Aspectos gerais da política nacional de meio ambiente

28/10/2018

Introdução.  

A organização das políticas ambientais no Brasil perpassa pela compreensão da Lei n.º 6.938/1981. A Lei n.º 6.938/1981, editada ainda no período de exceção democrática do Brasil, estabeleceu a Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA e o Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, contendo objetivos, metas e instrumentos.  

Com o avanço do ordenamento jurídico, a Lei n.º 6.938/1981 passou a ser interpretada à luz da Constituição Federal de 1988, em especial das disposições contidas no art. 23, relativo ao sistema de repartição de competência legislativa e o art.  225, que revisitou o tema relacionado à sustentabilidade no desenvolvimento socioeconômico. Em nível infraconstitucional a atenção do exegeta incluiu o paralelo da Lei Complementar n.º 140/2011, responsável por regulamentar o art. 23 da Constituição Federal e a Lei n.º 9.795/1999, relacionada com a Educação Ambiental, dentre outras diversas normas de interesse ambiental.  

O presente artigo pretende destacar os aspectos gerais da Política Nacional de Meio Ambiente, atentando para a necessidade de compatibilizar a Lei n.º 6.938/1981 com a matriz constitucional de 1988 e com as demais normas infraconstitucionais.  

Objetivos Gerais da Política Nacional de Meio Ambiente.  

A Lei n.º 6.938/1981 foi instituída com o objetivo preservar, melhorar e recuperar a qualidade ambiental, valendo-se de metas programáticas para propiciar melhoria na qualidade da vida de toda a sociedade brasileira. 

Art. 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: 

Os Princípios da Política Nacional de Meio Ambiente.  

A Lei n.º 6.938/1981, tendo listado princípios no art. 2º, em verdade editou metas ambientais necessárias ao equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade dos recursos naturais.    

II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar; 

Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais; 

IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas; 

V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras; 

VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais; 

VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental; 

VIII - recuperação de áreas degradadas;  

IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação; 

X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente. 

Objetivos Específicos da Política Nacional de Meio Ambiente 

Os objetivos específicos da Política Nacional de Meio Ambiente foram listados através do art. 4º da Lei n.º 6.938/1981, com destaque para dois, dentre diversos princípios modernos do direito ambiental: a) o princípio da sustentabilidade, que compatibiliza o desenvolvimento econômico, o crescimento industrial e a preservação do ambiente e dos recursos naturais; e b) princípio do poluidor pagador, fixando a obrigação do poluidor em custear os danos relacionados com o impacto da atividade econômica. 

Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: 

I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico; 

II - à definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; 

III - ao estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental e de normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais; 

IV - ao desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais; 

V - à difusão de tecnologias de manejo do meio ambiente, à divulgação de dados e informações ambientais e à formação de uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico; 

VI - à preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção do equilíbrio ecológico propício à vida; 

VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos. 

Titularidade do meio ambiente 

Uma importante questão a ser destacada pela evolução da legislação e da doutrina relaciona-se com a compreensão sobre a titularidade do meio ambiente. Segundo o art. 2º da Lei n.º 6.938/1981, o meio ambiente é um patrimônio público.  

Art. 2º (...) 

I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo; 

A primeira interpretação do dispositivo revelaria que o meio ambiente é um bem patrimonial de pertencimento da pessoa jurídica pública; contudo, o texto constitucional do art. 225, revelou que o meio ambiente é patrimônio, porém, um patrimônio do povo (bem de uso comum do povo). Embora o art. 225 tenha representado uma importante evolução, os avanços ainda são tímidos quando comparados às necessidades éticas de relacionamento da humanidade com o meio ambiente; mantendo a visão antropocêntrica e utilitarista do meio ambiente em detrimento da filosofia ecocentrica ou biocentrica. 

Instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente.  

Os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente foram listados no art. 9º, com os seguintes comentários, abaixo relacionados:  

Art. 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: 

I - o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental; 

O estabelecimento de padrões de qualidade ambiental é indispensável para o controle e prevenção da poluição. Com efeito, compete ao CONAMA estabelecer padrões relativos ao controle e a manutenção da qualidade do meio ambiente com vista ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente os hídricos, bem como os padrões nacionais de controle da poluição por veículos automotores, aeronaves e embarcações, mediante audiência dos Ministérios competentes. 

II - o zoneamento ambiental;                  

III - a avaliação de impactos ambientais; 

IV - o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; 

O zoneamento ambiental, a avaliação de impactos e o licenciamento de atividades poluidoras constituem políticas públicas essenciais à constituição de um ambiente urbano e rural sustentável. O estabelecimento de zonas apropriadas para instalação de empreendimentos, alocação de residências e constituição de áreas verdades ou de unidades de preservação são essenciais para a qualidade de vida. A avaliação dos impactos ambientais, consorciado com o sistema de licenciamento ambiental, promovem o controle do crescimento econômico e do desenvolvimento industrial, mitigando para os Seres Humanos, com fundamento nos princípios da prevenção e da precaução, os risco à saúde e a integridade do ambiente.  

V - os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental;  

Neste caso, é indispensável o investimento em pesquisa para se criarem tecnologias que reduzam ou eliminem a poluição, visando melhorar a qualidade do meio ambiente, a exemplo da produção de energia com fontes limpas, como a solar. O Poder Público deve ser empreendedor, criando incentivos em favor das empresas que empreendam com o manejo de técnicas menos impactantes ao ambiente, para reduzir a emissão da poluição. Nesse sentido existe autorização constitucional no art. 170, inciso VI, para tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.  

