COMPETÊNCIA TERRITORIAL E A RECENTE DECISÃO DO TST

30/10/2018

Coluna Atualidades Trabalhistas / Coordenador Ricardo Calcini

            O jornal Valor Econômico há exatos sete dias publicou a seguinte manchete: “TST permite a trabalhador ajuizar processo na cidade onde mora”, referindo-se à decisão da SDI- 1 daquele Tribunal (E-RR 11727-90.2015.5.03.0043).

            Tal manchete, elaborada e transmitida, no nosso sentir, sem o contexto processual, acabou gerando uma enorme insegurança no tecido social, pois induz (com ou sem intenção) a sociedade ao (re)estabelecimento de uma crença já superada de que a decisão teria contornos de proteção processual ao empregado, ou ainda que referida decisão seria contrária à lei. Respeitando opiniões diversas, como sempre deve ser, entendemos que não é bem assim.

            A questão é de natureza processual e se ocupa da aplicação do princípio da proporcionalidade numa interpretação conforme o texto constitucional, mas iniciemos pela questão pontual processual da competência territorial, que como todos sabemos, possui contornos de relatividade, como já tivemos oportunidade de enfrentar na CLT comentada.

            A noção de jurisdição se (entre) vê inscrita (até) na clássica explanação do lexicógrafo jurídico De Plácido e Silva:

JURISDIÇÃO. Derivado do latim jurisdictio (ação de administrar a justiça, judicatura), formado, como se vê, das expressões jus dicere, juris dictio, é usado precisamente para designar as atribuições especiais conferidas aos magistrados, encarregados de administrar a justiça. Assim, em sentido eminentemente jurídico ou propriamente forense, exprime a extensão e limite do poder de julgar de um juiz.

(...)

Considerado imperium, como o poder que decorre da autoridade suprema ou do poder soberano, todo juiz, investido do imperium, tem poder jurisdicional, salvo quando está afastado de sua função ou não a exerce, porque se tenha tornado em disponibilidade ou esteja aposentado, mas, também, neste caso, não representa a autoridade soberana, nem está investido em qualquer soma de poder público. (Vocabulário Jurídico. SLAIBI FILHO, Nagib. CARVALHO, Gláucia (Atualizadores), 22° Edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003, p. 802, destaques no original)

            Antes mesmo de se emprestar contornos seguros sobre a própria delimitação dos institutos da jurisdição e competência, registra-se a interessante passagem de Coqueijo Costa, identificador no marco da Revolução Francesa e do fim da sociedade estamental até então existente e por tal movimento sócio-político implodido[1], de uma delimitação temporal suficientemente válida para a compreensão de que, ao correr dos anos subsequentes, foi-se perseguida e paulatinamente assegurada uma garantia de jurisdição aos cidadãos como um todo:

À Revolução Francesa de 1789 devem-se duas idéias fundamentais em sede de jurisdição: foram extintos os antigos privilégios de jurisdição dos nobres e eclesiásticos e unificadas as diversas jurisdições de classe, e suprimiu-se a magistratura venal do “ancien régime”, que era paga pelas partes, implantando-se a magistratura remunerada pelo Estado. Isso, todavia, não resolveu também o problema social da justiça dos pobres, dado o alto custo dos processos. O que se destruiu foram as estruturas e os privilégios feudais, mas a igualdade do pobre continuou meramente formal. Outra coisa não seria de esperar-se do liberalismo e individualismo burgueses. O advento dos direitos sociais do homem é que viria a modificar o quadro, mas é um fenômeno recente. A primeira Constituição que elencou direitos sociais de liberdade foi a mexicana, de 1917. E a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, reza que “toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, com a determinação de seus direitos e obrigações, ou para o exame de qualquer acusação contra ela em matéria penal” (artigo 10). (Direito processual do trabalho. 2° Edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, 1984, p. 24)[2]

              A respeito desta categoria fundamental do processo, a jurisdição, e daquele outro conceito dela correlato, enquanto forma de sua distribuição, a competência, consigna-se o clássico e profícuo entendimento exposto por Enrico Tullio Liebman:

O exercício da função jurisdicional acha-se distribuído entre os numerosos órgãos da autoridade judiciária ordinária, aos quais ela é atribuída segundo as regras e com as limitações que foram expostas (...); tal distribuição é feita de modo a que cada um fique com uma fração, uma parte da função jurisdicional, a qual constitui a sua competência e em cujo âmbito, e não além dele, pode exercer suas funções. Diz-se, por isso, que a competência é a quantidade de jurisdição cujo exercício é atribuído a cada órgão, ou seja, a medida da jurisdição. Em outras palavras, ela determina em quais casos e em relação a quais controvérsias tem cada órgão, individualmente considerado, o poder de emitir provimentos, ao mesmo tempo em que delimita, em abstrato, o grupo de controvérsias que lhe são atribuídas. Para cada possível causa há, por isso, ao menos um juiz competente, segundo as normas legais vigentes: é o juiz natural (...) (Manual de Direito Processual Civil. Volume I. Tradução e notas de Cândido Rangel Dinamarco, 3° Edição, São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 81-82, destaques no original)[3]

            Dessa maneira, pode-se dizer que toda a estrutura judiciária brasileira – tal qual também em ambientes político-jurídicos para além de nossa fronteira – é investida de jurisdição, podendo dirimir conflitos a partir da aplicação da lei aos casos a ela concretamente apresentados, sendo, por outro lado, por uma questão procedimental/organizacional, divido, sob os mais diversos critérios, seus próprios limites. De outra forma: a jurisdição para o caso concreto, tendo em vista a incapacidade funcional de plasmá-la indistintamente para todos os órgãos administrativamente componentes da organização judiciária, e também sobre qualquer matéria, sob pena precisamente de não se pronunciar institucionalmente o direito, é delineada por regras de competência, enquanto seu próprio parâmetro de mensuração.

