DELAÇÃO PREMIADA E OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

04/06/2021

O presente artigo tem com o objetivo analisar a situação da delação premiada no direito Brasileiro, exibindo sua origem, conceituações e as questões no direito comparado, através de argumentos doutrinários pautados em vista das legislações vigentes, que dispõem sobre a delação premiada. Dessa maneira, analisa-se o instituto da delação premiada e seus desenvolvimentos no ordenamento jurídico brasileiro, com fundamento nos principais princípios constitucionais. Por fim, revisitam-se alguns casos polêmicos que aconteceram no Brasil, para compreender a aplicação da delação premiada na atualidade. O presente estudo tem a finalidade de apresentar o estudo da delação premiada que está presente no Direito Penal Brasileiro e demais leis específicas, cujo propósito é amparar o Estado em suas persecuções criminais por meio de benefícios atribuídos ao agente que, com sua voluntariedade e dos demais comparsas, asseguram ao Estado a aplicação da justiça criminal. O delito causado pode ser em relação a qualquer crime, mas é especialmente aplicado nas investigações de organização criminosa.

A aplicação da delação premiada cria muitas discussões acerca dos seus efeitos, ocorrendo discussões contrárias e favoráveis. O objetivo da colaboração premiada, em vários questionamentos, se dá pelo seu método, pois é considerado pouco ético em razão que a deleção estabelece de uma forma ou outra, traição aos comparsas.

Dessa forma, os benefícios ou prêmios trazidos ao agente criminoso permitem atualmente aplicação de uma pena menor, até o perdão judicial. O interesse desse trabalho é analisar a delação premiada no direito comparado justamente com os princípios constitucionais, demonstrado assim suas vantagens e desvantagens, relatando o que alguns doutrinadores entendem sobre o tema.

No primeiro capítulo, apresentaremos a origem da delação premiada em suas linhas gerais. Na sequência, faremos uma comparação com a legislação estrangeira. No terceiro capítulo, observaremos a aplicação do instituto nas leis de crimes hediondos, crimes contra a ordem tributária, lavagem de dinheiro, lei de proteção a vítima e testemunha, organização criminosa e crime organizado.

No quarto capítulo, apresentaremos a delação premiada sob a visão ética e constitucional no sistema jurídico brasileiro, com base nos princípios da individualização da pena, do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal, da não autoincriminação e da proporcionalidade. No quinto capítulo, observaremos uma breve diferença entre a delação aberta e fechada. No sexto capítulo, apresentaremos os efeitos positivos e negativos da delação premiada segundo alguns doutrinadores, e, por fim, apresentaremos dois casos de delação premiada que aconteceram no Brasil.

DELAÇÃO PREMIADA E SUA ORIGEM HISTÓRICA

A delação premiada foi instituída no século XIX, pelo jurista Rudolf Von Ihering, que criou um mecanismo que pudesse esclarecer os crimes, já que o Estado, em virtude das dificuldades enfrentadas naquele período, se exibia impotente para tal. A palavra delação premiada vem do latim accusatio. Segundo o dicionário Michaelis (1998), “aponta a responsabilidade por qualquer ato censurável ou relator ato reprovável ou criminoso”.

Gabriel C. Zacarias de Inellas (2006, apud GUIDI, 2006, p. 98) define o instituto da delação premiada como a afirmativa do corréu, ao ser interrogado, pela qual, além de confessar a autoria de um fato antijurídico, igualmente atribui a um terceiro a participação, como seu comparsa. Ainda completa dizendo:

Só se pode falar em delação quando o réu também confessa, porque, se negar a autoria, atribuindo-a a outrem, estará escusando-se da prática criminosa, em verdadeiro ato de defesa e, portanto, o valor da assertiva, como prova, será nenhum. Destarte, o elemento subjetivo essencial na delação, para sua credibilidade como prova, é a confissão do delator.

A delação decorre no momento que em uns envolvidos comprometem-se a colaborar com a justiça, confessando seu crime, e atribuindo a um terceiro a autoria conjunta no fato ocorrido, em troca de receber vantagens, tais como a diminuição na pena desde que entregue os seus comparsas, e o perdão judicial, ou a total suspensão da pena da sua punição.

Estabelece assim o artigo 4° da Lei n° 12.850/2013:

O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:

I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. (BRASIL, 2013).

Segundo a doutrina de Guilherme de Souza Nucci (2011), “delatar significa acusar, denunciar ou revelar. Processualmente, somente tem sentido de se falar em delação quando alguém, admitindo a prática criminosa, revela que outra pessoa também o ajudou de qualquer forma.”

