CONTAGEM DE PRAZOS EM DIAS ÚTEIS NOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. BREVÍSSIMOS COMENTÁRIOS À LEI 13.728/2018 E AO ART. 12-A DA LEI 9.099/95

13/11/2018

Coluna O Novo Processo Civil Brasileiro / Coordenador Gilberto Bruschi

 

                        Recentemente foi editada a Lei 13.728, de 31.10.2018, que, em linhas gerais, estabelece a contagem de prazos processuais em dias úteis também nos Juizados Especiais Federais.

                        A nova lei é muito breve e essencialmente se limita a introduzir o art. 12-A na Lei 9.099/95. Eis a redação do novel dispositivo:

“Art. 12-A. Na contagem de prazo em dias, estabelecido pela lei ou pelo juiz, para a prática de qualquer ato processual, inclusive para a interposição de recursos, computar-se-ão somente os dias úteis.”

                        Apesar de sua singeleza, o referido dispositivo legal não está isento de observações técnicas, todas com inegável impacto na prática do foro. E este escrito tem como objetivo expor, de forma resumida, algumas questões que podem surgir.

                        Preliminarmente, do ponto de vista pragmático, é indisfarçável que a contagem de prazos processuais em dias úteis nos juizados especiais visa especialmente à melhoria da segurança jurídica e ao melhor planejamento da prática dos atos processuais por parte da classe da advocacia.

                        Prossigamos, agora, com uma observação que já deve ter sido percebida pelo nosso leitor: o art. 12-A da Lei 9.099/95 tem evidente inspiração no art. 219 do CPC, que também prevê o cômputo dos prazos processuais em dias úteis nos procedimentos cíveis em geral.

 

                        Eis uma comparação entre os dois dispositivos legais mencionados:

 

Art. 12-A da Lei 9.099/95

Art. 219 do CPC

Art. 12-A. Na contagem de prazo em dias, estabelecido pela lei ou pelo juiz, para a prática de qualquer ato processual, inclusive para a interposição de recursos, computar-se-ão somente os dias úteis.

Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis.

Sem correspondência

Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais.

 

                        Quanto à amplitude do art. 12-A da Lei 9.099/95, e considerando a necessária interpretação dos juizados como um sistema (ou microssistema, como preferemr alguns), fica evidente que a nova regra também se aplica aos Juizados Especiais Federais (JEF – art. 1º da Lei 10.259/2001)[1] e aos Juizados Especiais da Fazenda Pública (JEFP – art. 27 da Lei 12.153/2009).

                        Não há como recusar, igualmente, que o próprio Código de Processo Civil deve ser aplicado supletivamente a todo microssistema dos juizados especiais (JEC, JEF e JEFP). Em sendo assim, devemos observar, criticamente, que desde a entrada em vigor do CPC/2015 os prazos, nos juizados, deveriam ser computados em dias úteis[2]. Mas, inexplicavelmente, vinha prevalecendo o Enunciado 165 do FONAJE (“Nos Juizados Especiais Cíveis, todos os prazos serão contados de forma contínua”).

                        Pode-se concluir, então, que a Lei 13.728/2018 acabou por uniformizar, para todas as modalidades de processos de natureza civil, a utilização da contagem de prazo em dias úteis, encerrando o contraproducente debate que existia no âmbito doutrinário e jurisprudencial[3]. Não fazia realmente nenhum sentido excluir-se dessa possibilidade de contagem de prazo em dias úteis os processos que tramitem em qualquer um dos juizados, ainda que eles se amparem no princípio da celeridade.

                        A Lei 13.728/2018 deixa claro que a contagem de prazos em dias úteis vale para a prática de quaisquer atos processuais, tanto na fase instrutória como no que se refere à interposição de recursos.

                        Com relação à interposição de recursos, aliás, parece-nos irrecusável a incidência, no âmbito do sistema dos juizados, daquilo que prevê o § 6º do art. 1.003 do CPC, isto é, “o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso.”

Conforme consta em obra de autoria dos coautores deste artigo, Manual de Recursos Cíveis – Teoria e Prática, “considera-se feriado local aquele válido apenas para a localidade onde tramita o processo, mas não para onde está sediado o órgão ad quem que julgará o recurso interposto”[4].

                        Pois bem, feitas estas observações, surge-nos uma interessante indagação: o art. 12-A da Lei 9.099/95 se aplica a qualquer prazo ou apenas a prazos processuais? Perceba, caro leitor, que o art. 12-A da Lei 9.099/95 não reproduz a regra do parágrafo único art. 219 do CPC (vide quadro comparativo supra). Detendo-se na redação do art. 12-A da Lei 9.099/95, percebe-se que o dispositivo ressalva que a contagem em dias úteis se aplica “para a prática de qualquer ato processual” (grifamos). Deste modo, à primeira vista, parece que a regra se restringe mesmo aos prazos processuais.

                        A resposta que acabamos de dar – limitação da regra aos prazos processuais – não é suficiente, contudo, para superar as divergências conceituais: afinal de contas, como distinguir um prazo material de outro processual? Esta resposta não é nada simples, como teve a oportunidade de demonstrar, em brilhante artigo científico, André Gustavo Salvador Kauffman[5], cuja leitura recomendamos vivamente.

                        Finalmente, o art. 2º da Lei 13.728/2018 dispõe que sua entrada em vigor se dá na data de sua publicação (que se deu em 1º de novembro de 2018). Assim, o art. 12-A da Lei 9.099/95 valerá tanto para os novos processos ajuizados a partir de sua vigência como também para os processos que já estejam em trâmite nos juizados na data de sua entrada em vigor.

                        Atente-se, apenas, que no Brasil adotamos o sistema do isolamento dos atos processuais para sanar questões de direito intertemporal. Deste modo, deve-se aplicar a lei vigente na data da publicação do ato judicial que fez desencadear o respectivo prazo processual. Portanto, não se aplica a regra aos prazos processuais que já estavam em andamento na data da entrada em vigor da regra.

 

 

Notas e Referências

[1] Sobre os Juizados Especiais Federais, um dos autores deste artigo destacou muitos aspectos técnicos e procedimentais sobre seu funcionamento. Consultar SERAU JR., Marco Aurelio, Curso de Processo Judicial Previdenciário, 4ª ed., São Paulo: Método, 2014.

[2] Conclusão corroborada pelo Enunciado 268 do FPPC.

[3] O tema foi levado ao STF pelo CFOAB. Consultar, naquela Corte, a ADPF 483.

[4] Sobre o alcance desta regra que trata da necessidade de comprovação do feriado local os autores deste artigo teceram diversos comentários no Manual que publicam em coautoria, ao qual remetem o leitor: DONOSO, Denis; SERAU JR., Marco Aurélio. Manual dos recursos cíveis – teoria e prática. 3ª ed., Salvador: Juspodivm, 2018, p. 96-100.

[5] KAUFFMAN, André Gustavo Salvador. Razões para ainda contar prazos como no CPC/73. Disponível em http://www.justificando.com/2016/04/20/razoes-para-ainda-contar-prazos-como-no-cpc73/, acesso 08.11.2018.

 

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