VI - a criação de reservas e estações ecológicas, áreas de proteção ambiental e as de relevante interesse ecológico, pelo Poder Público Federal, Estadual e Municipal; 

VI - a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas;         

Segundo o texto constitucional, art. 225, §1º, inciso III, as unidades da federação devem criar espaços especialmente protegidos, a exemplo das unidades de conservação. Também são exemplos as áreas de preservação permanente, as áreas verdes, as áreas de uso restrito e a reserva florestal legal. Tais áreas são essenciais para garantir a conservação da biodiversidade da fauna e da flora. A supressão ou alteração de tais áreas depende de lei específica para tal finalidade.          

VII - o sistema nacional de informações sobre o meio ambiente; 

O sistema nacional de informações sobre o meio ambiente – SINIMA é um importante instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, tendo regulamentação pelo art. 11 do Decreto n.º 99.274/1990, competindo ao Ministério do Meio Ambiente, na forma do art. 7º, inciso VIII da Lei Complementar n.º 140/2011, coordenar o fluxo de informações entre as entidades e órgãos que compõem o Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA. Dentre as novidades para o SINIMA, a Lei Complementar n.º 140/2011 previu a criação do Sistema Municipal de informações sobre o meio ambiente, organizado e mantido pelos Municípios.  

Outra importante inovação em relação ao sistema de informação foi a criação do Cadastro Ambiental Rural – CAR, instituído através do Código Florestal – Lei n.º 12.651/2012. O Cadastro é um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo a base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico, além de colaborar com o controle do desmatamento.  

VIII - o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; 

O cadastro técnico federal é administrado pelo IBAMA, constituindo um instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, exigível para pessoas naturais e jurídicas que prestam serviços de consultoria técnica relacionada com problemas ecológicos e ambientais, na forma do art. 17, inciso I da Lei n.º 6.938/1981.  

IX - as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental. 

X - a instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente, a ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA;   

O relatório de qualidade do Meio Ambiente é um instrumento gerido pelo IBAMA e deve ser objeto de divulgação anual, com a finalidade de garantir a ampla divulgação no meio da sociedade sobre as condições ambientais gerais do Brasil.  

XI - a garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzí-las, quando inexistentes; 

A prestação de informações relativas ao Meio Ambiente decorre do princípio da publicidade (art. 37 caput) e do direito à informação.  A regulamentação do sistema de transparência ambiental foi concretizado pela Lei n.º 10.650/2003, que instituiu a obrigação dos órgãos e entidades da federação em disponibilizar ao público o acesso aos processos administrativos da esfera ambiental, independente de comprovação de interesse específico, com ressalva apenas para as hipóteses de sigilo comercial, industrial e financeiro.  

O exercício do direito à informação é especificado pelo art. 4º da norma citada quando estabelece que os entes que compõem o SISNAMA devem publicar no Diário Oficial, por exemplo, as solicitações de licenciamento ambiental, lavraturas de auto de infração, recursos interpostos e lavratura de Termos de Ajustamento.  

XII - o Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais.                    

O cadastro técnico de atividades potencialmente poluidoras também é gerido pelo IBAMA, prestando-se ao registro obrigatório de pessoas naturais e jurídicas que se dedicam a exercer atividades econômicas que possuem potencial poluidor ou perigoso à sociedade. De igual forma, o Código Florestal, no art. 37, estabelece que o comércio de plantas vivas e outros produtos oriundos da flora nativa dependerá de licença ambiental dos órgãos estatuais e de registro no cadastro técnico de atividades utilizadoras dos recursos ambientais.  

XIII - instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão ambiental, seguro ambiental e outros.            

Os instrumentos econômicos constituem um rol de atividades abertas, com destaque para a concessão florestal, instituída pela Lei n.º 11.284/2006, relacionada com gestão de florestas e, os instrumentos de servidão e seguro ambiental.  

A instituição de instrumentos econômicos em prol do meio ambiente é uma medida crescente no mundo, ao lado da tradicional regulação direta do Estado. Por instrumento econômico é possível compreender o conjunto de medidas estatais que interferem na ordem econômica com o objetivo de reduzir a poluição ou inibir posturas lesivas ao meio ambiente.  

A natureza e a aplicação da servidão ambiental foram objeto de alteração pelo Código Florestal, possuindo natureza de direito real sobre a coisa alheia e com registro imobiliário; a onde o proprietário renuncia de maneira permanente ou temporária, o uso, a exploração e a supressão dos recursos naturais. A servidão ambiental, por sua vez, com o advento do novo Código Florestal, passou a fixar um prazo mínimo de 15 (quinze) anos e não pode ser instituída nas áreas de preservação permanente ou de reserva legal. 

O seguro ambiental é um instrumento presente em diversos países, possuindo relevância para os processos administrativos e judiciais de reparação de danos ao meio ambiente. No Brasil, o seguro ambiental não é obrigatório, contudo, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n.º 2.313/2003, que objetiva a implementação de seguro de responsabilidade civil do poluidor (pessoa natural e pessoa jurídica), que exerça atividade econômica potencialmente causadora de degradação ambiental.  

A matéria recebeu importante destaque na Lei n.º 12.305/2010, que aprovou a Política Nacional de Resíduos Sólidos, ao instituir a possibilidade de o órgão licenciador exigir a contratação de seguro de responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente ou a saúde pública.  

Conclusão. 

A política Nacional de Meio Ambiente, inobstante datar de 1981, é um importante instrumento legal de defesa e garantia da qualidade ambiental. De forma geral, a Lei n.º 6.938/1981 representou um avanço no debate envolvendo a cidadania e a democracia na gestão do meio ambiente do Brasil e aproximou o Brasil do debate internacional sobre meio ambiente.   

 

Imagem Ilustrativa do Post: Chapada dos Guimarães, Mato Grosso, Brasil. // Foto de: paulisson miura // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/paulisson_miura/35679830455

Licença de uso: https://creativecommons.org/publicdomain/mark/2.0/

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura