Autoritarismo, dialética, mudança na lei – Por Léo Rosa de Andrade

02/11/2016

Juízes que vão às mídias em busca do “sucesso” de suas decisões que determinam desativar o Facebook ou o Whatsapp. Um instante em que o povo os vê: ato gozoso em suas carreiras; ocasião egóica em suas vidas.

O exercício do poder decorre de muitas fontes: o afetuoso, cumprido carinhosamente; o descomedido e grotesco dos ditadores; o burocrático do funcionário, denunciado por Hannah Arendt; o político, conflitivo, reacomodatício.

O poder institucional. Abrimos mão de parcela de nossa soberania e a entregamos aos dirigentes da vida em comum. Nessa relação jurispolítica de poder democrático oferecemos muito de nós ao império das normas.

Quando submetemos as nossas vontades às regras, quando entregamos às leis parte de nosso poder pessoal, fazemo-nos cidadãos; exercendo cidadania, constituímos autoridades institucionais. Condição básica do “contrato”.

Os dirigentes institucionais brasileiros – é coisa quase consensual – têm sido o problema do Brasil. As instituições públicas são tomadas por muitas de nossas autoridades para duas coisas, digamos, privadas: roubar e permanecer.

Se no passado roubaram mais, ou menos, é uma discussão falaciosa e diversionista – contabilidade impraticável. Importa que roubam, propõem estancar o roubo, roubam igual. Esvaziam o pressuposto de licitude da autoridade.

Poucos querem largar o poder. A função pública é convertida em meio de manobras para permanência. As autoridades, para si, legislam licenças de continuidade; para o povo, quando fazem, não fazem o dever, mas o agrado.

Entre nós o exercício do poder público deixou de ser múnus; virou negócio. De negócio em negócio, parte dos próceres da pátria, surpreendentemente, acabou, nas barras, alguns das cadeias, outros ainda dos tribunais.

Quanto mais leis, quanto mais leis rígidas, mais se judicializa o País. Se os demais Poderes são desacreditados, se o Judiciário é superdimensionado, a República será decidida em gabinetes sem votos.

Alguns juízes compreendem seu papel institucional, exercem o poder no limite da lei. Outros a extrapolam, para o mal e, pior, para o bem. Não poucos investem em espírito de corpo, em poder de corporação: salários e privilégios.

Esses juízes corporativos são o pior que podemos ter entre nós. Ponto. Os juízes que se sabem servidores públicos são o que devem ser; espero que só e sempre se contentem com a dignidade de sua função.

Os juízes do agrado popular são o dedo em riste do Joaquim Barbosa e as prisões preventivas do Sérgio Moro. Aqui temos um dilema. Se não são o juiz que deveriam ser, são, paradoxalmente, um mal que fez e faz bem.

Insisto que o (mal) modo autoritário, seja o arrogante do Barbosa, seja o cavalheiro do Moro, não é invenção deles; é costume de grande parte do Judiciário. A novidade (bem) na ação de ambos é o foco.

Os miseráveis da pátria sempre se danaram diante desse Poder. A mudança de processados é que causa revolução. Dos insurgentes contra os excessos, muitos têm compromisso (a soldo) com os poderosos que caíram.

Vejo abuso em muitas dessas medidas que o petismo insiste serem judicialmente seletivas. Mas não acompanho a indignação alugada dos juristas que seletivamente deploram os excessos quando eles alcançam a sua casta.

Desses males que dialeticamente produzem algum bem retomo aos juízes que fecham redes sociais: danaram-se. E lembro do Renan. Expoente do poder, acuado, propõe rever as normas sobre abuso de autoridade. Ótimo.

Autoridades autoritárias do judiciário arrostaram autoridades autoritárias e larápias do Executivo e do Legislativo, levando-as ao cárcere. Abuso de poder. Consequência: vamos rever uma lei que autoriza autoritários.

Um assassino da Ditadura de 1964 ganhou um presente: Lei Fleury. O delegado era do mal; a Lei é do bem. Rever nosso autoritarismo legal sob clima de ladroagem e prisões é do mal, mas pode restar do bem. A ver.


 

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