            Pode-se assim, em comunhão ao traçado, elencar ao menos quatro clássicas características da jurisdição[4]: i) como por regra ser exercida pelo Poder Judiciário[5], seja através de seus juízos singulares ou em órgãos colegiados, pronuncia-se daí a noção de uma unidade que lhe percorre; ii) como o direito é, na esmagadora maioria de suas formas experienciais, realizado (religiosa e) espontaneamente, indiferente à atuação jurisdicional do Estado, tem-se que esta é secundária, já que alçada à atividade somente quando o conflito de interesses necessita, pela própria impossibilidade de resolução pelas partes, de uma sua dedução em juízo para a composição do litígio; iii) ao passo deste chamamento tardio, doador de razão à inércia da jurisdição, esta, em princípio, já goza de um juízo de imparcialidade, posto que já estruturada sua forma antes mesmo do conflito e não propriamente para um pontual, socorrendo ainda, graças à previsão de falibilidade e do acaso mesmo, instrumentos corretivos para quando de sua violação, como o instituto da suspeição (artigos 801/802[6]; artigo 145 do CPC[7]) e do impedimento (artigo 144 do CPC[8]); e iv) o caráter de substitutividade da jurisdição, posto que esta se manifesta em supressão à atuação das partes, em monopólio do exercício da sanção(-força-violência) pelo Estado.

No que diz respeito aos critérios destas regras de competência para delimitação da jurisdição, a Constituição Federal estabelece que esta é, no que tange às suas matérias próprias, num largo corte, ou comum ou especial. À jurisdição comum reserva-se a divisão de matérias próprias seja à Justiça Federal (CF/1988, artigos 106/110), seja, quanto aos residuais temas jurídicos, à Justiça Estadual (CF/1988, artigos 125/126). Quanto à especial forma de jurisdição, tem-se que esta é composta pela Justiça Eleitoral (CF/1988, artigos 118/121), pela Justiça Militar (CF/1988, artigos 122/124) e pela Justiça do Trabalho (CF/1988, artigos 111/117).

Quanto a esta última, com a modificação empreendida pela Emenda Constitucional n. 45, de 30 de dezembro de 2004, responsável por modificar a redação do artigo 114 da Constituição e de, propriamente, toda a determinação de competência material do juízo trabalhista, posto agora abarcar a noção de relações de trabalho como um todo, e não somente às de emprego como originariamente vinculada a jurisdição trabalhista, tem assim definida sua matéria afeta:

Art. 114 – Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II – as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V – os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI – as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII – as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII – a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes da sentença que proferir;

IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

(...)

            Ademais, se quanto à matéria hodiernamente submetida à jurisdição trabalhista pode-se empreender um corte de sua definição nas relações de trabalho enquanto gênero, necessária então a delimitação de sua possibilidade territorial; é dizer, expor as regras existentes para a determinação da competência territorial (ratione loci), enquanto linhas geográficas mesmo de circunscrição para a atuação do órgão jurisdicional.

            Esta é assim traçada pelo artigo 651 do Diploma Consolidado:

Art. 651 – A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.

§1° – Quando for parte no dissídio agente ou viajante comercial, a competência será da Junta da localidade em que a empresa tenha agência ou filial e a esta o empregado esteja subordinado e, na falta, será competente a Junta da localização em que o empregado tenha domicílio ou a localidade mais próxima.

§2° – A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento, estabelecida neste artigo, estende-se aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário.

§3° – Em se tratando de empregador que promova realização de atividades fora do lugar do contrato de trabalho, é assegurado ao empregado apresentar reclamação no foro da celebração do contrato ou no da prestação dos respectivos serviços.

            Entrevê-se, assim, que esta competência territorial da Justiça do Trabalho se delimita, basicamente, em quatro frentes de compreensão: quando do local da prestação de serviço, enquanto regra máxima; quando trabalhador agente ou viajante comercial; quando obreiro tupiniquim que labore no exterior; e quando empresa que promove atividade fora do lugar da celebração do contrato.

            Cumpre consignar que, antes mesmo da própria exposição destes critérios determinantes para a definição da localidade onde ser ajuizada a ação trabalhista, por ser a competência em razão do lugar de natureza relativa, o reconhecimento desta, em declinação de sua impossibilidade, não pode ser de ofício pelo magistrado. A Súmula n. 33 do Tribunal da Cidadania, não obstante seu eco à seara trabalhista inscrita na Orientação Jurisprudencial n. 149 da SDI-II do TST, assim delimitam esta noção:

Súmula n. 33 do STJ

A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.[9]

OJ n. 149 da SDI-II do TST

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. HIPÓTESE DO ART. 651, § 3º, DA CLT. IMPOSSIBILIDADE DE DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DE INCOMPETÊNCIA RELATIVA. (DEJT divulgado em 03, 04 e 05.12.2008).

