Por Rômulo Andrade Moreira - 29/06/2015
A 36ª. edição do "Jurisprudência em Teses" foi disponibilizada pelo Superior Tribunal de Justiça, com o tema Habeas Corpus. Nesta edição, há dezoito enunciados acerca do instituto.
Vejamos as teses:
1) O Superior Tribunal de Justiça não admite que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso próprio (apelação, agravo em execução, recurso especial), tampouco à revisão criminal, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade da paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus.
Esta questão, em parte, foi definida pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do Habeas Corpus nº. 113198. Dois Ministros já haviam se manifestado sobre a questão: o relator, Ministro Dias Toffoli, que defende a ampla admissão na Corte dos Habeas Corpus, mesmo que substitutivos dos recursos constitucionais, e o Ministro Roberto Barroso, que considera inadequada a via processual. Após os dois votos, o Ministro Teori Zavascki pediu vista do processo. A questão começou a ser discutida em agosto do ano passado, quando houve uma mudança de jurisprudência por parte da Primeira Turma do Supremo durante o julgamento do Habeas Corpus n. 109956, de relatoria do Ministro Marco Aurélio. Até então, ambas as turmas vinham admitindo os Habeas Corpus que tinham por objetivo substituir o recurso constitucional. O Ministro Dias Toffoli apresentou um histórico sobre o chamado ‘remédio constitucional’, lembrando que foi voto discordante na Primeira Turma quando a mesma passou a não admitir os Habeas Corpus substitutivos. Assim, ele votou pelo amplo conhecimento do pedido. O Ministro Roberto Barroso abriu a divergência quanto ao voto do relator e votou pelo não conhecimento do Habeas Corpus, considerando a inadmissibilidade por falta de previsão constitucional.
Na verdade, esta discussão começou a ser discutida quando a Turma analisou o Habeas Corpus nº. 108715, durante a apresentação de uma questão preliminar no voto do relator do processo, Ministro Marco Aurélio (que depois afirmaria, a respeito, em uma entrevista, que se arrependimento matasse, ele estaria morto!). Em sua preliminar, o Ministro defendeu que a Turma não mais admitisse o uso do Habeas Corpus para substituir o Recurso Ordinário em Habeas Corpus. Segundo o Ministro Marco Aurélio “o habeas corpus substitutivo do recurso ordinário, além de não estar abrangido pela garantia constante do inciso LXVIII do artigo 5º do Diploma Maior, não existindo sequer previsão legal, enfraquece este último documento, tornando-o desnecessário no que, nos artigos 102, inciso II, alínea “a”, e 105, inciso II, alínea “a”, tem-se a previsão do recurso ordinário constitucional a ser manuseado, em tempo, para o Supremo, contra decisão proferida por Tribunal Superior indeferindo ordem, e para o Superior Tribunal de Justiça contra ato de Tribunal Regional Federal e de Tribunal de Justiça”. E acrescentou: “o Direito é avesso a sobreposições e impetrar-se novo habeas, embora para julgamento por tribunal diverso, impugnando pronunciamento em idêntica medida implica inviabilizar, em detrimento de outras situações em que requerida, a jurisdição”. No julgamento desse Habeas Corpus (n. 108715) o Ministro Luiz Fux lembrou que assim como o Tribunal já decidiu que não cabe Mandado de Segurança como substituto de recurso ordinário, assim também deve ser para “não vulgarizar a utilização do habeas corpus”. Fonte: STF.
Após esta primeira e lastimável decisão, vários foram os Habeas Corpus não conhecidos pela mesma fundamentação, a saber: Habeas Corpus nº. 111909, Habeas Corpus nº. 122590, etc. Neste último, lamentavelmente, o Ministro Luís Roberto Barroso aceitou esta tal (inaceitável) inadequação da via eleita para fechar os olhos a uma (única e eficaz) garantia constitucional que temos para o direito de locomoção. Igualmente o Ministro Luiz Fux, referindo-se a uma suposta vulgarização do remédio constitucional. Possivelmente quem esteja vulgarizando-se em sua função constitucional seja o próprio Supremo Tribunal Federal, o que é uma lástima!
Pontes de Miranda, se vivo, espernearia! Rui Barbosa, pior! Pedro Lessa ficaria ruborizado... Óbvio que não falarei de João Sem-Terra, nem dos barões ingleses, pois estes, muito possivelmente, não tinham ideia do bem que faziam àquela altura para a liberdade humana (Carta Magna , 1215).
É lamentável como o Habeas Corpus vem sendo achincalhado pelos nossos juízes, tribunais e, incrivelmente, pela Suprema Corte
Desde logo devemos atentar para a diferença abissal entre as garantias constitucionais do mandado de segurança e do habeas corpus, tendo em vista a tutela por ambos visada. Comparar jurisprudência aplicável ao mandado de segurança com o habeas corpus é olvidar os direitos por elas garantidos.
Como se sabe, o Habeas Corpus deve ser necessariamente conhecido e concedido sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, pois se visa à tutela da liberdade física, a liberdade de locomoção do homem: ius manendi, ambulandi, eundi ultro citroque. Como já ensinava Pontes de Miranda, em obra clássica, é uma ação preponderantemente mandamental dirigida “contra quem viola ou ameaça violar a liberdade de ir, ficar e vir.”[1]
Para Celso Ribeiro Bastos “o habeas corpus é inegavelmente a mais destacada entre as medidas destinadas a garantir a liberdade pessoal. Protege esta no que ela tem de preliminar ao exercício de todos os demais direitos e liberdades. Defende-a na sua manifestação física, isto é, no direito de o indivíduo não poder sofrer constrição na sua liberdade de se locomover em razão de violência ou coação ilegal.”[2]
Aliás, desde a Reforma Constitucional de 1926 que o habeas corpus, no Brasil, é ação destinada à tutela da liberdade de locomoção, ao direito de ir, vir e ficar.
Ademais, não há falar-se em uma suposta sobreposição quando se está em jogo a presunção de inocência, que acode a todos nós. Não por menos, Julian Lopez Masle e Maria Inês Horvitz afirmam que “(...) el principio de inocência no excluye, de plano, la posibilidad de decretar medidas cautelares de carácter personal durante el procedimiento. En este sentido, instituiciones como la detención o la prisión preventiva resultan legitimadas, en principio, siempre que no tengan por consecuencia anticipar los efectos de la sentencia condenatória sino asegurar fines del procedimiento”[3]
Interessante artigo doutrinário de Renato Stanziola Vieira e Fernando Gardinali Caetano Dias, publicado sob o título “Geni”, no Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRim nº. 240 (novembro de 2012), merece ser transcrito em parte:
“A mera previsão de recursos cabíveis (como, por exemplo, o vetusto recurso em sentido estrito do Código de Processo Penal) nunca foi óbice às impetrações de habeas corpus. Quando não porque o constrangimento ilegal (cujas hipóteses estão previstas no art. 648 do CPP) independe de haver ou não outro recurso apto a debelar o mal, porque há situações em que existe o recurso mas não tem ele efeito suspensivo (por exemplo, o decorrente de não reconhecimento de causa extintiva de punibilidade ou, ainda, o decorrente de decisão de pronúncia). Da mesma forma, é sabido nos precedentes que matérias de direito que desafiem recursos também são cognoscíveis em habeas corpus, a depender da densidade da argumentação jurídica e da clareza da ilegalidade. Por essa perspectiva, o erro está na constatação empírica de que o manejo do habeas corpus não pode ser, de forma alguma, subsidiário, isto é, só admissível em situações nas quais não haja recurso. É irônico. Às vésperas do Ato Institucional 5, em julgamento havido pouco depois do golpe militar, dizia-se da necessidade do remédio para amparar a maldade e a injustiça. Hoje, com a Constituição em vias de completar um quarto de século, em plena democracia formal, atiram-se antigas pedras no mais importante remédio constitucional. O habeas corpus é, hoje, a Geni. Outro prisma, ainda, chama a atenção. No desenvolvimento da teoria dos direitos fundamentais, sobretudo da segunda metade do século passado para cá, a doutrina ocidental – entre a qual, inclusive, a brasileira mais atenta – vangloria-se por compreender como cláusula inerente a todo e qualquer deles a da proibição do retrocesso. Nessa cláusula, em também muito singela lembrança, o que vale lembrar é que não se admite andar para trás, ou seja, uma interpretação que amesquinhe o direito fundamental, dando-lhe eficácia menor do que a conquistada.Por isso, além de erradas as duas decisões do Supremo, perigosamente caminham por um retrocesso na interpretação do habeas corpus.Retrocesso que advém de um raciocínio jurídico perigoso, porque limitador de acesso ao STF nas matérias que lá chegarem via habeas corpus. Veja-se: por esse entendimento, contra a denegação de ordem de habeas corpus por um Tribunal de segunda instância, o correto seria interpor recurso ordinário ao STJ (art. 105, II, a, da Constituição Federal). Se a tal recurso for negado provimento, contudo, não será possível levar a matéria ao STF, pois não cabe recurso ordinário contra acórdão denegatório de outro recurso ordinário de habeas corpus (pelo art. 102, II, a, da Carta Magna, o recurso só é cabível para habeas corpus decidido em última instância pelo Tribunal Superior).Cria-se, com isso, um claro e insuperável fator limitador de acesso ao STF, sem previsão legal. Pior: sem previsão constitucional, dada a competência estrita da Corte, advinda da Carta Maior, pois ali se prevê às claras o cabimento de habeas corpus se o “coator for Tribunal Superior” (art. 102, I, i). Talvez, com essa interpretação que parece não ter amparo na Constituição, alcance-se o objetivo de diminuir o acervo de habeas corpus na Corte Suprema. Mas o resultado se dará, inevitável e lamentavelmente, à custa da redução da própria prestação jurisdicional em afronta à competência do Supremo prevista na Constituição da República (art. 102, I, i). Havia, entre os Ministros do Supremo, quem repetisse, para a alegria dos cultores dos direitos fundamentais e do manejo do habeas corpus, que se tratava de remédio que “não pode sofrer qualquer peia”. Hoje, o bastião da liberdade do habeas corpus¸ obedecida sua história de dignidade constitucional e defesa da liberdade, passou de mão. O habeas corpus é a Geni. Talvez seja, por enquanto, aquela Geni que é boa de apanhar, boa de cuspir. O problema é que, como remédio constitucional historicamente mais importante do Brasil, o mais fundamental instrumento de garantias no processo penal, depois alguém pode sair correndo atrás do prejuízo, pedindo para ele (ou para ela, a Geni): você pode nos salvar, você vai nos redimir. Pobre liberdade, órfã do instrumento maior para garanti-la.”
O problema, no fundo no fundo, ainda é o nosso Código de Processo Penal (e não só ele, óbvio…). A propósito, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, afirma que “a questão é tentar quase o impossível: compatibilizar a Constituição da República, que impõe um Sistema Acusatório, com o Direito Processual Penal brasileiro atual e sua maior referência legislativa, o CPP de 41, cópia malfeita do Codice Rocco de 30, da Itália, marcado pelo princípio inquisitivo nas duas fases da persecutio criminis, logo, um processo penal regido pelo Sistema Inquisitório. (...) Lá, como é do conhecimento geral, ninguém duvida que o advogado de Mussolini, Vincenzo Manzini, camicia nera desde sempre, foi quem escreveu o projeto do Codice com a cara do regime (...) ”[4]
Afinal de contas, como já escreveu Cappelletti, “a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todas.”[5] Devemos interpretar as leis ordinárias em conformidade com a Carta Magna, e não o contrário! Como magistralmente escreveu Frederico Marques, a Constituição Federal “não só submete o legislador ordinário a um regime de estrita legalidade, como ainda subordina todo o sistema normativo a uma causalidade constitucional, que é condição de legitimidade de todo o imperativo jurídico. A conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todos.”[6]
Especificamente sobre o assunto, Fabio Machado de Almeida Delmanto, lembra-nos “que o habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, embora não previsto em lei, passou a ser admitido pela jurisprudência de todos os Tribunais pátrios (inclusive do STF e do STJ), em virtude da necessidade de se garantir –imediatamente e com a máxima urgência a defesa da liberdade do cidadão contra eventuais arbitrariedades ou ilegalidades perpetradas por autoridades públicas, sendo até mesmo admitido quando o autor do constrangimento ilegal for um particular (é o caso, p. ex., de uma clínica psiquiátrica que interna o paciente sem amparo na lei). (...) Por isso, em casos assim, a jurisprudência – de todos os tribunais do País, repita-se – pacificou-se no sentido de admitir o habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, o qual é apresentado “no lugar” ou “em substituição” do recurso legalmente cabível (que é o recurso ordinário). Busca-se, com isso, evitar um mal maior e impedir que o constrangimento ilegal seja mantido sem um remédio ou socorro imediato, o que sem dúvida constitui um das marcas mais significativas de nosso Estado Democrático de Direito. O uso do chamado habeas corpus substitutivo de recurso ordinário é justificável, portanto, pela urgência do caso concreto e pela morosidade no trâmite do recurso ordinário (tanto na instância inferior quanto na instância superior). As principais causas de tal morosidade são as seguintes: 1) o trâmite do recurso ordinário se dá na instância em que ocorreu a ilegalidade (instância inferior), para subir ao Tribunal (instância superior) somente após o seu término; 2) durante este trâmite, a parte contrária geralmente o Ministério Público –, é chamada a apresentar contrarrazões ao recurso, o que ainda ocorre na instância inferior; 3) somente, então, o recurso ordinário é remetido à instância superior, onde será distribuído a um relator. A inexistência de liminar no recurso ordinário é, sem dúvida, outro argumento que justifica o uso imediato do habeas corpus substitutivo, em que a liminar é cabível, desde que demonstrada a manifesta ilegalidade e a urgência do caso concreto (p. ex., a prisão ilegal). A abolição do habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, em prol exclusivamente do uso do recurso ordinário de habeas corpus, tal como decidido recentemente pelo STF (1.ª Turma) e seguida agora pelo STJ (5.ª Turma), trará consequências gravíssimas – e ainda incalculáveis – aos cidadãos, especialmente nos casos de patente ilegalidade na liberdade de ir e vir. Daí o grave atentado à democracia praticado pelos Tribunais Superiores. Isso porque, no caso de ser negado o habeas corpus na instância inferior, o cidadão terá que aguardar todo o trâmite do recurso ordinário, inclusive a publicação do acórdão, para somente então ingressar com o recurso ordinário, que passará por todo um trâmite na instância inferior, até chegar à instância superior, o que pode levar meses ou até anos! (...) Em poucas palavras: a abolição dos habeas corpus substitutivos de recurso ordinário reduzirá, quando muito, os processos em apenas 8,6%! Não há dúvida, portanto, de que o preço que se pagará por tal economia sobretudo sob a ótica dos direitos e garantias individuais, que é a base do nosso Estado Social e Democrático de Direito – será enorme e desproporcional, não parecendo ser esse o melhor caminho para se resolver a sobrecarga de processos nos Tribunais Superiores. Isso sem mencionar a avalanche de medidas cautelares inominadas que certamente invadirá o STF ou mesmo o STJ nos casos de urgência inadiável (prisão ilegal, p. ex.), em que o paciente não poderá aguardar todo trâmite – moroso e burocrático – do recurso ordinário na instância inferior. Por fim, a precariedade dos argumentos do STF e do STJ, data vênia, é tamanha que a jurisprudência atual desses mesmos Tribunais tem aberto exceções para conceder habeas corpus “de ofício” nos casos de patente ilegalidade e desde que o habeas corpus tenha sido protocolizado antes da mudança do entendimento jurisprudencial do STF (ou seja, antes de 07.08.2012). Ora, tal entendimento na verdade coloca em “xeque-mate” o entendimento atualmente defendido pelo STF e pelo STJ (a abolição dos habeas corpus substitutivos), pois demonstra que há situações de grave ilegalidade que precisam ser urgentemente conhecidas e solucionadas (como se diz na praxe forense, “de ofício”), não podendo aguardar o trâmite moroso e burocrático do recurso ordinário. Ora, de que forma o STF ou o STJ podem vir a conhecer da ilegalidade (a ser sanada “de ofício”), senão pelo manejo do habeas corpus substitutivo?! A abolição deste último impedirá o conhecimento da ilegalidade por parte do Tribunal, ficando a ilegalidade sem remédio algum (fato, aliás, que viola a garantia prevista no art. 5.º, inciso XXXV, da CF: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”). Por fim, rebatendo ainda o entendimento do STF e do STJ, não parece lógico, razoável nem justo separar a questão entre habeas corpus protocolizados antes e depois de 07.08.2012. A 6.ª Turma do STJ, embora no geral acompanhe o entendimento inaugurado pelo STF e acolhido integralmente pela 5.ª Turma do STJ, demonstrando sensibilidade ao tema e atenta à gravidade da mudança anunciada, abre uma exceção para admitir o enfrentamento da matéria (ainda que trazida pela via inadequada do habeas corpus substitutivo) para “fazer cessar manifesta ilegalidade que resulte no cerceamento do direito de ir e vir do paciente” (vide HC 211.806/MG, rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira, j. 27.11.2012, DJe 05.12.2012). É uma luz no fim do túnel. Como dito, há casos urgentes que não podem aguardar o trâmite moroso do recurso ordinário, e precisam de solução imediata, sendo o habeas corpus substitutivo o único meio viável em nosso sistema para atender a essa urgência. Como disse o eminente advogado criminalista Dr. Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, em recente almoço realizado pelo MDA – Movimento de Defesa da Advocacia, “querem resolver a doença matando o doente”, referindo-se, é claro, às recentes decisões do STF e do STJ sobre a matéria.”[7]
De toda maneira, ressalta-se ser desnecessário o instrumento procuratório para a interposição do recurso ordinário. Neste sentido, veja-se a lição de Alberto Zacharias Toron:
"Depois que o Superior Tribunal de Justiça, na linha da jurisprudência da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, começou a restringir a impetração de Habeas Corpus originários, substitutivos do recurso, a interposição deste, a despeito de o seu processamento ser mais moroso, se avolumou. Agora, além das conhecidas restrições ao Habeas Corpus, eis que surge uma nova: a exigência de procuração para a interposição do RHC. Logo viveremos a realidade do “no day in court”, tão bem descrita por Sarah Staszak numa referência à contradição entre o proclamado acesso à Justiça e as políticas restritivas do Judiciário.O artigo 654 do CPP é taxativo quanto à legitimação ativa de “qualquer pessoa” para impetrar Habeas Corpus. Este também é o teor do artigo 1º, parágrafo 1º, do Estatuto do Advogado (Lei 8.906/94) que é expresso em determinar que “não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de Habeas Corpus em qualquer instância ou tribunal”.Sendo o writ of Habeas Corpus uma garantia constitucional de defesa de direitos fundamentais, em especial o direito à liberdade, é natural que o legislador de 1941 (CPP) e também o de 94 (Estatuto da OAB) tenham afastado formalismos no seu manejo.Como procedentemente apontam Nalini e Xavier de Aquino, “a tendência pretoriana a restringir o Habeas Corpus, esvaziando-o de seu conteúdo, mediante apreciação formalística de seus requisitos”, sela-o de morte. E tão relevante é o direito discutido no habeas que os Regimentos internos do STF (art. 191, I) e do STJ (art. 201, I) facultam ao relator a nomeação de advogado “para acompanhar e defender oralmente o habeas corpus impetrado por pessoa que não seja bacharel em Direito”.A despeito de a jurisprudência do STF, de longa data, como registra o saudoso Mirabete, proclamar a desnecessidade de procuração para o manejo de um RHC, pois, “se qualquer pessoa pode impetrar habeas corpus em favor de terceiro sem mandato deste, pode-se igualmente sem procuração recorrer da decisão denegatória.Precedentes do STF (RT 631/389)”, o STJ, recentemente, começou a erguer jurisprudência segundo a qual “’na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos’ (Enunciado da Súmula n. 115 desta eg. Corte)”. No corpo do julgado, o Min. Félix Fischer traz a colação o decidido pela 6ª Turma do STJ no RHC n. 52.995/RJ, assim ementado:- Incidente no caso o disposto no Enunciado n. 115 da Súmula desta Corte, porquanto ausente dos autos, no momento de interposição do recurso, o instrumento de mandato endereçado ao advogado subscritor da petição de recurso ordinário. Ademais, nos termos da jurisprudência desta Corte, não se admite a posterior regularização da capacidade postulatória, com a juntada tardia aos autos do instrumento de mandato. [...]Recurso ordinário desprovido" (RHC 52.995/RJ, Sexta Turma, Rel. Min. Ericson Maranho - Des. conv. do TJ/SP, DJe de 3/2/2015).Há, ainda, na mesma linha, o AgRg no RHC n. 52.916/SP da relatoria do Min. Gurgel de Faria (DJe 3/12/2014) e AgRg no RHC n. 40.896, rel. Min Sebastião Reis Jr. (DJe 27/6/2014).Afora a sólida jurisprudência do STF em sentido contrário, ao menos quatro questões mostram o desacerto do entendimento do STJ na matéria em exame:O RHC não é “instância especial” nos termos da Súmula 115 do STJ;Não há lógica em se permitir o manejo do habeas sem procuração e, simultaneamente, exigir-se procuração para o seu recurso;O Tribunal não pode criar condição extralegal para a impetração do habeas corpus;O impetrante é parte, não é mandatário do paciente. Portanto, ele recorre em nome próprio.A ideia de que o Recurso Ordinário em habeas corpus representa uma “instância especial”, briga com a expressa disposição legal constante do art. 30 da Lei 8.038/90, que fala em “recurso ordinário em habeas corpus”.Briga também com a própria Constituição Federal que é, igualmente, expressa ao atribuir competência ao STJ para julgar em “recurso ordinário” os habeas corpus decididos em única ou última instancia pelos Tribunais... (CF, art. 105, II, a).A Constituição Federal, no art. 105, III, alude ao recurso especial cabível contra as causas decididas em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais, do Distrito Federal ou pelos Tribunais de Justiça. É só nesta hipótese que se pode falar em “instância especial”.Basta dizer que todos os precedentes que deram base à construção da Súmula 115 do STJ são tirados de recursos especiais. Ou seja, a incidência da referida Súmula não pode ser alargada para alcançar hipótese representada por recurso ordinário constitucional.De se lembrar com o Ministro Marco Aurélio, que o Direito é ciência e, como tal, seus vocábulos têm sentido próprio (HC n. 114.770). Ora, se o verbete da Súmula 115 do STJ foi erguido para situações abrangidas pelo recurso especial e, bem por isso, alude à “instância especial”, causa espécie que se subverta o conteúdo do verbete para se alcançar o recurso ordinário constitucional em habeas corpus.Há mais. Qual é a lógica de se permitir o manejo do habeas sem procuração e não o seu recurso?Antiga jurisprudência do STF, da lavra do Min. Djaci Falcão, supra referida, responde com propriedade à questão:Se qualquer pessoa pode impetrar habeas corpus em favor de terceiro, sem mandado deste, pode-se igualmente sem procuração, recorrer da decisão denegatória. Precedentes do S.T.F RHC n. 66.144 (DJ 20/5/1998 ou na RT 631/389).Mais recentemente, no RHC n. 121.555/PE (DJe 25/3/2014), debruçando-se sobre o tema, a Min. Rosa Weber, em decisão monocrática, averbou que a posição sufragada pelo STJ, no ponto, contraria a jurisprudência de STF, verbis:“Embora esse posicionamento seja contrário ao predominante nesta Suprema Corte, que se orienta no sentido de “não se exigir habilitação legal para impetração originária do writ ou para interposição do respectivo recurso ordinário” (HC 86.307/SP, Rel. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ 26.5.2006; igualmente: HC 84.719/MG, Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJ 26.11.2004), a matéria de fundo do recurso foi devidamente analisada pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, ao fim, concluiu não ser hipótese de concessão de eventual ordem de ofício no habeas corpus.Também o Min. Maurício Corrêa, no AgR-AgR no RE n. 273.762 (DJ 10/10/2001), em decisão monocrática, rechaçou a exigência de procuração para a interposição de RHC, disse:(...) denegado o "writ" no tribunal de origem, aceita-se a interposição, pelo impetrante - independentemente de habilitação legal ou de representação - de recurso ordinário constitucional (HC nº 73.455, Rezek, DJ de 07.03.97, Segunda Turma; RHC nº 60.421, Moreira Alves, DJ de 22.04.83, Segunda Turma; HC nº 64.116, Sydney Sanches, DJ de 24.10.86, Primeira Turma, dentre outros).Todavia, dada a peculiaridade do caso e a justificativa do recorrente de que foi induzido a equívoco em razão de na autuação do processo figurar o paciente como recorrido e não um dos impetrantes do writ, reconsidero a decisão que declarou inexistente o primeiro agravo regimental.De mais a mais, ainda que se queira desprezar os argumentos precedentes, não se pode ignorar que o RHC pode ser substituído pela impetração de habeas corpus originária, segundo a firme jurisprudência da 2ª Turma do STJ.Assim sendo, soa extravagante que se permita a impetração originária substitutiva do recurso, feita por pessoa sem instrumento de mandato, mas o recurso não.Cria-se uma injustificável disparidade de tratamento que, em primeira e última análise, representa um formalismo incompatível com a garantia constitucional que direta ou indiretamente cuida da liberdade.No mais, é de se advertir, consoante sábia jurisprudência do próprio STJ, aliás, lavrada pelo saudoso Min. Assis Toledo, que “não pode o Tribunal criar condição extralegal para a impetração do habeas corpus (STJ, RHC 113, 5ª T., DJ 6/11/89)”.Embora o julgado em apreço tratasse da possibilidade de se recorrer da decisão que não conhecesse da habeas na instância de origem, a diretriz traçada se aplica com exatidão para o caso em que, pela via exegética, se quer criar condição não prevista em lei para o conhecimento do recurso de habeas corpus, vale dizer, procuração do advogado-impetrante ou “qualquer pessoa-impetrante”.Mais grave, repita-se, é que se está invocando uma Súmula que tem incidência aos casos de “instância especial” que o recurso ordinário, diz o próprio nome, não representa.Por fim, mas não menos importante, é de se lembrar que o impetrante é parte no habeas corpus, não representa, no sentido processual da expressão, o paciente. Portanto, ele, quando recorre, o faz em nome próprio.Expliquemo-nos: quando o advogado (ou qualquer pessoa sem ter essa qualificação) impetra o habeas o faz “em favor do paciente”. Vale dizer, não age por procuração, como representante do paciente no sentido processual do termo. Não é seu mandatário. Tem voz e legitimação ativa próprias.Assim, quando a ordem é denegada na origem, o impetrante, como parte que é, tem legitimidade recursal em nome próprio. A se seguir a jurisprudência do STJ cairíamos no absurdo de ter que se outorgar procuração em causa própria ou, pior ainda, ter que pedi-la ao paciente para atuar em seu nome, quando a lei não o exige!Enfim, a jurisprudência do STJ, que, lamentavelmente, começa a ganhar corpo, merece ser repensada e afastada pela odiosa restrição que acolhe em matéria onde deveria imperar a tão decantada “instrumentalidade das formas”, sempre lembrada para estreitar garantias, mas raramente para lhes dar vida." Fonte: Revista Consultor Jurídico, 22 de abril de 2015, 9h30 (http://www.conjur.com.br/2015-abr-22/alberto-toron-necessaria-procuracao-interpor-recurso-ordinario-hc).
Resta-nos, então, confiar que o Pleno da Corte Constitucional melhor reflita e mude esta esdrúxula orientação, pois, como já afirmava James Goldshimidt[8] no clássico “Problemas Jurídicos e Políticos del Proceso Penal” que a estrutura do processo penal de um país indica a força de seus elementos autoritários e liberais.[9] Não vamos confundir uma garantia constitucional do porte do Habeas Corpus com uma mera outra pretensão. Leiam, então, Pontes de Miranda: “História e Prática do Habeas Corpus”, Tomos I e II, cuja última edição foi publicada pela Editora Bookseller, Campinas, em 1999. Aliás, a primeira edição desta obra é de 1916, quando o autor só tinha vinte e três anos!
2) O conhecimento do habeas corpus pressupõe prova pré-constituída do direito alegado, devendo a parte demonstrar de maneira inequívoca a pretensão deduzida e a existência do evidente constrangimento ilegal.
3) O trancamento da ação penal pela via do habeas corpus é medida excepcional, admissível apenas quando demonstrada a falta de justa causa (materialidade do crime e indícios de autoria), a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.
4) O habeas corpus é ação de rito célere e de cognição sumária, não se prestando a analisar alegações relativas à absolvição que demandam o revolvimento de provas.
5) O habeas corpus não é a via adequada para o exame aprofundado de provas a fim de averiguar a condição econômica do devedor, a necessidade do credor e o eventual excesso do valor dos alimentos, admitindo-se nos casos de flagrante ilegalidade da prisão civil.
Estas quatro teses tratam de um mesmo aspecto do processo do Habeas Corpus.
Como se sabe, em princípio, o Habeas Corpus não é remédio cabível para o exame aprofundado da prova, sendo esta uma posição predominante na doutrina e na jurisprudência pátrias.
Nada obstante, em caráter excepcional e em determinados casos, o próprio Supremo Tribunal vem admitindo o revolvimento do material probatório, especialmente quando se trata de alegação de conduta atípica. Neste sentido, a Turma, por maioria, concedeu habeas corpus para restabelecer a decisão absolutória do juízo processante. Tratava-se de writ em que se questionava condenação fundada unicamente em elementos colhidos na fase investigatória. No caso, o paciente, absolvido pelo juízo monocrático, tivera sua sentença reformada pela Corte estadual com base em depoimentos colhidos no inquérito, muito embora houvessem sido refutados em juízo. Inicialmente, superou-se a preliminar suscitada pelo Ministério Público Federal no sentido do não conhecimento da impetração ante a necessidade de revisão dos elementos probatórios coligidos no processo. Asseverou-se, no ponto, que o não conhecimento do writ resultaria em violência ao princípio do acesso ao Judiciário, o qual visa afastar lesão ou ameaça de lesão a direito. Vencido o Min. Ricardo Lewandowski.
Nesse sentido, ensina Alberto Silva Franco:
“O exame do material probatório não deve ser submetido a uma aferição em profundidade. Pelo menos, via de regra. Há certas situações, no entanto, que autorizam sua análise mais aprofundada. Por exemplo, nos casos em que se recorre ao habeas corpus para o trancamento de ação penal. Não se trata aqui de um exame de mérito da imputação, mas apenas da verificação da legalidade ou não da ação penal." (Código de Processo Penal e sua interpretação jurisprudencial, volume 1, 2ª ed. rev., atualizada e ampliada, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 1560).
6) O reexame da dosimetria da pena em sede de habeas corpus somente é possível quando evidenciada flagrante ilegalidade e não demandar análise do conjunto probatório.
Não é bem assim que entende o Supremo Tribunal Federal.
Com efeito, o Ministro Dias Toffoli, relator do Habeas Corpus nº. 123691, impetrado em defesa de condenados por gestão fraudulenta na administração de uma corretora, deferiu pedido incidental de liminar para assegurar a liberdade dos pacientes até a conclusão do julgamento do HC que questiona a dosimetria das penas. A análise do processo foi iniciada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e interrompido por um pedido de vista do ministro Luiz Fux, após o voto do ministro Dias Toffoli – quando ainda integrava esse colegiado – indeferindo o habeas. De acordo com o ministro Toffoli, como o HC impetrado no STF tem relação direta com a dosimetria das penas impostas, o resultado do julgamento pode resultar na mudança do regime inicial fixado para seu cumprimento e também na própria duração da pena, caso a Turma acolha os argumentos da defesa.Por esse motivo, o ministro considerou caracterizados os requisitos que justificam a concessão da liminar e suspendeu a execução das penas até a conclusão do julgamento do habeas corpus. “Nesse contexto, reconheço a plausibilidade jurídica dos argumentos incidentais trazidos pelos impetrantes, já que, a depender do resultado do julgamento, a execução imediata das reprimendas impostas aos pacientes poderá ocorrer de forma mais gravosa, o que, aliás, é repelida pela jurisprudência da Corte”, afirmou o relator em sua decisão. O Ministro Toffoli suspendeu também a prescrição executória das penas enquanto perdurar a liminar.
No mesmo sentido: Habeas Corpus nº. 106380; Habeas Corpus nº. 113413, Habeas Corpus nº. 112449, Habeas Corpus nº. 109987, Habeas Corpus nº. 107532, Habeas Corpus nº. 110213, Habeas Corpus nº. 101909, Habeas Corpus nº. 108523, Habeas Corpus nº. 110302, Habeas Corpus nº. 101118, etc., etc.
7) Não obstante o disposto no art. 142, § 2º, da Constituição Federal, admite-se habeas corpus contra punições disciplinares militares para análise da regularidade formal do procedimento administrativo ou de manifesta teratologia.
Esta tese já é consagrada no Supremo Tribunal Federal, a saber:
“Recurso Ordinário Em Habeas Corpus 88.543-8 São Paulo - Relator: Min. Ricardo Lewandowski. A legalidade da imposição de punição constritiva da liberdade, em procedimento administrativo castrense, pode ser discutida por meio de habeas corpus. Precedentes.”
Vejamos este trecho do voto:
“(...) Cumpre notar que a via processual eleita para a discussão da legalidade da imposição de pena por suposta prática de infração disciplinar mostra-se correta, eis que está em causa a liberdade de locomoção do paciente, E não se diga que tal é vedado pelo art. 142, § 2º, da Carta Magna, visto que o que nele se proíbe é o exame do mérito da punição disciplinar, sendo lícito ao Judiciário, como reconhece a jurisprudência desta Corte, examinar os aspectos extrínse3cos do ato, isto é, os seus pressupostos de legalidade (RE 33440/RS, Rel. Min. Ellen Gracie; HC 70648/RJ, Rel. Min. Moreira Alves; HC 73.257/RJ, Rel. Min. Maurício Corrêa). Não cabe, todavia, à Justiça Militar da União, como se viu, julgar o presente writ porque lhe falece competência para tanto. Tenho que se cuida de hipótese prevista no inciso VII do artigo 109 da Carta Magna, segundo o qual compete à Justiça Federal julgar “os habeas-corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição.” Com efeito, o ato de membro das Forças Armadas, quando diverso de crime militar, não está sujeito à jurisdição castrense, submetendo-se o julgamento dos habeas corpus para o exame da legalidade das punições impostas pela prática de infrações disciplinares, que possam redundar na constrição da liberdade, à Justiça Federal comum. Todavia, a reprimenda já foi cumprida em sua integralidade, redundando em prejuízo ao presente HC. Ante o exposto, julgo o presente writ prejudicado.”
Eis o entendimento de Irineu Ozires Cunha doutrinário:
"As corporações militares discutem constantemente sobre cabimento ou não do Habeas Corpus em prisões disciplinares militares. A celeuma aumentou, muito mais, com a entrada em vigor da nova Constituição Federal em 1988, que em seu Art. 142 § 2.º estabelece: Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. § 2.º - Não caberá “habeas-corpus” em relação a punições disciplinares militares. Essa afirmação trouxe inquietude, principalmente no meio jurídico, mas foi muito mais forte no seio das praças, que passaram a acreditar num corporativismo advindo dos escalões superiores em relação a eles. Isto tudo não aconteceu, até por que, com a nova ordem constitucional, as organizações militares entenderam exatamente o significado do texto e é certo que para um comandante poder exercer o seu poder disciplinar, que é a sua capacidade de aplicar os regulamentos disciplinares punindo os seus subordinados, não o faria de forma arbitrária, sob pena de ver o seu ato invalidade dentro da própria caserna. Não há o que se negar a resistência no interior dos quartéis foi e ainda é muito grande, pois os menos avisados acreditam que o exercício desse remédio compromete a sua autoridade e como corolário a disciplina e a hierarquia. É um engano muito grande dos que assim pensam, visto que, o instituto não é uma ameaça que paira sobre a cabeça da autoridade competente para punir, mas ele serve para todos os militares do soldado ao general. Lamentavelmente o que sucede é que, ainda as escolas de formação, tanto de graduados, como de oficiais ensinam que o subordinado é sempre o soldado e às vezes, o sargento, o oficial, principalmente não consegue se enxergar como subordinado. Daí porque qualquer coisa que possa resultar em benefício para o subordinado, que na relação hierárquica, também é, acredita que será um atraso para a disciplina. Compreendamos a men legislatoris ao inserir tal parágrafo no artigo 152 da Constituição Federal, é evidente, não quis barrar de vez o hábeas corpus em prisões disciplinares, até por que o próprio Decreto 4.346, de 26 de agosto de 2002 em seu Art. 35 § 2.º, definiu regras claras do que seja ampla defesa e contraditório em processo disciplinar administrativo. O legislador, por certo, não queria, ao editar a regra, uma invasão do judiciário nas questões disciplinares dos quartéis, sob pena de aí sim deteriorar as relações entre os superiores e subordinados de forma que aqueles, de fato, não conseguiriam comandar suas tropas, caso houvesse essa intromissão nas relações mais simples de convivência nas organizações militares. Mas é certo, também que com aquele parágrafo não quer permitir que se instalem os abusos dentro dessas Instituições, pois que aqueles militares, igualmente são cidadãos e a Constituição Federal ao criar os seus institutos disse que todos são iguais perante a lei, sem qualquer distinção. Por isso, mesmo dentro dos quartéis, as ilegalidades e os abusos estão proibidos e em casos que tais o judiciário terá que apreciar pedido que faça remissão a tais comportamentos, sem que com isso interfira na autoridade do comandante de determinada Unidade Militar, quer seja das Forças Armadas ou de Forças Auxiliares (Polícias Militares).A tese de que o Judiciário não pode adentrar no mérito das decisões administrativas está errada, e toda vez que se estiver cometendo, em processo administrativo militar qualquer tipo de abuso, e aquele órgão for chamado a se manifestar deve fazê-lo sem o pejo de estar decidindo pelo administrador.O Poder Judiciário, portanto, não pode e não deve ser apenas um homologador das decisões proferidas pela Administração Pública. Todas as vezes que o juiz verificar que houve uma ilegalidade ou mesmo que o mérito do ato administrativo se afastou dos princípios constitucionais, ou se encontra marcado pelo excesso, pelo arbítrio, ou qualquer outra situação, deverá corrigir esta situação.A teoria segundo a qual o Poder Judiciário não tem competência para analisar o mérito do ato administrativo e que foi tão defendido por Hely Lopes Meirelles e outros, não deve mais prevalecer em respeito ao vigente texto constitucional. Afinal, caso seja necessário e em atendimento ao princípio constitucional segundo o qual, “nenhuma lesão ou ameaça a direito deixará de ser apreciada pelo Poder Judiciário”, art. 5.º, inciso XXXV, da CF, o juiz deverá adentrar no mérito do ato administrativo, o que não significa, como já disse, interferência na autonomia da Administração Pública, mas o cumprimento de um direito fundamental assegurado a todos aqueles que vivem no território nacional.Atualmente, o processo administrativo disciplinar, encontra-se sujeito aos princípios constitucionais. As afirmativas segundo as quais o processo administrativo não se assemelha ao processo judicial, com o advento da Constituição Federal de 1988, perdeu o seu significado. Na realidade, o que existe são as espécies de procedimentos que devem ser observados, conforme a natureza da transgressão disciplinar praticada, na busca de um processo administrativo disciplinar constitucional.Ainda que o procedimento seja sumário os institutos da ampla defesa e do contraditório devem estar presentes sob pena de violação dos preceitos constitucionais. A disciplina e hierarquia são e continuaram sendo os pilares das forças militares, mas isto não significa que sanções disciplinares poderão se afastar das disposições que foram estabelecidas pelo legislador constituinte de 1988.Há julgado do STF no sentido de que não há vedação para conhecimento das ações de habeas corpus da lavra do Ministro Sepúlveda Pertence:“O entendimento relativo ao § 2.º da art. 142 da EC/1969, segundo o qual o princípio, de que nas transgressões disciplinares não cabia habeas corpus, não impedia que se examinassem, nele, a ocorrência dos quatro pressupostos de legalidade dessas transgressões (hierarquia, poder disciplinar, o ato ligado à função e pena suscetível de ser aplicada disciplinarmente), continua válido para o disposto no § 2.º do art. 142 da atual CF que é apenas mais restritivo quanto ao âmbito dessas transgressões disciplinares, pois a limita às de natureza militar. Habeas corpus deferido para que o STJ julgue o writ que foi impetrado perante ele, afastada a preliminar de seu não - cabimento. Manutenção da liminar deferida no presente habeas corpus até que o relator possa apreciá-la, para mantê-la ou não”.Diante de tudo e antes que passemos aos comentários de cada inciso deste anexo, a conclusão é pelo cabimento do habeas corpus na prisão disciplinar militar decorrente de ilegalidade e abuso de poder. Entre outras situações cabe o remédio heróico: (a) quando a autoridade militar coatora não seja competente (art. 10 do Decr. 4.346, RDE), para aplicar a punição (não há o ato-ligado à função); (b) quando o fato que enseja a punição não esteja tipificado (anexo I, do RDE) como transgressão no regulamento (violação do inciso II da art. 5.º); (c) quando o procedimento administrativo não atendeu ao devido processo legal e todos os seus corolários da ampla defesa e do contraditório (art. 35 § 2.º Decr. 4.346) que a Constituição assegura a todos os acusados em geral (“ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, inciso LIV do art. 5.º da CF/88); (d) a autoridade legítima para aplicar a punição não atendeu aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade (art. 16 usque 20 do Dec. 4.346, RDE) que deve governar os atos das autoridades militares (prisão abusiva); (e) quando o militar estiver preso por tempo superior ao prescrito na decisão, principalmente.Os comentários feitos aqui, parte especial, do Regulamento Disciplinar do Exército, não são pela subtração da autoridade militar, seu legítimo poder disciplinador, o que seria um absurdo. Mas, utilizar-se da prisão como restrição do direito de ir e vir, confinando o militar, a fim de assegurar a disciplina sem a garantia da ampla defesa e do contraditório ou de forma coarctada não é, convenhamos o caminho democrático de exercer a cidadania. O que quero dizer é que se a infração disciplinar atingiu, dada magnitude, a ensejar pena de prisão de trinta dias, por exemplo, será que esse militar deve continuar compondo os quadros da Corporação ou ser excluído a bem da disciplina? Não seria uma ilusão acreditar que o cidadão irá se emendar após sua detenção? Certamente que o Conselho de Disciplina ou de Justificação é o “santo” remédio, que precisa ser ministrado e aí sim, não devem intervir os defensores dos oprimidos com expressões: “mas ele tem família, foi sempre um bom militar, é bom de serviço” e tantas outras que já conhecemos.Não há o que se discutir o legislador jamais pretendeu abrir, com o art. 142 e seu parágrafo segundo, as portas para os abusos e as ilegalidades dentro dos Quartéis de qualquer das Instituições, sejam federais ou estaduais." (Do cabimento de habeas corpus nas punições decorrentes de processo administrativo militar, publicado no www.paranaonline.com.br, com acesso no dia 08 de abril de 2007).
"Questão tormentosa em que se depara o Superior Tribunal Militar é o caso do cabimento de HC em relação à punição disciplinar militar. O Supremo Tribunal Federal já pacificou a matéria (Habeas Corpus 70.6487/RJ). Ao interpretar o art. 142, § 2º da CF88, entendeu que não caberia Habeas Corpus em relação ao mérito da punição, mas caberia apreciação quanto à legalidade do ato. Frisa-se que a hierarquia e a disciplina são os valores que alicerçam o meio militar. A questão do Habeas Corpus em punição disciplinar é tormentosa, pois, de um lado, não se pode afastar o controle judicial sobre a legalidade da medida, e, de outro, não se pode afrouxar na punição militar, eis que a tropa precisa de exemplo. Mas, ainda assim, o STM tem se revelado liberal ao rever tais punições quando desumanas e ilegais."[10]
A respeito, não é despiciendo citar Ada Grinover:
“Por isso é que no Estado de direito o processo penal não pode deixar de representar tutela da liberdade pessoal; e no tocante à persecução criminal deve constituir-se na antítese do despotismo, abandonando todo e qualquer aviltamento da personalidade humana. O processo é uma expressão de civilização e de cultura e consequentemente se submete aos limites impostos pelo reconhecimento dos valores da dignidade do homem.” (in Liberdades Públicas e Processo Penal, RT, 2ª. ed., p. 52).
8) A ausência de assinatura do impetrante ou de alguém a seu rogo na inicial de habeas corpus inviabiliza o seu conhecimento, conforme o art. 654. § 1º, “c”, do Código de Processo Penal.
Efetivamente, “a identificação e assinatura do impetrante são essenciais, não podendo ser admitido pedido anônimo ou apócrifo", como afirmam Ada Grinover, Scarance e Gomes Filho.” (Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6ª. ed., 2009, p. 284). Observa-se que referidos autores, respaldam tal posicionamento com remansosa jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal (pp. 284 e 285).
Nada obstante, tendo em vista o princípio do favor libertatis, entendemos que cópia dos autos deve ser enviada à Defensoria Pública, a fim que se analise a possibilidade de atuação, in casu, daquele órgão.
09) Compete aos Tribunais de Justiça ou aos Tribunais Regionais Federais o julgamento dos pedidos de habeas corpus quando a autoridade coatora for Turma Recursal dos Juizados Especiais.
Discordamos frontalmente! Obviamente, é possível a impetração de habeas corpus e do Mandado de Segurança no procedimento sumaríssimo.
Nestes casos, se a autoridade coatora for o Juiz singular o julgamento não será pelas Turmas Recursais e sim pelo respectivo Tribunal, pois são ações autônomas de impugnação e não de recursos e o art. 98, I da Constituição Federal é claro ao estabelecer a competência das turmas recursais para o julgamento de recursos (voltamos a este assunto adiante); se o ato violador for imputado à Turma Recursal, o julgamento seria pelo Supremo Tribunal Federal[11]. O Supremo Tribunal Federal sumulou que “compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal o julgamento de habeas corpus contra decisão de turma recursal de juizados especiais criminais.” (Enunciado 690).
Porém, na sessão do dia 23 de agosto de 2006, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, por oito votos a três, declinar da competência para julgar habeas corpus impetrado contra decisão de Turma Recursal. A decisão foi adotada no julgamento do Habeas Corpus nº. 86834, impetrado contra a Turma Recursal do Juizado Especial Criminal da Comarca de Araçatuba/SP. Neste julgamento, o Ministro Sepúlveda Pertence abriu a divergência na matéria ao considerar que as turmas recursais dos Juizados Especiais não se sujeitam à hierarquia funcional da Justiça, argumentando que, pelo fato de a turma recursal já se configurar de fato um duplo grau de jurisdição, não poderia estar subordinado aos respectivos Tribunais de Justiça: “As Turmas de recurso dos juizados especiais, com efeito, sob o prisma da hierarquia jurisdicional estão em aparente paradoxo em plano mais elevado que os tribunais de segundo grau da União e dos Estados na medida em que, a exemplo dos tribunais superiores, sujeitam-se imediata e exclusivamente a jurisdição do Supremo Tribunal Federal, dada a competência deste, e só dele, de rever suas decisões mediante recurso extraordinário. De tudo resulta que também e apenas o Supremo Tribunal Federal detém competência para julgar o presente habeas corpus”. Na avaliação do Ministro Pertence, os juizados especiais fugiriam de seu propósito, isto é, dar agilidade ao processamento das causas, quando constitucionais, se este tivesse que se sujeitar aos Tribunais de alçada ou Tribunais de Justiça e, posteriormente, ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal. A divergência aberta foi acompanhada pela Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha e pelo Ministro Celso de Mello. Mas os demais Ministros acompanharam o voto do relator, Ministro Marco Aurélio. Dessa forma, nos termos do voto do relator, a interpretação de que se deve seguir a hierarquia funcional dos Tribunais e, por isso, o processamento de habeas corpus impetrado contra decisão de Turma Recursal nos Tribunais de Justiça foi vencedor:
“HABEAS CORPUS 86.834-7 SÃO PAULO - RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO – Estando os integrantes das turmas recursais dos juizados especiais submetidos, nos crimes comuns e nos de responsabilidade, à jurisdição do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal, incumbe a cada qual, conforme o caso, julgar os habeas impetrados contra ato que tenham praticado.”
Vejamos este trecho do voto:
“(...) Consoante dispõe o artigo 96, inciso III, da Constituição Federal, aos tribunais de justiça cabe processar e julgar os juízes estaduais nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral. Então, imputado o ato de constrangimento a turma recursal de juizado especial criminal,incumbe ao tribunal de justiça examinar o habeas. Essa óptica é reforçada pelo fato de a competência originária e recursal do Supremo estar fixada na própria Carta, e aí não se tem preceito a versá-las que, interpretado e aplicado, conduza à conclusão sobre competir a esta Corte apreciar os habeas ajuizados contra atos de turmas recursais criminais, tratando-se de processo concernente a delito de menor potencial ofensivo. Considerado o disposto no artigo 102, inciso I, da Lei Fundamental, compete ao Supremo julgar hábeas corpus sendo pacientes o Presidente e o Vice-Presidente da República, os membros do Congresso Nacional, os próprios ministros da Corte, o Procurador-Geral da República, os ministros de Estado, os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os membros dos tribunais superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente. Relativamente à alínea “i” do citado inciso e tendo em vista atos de tribunais, veio à balha a Emenda Constitucional nº 22/99, explicitando que cumpre ao Supremo julgar os habeas uma vez envolvida Corte possuidora da qualificação de superior, sendo destinado ao Superior Tribunal de Justiça o julgamento das demais impetrações voltadas a afastar ato de tribunal que não tenha tal qualificação. Constitui até mesmo paradoxo interpretar o Diploma Básico, assentando-se que ao Supremo apenas cabe julgar o habeas quando se cuida de ato de tribunal superior, e apreciar toda e qualquer impetração direcionada ao afastamento de ato de turma recursal criminal cujos integrantes não compõem sequer tribunal. Vale frisar também que está no âmbito da competência do Supremo, ante a alínea “i” referida, os habeas que revelem como coator autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à respectiva jurisdição ou se trate de crime sujeito a mesma jurisdição em uma única instância, o que não é o caso. Em quadra na qual se nota que o Supremo fechará o ano com cerca de 78 mil processos distribuídos aos respectivos integrantes, cumpre o apego maior à definição da competência da Corte, estabelecida pela Constituição Federal. Por isso, articulo mais uma vez a matéria, concluindo não incumbir ao Supremo julgar habeas quando o ato impugnado decorra de atuação de turma recursal de juizado especial criminal, concluindo pela competência do tribunal de justiça ou do tribunal regional a que vinculado o órgão apontado como coator. No caso, declino da competência para o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, mantida, até o exame pelo relator a que vier a ser distribuído este habeas, a liminar deferida.”
Depois deste primeiro julgamento, o Ministro Gilmar Mendes aplicou, em três Habeas Corpus que tramitavam na Corte, este mesmo entendimento sobre a incompetência do STF para analisar pedidos de habeas corpus contra atos de turmas ou colégios recursais de Juizados Especiais. Para o Ministro, não competeria mais ao STF processar e julgar as ações impetradas contra decisão de turmas recursais. As decisões foram tomadas pelo relator (monocraticamente) nos Habeas Corpus 87835, 89495 e 89460. No mesmo sentido foi a decisão do Ministro Marco Aurélio, proferida no Habeas Corpus nº. 90701. Portanto, o Enunciado 690 está superado, aguardando, tão somente, o seu cancelamento.
Portanto, “não compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, pedido de habeas corpus impetrado contra decisão de Turma Recursal vinculada ao sistema de Juizados Especiais. Com base nesse reiterado entendimento da Corte, o ministro Celso de Mello considerou inviável pedido feito no Habeas Corpus (HC) 104892. O Ministro Celso de Mello lembrou que o Plenário do STF, no julgamento do HC 86834, reformulou sua orientação jurisprudencial sobre essa questão. Segundo ele, a Corte passou a entender que compete a Tribunal de Justiça (ou a Tribunal Regional Federal, quando for o caso) - e não mais ao Supremo Tribunal Federal -, a atribuição jurisdicional para apreciar, em sede originária, pedido de habeas corpus impetrado contra decisão de Turma Recursal estruturada no âmbito dos Juizados Especiais. No mesmo sentido também os HCs 89630, 89916 e 101014.”
Em relação ao mandado de segurança, por votação unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais são competentes para julgar recursos interpostos contra atos emanados de tais juizados, sejam eles simples recursos ou mandados de segurança. A decisão, tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 586789, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), confirma acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que entendeu competir à Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Paraná examinar o cabimento de mandado de segurança, quando utilizado como substitutivo recursal, impetrado contra decisão de juiz federal, no exercício da jurisdição do Juizado Especial Federal. No julgamento, os ministros entenderam que, em virtude do caráter singular dos juizados especiais, não há subordinação deles aos Tribunais de Justiça, quando de abrangência estadual e, no caso dos de natureza federal, aos Tribunais Regionais Federais. Os Ministros que participaram da decisão foram unânimes em rechaçar a tese contrária. Segundo eles, admiti-la seria fulminar o próprio objetivo com que foram criados os juizados especiais: simplificar o processamento de causas menores pelo Judiciário, dando-lhes celeridade. E, no entender deles, essa simplificação implica resolver, na própria estrutura dos juizados especiais, de que fazem parte as turmas recursais, os processos a eles trazidos. O Ministro Gilmar Mendes chegou a qualificar de “fracasso do sucesso” o que ocorreu com os juizados especiais federais, justamente em virtude da simplicidade e celeridade da tramitação dos processos levados a seu julgamento. É que, ao contrário do que se imaginava, segundo ele, que chegaria a 200 mil o número de processos em tramitação atualmente, essa marca já ultrapassou os 2,5 milhões, superando o número de processos em tramit ação na justiça federal comum. Neste sentido, a unanimidade dos Ministros acompanhou o voto do relator, ministro Ricardo Lewandowski, cujo entendimento foi o de que a decisão está em sintonia com o que preconiza o artigo 98, inciso I, da Constituição Federal, ou seja: a criação, pela União, pelo Distrito Federal, pelos estados e territórios, de “juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau”. Segundo observou o Ministro Celso de Mello, ao acompanhar o voto do relator, o modelo dos juizados especiais se rege, não pelo duplo grau de jurisdição, mas pelo critério do duplo reexame, que se realiza no âmbito do pr imeiro grau de jurisdição. Portanto, segundo ele, não se tratava de discutir a adequação da via processual utilizada, mas apenas de definir o órgão competente para julgar originariamente o Mandado de Segurança. E este, também em seu entender, é a Turma Recursal dos Juizados Especiais.
Esta já era a posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, cristalizada no Enunciado 376: “Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial” e nas seguintes decisões:
“Processo REsp 690553/RS; RECURSO ESPECIAL 2004/0137430-8 - Relator(a) Ministro GILSON DIPP (1111) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA. O julgamento de mandado de segurança contra ato jurisdicional compete ao órgão colegiado competente em grau recursal, sendo inaplicável, in casu, o artigo 108, I , alínea "c", porque versa sobre decisão de Juiz Federal no exercício da jurisdição do juizado especial, competindo, assim, à Turma Recursal do Juizado Especial Federal e não ao Tribunal Regional Federal. VI - A teor do artigo 41 e respectivo § 1º da Lei 9.099/95 (aplicável aos Juizados Especiais Federais, por força do artigo artigo 1º da Lei 10.259/01), os recursos cabíveis das decisões dos juizados especiais devem ser julgados por Turmas Recursais. VII - Conforme já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça é a Turma Recursal competente para o julgamento do mandado de segurança impetrado pelo INSS contra ato de juiz federal com jurisdição no Juizado Especial Federal. Precedentes. VIII - Embora a Lei 10.259/01, em seu artigo 3º, § 1º, I, preceitue não se incluir na competência do Juizado Especial Cível as ações de mandado de segurança, toda vez que houver algum ato praticado com ilegalidade ou abuso de poder, o remédio cabível é o mandado de segurança, por se cuidar de uma garantia constitucional. De fato, é o mandado de segurança uma ação civil de rito sumário, previsto no artigo 5º da Constituição Federal, inserido no Título das Garantias e Direitos Fundamentais. IX - Não se inclui na competência do Juizado Especial Federal ações de mandado de segurança, quando houver casos em que o segurado entenda possuir algum direito líquido e queira exercê-lo contra o Instituto Nacional do Seguro Social. Com certeza, este possível direito líquido e certo deverá ser exercido na Justiça Federal e não no Juizado Especial Federal, por vedação expressa da Lei. Todavia, reprise-se, caso haja ato abusivo ou ilegal de juiz federal com atuação no Juizado Especial Federal, é cabível o mandado de segurança a ser julgado por Turma Recursal. X - Já restou assentado no RMS 18.433/MA, julgado pela Eg. Quinta Turma, o entendimento de que os Juizados Especiais foram instituídos no pressuposto de que as respectivas causas seriam resolvidas no âmbito de sua jurisdição. Caso assim não fosse, não haveria sentido em sua criação e, menos ainda, na instituição das respectivas Turmas Recursais, pois a estas foi dada a competência de revisar os julgados dos Juizados Especiais, recebam ou não estes julgados o nome de recurso. XI - Recurso conhecido, mas desprovido.”
“Processo CC 40319/MG; CONFLITO DE COMPETENCIA 2003/0172095-5 - Relator(a) Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA (1106) Órgão Julgador S3 - TERCEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 10/03/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 05.04.2004 p. 200 A competência para processar e julgar ação mandamental impetrada contra ato de Juizado Especial é da Turma Recursal. Precedentes. Conflito conhecido, declarando-se a competência da Turma Recursal dos Juizados Especiais de Ipatinga/MG.”
“Processo CC 40199 / MG ; CONFLITO DE COMPETENCIA 2003/0166412-8 Relator(a) Ministro NILSON NAVES (361) Relator(a) p/ Acórdão Ministro BARROS MONTEIRO (1089) Órgão Julgador CE - CORTE ESPECIAL Data do Julgamento 06/10/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 23.05.2005 p. 119 – A competência para processar e julgar o mandado de segurança, aí compreendido o poder de declarar a inadmissibilidade, é da Turma Recursal, e não do Tribunal de Justiça ou, onde houver, do Tribunal de Alçada.” (CC n. 38.190-MG). Conflito conhecido, declarado competente o suscitado.”
“Processo CC 38190/MG; CONFLITO DE COMPETENCIA 2003/0013900-5 Relator(a) Ministro ARI PARGENDLER (1104) Órgão Julgador T5 - QUINTA TURMA Data do Julgamento 09/04/2003 Data da Publicação/Fonte DJ 19.05.2003 p. 120 RDDP vol. 5 p. 143. A competência para processar e julgar o mandado de segurança, aí compreendido o poder de declarar – a inadmissibilidade, é da Turma Recursal, e não do Tribunal de Justiça ou, onde houver, do Tribunal de Alçada.”
Nada obstante, reafirmamos o nosso entendimento que o julgamento do habeas corpus impetrado contra decisão de Juiz do Juizado Especial Criminal não compete à Turma Recursal, tendo em vista o mesmo primeiro motivo acima indicado, ou seja, pelo fato da Turma Recursal, por força da Constituição Federal e da Lei nº. 9.099/95, julgar apenas recurso[14]. Atente-se para o disposto no art. 650, § 1º. do Código de Processo Penal, segundo o qual “a competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição.” Ora, o Juiz apontado como coator está no exercício da judicatura de primeiro grau, tanto quanto os Juízes componentes da Turma Julgadora, o que os impede de deliberar a respeito de ato àquele atribuído, salvo, evidentemente, quando se tratar de competência recursal, o que não é o caso.
É de Tourinho Filho a seguinte lição:
“Não nos parece, à primeira vista, possa a Turma de Recursos, constituída de três Juízes de primeira instância, ter competência para julgar habeas corpus quando a autoridade coatora for Juiz do Sistema dos Juizados Especiais, na dicção do § 1º. do art. 650 do CPP, que, na hierarquia das leis, está em plano superior às leis estaduais, ainda que complementares. Não bastasse isso, a Lei nº. 9.099/95 não lhe conferiu poderes para conhecer de habeas corpus nem de mandado de segurança.”[15]
Mirabete, entendendo desta mesma forma, aduz que se assim não o fosse poderia a “Turma recursal julgar que houve abuso de autoridade do Juiz, o que só pode ser definido pelo Tribunal de Justiça ou de Alçada, e não por decisão de juízes de primeiro grau, ainda que investidos na competência para apreciar recursos de seus pares.”[16]
Roberto Podval já escreveu: “Tendo em vista o nosso ordenamento jurídico, a não ser que se modifique toda a legislação, não vemos como possível justificar a possibilidade das Turmas Recursais decidirem os habeas corpus.”[17]
Esta foi, aliás, a décima segunda conclusão da Comissão Nacional da Escola Superior da Magistratura: “Os tribunais estaduais têm a competência originária para os habeas corpus e mandados de segurança quando coator Juiz especial, bem como para a revisão criminal de decisões condenatórias do Juizado Especial Criminal.”
No Estado da Bahia, a Lei Estadual nº. 7.033/97 que dispõe sobre o Sistema Estadual de Juizados Especiais Cíveis e Criminais expressamente prevê que “será do Tribunal de Justiça a competência para o habeas corpus e os Mandados de Segurança quando coator for o Juiz, bem como para a revisão criminal de decisões condenatórias do Juizado Especial Criminal.” (art. 14).
10) O habeas corpus não é via idônea para discussão da pena de multa ou prestação pecuniária, ante a ausência de ameaça ou violação à liberdade de locomoção.
11) O habeas corpus não pode ser impetrado em favor de pessoa jurídica, pois o writ tem por objetivo salvaguardar a liberdade de locomoção.
12) É incabível a impetração de habeas corpus para afastar penas acessórias de perda de cargo público ou graduação de militar imposta em sentença penal condenatória, por não existir lesão ou ameaça ao direito de locomoção.
13) É cabível habeas corpus preventivo quando há fundado receio de ocorrência de ofensa iminente à liberdade de locomoção.
14) A jurisprudência tem excepcionado o entendimento de que o habeas corpus não seria adequado para discutir questões relativas à guarda e adoção de crianças e adolescentes.
Estas cinco teses dizem respeito ao direito tutelado pela garantia constitucional: apenas o de locomoção. Evidentemente, o Habeas Corpus não é ação admissível para proteger direitos de uma pessoa jurídica, porquanto se trata de um remédio que visa a tutelar a liberdade física, a liberdade de locomoção do homem: ius manendi, ambulandi, eundi ultro citroque.
Nesse sentido, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal negou o pedido dos sócios do curtume “Campelo Indústria e Comércio Ltda.”, para que fosse encerrado um processo penal por crime ambiental movido contra a empresa. Antes de analisar o pedido principal, os Ministros discutiram inicialmente a possibilidade de se ajuizar Habeas Corpus em favor de uma pessoa jurídica. Isto porque a empresa consta como uma das eventuais favorecidas neste Habeas Corpus, ao lado de seus sócios. Os Ministros entenderam, contudo, que o habeas corpus tem como objetivo combater eventuais ilegalidades que tenham como consequência, mesmo que reflexa, o cerceamento da liberdade de ir, vir e ficar, o direito de locomoção, que se referem necessariamente a pessoas físicas. Quanto às pessoas jurídicas, as penas previstas na própria lei ambiental tratam de interdição, multa ou perda de bens. Mas não se fala em cercear a liberdade de ir e vir da pessoa jurídica. Com esse argumento, os Ministros negaram a possibilidade de analisar o pedido no tocante à empresa, e passaram a julgar o pedido apenas com relação aos empresários e sócios do curtume.
Saliente-se a lição de Renato Brasileiro, in verbis: “Em se tratando de ações penais não condenatórias, todavia, é mais fácil visualizar a importância do interesse-adequação. Basta pensar no exemplo de persecução penal em andamento por conduta manifestamente atípica a qual seja cominada apenas pena de multa. Em tal hipótese, o habeas corpus não será instrumento adequado para se buscar o trancamento do processo, já que o referido remédio constitucional está ligado à proteção da liberdade de locomoção (CF, art. 5º., LXVIII). Logo, como o não pagamento de multa não mais autoriza sua conversão em pena privativa de liberdade (CP, art. 51, com redação determinada pela Lei nº. 9.268/96), o instrumento adequado será o mandado de segurança. (…) Na mesma linha, se, durante o trâmite de um habeas corpus, o juiz ou tribunal verificar que já cessou a violência ou coação ilegal, julgará prejudicado o pedido, nos termos do art. 659 do CPP. Em tal hipótese, a extinção do processo sem a apreciação do mérito se dará pelo desaparecimento superveniente do interesse de agir, porquanto teira deixado de existir ameaça à liberdade de locomoção.”[18]
A respeito, mais uma vez, Ada Grinover, Scarance e Gomes Filho lecionam:
“Assim, deve ser negado o interesse de agir, por falta da adequação, sempre que se pedir o habeas corpus para remediar situações de ilegalidade contra outros direitos, mesmo aqueles que têm na liberdade de locomoção condição de seu exercício. (...) Para tais hipóteses adequado, em tese, o mandado de segurança, previsto na Constituição justamente para a proteção de ‘direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data’."
A tese é unanimemente adotada pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nºs. 69.926-0, 82812, 92921, 92280, 88747, etc., etc.
15) Não cabe habeas corpus contra decisão que denega liminar, salvo em hipóteses excepcionais, quando demonstrada flagrante ilegalidade ou teratologia da decisão impugnada, sob pena de indevida supressão de instância, nos termos da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal.
16) O agravo interno não é cabível contra decisão que defere ou indefere pedido de liminar em habeas corpus.
17) O julgamento do mérito do habeas corpus resulta na perda do objeto daquele impetrado na instância superior, na qual é impugnada decisão indeferitória da liminar.
Aliás, sobre aquele (des) Enunciado, o Ministro Celso de Mello afirmou que, pessoalmente, tenha posição divergente, “por entender possível a impetração de ‘habeas corpus’ contra decisão monocrática de ministro de Tribunal Superior”, cabendo-lhe, nada obstante. observar, “em respeito ao princípio da colegialidade, essa orientação restritiva que se consolidou em torno da utilização do remédio constitucional em questão.” (Habeas Corpus nº. 126047).
18) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a reiteração do pedido formulado em habeas corpus com base em fatos ou fundamentos novos.
Neste sentido, o Ministro Cezar Peluso arquivou o pedido de Habeas Corpus nº. 95407 impetrado em defesa de dois irmãos advogados que cumprem prisão preventiva, acusados de obter benefícios previdenciários de modo fraudulento. Segundo o Ministro Peluso, o pedido dos irmãos é o mesmo feito em outro habeas corpus impetrado no Supremo Tribunal Federal, que foi arquivado pelo Ministro Carlos Ayres Britto em maio deste ano. “É inadmissível a repetição de pedidos, sem inovação”, afirmou Peluso.
Também: Habeas Corpus nºs. 92267, 83131, 82407, 80636, 97137, 81383, 79948, etc. Heráclito Antônio Mossin leciona que: “É natural, porém, que simplesmente renovar sem inovar, isto é, sem aduzir outras provas que justifiquem a mudança de julgamento, em nada resolve a situação, pois, por certo, o destino do novo pedido será o mesmo do anterior."
Notas e Referências:
[1] História e Prática do Habeas Corpus, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1999, p. 39.
[2] Comentários à Constituição do Brasil, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 312.
[3] Derecho Processual Penal Chileno, Tomo I, Santiago do Chile : Editorial Jurídica de Chile, 2003, p. 83.]
[4] O Núcleo do Problema no Sistema Processual Penal Brasileiro, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 175, junho/2007, p. 11.
[5] Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.
[6] Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 79.
[7] Boletim do IBCCrim, Ano 21, nº. 243 – ISSN 1676-3661, p. 16.
[8] Para Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, “nunca foi tão importante estudar os Goldschmidt, mormente agora onde não se quer aceitar viver de aparências e imbrogli retóricos.” (O Núcleo do Problema no Sistema Processual Penal Brasileiro, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 175, junho/2007, p. 12).
[9] Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 37.
[10] Astor Nina de Carvalho Júnior, Jornal Correio Braziliense, 11/09/2006.
[11] Habeas Corpus n. 71.713-6/PB, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 26/10/94, DJU 23/03/01, m. v., p. 85 e Habeas Corpus n. 76.915-0/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, , DJU 27/04/01, p. 59. Em relação ao Mandado de Segurança, o Supremo Tribunal Federal, no entanto, parece ter modificado esta orientação, pois no julgamento do Mandado de Segurança nº. 24.318, decidiu-se que não cabe à Corte julgar Mandado de Segurança movido contra ato da Turma Recursal do Juizado Especial, pois os seus juízes estão sujeitos ao Tribunal de Justiça, nos crimes comuns e de responsabilidade, conforme prevê a Constituição Federal, art. 96, III. Veja-se esta decisão monocrática proferida no STF: “MANDADO DE SEGURANÇA Nº. 24733/GOIÁS - MANDADO DE SEGURANÇA – Relator: MIN. MARCO AURÉLIO – Julgamento - 10/12/2003 – Publicação: DJ 02/02/2004 P – 00092 Despacho: DECISÃO COMPETÊNCIA - MANDADO DE SEGURANÇA - ATO DE PRESIDENTE DE TURMA RECURSAL. 1. Na sessão de 4 de dezembro de 2003, o Plenário dirimiu questão de ordem por mim suscitada no Mandado de Segurança nº. 24.691 e proclamou a competência da própria Turma Recursal para julgar mandado de segurança impetrado contra ato de integrante ou do Colegiado. Na oportunidade, concluí de modo diverso, apontando a competência do Tribunal a que integrado o autor do ato ou os componentes do Colegiado. A esta altura, descabe insistir no entendimento. 2. Declino da competência para a turma julgadora recursal de que faça parte o autor do ato envolvido na espécie. 3. Proceda-se à remessa do processo. 4. Publique-se. Brasília, 10 de dezembro de 2003.” Durante a sessão plenária do dia 02 de março de 2007, os Ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram encaminhar para o tribunal competente um mandado de segurança impetrado erroneamente no STF. A decisão unânime foi tomada no julgamento do Agravo Regimental no Mandado de Segurança (MS) 26006. Na primeira decisão sobre o MS, o relator do caso, ministro Celso de Mello, apontou a falta de competência do STF para julgar um mandado contra ato do Tribunal Superior do Trabalho. “O STF não dispõe de competência originária para processar e julgar mandados de segurança impetrados contra qualquer tribunal judiciário”, afirmou em sua decisão. Ele também determinou o arquivamento do processo, apontando que não caberia ao relator encaminhá-lo ao órgão judiciário competente. No caso, o TST. O município de Guariba (SP), autor do MS, interpôs um Agravo Regimental solicitando que o relator reconsiderasse a parte da decisão que determinou o arquivamento do processo. Nesta sessão de hoje, Celso de Mello lembrou que há decisões recentes do Plenário do STF que permitiram o encaminhamento dos autos de mandado de segurança para o tribunal competente. Essa é uma jurisprudência nova, já que a orientação firmada pelo Plenário era a de que não cabia ao STF remeter ao juízo competente mandado impetrado erroneamente na Corte. “No entanto, por força do princípio da colegialidade, eu devo submeter-me a essa nova orientação que o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou”, finalizou. Outros dois Ministros que haviam votado com Celso de Mello pelo arquivamento do MS também mudaram de posição. “Alterei meu ponto de vista preocupado com a questão da decadência”, disse o Ministro Ricardo Lewandowski. Mas ele reconheceu que, “do ponto de vista prático”, há dificuldade para seguir a orientação. “São centenas de mandados de segurança que nós recebemos e temos de decidir quando o advogado não sabe a quem endereçar e endereça ao Supremo”, lembrou. Fonte: STF (02/03/2007).
[12] A jurisprudência, no entanto, vem decidindo de forma diversa. A respeito, vejam os julgados transcritos na obra de Ada, Scarance, Luiz Flávio e Gomes Filho, já citada, p. 190.
[13] Comentários à Lei dos Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Saraiva, 2000, p. 123.
[14] Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Atlas, 4ª. ed., 2000, p. 204.
[15] Leis Penais e sua Interpretação Jurisprudencial, Vol. I, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 7ª. ed., 2001, p. 1.926.
[16] Manual de Processo Penal. 2ª. ed. Salvador: Editora Juspodivm: 2014, páginas 193/194.
[17] Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3ª. ed., 2001, p. 352.
[18] Habeas Corpus, São Paulo: Atlas, 4ª edição, p. 174.
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Rômulo de Andrade Moreira é Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor de Direito Processual Penal da UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela UNIFACS.
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