Coluna Isso Posto / Coordenadores Ana Paula Couto e Marco Couto
Seguimos comentando os artigos do Código de Processo Penal, dando continuidade às nossas colunas anteriores elaboradas neste sentido.
Art. 75. A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente.
Parágrafo único. A distribuição realizada para o efeito da concessão de fiança ou da decretação de prisão preventiva ou de qualquer diligência anterior à denúncia ou queixa prevenirá a da ação penal.
O art. 75, caput, do CPP, trata da competência por distribuição, a qual só tem lugar quando, na mesma circunscrição judiciária, existe mais de um juiz igualmente competente. É claro que o termo circunscrição judiciária abrange qualquer terminologia que signifique a menor divisão interna da justiça de determinado local. Em outras palavras, se a lei de organização judiciária preferir o uso de outro termo, como comarca, por exemplo, deve ser empregado o mesmo raciocínio.
O que se pretende com a distribuição, a ser operacionalizada através de um sorteio, é definir a competência da forma mais objetiva possível, sem que o juízo competente seja escolhido através de um critério subjetivo, seja para favorecer o réu, seja para prejudicar o réu.
De fato, o legislador, diante do impasse causado pela existência de dois ou mais juízos igualmente competentes, adotou uma fórmula que é capaz de definir o juízo competente no caso concreto através do sorteio que, a rigor, pode representar a sorte ou mesmo o azar do réu, a depender do perfil do julgador que realizará o julgamento.
Vale o exemplo. Se o réu pratica o crime de homicídio doloso na Comarca da Capital do Rio de Janeiro, considerando o local da infração e a natureza da infração, a competência será do tribunal do júri da Comarca da Capital. Ocorre que na Comarca da Capital do Rio de Janeiro existem quatro tribunais do júri igualmente competentes para o julgamento. Portanto, o juízo competente para o caso concreto há de ser definido através do sorteio.
O mesmo raciocínio deve ser adotado em grau recursal. Se, por exemplo, o réu é condenado no IV Tribunal do Júri da Comarca da Capital do Rio de Janeiro e interpõe o recurso de apelação, caberá a uma das oito câmaras criminais do TJRJ o julgamento do apelo. Da mesma forma, a definição de qual das câmaras criminais julgará a apelação será feita através de sorteio. Por motivo óbvio, o mesmo raciocínio deverá ser empregado entre as turmas do Superior Tribunal de Justiça e entre as turmas do Supremo Tribunal Federal.
O art. 75, parágrafo único, do CPP, traz importante regra que se relaciona à prevenção. Isso porque, segundo a lei processual, a distribuição anterior à denúncia ou à queixa-crime, prevenirá a distribuição da ação penal. Não custa lembrar que o critério da prevenção está previsto no art. 83, caput, do CPP, segundo o qual verificar-se-á a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa.
Embora o art. 75, parágrafo único, do CPP, tenha feito referência expressa aos casos de concessão de fiança e de decretação da prisão preventiva, a parte final do dispositivo, quando se refere a qualquer diligência anterior à denúncia ou à queixa, por ser mais abrangente, é suficiente para a compreensão do dispositivo.
Isso porque, a rigor, qualquer distribuição anterior à deflagração do processo criminal vincula o futuro oferecimento da denúncia ou da queixa-crime. Vale o exemplo. Se for instaurado um inquérito policial para apurar a prática do crime de homicídio doloso ocorrido na Comarca da Capital e, no curso da investigação, surgir a necessidade de uma interceptação telefônica, o inquérito policial deverá ser distribuído para um dos quatro tribunais do júri da Comarca da Capital. Se, por exemplo, o inquérito policial for distribuído ao IV Tribunal de Júri da Comarca da Capital, deferida ou não a interceptação telefônica, o juízo ficará prevento. Encerrada a investigação, quando houver o oferecimento da denúncia, a mesma será dirigida necessariamente ao IV Tribunal do Júri da Comarca da Capital, em razão da sua prevenção.
O mesmo raciocínio deve ser aplicado em grau recursal. Vale o exemplo. Se o réu responde preso ao processo na 32ª Vara Criminal da Comarca da Capital e a defesa impetra habeas corpus buscando a revogação da prisão preventiva, o writ será distribuído para uma das oito câmaras criminais do TJRJ. Independentemente do resultado do habeas corpus, a câmara criminal ficará preventa. Posteriormente, se o réu for condenado e a defesa interpuser recurso de apelação, o recurso necessariamente será julgado na mesma câmara criminal que apreciou o habeas corpus por força da prevenção. O mesmo raciocínio vale entre as turmas do Superior Tribunal de Justiça e entre as turmas do Supremo Tribunal Federal.
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