Não cabe declaração de ofício de incompetência territorial no caso do uso, pelo trabalhador, da faculdade prevista no art. 651, § 3º, da CLT. Nessa hipótese, resolve-se o conflito pelo reconhecimento da competência do juízo do local onde a ação foi proposta.

            Desta maneira, para o reconhecimento da incompetência territorial, a parte interessada – o réu, pois – possui o ônus de arguir a respectiva exceção (artigos 799/800[10]), sob pena mesmo de preclusão e, por consequência, prorrogação da competência. No entanto, o robusto entendimento jurisprudencialmente erigido na seara trabalhista delimita sentido de que esta arguição de incompetência relativa pode se dar por meio de preliminar na contestação, caracterizando-se tão somente esta forma de postulação uma irregularidade formal, restando ao magistrado o seu recebimento enquanto exceção de incompetência mesmo. Ademais, interessante notar que esta mesma sólida compreensão construída no seio da Justiça Obreira foi, ao fim, também elevada a regular norma jurídica processual, de genérica aplicação, com a edição no novo Código de Processo Civil de 2015, posto este diploma expressamente prever, para além da isolada competência relativa, que seja ela “absoluta ou relativa, será alegada como questão de preliminar de contestação” (CPC, artigo 64, caput[11]), sendo prorrogada tais lindes jurisdicionais, caso relativa, se não alegada então pelo réu nestes seus momento – contestação –  e forma – preliminar ao mérito –  oportunos (CPC, artigo 65, caput)[11].

            Quanto propriamente à primeira forma de delimitação da competência das Varas Trabalhistas, expressa no caput do artigo 651 celetista, tem-se que sua determinação se dá pela localidade onde o empregado, seja ele o propositor da ação (autor; reclamante) ou sujeito passivo dela (réu), prestar serviços ao seu empregador, indiferentemente onde tenha sido celebrado seu contrato, se diverso deste onde labora ou, ainda, no estrangeiro[13]. Cabe notar também que se eventualmente o trabalhador tenha prestado serviços ao seu empregador em muitas localidades, também indiferente se acaso tenha sido contratado em localidade ainda distinta destas onde tenha laborado, e mesmo que noutro país para prestar serviços no Brasil, competente será aquele último local em que o operário trabalhou.

            Bem se identifica, então, que a proposição normativa que se vê entranhada em tal dispositivo legal se manifesta na ideia de, ao máximo, facilitar ao empregado o seu acesso à jurisdição, bem como de sua possibilidade de efetivo manuseamento dos instrumentais processuais a ele conferidos, como, em maior exemplo, o desimpedimento à produção de prova, pela proximidade mesmo das circunstâncias próprias ao ambiente de trabalho, bem como de seus colegas – estes quase sempre o maior referencial probatório, posto ser a prova testemunhal aquela mais usualmente comum e fácil de produção na rotina judiciária.

            Contudo, há que se pontuar o entendimento imediatamente seguinte, em direção ao delimitar que, ainda que a regra máxima se materialize nesta ideia de a competência territorial se determinar pelo local da prestação de serviço, algumas exceções são a ela adstritas, enquanto pressuposto mesmo de sua qualificação como tal.

            Em primeira hipótese, aquela que diz respeito ao trabalhador agente ou viajante comercial, sendo a norma estampada no §1° do artigo 651 responsável por contemplar a peculiaridade que é própria a tal figura, qual seja, a de estar vinculado a uma empresa de sede fixa, mas se deslocando continuamente para a promoção mesmo de sua função nela desempenhada. Determina o citado dispositivo celetista, com a alteração advinda com Lei n. 9.851, de 27 de outubro de 1999, que duas são hipóteses determinantes para a delimitação da competência de eventual dissídio que envolva este agente ou viajante comercial: em primeira atenção, a de o ajuizamento da ação se dar perante o juízo da agência ou filial a qual o trabalhador estiver subordinado; e, em segunda atenção, quando inexistente um nível de subordinação a uma dada filial ou sucursal que lhe valha, deverá o obreiro ajuizar a ação no local de seu domicílio ou da Vara do Trabalho mais próxima deste.

            Em segunda hipótese, no que concerne ao critério de competência territorial quando trabalhador brasileiro que labore no exterior, necessária a declinação de algumas notas a respeito de matérias que, ainda que não propriamente trabalhistas, lhe dão sentido, bem como para a maior compreensão da mudança jurisprudencial que percorre o histórico recente de tal dispositivo disciplinador. Diz-se isto porque, em vista da norma estampada no § 2° do artigo 651, nesta se inscreve matéria muito mais afeta à resolução de conflito de leis no espaço, entre normas propositivas de distintos Estados soberanos, campo próprio ao direito internacional privado, do que especificamente direito do trabalho.

            Sob arrimo das determinações legais contidas nos artigos 9°[14] e 12[15] da então Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro – Decreto-Lei n. 4.657, de 04.09.1942; hoje denominada Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, conforme artigo 2°, da Lei n. 12.376, de 30.12.2010 –, em que, em síntese possível de se avocar, sustentavam a diretriz normativa de que devida era a aplicação da lei do país em que a obrigação fosse cumprida, in casu, a relação de trabalho propriamente considerada em ambiente normativo outro que não o brasileiro, em referendo da máxima principiológica de que lex loci execusionis[16], editada foi a Súmula n. 207 do Tribunal Superior do Trabalho[17]:

Súmula n. 207 do TST

Conflitos de leis trabalhistas no espaço. Princípio da “lex loci executionis” (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação.

            Contudo, crescentemente se fez maior a compreensão de que a alguma relativização desta ideia deveria se dar, em sentido de que o processo de globalização e transnacionalização dos empreendimentos econômicos que lhe é inerente, em vistas da inserção do Brasil no mercado global de capitais, compreenderia também uma igualdade de tratamento de casos de regulação trabalhista, seja em ambiente nacional ou no exterior – neste ambiente de considerações cancelada o verbete citado, conforme a Resolução n. 181/2012, divulgado pelo Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho, nos dias 19, 20 e 23.04.2012.

Soma-se a esta última linha de raciocínio de hoje haver uma maior inserção do Brasil e seu mercado produtivo na linha de transferência global de capitais também o fato de que, com a modificação da Lei n. 7.064, de 06.12.1982 – alteração esta veiculada pela Lei n. 11.962, de 02.07.2009 –, não mais se adstringiu a aplicação de seus dispositivos às hipóteses de empresas prestadoras de serviços de engenharia, mas sim à genérica regulação jurídica dos trabalhadores contratados no Brasil, ou transferidos por seus empregadores, para prestar serviços no exterior, prevendo que aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, quando mais favorável do que aquela territorialmente vinculada pela prestação de serviço propriamente, no conjunto de normas e em relação a cada matéria/instituto (Lei n. 7.064, de 06.12.1982, artigo 3°, inciso II). Esta compreensão jurisprudencial hoje imperante tem suas considerações assim mais bem estruturada e exposta no seguinte julgado, até mesmo em sua redação ementária:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL E QUE DESENVOLVEU PARTE DO CONTRATO DE TRABALHO EM ÁGUAS TERRITORIAIS BRASILEIRAS. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. INAPLICABILIDADE DA ANTIGA SÚMULA 207/TST (HOJE, INCLUSIVE, JÁ CANCELADA). A jurisprudência trabalhista, sensível ao processo de globalização da economia e de avanço das empresas brasileiras para novos mercados no exterior, passou a perceber a insuficiência e inadequação do critério normativo inserido na antiga Súmula 207 do TST (lex loci executionis) para regulação dos fatos congêneres multiplicados nas duas últimas décadas. Nesse contexto, já vinha ajustando sua dinâmica interpretativa, de modo a atenuar o rigor da velha Súmula 207/TST, restringido sua incidência, ao mesmo tempo em que passou a alargar as hipóteses de aplicação das regras da Lei n. 7.064/1982. Assim, vinha considerando que o critério da lex loci executionis (Súmula 207) - até o advento da Lei n. 11.962/2009 - somente prevalecia nos casos em que foi o trabalhador contratado no Brasil para laborar especificamente no exterior, fora do segmento empresarial referido no texto primitivo da Lei n. 7064/82. Ou seja, contratado para laborar imediatamente no exterior, sem ter trabalhado no Brasil. Tratando-se, porém, de trabalhador contratado no País, que aqui tenha laborado para seu empregador, sofrendo subsequente remoção para país estrangeiro, já não estaria mais submetido ao critério normativo da Convenção de Havana (Súmula 207), por já ter incorporado em seu patrimônio jurídico a proteção normativa da ordem jurídica trabalhista brasileira. Em consequência, seu contrato no exterior seria regido pelo critério da norma jurídica mais favorável brasileira ou do país estrangeiro, respeitado o conjunto de normas em relação a cada matéria. Mais firme ainda ficou essa interpretação após o recente cancelamento da velha Súmula 207/TST. No caso concreto, ficou evidenciado que o Reclamante foi contratado no Brasil e que parte do tempo de duração do contrato de trabalho desenvolveu-se em águas territoriais brasileiras. Não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui a decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido. (TST – AIRR: 1108006420085020445 110800-64.2008.5.02.0445, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 13/08/2013, 3° Turma, Data de Publicação: DEJT 16/08/2013)[18]

Outrossim, igualmente enquanto exceção à regra da determinação de competência territorial a partir do local da prestação do serviço, tem-se também aquela referente à hipótese em que a empresa promove a atividade fora do lugar da celebração do contrato. Inicialmente, sobre este dispositivo normativo inscrito no terceiro parágrafo do artigo 651, pairava interpretação restritiva de seus traços, em perspectiva da ideia de que quando patrão promovedor de atividades em lugar distinto daquele da celebração do contrato, a faculdade assegurada ao empregado de postulação da ação se restringiria às localidades do foro daquela inicial entabulação contratual ou naquele da prestação dos respectivos serviços.

            Contudo, o posicionamento jurisprudencial que paulatinamente ganha cada vez maior robustecimento de seus traços, em contrariedade possível a este entendimento inicial que margeava uma literalidade da norma do artigo 651, §3°, é o de hoje ser majoritária no Tribunal Superior do Trabalho a compreensão que permite que o reclamante possa optar pelo ajuizamento da demanda no local de seu domicílio, mesmo que em local diverso da prestação laborativa, caso não coincidente aquele local da contratação com o da prestação de serviço, em alargamento de linhas compreensivas até então imperantes.

            Propício assinalar que tal entendimento ganha corpo efetivamente às empresas que arregimentam trabalhadores, empresas nacionais, empregados e empregadores domésticos, na atividade rural.

            Aqui nos deparamos com o conflito constitucional claro de dois direitos fundamentais, representados pelo acesso à justiça X direito de defesa, devendo ser avaliado caso a caso em concreto a posteriori e não prima facie.

            Nesse sentido, convém destacar o interessante Enunciado 19 do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região em seminário de formação continuada (novembro de 2015), que permite nessa hipótese, utilização de peticionamento eletrônico anterior à apresentação da peça de resistência de mérito, sob o argumento de aplicação do artigo 340 do CPC, por entender haver espaço aberto dentro das previsões da CLT, com suporte nos artigos 799 e 800, vejamos:

“Enunciado 19. PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO.  Exceção de incompetência. Réu domiciliado fora da jurisdição. Possibilidade de arguição pela parte e de análise pelo juiz do trabalho antes da audiência inicial.

1. Em razão de omissão parcial da CLT (artigos 799 e 800), aplica-se analogicamente ao processo do trabalho o procedimento previsto no artigo 340, caput, do CPC, com adaptações, de modo a possibilitar que a exceção de incompetência arguida pela ré domiciliada fora do juízo em que tramite a ação seja apresentada e processada antes da realização da audiência inicial ou una, diretamente no processo eletrônico onde a ação foi ajuizada.

2. Nesse caso, a exceção deverá ser apresentada com a devida justificativa e requerimento específico de apreciação antecipada.

3. Após a oitiva da parte contrária (no prazo de 24 horas) e não havendo necessidade de dilação probatória, a questão poderá ser decidida pelo magistrado antes da audiência”.

   

             E este entendimento de acesso à jurisdição no caso de arregimentação, hoje mais sólido, já se mostrava declinado no seguinte verbete elaborado na I Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho:

Enunciado n. 7

Acesso à justiça. CLT, art. 651, § 3°. Interpretação conforme a Constituição. Art. 5.°, XXXV, da Constituição da República.

Em se tratando de empregador que arregimente empregado domiciliado em outro município ou outro Estado da federação, poderá o trabalhador optar por ingressar com a reclamatória na Vara do Trabalho de seu domicílio, na do local da contratação ou na do local da prestação de serviços.[19]

            Ainda que não reste inscrita a fundamentação propriamente nos termos deste Enunciado, o seguinte julgado, em sua redação ementária, bem explicita a ratio que subjaz ao colacionado verbete:

EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. ARTIGO 651 DA CLT. A competência relativa, ao contrário da absoluta, é instituída também no interesse das partes, não podendo ser desconsiderada a influência delas na fixação da competência territorial em determinado processo. A norma legal (art. 651/CLT) defere ao empregado que prestar serviços em mais de uma localidade a possibilidade de ajuizar dissídio individual no foro do local da prestação de serviços, podendo, pois, optar pelo que melhor lhe aprouver, não somente por facilita-lhe o acesso ao judiciário (inc. XXXV do art. 5º da CF/88), mas também por ser esta a interpretação mais favorável ao obreiro. Recurso conhecido e provido. (TRT-10 – RO: 1856201201310006 DF 01856-2012-013-10-00-6 RO, Relator: Desembargador Mário Macedo Fernandes Caron, Data de Julgamento: 10/04/2013, 2° Turma, Data de Publicação: 26/04/2013 no DEJT)

            No caso objeto de análise, a empresa demandada já não possuía atividades no Pará, estando localizada na cidade do Rio de Janeiro. De outro lado, a Autora da ação reside em Uberlândia e lá propôs a ação, não havendo, no nosso sentir qualquer sentido na exigência de que a ação fosse proposta no Pará, o que dificultaria além do deslocamento da demandante, geraria custos e dificuldade inclusive para a própria defesa da empresa, que não possui mais um só funcionário naquela comarca.

            Relembre-se que o processo não é um fim em si mesmo, se tratando de mero iter para o alcance do direito material. No caso, entendeu o TST noutras palavras que haveria um direito fundamental (direito de ação) restringido em excesso (übermassverbot) para atender apenas a formalidade de um direito processual.

            Noutras palavras, não se pode considerar hodiernamente que o processo deveria tramitar no Estado do Pará por simples análise pontual do texto da lei sem o devido contexto constitucional, inclusive da questão inerente a isonomia e efetividade do processo. Esse pensamento é deveras antigo.

            Enfrentamos o tema da proporcionalidade noutra oportunidade[20], externando a ideia dos três subprincípios ou princípios parciais (teilgrundsätze), com fundamento na teoria de Robert Alexy, que assim se apresentam:

“Princípio da proporcionalidade em sentido estrito prevê que se estabeleça uma correspondência entre o fim a ser alcançado por uma disposição normativa e o meio empregado, que seja juridicamente o melhor possível...”

“Os subprincípios da adequação e exigibilidade ou indispensabilidade determinam que o meio escolhido se preste a atingir o fim estabelecido, mostrando-se assim “adequado”, meio este que também deve se mostrar exigível, o que significa que não há outro igualmente eficaz e menos danoso aos direitos fundamentais”

            No caso objeto de análise se evidencia que a decisão do Tribunal Superior do Trabalho não obstante tenha privilegiado o acesso à Justiça, permitiu maior facilidade quanto a própria apresentação da defesa da empresa, permitindo inclusive a maior celeridade processual com custo menor.

