direitos reais em geral5. Para além dessa incoerência interna, essa posição predominante é criticável por desconsiderar as hipóteses de vizinhança originadas de direitos obrigacionais, como ocorre no caso da locação imobiliária. De todo modo, observa-se que prevalece atualmente a compreensão de que a natureza jurídica da relação jurídica de vizinhança não é real nem obrigacional, mas sim um meio-termo entre ambas as caracterizações6.   

Tanto a legislação brasileira quanto a portuguesa, por outro lado, trazem elementos com vistas à determinação dos sujeitos da relação jurídica de vizinhança. Ao tratar da matéria, por exemplo, o CCBR utiliza as expressões “proprietário”, “possuidor” e “dono”. Já o CCPT emprega os termos “proprietário” e “dono”. De início, percebe-se que o Brasil conta com uma terminologia mais abrangente, pois estende a qualidade de vizinho àquele que esteja na posse no prédio. A doutrina portuguesa, entretanto, tem compensado a restrição legal com uma interpretação extensiva, que estabelece a titularidade de direitos reais como critério de definição da figura do vizinho7. Todavia, a conceituação do vizinho com base na titularidade de direitos reais tem sido criticada nos últimos tempos pelo enfoque patrimonialista, que considera apenas indiretamente a pessoa integrante da relação8.

Por fim, seja no direito brasileiro ou no direito português, não há previsão legal expressa sobre a abrangência da relação jurídica de vizinhança. Em ambos os ordenamentos jurídicos, contudo, há consenso quanto à insuficiência do parâmetro da confinância. Em outras palavras, o vínculo de vizinhança não se restringe aos prédios contíguos. Pelo contrário, deve-se utilizar como critério a possibilidade de interferência na esfera jurídica alheia9. Nesse sentido, ilustrativamente, consideram-se vizinhos todos os prédios afetados pela poluição sonora oriunda de uma discoteca.

 

2 BRASIL: A RELEITURA DA SISTEMATIZAÇÃO DE F. C. SAN TIAGO DANTAS SOBRE A COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS DE VIZINHANÇA

Delineadas as linhas gerais da relação jurídica de vizinhança, faz-se possível iniciar a análise da interface entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil. No Brasil, esse estudo perpassa necessariamente pelos trabalhos de F. C. de San Tiago Dantas. Na obra O conflito de vizinhança e sua composição10, ele se propôs a esmiuçar o art. 554 do Código Civil de 1916, que estabelecia que “O proprietário, ou inquilino de um prédio tem o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam”. Nesse desiderato, San Tiago Dantas sistematizou três modos de composição dos conflitos de vizinhança:

Resumindo, temos que atravez do artigo 554, pode o juiz compor de tres modos o conflito de vizinhança:

1.° - verificando que os incômodos são normais e que não o seria privar o interferente da livre prática dos atos reclamados, o juiz mandará tolerar os incômodos, atuando o direito de vizinhança, gratuitamente concedido a todos os proprietários, de terem as suas imissões toleradas pelos proprietários dos prédios vizinhos;

2.º - verificando, porem, que os incômodos são excessivos por ser anormal o uso da propriedade que lhes dá origem, o juiz indagará si a supremacia do interesse público legitíma este uso excepcional; si legítima, e si a ofensa à saúde, segurança ou sossego não é de molde a inutilizar o imovel prejudicado, o juiz manterá os incômodos inevitaveis, e pela expropriação que assim inflige ao proprietário incomodado, ordenará que se lhe faça cabal indenização (direito oneroso de vizinhança);

3.º - si, porem, o interesse público não legitima o uso excepcional, é de “mau uso” que se trata, e o juiz o mandará cessar11.

Atualmente, não obstante o lapso temporal e a superveniência do Código Civil de 2002, a formulação de San Tiago Dantas permanece influente na doutrina nacional. Entre os autores contemporâneos, é comum a problematização do direito de vizinhança em três eixos, que remontam aos três modos de composição de conflitos. Essa também é a orientação adotada no presente trabalho, que detalhará cada uma das três situações nos tópicos a seguir. Insta salientar, entretanto, que ao invés da lógica eminentemente patrimonialista do século passado, busca-se hoje tutelar a pessoa a partir do reconhecimento de sua dignidade. Essa nova tônica do direito de vizinhança, por exemplo, evidencia-se no Enunciado 319 da IV Jornada de Direito Civil: “A condução e a solução das causas envolvendo conflitos de vizinhança devem guardar estreita sintonia com os princípios constitucionais da intimidade, da inviolabilidade da vida privada e da proteção ao meio ambiente”.

 

2.1 Uso normal, causando incômodos normais

A primeira situação-problema do direito de vizinhança é aquela em que alguém usa normalmente o respectivo prédio e causa incômodos razoáveis nos vizinhos12. Trata-se de um ato lícito que acarreta um dano lícito. Não há que se falar, portanto, em responsabilidade civil. Seria o caso, por exemplo, da pessoa que esporadicamente pratica um instrumento musical em sua residência. Nesse ponto, é imprescindível realizar uma análise casuística de razoabilidade. A vida em comunidade abrange fatalmente alguns dissabores. Assim, as perturbações de vizinhança devem ser toleradas quando situadas dentro de um limite médio de tolerância. No caso concreto, deve-se recorrer à figura abstrata do homem médio a partir das circunstâncias envolvidas. Nesse sentido aponta a conjugação do caput com o parágrafo único do art. 1.277 do CCBR. O caput traz a regra geral do direito de vizinhança: “O proprietário ou possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha”. Já o parágrafo único concede flexibilidade ao dispositivo: “Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança”.

 

2.2 Uso normal, causando incômodos anormais, mas socialmente justificados

A segunda situação-problema do direito de vizinhança é aquela em que, na utilização normal de seu prédio, o vizinho causa incômodos extraordinários, mas socialmente justificados13. Trata-se de um ato lícito que, todavia, enseja um dano ilícito. A ilicitude da conduta é afastada pelo reconhecimento jurídico da existência de um exercício regular de direito (art. 188, I)14. Não obstante, a doutrina brasileira considera que nesse caso existe responsabilidade civil, ainda que motivada por um ato lícito15. Isso porque o lesado, embora tenha o dever de tolerar a perturbação, terá direito à indenização pelos prejuízos. É o que se depreende do art. 1.278: “O direito a que se refere o artigo antecedente não prevalece quando as interferências forem justificadas por interesse público, caso em que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho indenização cabal”. A justificação por interesse público não possui uma definição legal e por isso opera como um conceito jurídico indeterminado. Não obstante, a própria legislação elenca algumas hipóteses especiais, como a passagem forçada (art. 1.285, caput)16, a passagem de cabos e tubulações (arts. 1.286)17 e a passagem de aquedutos (arts. 1.293, caput)18. Ainda que socialmente justificadas, entretanto, as interferências excessivas deverão ser contidas na medida do possível. Nesse sentido dispõe o art. 1.279: “Ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as interferências, poderá o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando estas se tornarem possíveis”.

 

2.3 Uso anormal, causando danos anormais, sem justificação social

A terceira e última situação-problema do direito de vizinhança é aquela em que o uso anormal do prédio causa incômodos extraordinários desprovidos de justificação social19. Trata-se de um ato ilícito que ocasiona danos ilícitos. Ausente a justificação por interesse público, o prejudicado poderá tomar medidas judiciais com vistas à cessação da conduta lesiva, bem como poderá pleitear a reparação dos danos sofridos. Essa situação abrange tanto as hipóteses de ilícito subjetivo (art. 186)20 quanto as hipóteses de ilícito objetivo (art. 187)21. Haverá ilícito subjetivo, por exemplo, no caso em que um vizinho, premeditadamente ou por descuido, arremessar objetos de sua sacada contra a vidraça de seu confinante. Haverá ilícito objetivo, por outro lado, caso uma construção seja levantada com o intuito de tão somente tampar a luz do sol incidente sobre a janela do vizinho. Em ambos os casos, contudo, não restam dúvidas quanto à presença dos pressupostos da responsabilidade civil presentes no caput do art. 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

 

3 PORTUGAL: A SISTEMATIZAÇÃO DE JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO SOBRE OS FUNDAMENTOS DOS DEVERES NO DIREITO DE VIZINHANÇA

A despeito da semelhança entre as previsões do CCBR e do CCPT, a doutrina portuguesa apresenta algumas diferenças em relação aos estudos brasileiros sobre a interface entre o direito de vizinhança e a responsabilidade civil. O presente trabalho objetiva destacar essas distinções a partir do contraste com as lições de José de Oliveira Ascensão. No artigo A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança22, o autor português demonstra o equívoco de reduzir o direito de vizinhança à responsabilidade civil, embora reconheça um certo entrelaçamento em determinadas situações. Nesse sentido, Ascensão elenca quatro fundamentos para os deveres no direito de vizinhança, que serão detalhados a seguir.