Sendo assim, a delação é um mecanismo jurídico que traz as verdades dos fatos, é um tipo de objeto importantíssimo que contribui para as investigações como nas sentenças de vários delitos, bem como o ponto essencial para possibilitar as desarticulações de organizações criminosas.

Porém, não há como se confundir a “confissão” com a delação, pois são palavra distintas, uma vez que a confissão diz respeito à autoincriminação, e a delação reflete a imputação do fato relacionado a terceiro.

A delação vem auxiliar na fraqueza do Estado diante do combate à criminalidade, que se desenvolve em âmbito nacional. Deste modo, a criminalidade vem crescendo de forma significativa, não somente quanto aos delitos que afetam bens jurídicos, mas também houve a multiplicação de delinquentes que formaram grupos criminosos que se fortalecem através de seus delitos, enquanto os órgãos de combate à criminalidade se enfraquecem e perdem sua palavra de autoridade.

Por conta da sua incompetência, o Estado procura alternativas a essa sua fragilidade de reprimir a prática de delitos, buscando assim soluções pouco recomendadas, como um acordo entre o aplicador do direito e o criminoso na entrega de seus comparsas, diminuindo a sua pena se vier a ser condenado, ou até mesmo o perdão judicial que está previsto no artigo 107 IX, do Código Penal. Deduzido assim que o Estado se juntou ao criminoso para um ao lado do outro lutarem contra a criminalidade.

O Desembargador Federal Tourinho Filho, em acórdão, fez a seguinte crítica:

A delação (traição) premiada revela a incompetência do Estado na luta contra o crime, na ineficiência do sistema de persecução criminal. Vale-se, então, da franqueza de caráter de determinados indivíduos. A delação premiada é a institucionalização da traição. (BRASIL, 2015).

 

 

NO DIREITO BRASILEIRO

No Direito brasileiro, os primeiros apontamentos de investigação da delação premiada foram ser verificados nas Ordenações Filipinas (1603-1867), que se tratavam de falsificação de moeda. Estas ações apareciam em seu próprio livro V, ocorrendo entre janeiro de 1603 até entrar em vigor o Código Criminal de 183. Ainda assim, a delação premiada só foi efetivamente inserida no ordenamento jurídico através do artigo 8° da Lei n° 8.072/1990, em seu parágrafo único:

O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços. (BRASIL, 1990a).

Walter Barbosa Bittar (2011, p. 226) comenta:

No Brasil a introdução do polêmico instituto teve como inspiração para o legislador pátrio o modelo italiano (quiçá o único), pois houve, na prática, um verdadeiro pedido de empréstimo à legislação antiterrorista italiana, de regra de premiar o delator que tenha propiciado em razão de suas denúncias, a liberação do sequestrado ou que tenha colaborado, com a autoridade judiciária ou policial na coleta de provas/ decisivas para a identificação e captura dos concorrentes.

Alguns ensinamentos doutrinários classificam a delação premiada com dois aspectos: aberta e fechada. A espécies de aberta é quando o indivíduo se apresenta identificando-se, tentado se favorecer de alguma forma, seja favorecimento da recompensa ou na redução da pena ou até mesmo, no perdão judicial. Na do tipo fechada, ao contrário da primeira, o indivíduo não se apresenta, mantém-se sempre anônimo, contribuindo de modo desinteressado e sem qualquer tipo de ameaça.

É de ser observar também que a delação premiada atuou em vários períodos históricos como, por exemplo, na Conjuração Mineira no ano de 1789, no qual um dos conjurados chamando Joaquim Silvério Reis conseguiu o perdão de suas dívidas junto à Fazenda Pública em troca de favores na delação, entregado assim os seu comparsas, levando dessa maneira à morte de Joaquim José da Silva Xavier, que ficou conhecido como o herói nacional Tiradentes. O acontecimento mais recente na história brasileira ocorreu após o golpe militar: nota-se assistência do uso reiterado da delação com a finalidade de descobrir supostos criminosos os quais não eram adeptos ao regime militar que vigorava na época.

 

HISTÓRICO NA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA

NO DIREITO ITALIANO

Em relação no que diz respeito aos outros países estrangeiros, como aconteceu na Itália, que a partir do ano de 1970 foi criando um mecanismo de delação premiada, ao combater ao crime de extorsão mediante sequestros, procurado assim propor aos indivíduos uma pena mais branda, àqueles que colaboram no combate com esse delito, desde que cumpra com os requisitos em leis. Porém no ano de 1980 a Itália recebeu o maior destaque e instituiu a Operação Mão Limpas (Operazione Mani Pulite), com a finalidade de exterminar a máfia, sendo aqueles que combaterem a organização criminosa terá a recompensa do sanctio legis.

Sobre a origem da colaboração com a Justiça no direito italiano, Eduardo Araújo da Silva (2005) ensina:

No direito italiano, as origens históricas do fenômeno dos “colaboradores da Justiça” é de difícil identificação; porém sua adoção foi incentivada nos anos 70 para o combate dos atos de terrorismo, sobretudo a extorsão mediante sequestro, culminando por atingir seu estágio atual de prestígio nos anos 80, quando se mostrou extremamente eficaz nos processos instaurados para a apuração da criminalidade mafiosa. O denominado pentitismo do tipo mafioso permitiu às autoridades uma visão concreta sobre a capacidade operativa das Máfias, determinando a ampliação de sua previsão legislativa e a criação de uma estrutura administrativa para sua gestão operativa e logística (Setor de Colaboradores da Justiça).

No Direito italiano, quando o agente se arrepender, depois da prática de algum crime, sendo este em concurso com organizações criminosas e se empenhar para diminuir as consequências desse crime, confessando-o ou impedindo o cometimento de crimes conexos, terá o benefício de diminuição especial de um terço da pena que for fixada na sentença condenatória, ou da substituição da pena de prisão perpétua pela reclusão de 15 a 21 anos (GUIDI, 2006, p.102).

Os indivíduos passaram a ser conhecidos com pentiti, e a partir de então a matéria passou a fazer parte do Código Penal italiano incluindo outra legislação, como a Lei no 82, de 15 de janeiro de 1991. A lei tem como objetivo de estabelecer uma pena menor aos coautores de crimes de extorsão mediante sequestros, subversão da ordem democrática, desde como o objetivo em lei.

Encontram-se três tipos de colaboradores no Direito italiano: o arrependido, o dissociado e o colaborado. O arrependido é o indivíduo que entrega todas as informações necessárias da organização criminosa com as atividades desenvolvidas e as que serão realizadas; o dissociado confessa a prática dos crimes, e assim tenta diminuir as consequências de novos atos a serem realizados; o colaborado busca fornecimento de provas. Destaca-se que todos os tipos de colaboração devem acontecer antes da sentença condenatória.

Pela lei, o “arrependido” poderia ser beneficiado com hipóteses de não-punibilidade, atenuantes e com a suspensão condicional da pena; porém, a proteção poderia ser revogada se as declarações fossem mendazes ou reticentes. Por outro lado, a designação dissociado surgiu na Lei no 34/87, que tratava exclusivamente das organizações e dos movimentos de matriz terrorista ou eversiva. O art. 18 dessa lei nacional previa o “comportamento daquele que, imputado ou condenado por crime como finalidade terrorista ou de aversão ao ordenamento constitucional, admitia as atividades efetivamente desenvolvidas e demonstrava comportamento incompatível com o vínculo associativo e de repúdio à violência como método de luta política”. A diferença entre as duas figuras estava no fato de que, enquanto para os “arrependidos” eram exigidas apenas declarações sobre os fatos e os envolvidos no crime, para o “dissociado”, além dessas informações, exigia-se também sua ruptura com a ideologia política que motivava o seu comportamento criminoso. Por fim, a figura do

 

“colaborador da Justiça” é uma evolução ampliativa dos dois modelos anteriores, prevista primeiramente no art. 10 da Lei no 82/91, abarcando aqueles que genericamente colaboraram coma Justiça ou apresentam declarações úteis no curso das investigações, independentemente de serem coautores ou partícipes dos crimes investigados, testemunhas ou pessoas que colaboraram de alguma forma com as autoridades responsáveis pela investigação.

Ainda relacionado às três figuras acima descritas, Carvalho e Coutinho (2006, p. 75) esclarecem:

NO DIREITO NORTE-AMERICANO

Não foi diferente nos Estado Unidos, onde foi estabelecida a delação premiada após a Segunda Guerra Mundial. Essa delação passou a ser usada em decorrência dos resultados eficientes, de cerca de 80% a 95% dos crimes acontecido no Estados Unidos, são resolvidos através do plea bargaining, que são tipos de acordo entre o acusador e réu.

A delação se apresenta como uma figura com resultado específico diante da sociedade americana. Esse modelo de plea bargaining faz com que o Ministério Público faça as coletas de provas no inquérito policial, e diante disso faz a acusação ao poder judiciário. Se porventura existir uma possibilidade de acordo com o acusado, o Ministério Público terá a liberdade para fazer negociações e decidir se prosseguirá ou não com as acusações.

Sobre o tema, Frederico Valdez Pereira (2014, p. 42) se manifesta:

O postulado regente da persecução penal nesses países: princípio da oportunidade, confere ao Ministério Público amplo poder de seleção e de condução do processo penal com ferramentas como plea bargaining e guilty plea, seguindo a linha do utilitarismo inerente ao sistema que abraça negociações entre acusação e defesa direcionadas à solução do litígio penal.

Natália de Oliveira de Carvalho (2009, p. 78) conclui que “no direito norte-americano, mormente após a Segunda Guerra Mundial, o direito premial ganhou força em razão da produção de resultados ‘eficientes’”.

Há diversos modos de se contribuir com a justiça, mas principalmente instituto da plea bargaining tem o reconhecimento da culpa pelo imputado na fase preliminar, sem passar pela fase de julgamento, evitando processo. Ainda assim, refere-se a instituto que se expõe sobre várias facetas.

NO DIREITO ALEMÃO

Na Alemanha, existe um tipo de sistema onde aquele indivíduo que colabora voluntariamente denunciando o delito ou impedindo uma organização criminosa de cometê-lo pode receber uma diminuição da pena ou por ventura até a não aplicação da pena.

Segundo o entendimento do doutrinador Frederico Valdez Pereira, o acordo de delação entres os criminosos e justiça tem raízes profundas nos procedimentos jurídicos como o exemplo anglo-saxão.

Pereira (2014, p. 41-42) comenta:

[...] o recurso à cooperação pós-delitiva de coautor de delito como elemento de prova no processo penal teve alguma idealização nos ordenamentos jurídicos de modelo anglo-saxão, nos quais a origem é facilmente explicável pelo fato de a participação do imputado com administração da justiça penal ser considerada, em linhas gerais, um dos pilares de países como Grã-Bretanha e Estados Unidos. Nesses sistemas jurídicos, as práticas negociais vêm favorecidas por um conjunto de fatores que permitem dizer-se que a colaboração processual do imputado com a justiça penal é uma instituição típica desse sistema de commow law, sendo a concessão de benefícios punitivos um dos seus componentes básicos.

 

 

ANÁLISE DO INSTITUTO NA LEI

Nesse capítulo, serão analisados os principais pontos de cada lei que contém o referido instituto, além da evolução legislativa na matéria.

LEI N° 8.072/1990 – CRIMES HEDIONDOS

Os crimes hediondos são os tipos de crime mais desenvolvidos com maiores agravantes em relação à pena, e por isso ganham maior atenção do Estado, garantindo assim ao autor do fato que após as investigações não poderá adquirir direitos como fiança, não pode ser afastado do ato ilícito cometido, sem perdão ou esquecimento judicial. A ressalva existente encontra-se no artigo 8°, parágrafo único, que trata a respeito da Delação Premiada:

Art. 8o Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços. (BRASIL, 1990a).

Observa-se também no artigo 5o, XLIII, da Constituição Federal, com este aguamento da lei o examinado buscou diminuir a responsabilidade criminal dos réus, que com sua participação com a autoridade judicial colaborasse com dados para que facilitasse as liberações de sequestros. Aparece então no ordenamento jurídico brasileiro a delação premiada.

A primeira aparição surgiu num ato de delação prevista no artigo 7o § 4o e no artigo 159 do Código Penal, e o segundo acordo no artigo 8o parágrafo único. A uma diferenciação entre o associado e participante entre os agentes é que o agente poderia sofre uma redução na pena e o associado responderia no crime que participou.

Portanto, o Diploma Legal estabelece no Brasil, alçado no Direito italiano, a delação premiada, que somente era usada em duas situações penais: na extorsão mediante sequestro e a quadrilha ou bando.

Observa-se que a vantagem era unicamente concedida à aqueles criminosos que praticaram atos em quadrilhas ou bando, e que tenham mais de três indivíduos envolvidos, a queixa precisa ser produtiva, isto é, para facilitar a liberação do sequestrado.

Assim a lei observa o participante ou associado falar perante a autoridade judicial que está envolvido em um crime hediondo terá a possibilidade da diminuição da pena pela metade.

LEI N° 8.137/1990 – CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA

A Lei n° 8.137/1990 sofreu algumas alterações por meio da Lei n° 9.080/1995 em relação à aplicação da delação premiada nos crimes relacionados à ordem tributária. Para a obtenção do acordo, alguns elementos são requeridos, como a voluntariedade do delator, para que haja redução na pena.

LEI N° 12.683/2012 – LAVAGEM DE DINHEIRO

Há três espécies de aplicação da delação premiada na nova lei: redução da pena e seu cumprimento em regime mais brando, perdão judicial e substituição da prisão por pena restritiva de direitos.

LEI N° 9.807/1999 – LEI DE PROTEÇÃO À VÍTIMA E À TESTEMUNHA

Destaca-se que há a proteção daqueles indivíduos que tenham convivência habitual, desde que dependentes, bem como companheiro(a) ou cônjuge, ascendentes, descendentes da pessoa ameaçada. Outro ponto é que essas medidas de proteção dispostas na legislação não são obrigatórias, ou seja, são uma opção que a pessoa possui: mesmo que esteja sendo ameaçada, ela não será obrigada a ter sua liberdade restringida. Para Nucci (2011), a proteção é um benefício, e não uma penalidade.

LEI N° 12.850/2013 – ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

O crime organizado atualmente não existe conceito e definições no ordenamento jurídico, somente pode ser dito que existem acordos de compreensão com o poder judiciário em relação aos países estrangeiros, inclusive o último foi promovido no dia 06 de novembro no corrente ano, no Brasil e Alemanha onde procuraram desenvolver em parceria ao crime organizado.

Hoje a tecnologia avançada trouxe mais facilidade de acesso aos indivíduos que fazem parte de organização criminosa, ultrapassando as fronteiras e desconsiderando os estados nacionais. Essas quadrilhas organizadas são desenvolvidas com ligações de terrorismo internacional por empresas e vários apoios logísticos.

Os criminologistas assim definem crime organizado:

Qualquer crime cometido por pessoas ocupadas em estabelecer em divisão de trabalhos: uma posição designada por delegação para praticar crime que como divisão de tarefas também inclui, em última análise, uma posição para corruptor, um corrompido e uma para um mandante. (MINGARDI, apud GUIDI, 2006, p. 31.).

A definição do FBI é a seguinte:

Qualquer grupo tendo algum tipo de estrutura formalizada, cujo objetivo é a obtenção de dinheiro através de atividades ilegais. Tais grupos mantêm suas posições através do uso de violência, corrupção, fraude ou extorsão, e geralmente têm significativo impacto sobre os

locais e regiões do País onde atuam. (GUIDI, 2006, p. 31).

LEI N° 9.034/1995 – LEI CONTRA O CRIME ORGANIZADO

Para este tipo de delito de crimes organizados, é necessário que algumas pessoas se organizem na intenção de cometerem o determinado crime na repartição de tarefas. Cada vez mais as pessoas apresentam atividades criminosas diante da sociedade, principalmente envolvendo crimes contra vida e o patrimônio.

Com esta situação surgiu a Lei n° 9.034/1995, que recebeu o nome de Lei contra o Crime Organizado. O objetivo é combater na forma mais competente este tipo de delito, então o legislador trouxe novamente a delação premiada, que já era aplicada nos crimes hediondos. A formalidade básica para delação premiada apresentada na lei ora em análise baseia-se na “colaboração verdadeira do agente”, compreendido como qualquer pessoa membro na organização criminosa que deseja contribuir voluntariamente com a justiça.

A DELAÇÃO PREMIADA SOB A VISÃO ÉTICA E CONSTITUCIONAL NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

A delação premiada está cada mais estabelecida na legislação infraconstitucional, regulada no poder judiciário com alcance em crimes econômicos, e vem amplamente sucedendo nas doutrinas. As divergências contrárias alegam a inconstitucionalidade da delação, comparado a prática a uma traição, entojado a coletividade.

Segundo o ínclito criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, vulgo Kakay, a delação premiada “constitui singular inversão de valores de constitucionais”. O criminalista defende a inversão de valores posto que para celebrar o acordo de delação o réu deve desistir de recursos constitucionais tais como o habeas corpus. O advogado ainda complementa sobre a inconcebível supressão de direitos: “Qualquer tipo de exigência que signifique supressão de garantias fundamentais inequivocamente atenta contra o Estado Democrático de Direito”.

(CANÁRIO, 2015).

Dessa forma, pode-se afirmar que todos os recursos que previram o uso da deleção premiada são dispositivos que promovem a segurança e a justiça, direitos esses que estabelecem-se no preâmbulo da Constituição Federal de 1988, devem ser asseguradas no estado democrático, pois concedem a perseguição penal um mecanismo para combater a criminalidade organizada e a imputabilidade no Brasil.

PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

O princípio da individualização da pena está estabelecido no rol do artigo 5o inciso XLVI da Constituição Federal, que diz o seguinte:

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

  1. a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
  2. e) suspensão ou interdição de direitos; (BRASIL, 1988).)

O princípio da individualização da pena estabelece que cada indivíduo tem sua pena individualizada, ou seja, deverá ser aplicada a uma pena definida de acordo com o crime cometido. O doutrinador José Antônio Paganella Boschi (2011) acredita que a individualização da pena e imprescindível à atividade legislativa e do juiz, cujas tarefas compreendem. O doutrinador

define crime como uma espécie de penas e aponta limites.
Diante disso, é possível que a personalidade do indivíduo que vem a colaborar com as

investigações policias, se mostre mais ampla para aceitar as normas do ordenamento jurídico que sobressaem para mundo social.

No que se refere à delação premiada, é necessário observar os benefícios que o juiz considerará na aplicação ao perdão judicial e na redução da pena, estabelecendo assim, ao grau de responsabilidade da conduta do agente. Por esse motivo, quanto maior a colaboração do indivíduo, menor será a censurabilidade da sua pena, fazendo jus aos benefícios que a delação premiada permite.

No entanto, o simples fato do autor delatar releva, supostamente, certo arrependimento do indivíduo que praticou o delito, propondo não apensas a permissão do benefício oferecido, mais também a socialização. Dessa forma, pode se dizer que o princípio da individualização da pena não contrapõe a delação, pois é considerado ao agente a conduta de acordo com as circunstâncias que fizeram se redimir, bem como a conduta personalista.

O professor Boschi (2011, p. 59) diz que:

Ao legislador incumbe definir o crime, indicar as espécies de penas e apontar os limites; ao juiz, eleger a pena dentre as possíveis, mensurá-la dentro dos limites, e, por último, presidir o processo executório da pena que vier a ser concretizada.

PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO

O princípio do contraditório está estabelecido na Constituição Federal no art. 5°, LV:

O princípio do contraditório está interligado no processo legal, um exemplo muito comum no ordenamento jurídico é quando o réu e acusado é processado e possui direito de informação e de se defender das acusações alegadas contra si no procedimento processual. Ressalva-se que não será aplicado este princípio na fase de inquérito policial.

O princípio do contraditório traz várias estabilidades ao acusado, uma delas é a igualdade de condições, ou seja, a outra parte também poderá ser ouvida isto engloba a instrução do lato sensu.

Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. (BRASIL, 1988). Ou melhor dizendo, todo tipo de movimento a ser preparado pelo magistrado. Na sua doutrina, Renato Brasileiro de Lima (2015, p. 48) traz o entendimento do princípio do:

Na clássica lição de Joaquim Canuto Mendes de Almeida, sempre se compreendeu o princípio do contraditório como a ciência bilateral dos atos ou termos do processo e a possibilidade de contrariá-los. De acordo com esse conceito, o núcleo fundamental do contraditório estaria ligado à discussão dialética dos fatos da causa, devendo se assegurar a ambas as partes, e não somente à defesa, a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos praticados no curso do processo. Eis o motivo pelo qual se vale a doutrina da expressão “audiência bilateral”, consubstanciada pela expressão em latim audiatur et altera pars (seja ouvida também a parte adversa). Seriam dois, portanto, os elementos do contraditório: a) direito à informação; b) direito de participação. O contraditório seria, assim, a necessária informação às partes e a possível reação a atos desfavoráveis.

PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA

O princípio da ampla defesa também está estabelecido na Constituição Federal no art. 5°, LV, como visto no tópico anterior. Além disso, nossa Carta Magna também estabelece o princípio da presunção da inocência no inciso LVII do mesmo artigo 5o:

Assim, o princípio da ampla defesa rege a garantia do acusado a ser protegido tanto em processo judicial ou administrativo. Diante disso, Tornaghi (2007, p. 175) também discorre sobre o princípio da ampla defesa:

A defesa deve ser, portanto, ampla e efetiva. Somente a amplitude da defesa é capaz de dar tranquilidade ao homem de bem. Ela é uma instituição de ordem pública, uma vez que a sociedade tem o interesse, não que a pena recaia sobre qualquer cabeça, mas que a punição recaia sobre o culpado. Sua função ultrapassa o interesse subjetivo do réu, para cumprir uma tarefa que interessa a toda comunidade.

Dessa forma, a ampla defesa e o contraditório estão unidos num elo de instrumentalidade no qual a defesa assegura ao contraditório também por este e garantido. Lopes Junior (2008, p. 185) destaca a relevância da distinção ente os princípios:

A relevância da distinção reside na possibilidade de violar um deles sem a violação simultânea do outro, com reflexos no sistema de nulidades processuais. É possível cercear o direito de defesa pela limitação no uso de instrumentos processuais, sem que necessariamente ocorra violação do contraditório. A situação inversa é, teoricamente, possível, mas pouco comum, pois em geral a ausência de comunicação gera a impossibilidade de defesa.

Art. 5o. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; (BRASIL, 1988).

A ampla defesa gera inúmeros direitos exclusivos ao réu, como é o caso de ajuizamento de revisão criminal, instrumento vedado à acusação, bem como a oportunidade de ser verificada a eficiência da defesa pelo magistrado, que pode desconstituir o advogado escolhido pelo réu, fazendo-o eleger outro ou nomeando-lhe um dativo, entre outros (NUCCI, 2015, p. 36).

Destaca-se ainda que seja importante que os depoimentos acontecer de acordo com as condições oferecidas pelos princípios constitucionais do ordenamento jurídico brasileiro, com a finalidade que a delação premiada seja examinada com meio de prova lícita, pois caso fira algum dos princípios tornará o procedimento nulo. Para tornar-se válida a confissão, deverá ocorrer repetida a instrução. Diante disso, será conhecido o teor da delação premiada oferecendo oportunidades ao contraditório e ampla defesa.

PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL

O princípio do devido processo legal está previsto no artigo 5o, inciso LIV, da Constituição Federal:

Verifica-se, portanto, que é garantida de todo indivíduo um processo digno, com seus direitos e garantias fundamentais.

O estado deverá propor uma ação penal para solucionar os conflitos penais, através de cada órgão acusado, dessa maneira se determinado fato por típico, ilícito ou culpável.

Acerca da utilização da deleção premiada, o princípio do devido processo legal está o índice do impedimento que fazem com que a delação premiada não se torne uma forma mais adequada para quem a utiliza. Segundo entendimento do doutrinador Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (2006), há um descumprimento em relação ao devido processo legal, na utilização entre os acordos proferidos pelo Ministério Público e a defesa do delator, sendo assim, que os depoimentos apresentados pelo indivíduo acabam tornando-se inacessíveis no processo em que são utilizados. Nota-se ainda que alguns acordos acabam ferido o princípio do devido processo legal, por conta dos princípios da obrigatoriedade e da indisponibilidade, regentes no ordenamento jurídico brasileiro.

Segundo Moraes (2001, p. 112):

Ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (BRASIL, 1988).

O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado persecutor e plenitude de defesa (direito à defesa

técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal). (MORAES, 2001, p. 112).

PRINCÍPIO DA NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO

No ato da delação premiada, é fundamental que o indivíduo investigado confesse o delito por ele praticado, e que se oponha na presença do seu defensor, ao direito do silêncio, observando o inciso LXIII do artigo 5o da Constituição Federal:

Art. 5o - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo- lhe assegurada a assistência da família e de advogado; (BRASIL, 1988).

Nota-se que se trata de uma violação de uma garantia constitucional, visto que não há uma voluntariedade por parte do delator na sua confissão em relação à sua culpa, tendo que o investigado dispor do seu direito de silenciar com a finalidade de efetuar o acordo. O direito ao silêncio refere-se a uma faculdade conferida ao réu, não podendo o mesmo ser obrigado a exercê-lo.

PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

No contexto penal, deve-se notar que a proporcionalidade do delito é inexistente entre a diversidade de um fato, a uma sanção aplicada em relação ao grau de culpabilidade do indivíduo. Porém, no instituto da delação premiada, é perecível uma violação deste princípio, bem como poderá ser aplicado a uma pena diferenciada para aquele indivíduo que cometeu o mesmo crime de igual forma. A pena não poderia ser aplicada de igual forma com responsabilidade proporcional aos indivíduos.

Conforme o artigo 59 do Código Penal:

Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade (BRASIL, 1940).

Alberto Silva Franco (2007, p. 67) aduz que “o princípio da proporcionalidade exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato) e o bem de que pode alguém se privado (gravidade da pena)”.

alguns dos indivíduos do crime se beneficiam com a redução da pena ou até isenção, independentemente de sua culpa.

Em relação à delação premiada, essas garantias não são corretamente consideradas, pois

DIFERENÇA ENTRE A DELAÇÃO ABERTA E FECHADA

A delação premiada é classificada em dois gêneros, sendo aberta e fechada.

A delação fechada, segundo Guidi (2006), é aquela em que o delator não se expõe diretamente, se apresentando sempre de forma anônima, favorecendo-se de uma assistência desinteressada e sem qualquer tipo de ameaça.

A outra espécie de delação é a aberta, em que o indivíduo entrega seus comparsas de crime, se identificando, e dessa forma se beneficia de algum modo através do seu ato, tal como atribuir a ação criminosa a terceiro.

EFEITOS DA DELAÇÃO PREMIADA

Atualmente, existe um enorme desentendimento entre os doutrinadores em relação à delação premiada, como se verá.

NEGATIVOS

Cesare Beccaria (1764, p. 112) posiciona-se da seguinte forma em relação às desvantagens da delação premiada:

POSITIVOS

As desvantagens são: que as leis autorizam a traição, que é odiada mesmo entre os criminosos e introduz crimes de covardia, que são muito mais perniciosos do que os crimes de coragem. A coragem não é comum e só precisa de um poder benevolente para guia-lo ao bem público. Covardia ao contrário é um mal frequente, interesseiro e contagioso, que nunca poderá ser transformado em virtude. Ademais, o tribunal que recorre a esse método demonstra sua falibilidade e as leis, suas fraquezas, ao implorar a ajuda daqueles que a violaram.

Em relação aos efeitos positivos da delação, Beccaria (1764, p. 112) diz o seguinte: “As vantagens são: que ele previne grandes crimes, cujos efeitos, sendo conhecidos pelo público e ocultos os autores, amedronta o povo. Também contribui para provar que, aquele que viola as leis, que são pactos públicos, também viola os pactos privados”.

Diante disso, percebe-se que a delação premiada recebe muitas críticas, mas não restam dúvidas que suas vantagens são auxiliares no combate à organizações criminosas, além do indivíduo delatar seus comparsas, evita consumações de outros crimes, beneficiado a justiça em suas atividade de recolher provas.

CASOS DE DELAÇÃO PREMIADA NO BRASIL

OPERAÇÃO LAVA-JATO

O caso mais recente de delação premiada no Brasil trata-se do benefício concedido na

Operação Lava-Jato, deflagrada pela Polícia Federal em março de 2015, e foi usada em favor do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa.

Por meio de acordos de delação premiada, no qual confessaram seus crimes em troca de benefícios, o ex-diretor e o doleiro trouxeram à tona evidências que puderam ajudar no combate aos chamados crimes de colarinho-branco, revelando em depoimentos à Polícia Federal (PF), “que três governadores, seis senadores, um ministro e pelo menos 25 deputados federais embolsaram ou tiraram proveito de parte do dinheiro roubado dos cofres da estatal” (REVISTA VEJA, 2014, p. 60).

CASO ELOÁ

O Brasil inteiro acompanhou o drama da jovem Eloá Cristina Pereira Pimentel, que ficou cinco dias na mira do revólver do seu ex-namorado, Lindemberg Fernandes Alves. No final do drama, ocorrido em outubro de 2008, Lindemberg matou a moça.

O caso ainda teria mais surpresas: o pai de Eloá, Everaldo Santos, ex-cabo da Polícia Militar de Alagoas, ao ter sua imagem transmitida pelas emissoras de TV, foi reconhecido como integrante de um grupo de extermínio, formado por policiais civis e militares que praticavam assassinatos no Estado de Alagoas. Como eles matavam vestindo as fardas, ganharam o apelido de “Guangue Fardada”.

Everaldo, que já tinha prisão decretada em Alagoas, fugiu para São Paulo onde estava morando sem ter sido punido pelos crimes que praticou enquanto fez parte do esquadrão da morte. O juiz Marcelo Tadeu, da 16a Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça de Alagoas, ao saber que Everaldo havia dito que não iria se entregar porque tinha medo de morrer, concordou: “se ele voltar ele morre”. O conselho do juiz foi de que Everaldo “abrisse bem o bico” e ressaltou que a melhor opção para o ex-cabo da PM era pedir a delação premiada, cooperar com as investigações

contando tudo o que sabia, porque teria a garantia de ficar preso bem longe de Alagoas (onde o perigo era muito maior) e ainda ganhar redução na pena (SOUZA, 2015).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da pesquisa exposta nesse trabalho, percebe-se que o Estado tem suas preocupações em relação à delação premiada, pois, por exemplo, a criminalidade é o episódio que mais cresce na sociedade, onde o Estado não consegue conter os delinquentes, e está fadado a um sistema penal que na realidade não consegue dar conta de julgar e punir os desertores da sociedade.

A delação ocorro no momento em que algum envolvido compromete-se a colaborar com a justiça, confessando a sua participação e entregando outro(s) agente(s) envolvido(s) no crime. As vantagens que se impõem ao delator diante de sua confissão são vantajosas, como a redução da pena em até dois terços, a possibilidade de responder o processo ou cumprir sua pena em regime mais brando, e até mesmo o perdão judicial da sua pena. O objetivo do Estado na delação premiada é beneficiar o acusado diante de sua informação fornecida.

No decorrer da presente pesquisa, verificou-se que há muita discussão entre os doutrinadores acerca dos efeitos da delação premiada, pois para alguns, a delação é uma traição do delator contra seus comparsas, demonstrando covardia do acusado e fraqueza do Estado em investigar, e para outros a delação tem seus efeitos positivos ao auxiliar no desmantelamento de organizações criminosas com informações privilegiadas.

Não se pode negar que o Estado tenha utilizado a delação premiada como forma de resolver os problemas ocorridos na sociedade, sendo uma espécie de trunfo, e que sem o uso dela não seria possível atingir seus objetivos por meio das leis.

 

Notas e Referências

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