ASPECTOS LABORAIS NOS TRATADOS DE LIVRE COMÉRCIO

27/08/2019

Coluna Atualidades Trabalhistas / Coordenador Ricardo Calcini

1. Introdução

Tanto o Tratado de Livre Comércio do Canadá, México e Estados Unidos de América, como o Tratado de Livre Comércio firmado entre Chile e Canadá, possuem em seus anexos um documento chamado Acordo de Cooperação Laboral, ACLAN e ACLCC, respectivamente.

Um tratado de livre comércio é uma forma de integração econômica normalmente utilizado com o objetivo de agregar uma região ou grupo de países, visando eliminar barreiras que afetem ou atrapalhem o comércio.

O tema laboral vem sendo cada vez mais frequente nesses instrumentos, no contexto maior de igualdade competitiva entre os países acordantes, visando estabelecer um equilíbrio entre as nações.

Esses tratados comerciais, portanto, estabelecem direitos trabalhistas mínimos, o que dá credibilidade ao compromisso firmado e obriga o Estado a reconhecê-los e protegê-los.

A capacidade de garantia do cumprimento dos compromissos trabalhistas contidos nesses tratados, e acordos complementares, é determinada pelo nível de coercibilidade de suas normas.

 

2. Aspectos Laborais nos Tratados de Livre Comércio

Analisando o Acordo de Cooperação Laboral da América do Norte (ACLAN) anexo ao Tratado de Livre Comércio do Canadá, México e Estados Unidos de América; e o Acordo de Cooperação Laboral do Canadá e Chile (ACLCC), anexo ao Tratado de Livre Comércio subscrito por esses países, observamos as seguintes premissas:

 

Medidas Estatais de Fiscalização das Relações de Trabalho

As partes se obrigam a promover e cumprir sua legislação trabalhista, por meio de medidas governamentais de inspeção, que incluem a nomeação e treinamento de inspetores do trabalho; monitoramento do cumprimento da legislação, incluindo visitas nos locais de trabalho; o estabelecimento de comissões de empregadores e trabalhadores; e a promoção de mediação, conciliação e arbitragem, por exemplo.

 

Tribunais Administrativos e/ou Judiciais em Matéria Trabalhista

As partes se obrigam a assegurar que as pessoas com interesse legalmente reconhecido tenham acesso aos tribunais administrativos e/ou judiciais em matéria trabalhista.

O intuito aqui é de se estabelecer um sistema de justiça para a aplicação da legislação laboral, que se diferencie do sistema geral de aplicação da lei.

Também devem assegurar que as autoridades competentes analisem pedidos apresentados por um empregador ou por um trabalhador, e que qualquer violação à legislação trabalhista seja investigada.

Ressalte-se que a ideia de um tribunal administrativo para esses casos não é nova. Isso, pois, no Brasil, em 13.06.06 foi publicado no Jornal do Commercio – Rio de Janeiro –– p. A-16, artigo do Professor e Auditor Fiscal do Trabalho Ronald Sharp Jr. intitulado “Julgamento monocrático do Ministério do Trabalho”.

O referido autor defendia, com base no artigo 10 de nossa Carta Magna, que os julgamentos administrativos dos autos de infração trabalhistas, em grau recursal, fossem colegiados, vez que o dispositivo constitucional assegura a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão ou deliberação.

Ano passado (LOPES FILHO, 2018), novamente a doutrina trouxe a questão de um tribunal administrativo (colegiado) para esses casos e, neste ano, já se discute a ampliação do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS, com essa finalidade.[1]

 

Garantia do Devido Processo

De modo similar, ambos os acordos (ACLAN e ACLCC) obrigam as partes a garantir que o processo perante os tribunais acima mencionados sejam justos, equitativos e transparentes. Para isso, precisam garantir que os procedimentos estejam em conformidade com o devido processo legal; que todas as audiências sejam públicas, salvo casos excepcionais; que as partes envolvidas tenham o direito de sustentar ou defender suas respectivas posições e apresentar informações ou provas; e que os procedimentos não sejam desnecessariamente complexos ou impliquem em custos ou prazos excessivos.

Devem também assegurar que os tribunais responsáveis ​​pelo processo trabalhista (administrativo ou judicial) sejam imparciais e independentes.

Os acordos também determinam que cada parte pode estabelecer ou manter órgãos para representar ou aconselhar os trabalhadores.

 

Transparência e Publicidade

As partes se obrigam a assegurar que suas leis, regulamentos, procedimentos e resoluções, em geral, sejam disponibilizados aos interessados para o seu conhecimento. Além disso, ao serem adotadas novas medidas legais, devem oferecer uma oportunidade razoável para as pessoas interessadas formularem suas observações.

 Da mesma forma, as partes são obrigadas a promover o conhecimento público de sua legislação e procedimentos trabalhistas pela sua aplicação e conformidade, ou, quando apropriado, promoverão a educação da população em relação à legislação trabalhista.

 

3. Conclusão

As disposições trabalhistas contidas nos Tratados de Livre Comércio e seus Acordos de Cooperação Laboral, complementam e fortalecem as normas trabalhistas nacionais, cuja conformidade efetiva é imperativa para as partes (Controle de Convencionalidade). Ao mesmo tempo inspiram e promovem a adoção de reformas que os aperfeiçoam, com o objetivo de alcançar a melhoria das condições de trabalho.

Com isso, esses textos não congelam o conteúdo das normas internas, mas incentivam sua reforma visando garantir padrões superiores.

 

Notas e Referências

A unificação da inspeção trabalhista e previdenciária (não exclusiva) e a ampliação da competência do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS para o julgamento dos autos de infração trabalhistas. Site visitado em 20/08/2019. https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI309199,41046-A+unificacao+da+inspecao+trabalhista+e+previdenciaria+nao+exclusiva+e

LOPES FILHO, Abel Ferreira. Manual de Direito Administrativo do Trabalho. Editora LTr, São Paulo, 2018.

MORGADO, E. Internacionalización de las relaciones individuales y colectivas de trabajo: acuerdos de libre comercio de América. Site visitado em 20/08/2019. http://biblio.juridicas.unam.mx/libros/5/2150/21.pdf.

SHARP JR. Ronald. Julgamento monocrático do Ministério do Trabalho. Artigo publicado no Jornal do Commercio – Rio de Janeiro –– p. A-16, em 13.06.06.

[1]https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI309199,41046-A+unificacao+da+inspecao+trabalhista+e+previdenciaria+nao+exclusiva+e).

 

 

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