Aspectos jurídicos do estudo prévio de impacto ambiental – Por Wagner Carmo

21/05/2017

A Constituição Federal, em seu art. 225, IV, dispõe que o Poder Público deverá exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental.

Art. 225. (...)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; 

A Lei Federal n.º 6.938/81, recepcionada pela Constituição de 1988, em seu art. 9º, inciso III, já havia incluído a avaliação dos impactos ambientais como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente.

Art. 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:

(...)

III - a avaliação de impactos ambientais;

Ainda sob o aspecto da regulamentação, o Decreto n.º 88.351/83, em seu art. 18, §1º, atribuiu ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), a tarefa de fixar os critérios básicos e as diretrizes gerais para estudos de impacto ambiental para fins de licenciamento de obras e atividades, tendo sido publicada, em 1986, a Resolução n.º 1 do CONAMA, que tratou da matéria.

Art. 18. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimento de atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão estadual competente, integrante do SISNAMA, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis.

§ 1º Caberá ao CONAMA fixar os critérios básicos, segundo os quais serão exigidos estudos de impacto ambiental para fins de licenciamento, contendo, entre outras, os seguintes itens:

a) diagnóstico ambiental da área;

b) descrição da ação proposta e suas alternativas;

c) identificação, análise e previsão dos impactos significativos, positivos e negativos.

Por conseguinte, a Resolução n.º 1/86 do CONAMA, em seu art. 1º, define o que é impacto ambiental:

Artigo 1º - Para efeito desta Resolução, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam:

I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

II - as atividades sociais e econômicas;

III - a biota;

IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;

V - a qualidade dos recursos ambientais.

Já o art. 2º da citada Resolução estabelece um rol exemplificativo de atividades que dependem, obrigatoriamente, da elaboração do estudo de impacto ambiental para seu licenciamento.

Artigo 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental - RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA e1n caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como:

I - Estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento;

II - Ferrovias;

III - Portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos;

IV - Aeroportos, conforme definidos pelo inciso 1, artigo 48, do Decreto-Lei nº 32, de 18.11.66;

V - Oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários;

VI - Linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230KV;

VII - Obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10MW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d'água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, diques;

VIII - Extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão);

IX - Extração de minério, inclusive os da classe II, definidas no Código de Mineração;

X - Aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos;

Xl - Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10MW;

XII - Complexo e unidades industriais e agro-industriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos);

XIII - Distritos industriais e zonas estritamente industriais - ZEI;

XIV - Exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental;

XV - Projetos urbanísticos, acima de 100ha. ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério da SEMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes;

XVI - Qualquer atividade que utilize carvão vegetal, em quantidade superior a dez toneladas por dia.

A inclusão de um rol exemplificativo de atividades que devam ser consideradas de impacto ambiental e, portanto, sujeitas ao EIA/RIMA, foi uma medida tomada pelo CONAMA para reduzir a discricionariedade do órgão licenciador.

Entretanto, inobstante exista divergências na doutrina, o entendimento majoritário compreende que a listagem traz uma presunção jures et de jure de que àquelas atividades produzam significativo impacto ambiental, obrigando o órgão ambiental a submetê-la ao rito introduzido pela Resolução.

O problema surge, entretanto, quando a atividade a ser licenciada não se encontra listada no art. 2º da Resolução n.º 1/86 do CONAMA.

Nesta hipótese, o CONAMA tratou de editar a Resolução n.º 237/1997, cujo art. 3º, remeteu à autoridade administrativa a discricionariedade para avaliar se a atividade a ser licenciada é capaz de causar significativa degradação ambiental, veja-se:

Art. 3º- A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.

Parágrafo único. O órgão ambiental competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento.

Verifica-se, pela redação do art. 3º, que a solução para o rol exemplificativo, na hipótese de ausência da atividade a ser licenciada, recai sobre a discricionariedade da definição técnica, pelo órgão licenciador, sobre o que seja degradação ambiental e quando a atividade provoca significativo impacto ambiental.

A fluidez do conceito de significativo impacto ambiental resulta em duas considerações: a) o que fazer quando a atividade não exige estudo de impacto ambiental e, b) como deve ser realizada a dispensa do EIA/RIMA pelo órgão licenciador quando tecnicamente não há degradação significativa para o meio ambiente.

O CONAMA, neste sentido, com a finalidade de empregar juízo de legalidade à definição fluida do conceito de significativo impacto ambiental, editou a Resolução n.º 308/2002. Segundo a Resolução nº 308/2002, o órgão ambiental poderá dispensar o Estudo de Impacto Ambiental na hipótese de ficar constatada por estudos técnicos que o empreendimento não causará significativa degradação ao meio ambiente.

Nesta quadra, cabe listar, também, as Resoluções CONAMA n.º 312/2002 e 369/2006, cujo conteúdo fixa a possibilidade de dispensa de Estudos de Impacto Ambiental mediante decisão administrativa motivada.

Pela analise sistêmica do ordenamento jurídico brasileiro, é possível afirmar que não existe impedimento quanto à dispensa, pelo órgão ambiental, do EIA/RIMA ou, ainda, quanto à substituição do EIA/RIMA por outros estudos/relatórios ambientais; exigindo-se, para tanto, apenas, que a decisão administrativa seja motivada e justificada tecnicamente.

Todavia, alguns juristas contestam a possibilidade de substituição do Estudo Prévio de Impacto Ambiental por relatórios, alegando haver contrariedade à Constituição Federal. Helita Barreiro Custódio, citada por Carol Manzoli Palma[1] afirma que por força dos princípios gerais do Direito consolidado na Constituição brasileira, não cabe ao interprete ou ao legislador da lei ou do ato normativo ampliar ou restringir, alterar ou substituir o conteúdo e o alcance da norma constitucional no sentido de ajustá-los a tendências generalizadas de teses subjetivas e gritantemente incompatíveis com as expressas normas constitucionais.

Conclui-se, que para alguns juristas, as Resoluções do CONAMA possuem conteúdo que ultrapassa a natureza regulamentadora e de estabelecimento de regras práticas para o exercício da legislação ambiental, contrariando a ordem constitucional, a técnica legislativa vinculada ao direito e introduzindo dispositivos inconstitucionais em  prejuízo à coletividade.


Notas e Referências:

[1] PALMA, Carol Manzoli. Petróleo. Exploração, produção e transporte sob a óptica do direito ambiental. Campinas. Millennium, 2011.


 

Imagem Ilustrativa do Post: Youart RJ, Industries Encroach, Environmental Impact // Foto de: Campbelltown City Council // Sem alterações

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