 

3.1 Responsabilidade por fatos lícitos

Para Ascensão, o primeiro fundamento para os deveres no direito de vizinhança é a responsabilidade por fatos lícitos23. Assim como o direito brasileiro, o direito português reconhece situações em que, não obstante a licitude da conduta, haverá o dever de reparar os prejuízos causados. Essa situação, por exemplo, é observada na previsão do estado de necessidade no CCPT (art. 339.º)24. No campo específico do direito de vizinhança, Ascensão utiliza o exemplo do instituto da passagem forçada momentânea, que contempla a responsabilização civil por fato lícito se houver dano (art. 1349.º)25.

 

3.2 Responsabilidade por fatos ilícitos

O segundo fundamento para os deveres no direito de vizinhança apontado por Ascensão é a responsabilidade por fatos ilícitos26. Mais uma vez de modo similar ao direito brasileiro, a relação jurídica de vizinhança no direito português pode atrair a incidência do princípio geral da responsabilidade civil, previsto no art. 483.º, 1, do CCPT: “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. Esse ponto é ilustrado por Ascensão com a hipótese de construção ou manutenção de instalação prejudicial que acarrete danos para os vizinhos (art. 1347.º)27.

 

3.3 Desapropriação por interesse particular

Segundo Ascensão, o terceiro fundamento para os deveres no direito de vizinhança é a desapropriação por interesse particular28. Trata-se de hipótese em que a lei estabelece um direito potestativo que permite a alguém sujeitar seu vizinho a um sacrifício mediante uma contraprestação prévia e predeterminada. Nesse caso, diferentemente dos dois anteriores, não haveria responsabilidade civil por fato lícito ou ilícito. As peculiaridades da situação evidenciariam, pelo contrário, uma aproximação com a figura da expropriação por utilidade pública. Ascensão exemplifica esse caso com os institutos da servidão de passagem (arts. 1550.º c/c 1554.º)29 e da servidão de águas (arts. 1557.º, 1)30. Nesse tópico, percebe-se um desencontro com a doutrina brasileira. As situações que os portugueses rotulam de desapropriação por interesse particular são classificadas, no Brasil, como hipóteses de responsabilidade civil por fato lícito.

 

3.4 Princípio da preservação do equilíbrio imobiliário

O quarto e último fundamento para os deveres no direito de vizinhança exposto por Ascensão é o princípio da preservação do equilíbrio imobiliário31. Para o autor português, esse princípio seria o vetor ordenador de todo o direito de vizinhança. Dessa forma, em um sentido amplo, a violação do equilíbrio imobiliário da vizinhança geraria uma pretensão real em favor dos prejudicados e em prol da reconstituição da situação anterior. Para Ascensão, essa conclusão é hoje reforçada pela crescente preocupação com a preservação ambiental. Frise-se, no entanto, que a referida pretensão real não se confunde com a pretensão indenizatória oriunda da responsabilidade civil. Pelo contrário, as pretensões são autônomas e podem coincidir ou não a depender do caso32. Aqui evidencia-se uma outra diferença com a doutrina brasileira, que em regra não trata do princípio da preservação do equilíbrio imobiliário no campo do direito de vizinhança. Por fim, cumpre tecer algumas críticas ao posicionamento português. Levado ao extremo, o princípio da preservação do equilíbrio imobiliário favorece demasiadamente a manutenção do status quo e pode acarretar um indesejado engessamento comunitário.

 

4 CONCLUSÃO

A interface entre direito de vizinhança e responsabilidade civil é mais complexa do que aparenta à primeira vista. Esses dois campos milenares do conhecimento jurídico possuem vários pontos de encontro e de desencontro na disciplina da vida comunitária. O contraste entre o regramento brasileiro e o português, ainda que superficial, é suficiente para evidenciar uma série de nuances teóricas muitas vezes despercebidas pelos operadores do direito.

No Brasil, a sistematização dos modos de composição de conflitos de vizinhança proposta por F. C. San Tiago Dantas fez escola e perdura até os dias atuais. Nesse sentido, considera-se a existência de três situações-problema quanto à utilização de prédios no contexto de vizinhança: a) o uso normal que causa incômodos normais; b) o uso normal que causa incômodos anormais, mas socialmente justificados; e c) o uso anormal que causa danos anormais sem justificação social. A primeira hipótese é resolvida pelo dever de tolerância a interferências ordinárias. Já a segunda hipótese é solucionada pelo instituto da responsabilidade civil por ato lícito. A terceira hipótese, por fim, é composta pela invocação da responsabilidade civil por ato ilícito.

Em Portugal, de modo diverso, José de Oliveira Ascensão identifica quatro fundamentos para os deveres no direito de vizinhança: a) a responsabilidade por fatos lícitos; b) a responsabilidade por fatos ilícitos; c) a desapropriação por interesse particular; e d) o princípio da preservação do equilíbrio imobiliário. Por um lado, percebe-se que o entendimento português predominante não problematiza isoladamente o dever de tolerância a interferências ordinárias. Por outro lado, observa-se que o posicionamento brasileiro prevalecente não considera as categorias da desapropriação por interesse particular e do princípio da preservação do equilíbrio imobiliário.

Em suma, a análise dialógica do regramento brasileiro e português quanto ao direito de vizinhança demonstra a existência de uma realidade jurídica dinâmica e plural. No âmbito de uma relação jurídica de vizinhança, é possível cogitar de um amplo leque de pretensões que incidem isolada ou concomitantemente com diversas modalidades de responsabilidade civil. Essa constatação aponta a necessidade de um tratamento dogmático mais rigoroso. Para além de respostas casuísticas e operacionais, faz-se necessário o empreendimento de um arranjo teórico coerente da matéria.

 

Notas e Referências

1 Nesse sentido, Anderson Schreiber aponta a erosão dos filtros da reparação. Cf. SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

2 Cf. BARRETO, S. Silva. O mau vizinho. Justitia, São Paulo, v. 44, p. 60-89, jul./set. 1982. DANTAS, F. C. de San Tiago. O conflito de vizinhança e sua composição. Rio de Janeiro: Borsoi, 1939. FULGÊNCIO, Tito. Direitos de vizinhança: limites de prédios. 2. ed. Atual. José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro: Forense, 1959. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de construir. 8. ed. Atual. Eurico de Andrade Azevedo. São Paulo: Malheiros Editores, 2000.

3 Cf. DANTAS JÚNIOR, Aldemiro Rezende. O direito de vizinhança. Rio de Janeiro: Forense, 2003. FACHIN, Luiz Edson. Direitos de vizinhança e o novo Código Civil brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, v. 5, n. 17, p. 51-71, jan./mar. 2004. LÔBO, Paulo. Direitos e conflitos de vizinhança. Revista Brasileira de Direito Civil, v. 1, p. 66-94, jul./set. 2014.

4 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 539. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil: reais. 5. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1993. p. 204-215.

5 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 540. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil: reais. 5. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1993. p. 233-280.

6 Na síntese de Luiz Edson Fachin: “Em matéria de natureza jurídica dos direitos de vizinhança, já se tem assentado que tais direitos são, em verdade, limitações aos direitos decorrentes da propriedade, que não se confundem com direitos reais, pois dão origem a direitos não só de natureza real, mas também pessoal”. FACHIN, Luiz Edson. Direitos de vizinhança e o novo Código Civil brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, v. 5, n. 17, p. 51-71, jan./mar. 2004. p. 59.

7 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 2

8 FACHIN, Luiz Edson. Direitos de vizinhança e o novo Código Civil brasileiro. Revista Trimestral de Direito Civil, Rio de Janeiro, v. 5, n. 17, p. 51-71, jan./mar. 2004. p. 53.

9 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 539-540. ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 2.

10 DANTAS, F. C. de San Tiago. O conflito de vizinhança e sua composição. Rio de Janeiro: Borsoi, 1939.

11 DANTAS, F. C. de San Tiago. O conflito de vizinhança e sua composição. Rio de Janeiro: Borsoi, 1939. p. 329-330.

12 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 550-551.

13 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 551-552.

14 Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; [...]

15 Em sentido contrário, Sergio Cavalieri Filho defende que, tecnicamente, não existe responsabilidade civil por ato lícito: “[...] o ressarcimento pode se dar a título diverso da responsabilidade civil, isto é, sem que o agente tenha violado qualquer dever jurídico. Muitas são as hipóteses em que a lei concede um direito mas condiciona o seu exercício, apesar de legítimo, à reparação dos eventuais prejuízos sofridos por terceiros. Assim, por exemplo, na desapropriação, na servidão e no estado de necessidade. Em casos tais, não á, a rigor, que se falar em responsabilidade civil porque, como já ressaltado, o agente não viola qualquer dever jurídico; antes, pelo contrário, age conforme o Direito”. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 607.

16 Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário. [...]

17 Art. 1.286. Mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa. Parágrafo único. O proprietário prejudicado pode exigir que a instalação seja feita de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel.

18 Art. 1.293. É permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à indústria, bem como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de terrenos.

19 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 552-555.

20 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

21 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

22 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007.

23 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 3-4.

24 Artigo 339.º (Estado de necessidade) 1. É lícita a acção daquele que destruir ou danificar coisa alheia com o fim de remover o perigo actual de um dano manifestamente superior, quer do agente, quer de terceiro. 2. O autor da destruição ou do dano é, todavia, obrigado a indemnizar o lesado pelo prejuízo sofrido, se o perigo for provocado por sua culpa exclusiva; em qualquer outro caso, o tribunal pode fixar uma indemnização equitativa e condenar nela não só o agente, como aqueles que tiraram proveito do acto ou contribuíram para o estado de necessidade.

25 Artigo 1349.º (Passagem forçada momentânea) 1. Se, para reparar algum edifício ou construção, for indispensável levantar andaime, colocar objectos sobre prédio alheio, fazer passar por ele os materiais para a obra ou praticar outros actos análogos, é o dono do prédio obrigado a consentir nesses actos. 2. É igualmente permitido o acesso a prédio alheio a quem pretenda apoderar-se de coisas suas que acidentalmente nele se encontrem; o proprietário pode impedir o acesso, entregando a coisa ao seu dono. 3. Em qualquer dos casos previstos neste artigo, o proprietário tem direito a ser indemnizado do prejuízo sofrido.

26 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 4.

27 Artigo 1347.º (Instalações prejudiciais) 1. O proprietário não pode construir nem manter no seu prédio quaisquer obras, instalações ou depósitos de substâncias corrosivas ou perigosas, se for de recear que possam ter sobre o prédio vizinho efeitos nocivos não permitidos por lei. 2. Se as obras, instalações ou depósitos tiverem sido autorizados por entidade pública competente, ou tiverem sido observadas as condições especiais prescritas na lei para a construção ou manutenção deles, a sua inutilização só é admitida a partir do momento em que o prejuízo se torne efectivo. 3. É devida, em qualquer dos casos, indemnização pelo prejuízo sofrido.

28 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 4-6.

29 Artigo 1550.º (Servidão em benefício de prédio encravado) 1. Os proprietários de prédios que não tenham comunicação com a via pública, nem condições que permitam estabelecê-la sem excessivo incómodo ou dispêndio, têm a faculdade de exigir a constituição de servidões de passagem sobre os prédios rústicos vizinhos. 2. De igual faculdade goza o proprietário que tenha comunicação insuficiente com a via pública, por terreno seu ou alheio. Artigo 1554.º (Indemnização) Pela constituição da servidão de passagem é devida a indemnização correspondente ao prejuízo sofrido.

30 Artigo 1557.º (Aproveitamento de águas para gastos domésticos) 1. Quando não seja possível ao proprietário, sem excessivo incómodo ou dispêndio, obter água para seus gastos domésticos pela forma indicada no artigo anterior, os proprietários vizinhos podem ser compelidos a permitir, mediante indemnização, o aproveitamento das águas sobrantes das suas nascentes ou reservatórios, na medida do indispensável para aqueles gastos.

31 ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007, p. 6.

32 Na síntese de José de Oliveira Ascensão: “Há que extrair o princípio: cada vizinho pode agir livremente in suo, no respeito das normas específicas vigentes. Mas não pode fazer à custa da condição natural preexistente do prédio vizinho. Se o fizer, terá de reconstituir a situação primitiva, independentemente de qualquer consideração de responsabilidade civil”. ASCENSÃO, José de Oliveira. A preservação do equilíbrio imobiliário como princípio orientador da relação de vizinhança. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, v. I, ano 67, p. 1-14, jan. 2007. Disponível em: <https://portal.oa.pt/comunicacao/publicacoes/revista/ano-2007/ano-67-vol-i-jan-2007/doutrina/jose-de-oliveira-ascensao-a-preservacao-do-equilibrio-imobiliario-como-principio-orientador-da-relacao-de-vizinhanca/>. Acesso em: 01 de dezembro de 2017. p. 6.

 

Imagem Ilustrativa do Post: courthouse hammer // Foto de: pixabay.com // Sem alterações

Disponível em: https://www.pexels.com/photo/close-up-court-courthouse-hammer-534204/

Licença de uso: https://www.pexels.com/creative-commons-images/

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura