Por Adriano Sant’Ana Pedra – 19/06/2016
As manifestações que têm ocorrido nas últimas semanas em todo o Brasil representam um fenômeno novo, espontâneo, alimentado nas redes sociais virtuais, que ganhou corpo motivado por uma insatisfação geral da população que gerou pautas difusas e independentes nas diferentes regiões do país, e muitos ainda não sabem como lidar com ele.
A Constituição assegura que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente” (artigo 5º, XVI). Assim, a reunião não pode partir para a conflagração física nem colocar em perigo pessoas ou bens. Contudo, o fato de alguma pessoa estar utilizando a violência não impede a continuidade da reunião, porquanto deve a força policial agir especificamente em relação a esse indivíduo. Não se exige autorização, mas apenas um prévio aviso à autoridade competente com a finalidade de que sejam mobilizados os recursos materiais e humanos necessários (policiais, guardas de trânsito, profissionais de saúde etc.) para uma boa realização da manifestação, bem como para que os direitos dos manifestantes e das outras pessoas permaneçam protegidos e conciliados. Daí a importância de um mínimo de organização, o que fica prejudicado em razão da ausência de lideranças.
A nossa Constituição também assegura que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (artigo 5º, IV). A liberdade para criticar os governantes é importante para o controle das atividades do Estado, mas a liberdade de manifestação do pensamento não é compatível com o anonimato. Nenhum manifestante pode cobrir o rosto com o fim de omitir a sua identidade para a prática de ilícitos – da mesma forma que nenhum policial pode usar farda sem identificação nas manifestações.
Ademais, o exercício dessas liberdades constitucionais deve ser ponderado em situação de colisão com outros direitos fundamentais. Assim, por exemplo, a liberdade de reunião não pode impedir totalmente o exercício do direito de ir e vir de outras pessoas; a liberdade de expressão não pode promover nas proximidades de um hospital um som tão alto que prejudique os pacientes aí internados; igualmente, tais liberdades não podem servir de pretexto para a destruição de patrimônio privado e público – inclusive o patrimônio histórico e cultural.
Pode parecer contraditório, mas não é: só existe liberdade limitada. Cada um deve respeitar a liberdade do outro. Se todos fizerem isso, todos gozarão de liberdade.
. . Adriano Sant’Ana Pedra é Doutor em Direito Constitucional (PUC/SP) e Professor da FDV.. . .
Imagem Ilustrativa do Post: O GIGANTE ACORDOU 19/06/13 // Foto de: Maria Objetiva // Sem alterações
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