            O que nos parece de extrema importância é registrar que não é uma atitude pró-empregado ou pró-empresa, e sim, uma interpretação constitucional do caso concreto, que viabiliza em tempo e modo o exercício do direito de acesso à justiça.

                       

     

Nota e Referências

[1] Contudo, pontua-se clara a ressalva de uma não plena subscrição – leia-se: admite-se com ressalvas – ao marco temporal da Revolução Francesa, como indicado pelo autor, enquanto divisor para a universalização do acesso à justiça pelo fim da estamental estrutura social até então imperante, a partir mesmo do encerramento de concessões de privilégios aos nobres e à Igreja, tendo em vista não o mero não comungar deste marco temporal em si, mas precisamente por desconfiar do didatismo da adoção de emblemáticos acontecimentos como possíveis portos de referência histórica, em contemplação do pernicioso preço da possibilidade de se erigir a compreensão histórica sob a base de fatos monumentalmente concebidos. A respeito desta ideia de uma História Monumental, lançada pelo filósofo alemão Friedrich Wilhelm Nietzsche, conferir a Nota de Rodapé n. 310, constante de Greve e Locaute, do tópico Direito Coletivo do Trabalho.

[2] Esclarece-se, não obstante, que a citação empreendida pelo juslaboralista baiano peca ao final, mas sem tampouco arranhar a inteireza de seu comentário, por uma imprecisão terminológica: o documento internacional de 1948 por ele referenciado se denomina, em realidade, Declaração Universal dos Direitos Humanos – proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de dezembro de 1948 (Resolução 217-A); documento este que em conjunto com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (dois protocolos opcionais: procedimento de queixa e pena de morte) e também com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (e seu Protocolo Opcional) formam a denominada Carta Internacional de Direitos Humanos. Consigna-se tal errata tendo em vista que a referência do autor à Declaração Universal dos Direitos do Homem fica mais próxima, de maneira tangente, quando em perspectiva o emblemático documento aprovado pela Assembleia Nacional Francesa em 26 de agosto de 1789, denominado Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, enquanto insígnia da mais significativa das revoluções burguesas europeias do século XVIII-XIX – em epígrafe, a Queda da Bastilha e, mais largamente, do próprio Ancien Régime francês.

[3] CF (05.10.1988): Art. 5° – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;

(...)

[4] LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 9° Edição, São Paulo: Editora LTr, 2011, p. 149-150.

[5] Ressalva esta feita em perspectiva do fato de que a jurisdição pode, em pontuais hipóteses, ser também exercitada por estruturas de poder que, ainda que imediata ou mediatamente também sejam vinculadas à figura estatal, não se confundem com o Poder Judiciário e suas clássicas manifestações da forma jurídica. São elas: a jurisdição político-jurídica exercida pelo Senado Federal para processar e julgar algumas autoridades por crimes de responsabilidade (CF/1988, artigos 52, incisos I e II, e 86, caput, segunda parte); casos de imunidade de jurisdição validamente reconhecida por instrumento que o legitime, em contemplação da noção de soberania, conferida aos Estados estrangeiros e seus representantes diplomáticos; e nos casos de compromisso arbitral (como, em exemplo próximo, aqueles relativos ao dissídio coletivo: CF/1988, artigo 114, §§ 1° e 2°).

[6] Art. 801 – O juiz, presidente ou juiz classista, é obrigado a dar-se por suspeito, e pode ser recusado, por algum dos seguintes motivos, em relação à pessoas dos litigantes:

a) inimizade pessoal;

b) amizade íntima;

c) parentesco por consanguinidade ou afinidade até o terceiro grau civil;

d) interesse particular na causa.

Parágrafo único. Se o recusante houver praticado algum ato pelo qual haja consentido na pessoa do juiz, não mais poderá alegar exceção de suspeição, salvo sobrevindo novo motivo. A suspeição não será também admitida, se do processo constar que o recusante deixou de alega-la anteriormente, quando já a conhecia, ou que, depois de conhecida, aceitou o juiz recusado ou, finalmente, se procurou de propósito o motivo de que ela se originou.

Art. 802 – Apresentada a exceção de suspeição, o juiz ou Tribunal designará audiência dentro de 48 (quarenta e oito) horas, para instrução e julgamento da exceção.

  • – Nas Juntas de Conciliação e Julgamento e nos Tribunais Regionais, julgada procedente a exceção de suspeição, será logo convocado para a mesma audiência ou sessão, ou para a seguinte, o suplente do membro suspeito, o qual continuará a funcionar no feito até decisão final. Proceder-se-á da mesma maneira quando algum dos membros se declarar suspeito.
  • – Se se tratar de suspeição de Juiz de Direito, será este substituído na forma da organização judiciária local.

[7] Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16.03.2015): Art. 145 – Há suspeição do juiz:

I – amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;

II – que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às despesas do litígio;

III – quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive;

IV – interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes.

  • – Poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de fora íntimo, sem necessidade de declarar suas razões.
  • – Será ilegítima a alegação de suspeição quando:

I – houver sido provocada por quem a alega;

II – a parte que a alega houver praticado ato que signifique manifesta aceitação do arguido.

[8] Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16.03.2015): Art. 144 – Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:

I – em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como membro do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha;

II – de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;

III – quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;

IV – quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;

V – quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte no processo;

VI – quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;

VII – em que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços;

VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;

IX – quando promover ação contra a parte ou seu advogado.

  • – Na hipótese do inciso III, o impedimento só se verifica quando o defensor público, o advogado ou membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início da atividade judicante do juiz.
  • – É vedada a criação de fato superveniente a fim de caracterizar impedimento do juiz.
  • – O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo.

[9] Data de julgamento da Corte Especial: 24.10.1991; Data de publicação no Diário de Justiça: 29.10.1991, p. 15.312.

[10] Art. 799 – Nas causas da jurisdição da Justiça do Trabalho, somente podem ser opostas, com suspensão do feito, as exceções de suspeição ou incompetência.

  • – As demais exceções serão alegadas como matéria de defesa.
  • – Das decisões sobre exceções de suspeição e incompetência, salvo, quanto a estas, se terminativas do feito, não caberá recurso, podendo, no entanto, as partes alegá-las novamente no recurso que couber da decisão final.

Art. 800 – Apresentada a exceção de incompetência, abrir-se-á vista dos autos ao exceto, por 24 (vinte e quatro) horas improrrogáveis, devendo a decisão ser proferida na primeira audiência ou sessão que se seguir.

[11] Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16.03.2015): Art. 337 – Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:

(...)

II – incompetência absoluta ou relativa;

(...)

[12] Chama-se, ainda, atenção ao fato de que este mesmo diploma processual estabelece, expressamente, a impossibilidade de declinação de ofício pelo magistrado de incompetência relativa. Em seus termos,  tem-se:

Código de Processo Civil (13.105, de 16.03.2015): Art. 337 – Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:

I – inexistência ou nulidade da citação;

II – incompetência absoluta e relativa;

III – incorreção do valor da causa;

IV – inépcia da petição inicial;

V – perempção;

VI – litispendência;

VII – coisa julgada;

VIII – conexão;

IX – incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização;

X – convenção de arbitragem;

XI – ausência de legitimidade ou de interesse processual;

XII – falta de caução ou de outra prestação que a lei exige como preliminar;

XIII – indevida concessão do benefício ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.

(...)

  • – Excetuadas a convenção de arbitragem e a incompetência relativa, o juiz conhecerá de ofício das matérias enumeradas neste artigo.

(...)

[13] Pode-se também perceber nesta regra de determinação de competência a partir do local da prestação de serviços uma reverberação, com maior ou menor elastecimento de seus contornos – a depender do prisma analítico, pois –, da disciplina geral de competência acerca do cumprimento de obrigações. Esta é assim hoje disciplinada pelo CPC/2015:

Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16.03.2015): Art. 53 – É competente o foro:

(...)

III – do lugar:

(...)

d) onde a obrigação deve ser satisfeita, para a ação em que se lhe exigir o cumprimento;

(...)

[14] LInDB (Decreto-Lei n. 4.657, de 04.09.1942): Art. 9° – Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem.

  • – Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.
  • – A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.

[15] LInDB (Decreto-Lei n. 4.657, de 04.09.1942): Art. 12 – É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.

  • – Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas à imóveis situados no Brasil.
  • – A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segunda a forma estabelecida pela lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências.

[16] A este entendimento acudia também premissa de direito internacional privado então mais unânime de aceitação, exposta na Convenção de Direito Internacional privado (Código de Bustamante), adotada na Sexta Conferência Internacional Americana, reunida em Havana, e assinada em 20.02.1928 – em Brasil, veiculado pelo Decreto n. 5.647, de 08.01.1929, e promulgada pelo Decreto n. 18.871, de 13.08.1929 –, de submissão ao direito nacional do Estado em que a obrigação é cumprida (lex loci execusionis). Em dois específicos dispositivos deste documento convencional se entrevê, claramente, esta máxima:

Código de Bustamente (20.02.1928): Art. 318 – Submissão voluntária dos litigantes à Justiça de qualquer país, desde que uma das partes seja nacional ou nele domiciliada, o mesmo acontecendo quanto à jurisdição voluntária.

(...)

Art. 332 – Dentro de cada Estado contratante, a competência preferente dos diversos juízes será regulada pelo seu direito nacional.

[17] Veiculada pela Resolução n. 13/1985, publicada no Diário de Justiça de 11, 12 e 15.07.1985.

[18] Na esteira do já exposto ao início do presente tópico, de que a própria sustentação da moderna figura do Estado, desde mesmo suas configurações originárias e ainda aquela hoje presente, se baliza a partir da canalização das formas jurídicas em torno de sua própria estrutura, enquanto seu centro irradiador, em monopólio do exercício da violência, tem-se a própria imbricação problemática dela decorrente, qual seja, a da multiplicidade de ordenamentos e seu inter-relacionar, em manifestação das múltiplas soberanias nacionais que lhes fundamentam. E precisamente acerca deste correlacionar entre tais ordenamentos normativos, seja em conflitos de leis de distintos Estados num dado espaço nacional, seja quanto, enquanto hipóteses também possíveis, à pontual extraterritorialidade das leis nacionais ou, ainda, quanto ao intercâmbio mercadológico internacional, que, em largas linhas, repousam as perquirições próprias ao direito internacional privado. Ademais, tem-se que a compreensão acerca de qual dispositivo normativo se aplicar, quando em conflito diferentes ordenamentos, encontra racionalização de seus termos a partir da precípua e primeira tarefa da qualificação da relação jurídica a ser regulada, para a determinação de qual disciplina jurídica se lhe adstringe sentido, enquanto regra geral. Segundo as já clássicas linhas de Irineu Strenger, “A aplicação, portanto, da norma de direito internacional privado, implica a prévia solução de problema consistente em qualificar a natureza da relação jurídica, que não recebe idêntica definição em todas as legislações. Enfim, as normas de conflito não têm de uma para outra jurisdição a mesma natureza jurídica e classificação. Alguns exemplos podem esclarecer melhor o sentido dessa afirmação: a doação causa mortis é matéria de obrigação ou sucessão? Arrendamento é direito pessoal ou real? Direitos patrimoniais da mulher casada pertencem ao campo das sucessões ou da família? Outorga uxória em fiança é problema de capacidade ou corresponde aos efeitos das obrigações? O Estado recolhe a herança jacente a título de herdeiro ou por ocupação? A prescrição é instituto de direito formal ou material? A qualificação talvez seja questão das mais controvertidas na doutrina do direito internacional privado. Como ensina o consagrado internacionalista português, Ferrer Correia, é sabido que as normas de direito internacional privado sancionadas nos vários sistemas legislativos internos estão longe da uniformidade. Não raro as relações do comércio jurídico internacional se encontram em ligação com leis que consagram a seu respeito critérios de competência não coincidentes; nesses casos verifica-se o que se chama um conflito de normas de conflitos. Esse conflito é muitas vezes patente: a divergência de normas em que se filia, é manifesta, ostensiva. Assim, v. g., a divergência entre a regra do nosso direito que sanciona o princípio do domicílio nas matérias do estatuto pessoal, e a correspondente do direito alemão, francês e italiano que declara aplicável a lex patriae. Em outros casos trata-se de uma divergência oculta, não refletida na formulação verbal das regras de competência legislativa, mas que, tal como a outra, se traduzirá em conflitos positivos e negativos. São os conflitos latentes (...)” (Direito internacional privado. 3° Edição aumentada, São Paulo: Editora LTr, 1996, p. 406-407, destaques no original). Cumpre esclarecer, outrossim, que se inicialmente gozou largo prestígio a noção de que a qualificação do fato a ser jurisdicizado se mostraria mais bem resolvida pela noção do lex fori, face às vantagens ao direito internacional privado neste critério inscrito – segundo Bartin, são em número de três elas: a desnecessidade de o legislador conhecer outros direitos internos que não aquele em que se vê vinculado, face ao fato de que, quando da formulação de disciplina interna de direito internacional privado, esta é feita tendo em vista a vivência do próprio direito civil; irrestrito respeito à noção de soberania do país em que se dá a ocorrência do fato; e, face ao fato de o direito internacional privado, sob sua ótica, não se vincular aos conflitos de soberania propriamente considerados, mas sim ao conflito de leis, de qualificações, não ferindo a noção do próprio Estado, mais bem resguardadas este conceito por uma teoria que não lhe afeta, posto ser ele entendido como soberano em atenção mais irrestrita de sua potencialidades  –, inequívoco que o passar dos anos lhe feriu a largueza de sua abrangência, tendo em vistas as críticas a ela apostas. Nos termos do mesmo falecido catedrático da sempre prestigiosa Academia do Largo de São Francisco, tem-se a seguinte metafórica lição que ilustra os despropósitos de tal teoria, se compreendida em termos estritos, também inscrita no entendimento traçado, ainda que sob diferentes termos, na cancelada Súmula n. 207 do Tribunal Superior do Trabalho: “Descrevendo um quadro pitoresco, assim se refere Werner Goldschmidt à doutrina de Bartin: ‘O tratamento que a teoria da lex civilis fori dá ao direito estrangeiro, se assemelha ao de um anfitrião que convida seus amigos para banqueteá-los e que, em lugar de se adaptar aos desejos de seus convivas, lhe impõe, coercitivamente, seu próprio conceito culinário. Teremos, então, o quadro apresentado por aqueles hóspedes, servindo-se do mesmo regime alimentar que o médico do anfitrião bilioso lhe receitou, em virtude de sua moléstia hepática...” (Sistema y Filosofia del Derecho Internacional Privado). Então, da mesma maneira estaremos discutindo o direito internacional privado, cuja finalidade é estabelecer equilíbrio entre as pessoas estrangeiras que residem em outros países e precisam ter a tutela do seu direito. Em princípio, a lex fori é uma doutrina que visa estabelecer regra de qualificação, que é a adoção dos princípios que estão contidos na própria lei do país onde o problema é colocado.” (Ibid, p. 418, destaques no original).

[19] Enunciado aprovado na 1° Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, promovida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT) e Associação Nacional dos Magistrados de Trabalho (ANAMATRA), nos dias 21 a 23 de novembro de 2007.

[20] Guimarães, Ricardo Pereira de Freitas. O princípio da proporcionalidade no direito do trabalho. Revista dos Tribunais. São Paulo. 2015, p. 88 e seguintes.

 

 

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