Coluna Atualidades Trabalhistas / Coordenador Ricardo Calcini
1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 13.467/2017, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), atendendo, em parte, aos anseios da advocacia militante na seara trabalhista, acabou por ampliar as hipóteses de condenação dos honorários de sucumbência no Processo do Trabalho.
Além disso, reconheceu que os honorários são de titularidade do advogado, não podendo ser objeto de compensação, e disciplinou expressamente as hipóteses de concessão do benefício da justiça gratuita e de condenação ao pagamento dos honorários periciais.
Todavia, a previsão de condenação do beneficiário da justiça gratuita ao pagamento de honorários periciais e de sucumbência, com a possibilidade de compensação com o seu crédito, conforme disposto no parágrafo 4º do art. 790-B e no parágrafo 4º do art. 791-A, é entendida por alguns como um verdadeiro entrave de acesso à Justiça, conforme salienta SCHIAVI:
“A previsão da sucumbência recíproca configura a alteração mais significativa da novel legislação, pois altera, em muito, o protecionismo processual que é um dos pilares de sustentação do processo trabalhista e, pode em muitos casos inviabilizar ou ser um fator inibitório do acesso à justiça da parte economicamente fraca”[i].
No presente artigo, pretende-se analisar a constitucionalidade das referidas inovações processuais e apresentar uma solução interpretativa sob a ótica do texto constitucional.
2 DO DEMANDISMO E DA MOTIVAÇÃO DA REFORMA
Um dos principais objetivos do projeto de lei que tratou da reforma trabalhista era o de reduzir o número de processos trabalhistas no Brasil, uma vez que, conforme dados estatísticos, o nosso país seria considerado campeão mundial em número de tais ações.
No parecer apresentado no referido projeto de lei, pelo Deputado Federal Rogério Marinho, restou consignado que:
“Um dos problemas relacionados ao excesso de demandas na Justiça do Trabalho é a falta de onerosidade para se ingressar com uma ação, com a ausência da sucumbência e o grande número de pedidos de justiça gratuita. Essa litigância sem risco acaba por estimular o ajuizamento de ação trabalhista.
A assistência jurídica integral e gratuita é um direito assegurado constitucionalmente, porém o texto da Constituição Federal garante essa assistência “aos que comprovarem insuficiência de recursos” (art. 5º, LXXIV).
A redação sugerida aos §§ 3º e 4º do art. 790 da CLT visa justamente a dar efetividade ao princípio da gratuidade, transcrevendo os termos da Constituição no § 4º, enquanto o § 3º exclui a presunção de insuficiência de recursos, admitida na parte final da redação atual.
Ressalte-se que o objetivo não é dificultar o acesso à Justiça, mas, pelo contrário, torná-la efetiva, evitando-se as ações em que se solicita, e muitas vezes é concedida, a justiça gratuita para pessoas que dela não poderiam usufruir, mediante mero atestado de pobreza. Com essa medida, afastam-se as pessoas que não se enquadram nos requisitos de “pobreza” e se garante que o instituto seja utilizado por aqueles que realmente necessitam”.
Não há dúvidas de que a Constituição Federal possibilitava a regulamentação das hipóteses de concessão dos benefícios da justiça gratuita, com a restrição de deferimento apenas para aquelas pessoas que, efetivamente, não possuíssem recursos financeiros para custear das despesas do processo. Por outro lado, não seria possível que eventual regulamentação, conforme restará demonstrando nos tópicos seguintes, deixasse de considerar os demais princípios e garantidas constitucionais.
Diversamente do que constou no referido parecer, a reforma não tratou somente da regulamentação das hipóteses de concessão da justiça gratuita, mas, ao prever a possibilidade de pagamento de honorários periciais e de sucumbência, nas oportunidades em que o beneficiário tenha crédito a receber, acabou por impor limites à própria garantia constitucional.
Sem sombra de dúvidas, a ética no processo deve ser um objetivo a ser perseguido por nossa legislação e por todos operadores do direito. Porém, não parece que a restrição de abrangência do benefício da justiça gratuita, sob o prisma constitucional, seja tecnicamente a solução mais adequada para se coibir práticas abusivas dos atores processuais.
3 DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA E A GARANTIA DE ACESSO À JUSTIÇA
O acesso à justiça é um direito fundamental previsto no artigo 5º, XXXV, da Constituição da República.
E, ainda, o artigo 5º, LXXIV, da Constituição da República, estabelece que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.
A garantia de acesso à justiça passou por ondas renovatórias, conforme salientado por CAPPELLETTI e GARTH[ii], em trabalho pioneiro sobre a efetivação de direitos, com a apresentação das barreiras que deveriam ser superadas para que os indivíduos, principalmente, os mais carentes, tivessem, efetivamente, garantidos os seus direitos, transformando-se em cidadãos.
A primeira onda caracteriza-se pela garantia de assistência jurídica para os pobres e está relacionada ao obstáculo econômico do acesso à justiça. A segunda refere-se à representação dos direitos difusos em juízo e objetiva contornar o obstáculo organizacional de acesso à justiça. Por fim, a terceira onda ocorre com a informalização de procedimentos de resolução de conflitos, com a finalidade de instituir técnicas processuais adequadas e melhor preparar os aplicadores do direito.
DINAMARCO, ao tratar da efetividade do direito ao processo, salienta que:
“A assistência judiciária é instituto destinado a favorecer o ingresso em juízo, sem o qual não é possível o acesso à justiça a pessoas desprovidas de recursos financeiros suficientes à defesa judicial de direitos e interesses. (…)
Uma das famosas ondas renovatórias que vêm contribuindo para a modernização do processo civil, adequando-o à realidade social e contribuindo para a consecução de seus escopos sociais, é precisamente aquela consistente em amparar pessoas menos favorecidas. A assistência judiciária integra o ideário do Armenrecht, que em sentido global é um sistema destinado a minimizar as dificuldades dos pobres perante a ordem jurídica e para o exercício de seus direitos”[iii].
Portanto, a nova legislação, sob este aspecto, teria atuado na contramão histórica de evolução do acesso à justiça, impondo restrições financeiras para o acesso à justiça.
4 A ESPECIFICIDADE PRINCIPIOLÓGICA DO DIREITO MATERIAL E PROCESSUAL DO TRABALHO
A origem do Direito do Trabalho está estreitamente vinculada ao surgimento e ao desenvolvimento do modelo capitalista de produção, a partir do século XVIII e XIX, época em que os meios de produção passaram a se concentrar nas grandes cidades, gerando diversas transformações sociais e econômicas.
Nesse período, verificou-se que a lógica civilista clássica, segundo a qual os sujeitos da relação jurídica estariam em relação de igualdade, não era suficiente para tratar da relação de emprego em que a hipossuficiência do trabalhador era patente, dando origem ao denominado princípio protetor, conforme discorre RODRIGUEZ:
“O fundamento do princípio protetor está ligado à própria razão de ser do Direito do Trabalho. Historicamente, o Direito do Trabalho surgiu como consequência de que a liberdade de contrato entre pessoas com poder e capacidade econômica desiguais conduzia a diferentes formas de exploração. Inclusive as mais abusivas e iníquas. O legislador não pôde mais manter a ficção de igualdade existente entre as partes do contrato de trabalho e inclinou-se para uma compensação dessa desigualdade econômica desfavorável ao trabalhador com uma proteção jurídica a ele favorável. O Direito do Trabalho responde fundamentalmente ao propósito de nivelar desigualdades. Como dizia Couture: ‘o procedimento lógico de corrigir desigualdades é o de criar outras desigualdades'”[iv].
Assim, verifica-se que Direito do Trabalho surgiu com o objetivo de proteger os trabalhadores dos avanços do capital, equilibrando o conflito existente entre este e o trabalho, sendo que ação do proletariado foi o principal fator para a formação histórica deste ramo do direito, fundamentando o denominado princípio da proteção.
E, por sua vez, em relação ao Processo do Trabalho, conforme salienta PASCO:
“O Direito Processual do Trabalho é, por definição objetiva, um direito instrumental; sua finalidade ‘é atuar, na prática, tornando efetivo e real o Direito Substantivo do Trabalho’ (Giglio, 1984, p. 374). Para esse fim, o processo deve guardar adequação com a natureza dos direitos que nele se controvertem; e se as controvérsias e conflitos trabalhistas são intrinsecamente distintos das controvérsias comuns, é indispensável a existência de um direito processual que, atendo a essa finalidade, seja adequado à natureza e caracteres daqueles”[v].
Portanto, a lógica protecionista do direito material de uma forma ou de outra, em razão do caráter instrumental do processo, acabou por influenciar a lógica processual trabalhista.
Nem se diga que tal postura protecionista seria restrita à legislação trabalhista, uma vez que tal situação também se estendeu ao Código de Defesa do Consumidor e ao regramento procedimental dos Juizados Especiais.
E, conforme demonstraremos a seguir, a Lei n. 13.467/2017, desconsiderando totalmente a origem história e os princípios do Direito do Trabalho, acabou por inverter a lógica protecionista aplicável ao trabalhador, conferindo-lhe um tratamento mais rigoroso do que aquele aplicável aos cidadãos comuns que, teoricamente, estariam em situação de igualdade entre si.
5 CONFRONTO ENTRE A CLT E A LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL COMUM
DINAMARCO, ao tratar das inovações promovidas pelo Código de Processo Civil de 2015, demonstrou qual foi a intenção do legislador, ao tratar do benefício da assistência judiciária gratuita:
“Nos arts. 98 a 102 do Código de Processo Civil e em seus múltiplos parágrafos e incisos mostra-se patente o empenho do legislador não só em ampliar a oferta de assistência jurídica integral, incluindo benefícios antes não concedidos, como também em disciplinar a matéria em pormenores dos quais a legislação precedente jamais cuidou. São resolvidas várias questões que antes, por não lhes dar atenção a legislação constitucional nem infraconstitucional, eram debatidas na doutrina e nos tribunais, com alguma incerteza que em certa medida debilitava o sistema. A atenção do legislador de 2015 a esse tema constitui projeção de um dos propósitos fundamentais anunciados pela Comissão de Redação do anteprojeto do Código de Processo Civil de 2015, consistente na fidelidade ao contexto social mediante a maior aderência possível às realidades subjacentes ao processo (Exposição de Motivos)”[vi].
E, conforme se passará a demonstrar, a Lei n. 13.467/2017, com o propósito inverso do legislador processual civil de ampliação da oferta de assistência jurídica integral, acabou por conferir um tratamento prejudicial ao trabalhador, conforme afirmou DELGADO:
“(…) esta modificação denota o sentido discriminatório da nova legislação com respeito à pessoa humana que vive de seu trabalho assalariado ou equiparado. À diferença do ocorrido nas relações processuais sob regência do Código de Processo Civil e, particularmente, do Código do Consumidor, o beneficiário da justiça gratuita, no processo do trabalho, passa a manter diversos encargos econômicos durante e mesmo após terminado o seu curso processual, em que foi tido como beneficiário da justiça gratuita”[vii].
Segundo o parágrafo 3º do art. 99 do CPC/2015, há presunção de hipossuficiência econômica a pessoa natural que declare seu estado de miserabilidade, independentemente de comprovação da insuficiência econômica. Entretanto, de forma diversa, o parágrafo 3º do art. 790 da CLT passou a exigir que o trabalhador que receba acima de 40% do valor do teto de benefícios do Regime Geral da Previdência Social comprove o seu estado de hipossuficiência econômica, não bastando a mera declaração.
O Código de Processo Civil, ao tratar da hipótese de sucumbência do beneficiário da Justiça Gratuita, estabeleceu, no parágrafo 3º de seu art. 98, que:
“§ 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
E, por sua vez, a Lei n. 13.467/2017, sobre o tema, no parágrafo 4º do art. 791-A, previu que:
“§4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
Idêntico foi o regramento quanto aos encargos decorrentes da perícia, na hipótese de sucumbência do trabalhador, conforme redação do §4º do art. 790-B da CLT:
“§ 4o Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo”.
Tais inovações, se interpretadas literalmente, certamente serão consideradas discriminatórias em relação ao trabalhador e inconstitucionais, por violação ao disposto no art. 5º, I, da Constituição da República, uma vez que não poderia o legislador reformista conferir ao trabalhador tratamento mais gravoso do que aquele conferido ao cidadão comum. Este é justamente o objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5766, ajuizada pelo Ministério Público Federal, que ainda tramita perante o Supremo Tribunal Federal.
6 UMA PROPOSTA DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO
Em razão da presunção de constitucionalidade das normas jurídicas, segundo leciona BARROSO, uma norma não deve ser declara inconstitucional nas seguintes hipóteses:
quando a invalidade não seja manifesta e inequívoca, militando a dúvida em favor de sua preservação;
quando, entre interpretações plausíveis e alternativas, exista alguma que permita compatibilizá-la com a Constituição[viii].
E, conforme salienta CANOTILHO, “A interpretação conforme a Constituição só é legítima quando existe um espaço de decisão (= espaço de interpretação) em que são admissíveis várias propostas interpretativas, uma vez que em conformidade com a constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela”[ix].
Como se sabe, nos processos trabalhistas, quase que invariavelmente, a demandas apresentam a cumulação de pedidos, surgindo a possibilidade de o autor lograr êxito em algumas pretensões e em outras não obter sucesso. Tal situação, na prática, é de difícil ocorrência no processo civil, em que a cumulação de pedidos ocorre com menor frequência.
Importante salientar que, no sistema processual civil, segundo as lições de GAIO JR. e MELLO, ao tratarem sobre a concessão da justiça gratuita:
“(…) a referida concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios quando decorrentes de sua sucumbência, bem como não afasta o dever do mesmo pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas.
Assim, uma vez vencido o beneficiário da gratuidade, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passadio esse prazo, tais obrigações do beneficiário (§3º do art. 98)”[x].
Portanto, a lógica processual civil decorre do fato de que, geralmente, em razão da menor incidência de cumulação de pedidos, o beneficiário da justiça gratuita certamente não obteria outros créditos para satisfação dos honorários de sucumbência e das demais despesas processuais, sendo que, embora houvesse a condenação, a exigibilidade do crédito ficaria suspensa até que o devedor superasse a sua situação de insuficiência de recursos.
Nas hipóteses de rejeição total dos pedidos formulados em ação trabalhista, não possuindo o autor créditos em outros processos, a solução seria muito semelhante. O crédito ficaria com exigibilidade suspensa por um prazo mais limitado de 2 anos.
Entretanto, nas hipóteses em que o trabalhador possua crédito a receber, no mesmo ou em outro processo, nas hipóteses de sucumbência do beneficiário da justiça gratuita, faz-se necessária uma solução interpretativa que preserve a constitucionalidade das disposições da Lei n. 13.467/2017, em respeito ao disposto no art. 5º, LXXIV, que garante o benefício assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, com a manutenção de isonomia do trabalhador com os demais cidadãos (art. 5º, I, da CR).
E, partindo-se desta premissa, analisando os regramentos do parágrafo 4º do art. 790-A e do parágrafo 4º do art. 791-A, da CLT, constata-se que em ambos dispositivos existe a previsão de pagamento das parcelas decorrentes da sucumbência, nas hipóteses em que o perdedor tenha recebido ou venha a receber “créditos capazes de suportar a despesa”.
Com base em critérios de razoabilidade e proporcionalidade, para preservação da constitucionalidade das disposições, para que o beneficiário da justiça gratuita pudesse ser condenado ao pagamento imediato das despesas decorrentes da sucumbência, sem a suspensão da exigibilidade, não bastaria o acolhimento de crédito em montante pouco expressivo, sendo necessário que o este também fosse suficiente para que não mais subsistisse a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, assim como ocorreria no âmbito do Processo Civil, conforme estabelecido no parágrafo 3º de seu art. 98, em respeito ao princípio da isonomia, mesmo que apenas formalmente.
Suponha-se que um trabalhador tivesse reconhecido um crédito de R$ 10.000,00 no processo, não há dúvidas de que tal valor, por si só, não seria suficiente para justificar a revogação da concessão da gratuidade e para que houvesse a obrigatoriedade de pagamento de honorários advocatícios ou periciais, qualquer que fosse o montante destes últimos.
Portanto, parece razoável que, para preservação da constitucionalidade das disposições da Lei n. 13.467/2017, a compensação entre o crédito trabalhista e os ônus decorrentes da sucumbência apenas ocorra nas hipóteses em que o saldo remanescente resulte em valor significativo para alterar a situação financeira do demandante, retirando-lhe da condição de pobreza, ainda que presumidamente.
E, como parâmetro interpretativo inicial, sem prejuízo de melhor ponderação futura, poder-se-ia utilizar o limite de 50 salários-mínimos previstos no art. 833, IV, §2º, do CPC/15, os quais são impenhoráveis, mesmo com relação a créditos de natureza alimentícia, consoante entendimento da OJ n. 153, da SBDI-II, do TST.
Assim, apenas em casos de acolhimento de pretensões superiores ao limite de 50 salários mínimos, haveria a compensação entre o valor que superasse o referido limite e as despesas decorrentes da sucumbência, conforme arbitramento realizado pelo Juízo.
7 CONCLUSÃO
Com base no exposto, para que prevaleça o entendimento quanto à constitucionalidade das disposições do parágrafo 4º do art. 790-B e do parágrafo 4º do art. 791-A, da CLT, faz-se necessária uma interpretação conforme a Constituição Federal, sendo que a compensação entre o crédito trabalhista e os ônus decorrentes da sucumbência apenas deverá ocorrer nas hipóteses em que o saldo remanescente resulte em valor significativo para alterar a situação financeira do demandante, retirando-lhe da condição de pobreza, ainda que presumidamente, com a garantia de acesso gratuito e integral à justiça para aqueles que comprovem a insuficiência de recursos, sob pena de violação às disposições dos incisos I, XXXV e LXXIV da Constituição da República.
Notas e Referências
[i] SCHIAVI, Mauro. A reforma trabalhista e o processo do trabalho: aspectos processuais da Lei n. 13.467/17. — 1. ed. — São Paulo: LTr Editora, 2017, p. 85.
[ii] CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre, Sérgio Antônio Fabris, 1988.
[iii] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. Brasil: Malheiros, 2017, p. 794.
[iv] RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 85.
[v] PASCO, Mário. Fundamentos do direito processual do trabalho. São Paulo: LTr, 1998, p. 51.
[vi] Op. cit., p. 795.
[vii] DELGADO, Mauricio Godinho. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017 I Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. – São Paulo: LTr, 2017, p. 290.
[viii] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 174.
[ix] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. 5. ed. Coimbra: Livr. Almedina, 1991, p. 236.
[x] GAIO JR., Antônio Pereira. Novo CPC comentado: Lei 13.105, de 16 de março de 2015 I Antônio Pereira Gaio Júnior, Cleyson de Moraes Mello. Belo Horizonte: Del Rei, 2016, p. 122.
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