A Sustentabilidade e sua relação com o Desenvolvimento Econômico

30/03/2015

Por Antonio Marcos Gavazzoni - 30/03/2015

No mundo capitalista de hoje, sempre ávido por lucro, tudo torna-se um negócio, sendo as crises vistas muitas vezes como oportunidades de enriquecimento. Com a crise ambiental não seria diferente.

A mola propulsora do homem moderno sempre foi a riqueza, traduzida às vezes em forma de poder, influência, manipulação. Para angariar riquezas, alguns homens influentes mudaram o modo de vida de todos, estudaram, trabalharam, investiram. Todo desenvolvimento veio atrelado à busca de mais riquezas para menos pessoas. Antes desse modelo econômico a intenção era produzir e vender mais para mais pessoas, comprava-se aquilo que se precisava, os consumidores eram movidos pela necessidade e não pelo desejo e impulso consumista, como observamos na atual economia. (MORAIS DA ROSA e GOSTINSKI, 2014, p.34-35)

A preocupação com os anseios consumistas, básicos ou não, dos sujeitos comparados com os limites do crescimento e concretização dos ditos clamores compõem o núcleo da preocupação ambiental. Preliminarmente o foco das ações estava mais voltado ao desenvolvimento, especialmente dos países mais pobres. Não por acaso, ao longo dos anos tenha se perpetuada a visão errônea de que os pobres são os principais responsáveis pelas crises ambientais, o que não é verdade, diga-se de passagem (LATOUCHE, 2003). A questão ambiental não se apresentava como mola propulsora. Importava a potencialização do desenvolvimento enquanto bem jurídico a ser fomentado também em escala mundial, com incidência nas esferas comunitárias e nacionais.

A preocupação maior volta-se aos meios de contenção de uso dos bens e recursos naturais e com a necessidade de assegurar condições adequadas de vida digna também para as futuras gerações (BODNAR, 2008, p.325-343). Esta constatação abre duas vertentes de análise, na essência interligada: a primeira, a defender a ideia de bens e recursos ambientais e seu uso e gozo de modo absolutamente diverso das faculdades que são inerentes ao proprietário; a segunda, cria vínculos de solidariedade e exigibilidade judicial intergeracional.

Não por acaso, como atesta Morin (2011, p. 100-101), chegou-se à noção de desaceleração das atividades econômicas, extrativistas e consumistas, se possível, inclusive, com espaços para retração, no intuito de não se antecipar o tempo de exaurimento da existência. Sintetiza-se suas preocupações na imprescindibilidade da tutela dos bens e recursos ambientais, como modo de otimização da dignidade da pessoa humana, compatibilizando-a com o desenvolvimento, agora sustentável, em favorecimento acessório aos fundamentos da livre iniciativa e dos valores sociais do trabalho.

Assim, objetivou-se a situação do mercado em função da justiça e não a justiça como guardiã das transações econômicas, como deseja, até o momento a cartilha neoliberal. Especial contributo para a maturação deste ideal se deve aos postulados de Sen (2005, p.133) ao argumentar em favor do balizamento das liberdades negociais para o compartilhamento do uso e gozo de estilos de vida antes excludentes, mas que devem ser socializados, propondo, inclusive, a substituição do indicador de riqueza do PIB para o IDH.

E o que observa hodiernamente é que longe de ser um discurso ingênuo, como aponta Lima (2003) citando Drysek, o “sustentável” se adaptou ao mercado. Num mundo globalizado e essencialmente capitalista o discurso do desenvolvimento sustentável só poderia lograr êxito se conseguisse demonstrar que a conservação ambiental promovia o crescimento dos negócios e da economia e não apenas que estes valores opostos podiam ser reconciliados. E essa é a maior crítica ao discurso do desenvolvimento sustentável confundido com o da sustentabilidade: “a frágil factibilidade da proposta no contexto de uma sociedade capitalista orientada pelo mercado”.

Contudo, Morais da Rosa e Gostinski (2014, p.31-45), alertam para a mercantilização da sustentabilidade e a criação do mito da destruição ambiental, com o propósito de manipular mercados, criar modismos e garantir soluções para as grandes economias, fomentando ainda mais a discussão sobre as diversas faces dos discursos sustentáveis. Segundo Sachs (2009, p. 51) os “pessimistas anunciavam o apocalipse para o dia seguinte” pregando a imediata estagnação do crescimento econômico e também demográfico que gera o aumento do consumo.

Longe de ter um final para essa polêmica de tão antagônicas opiniões Veiga (2010, p. 122) analisa um caminho que talvez se possa dizer mediano; mais tardio e representado pelo Nobel de economia Robert M. Solow, essa linha de pensamento aposta no progresso científico e tecnológico para promover as alterações que substituam a possível escassez ou comprometimento dos recursos naturais.

Diante deste panorama, o princípio da sustentabilidade, conforme destaca Leff (2005, p. 31), aparece como um critério normativo para a reconstrução da ordem econômica, como uma condição para a sobrevivência humana e como suporte para chegar a um desenvolvimento duradouro, questionando as próprias bases da produção. Em conclusão, para Naline (2001) a sustentabilidade importa em transformação social, sendo conceito integrador e unificante. Propõe a religação da unidade homem/natureza na origem e no destino comum e significa um novo paradigma.

A sustentabilidade é um desafio de dimensões planetárias, e que requer estratégias complementares entre países centrais e periféricos. Seria necessária uma grande mudança de padrões de vida, de revisão da lógica de consumo imposta pelo mercado, de redimensionamento da importância da natureza para a vida, etc. Exigiria, em verdade, uma nova visão de mundo articulada com uma pré-disposição para enfrentar os novos desafios contemporâneos (SACHS, 2002, p.57).

A urgência das necessidades humanas faz com que seja lançado um novo paradigma, fundado nessa visão ampliada da sustentabilidade mutante, com inspirações capazes de apaziguar a carga genética egoísta e agressiva do homem e defender mudanças estruturais da tecnologia, dos padrões de consumo e de vida (KUHN, 2002, p.142). No caso, este novo paradigma passa a ser a sustentabilidade, como ponto de gravidade dos demais institutos, em substituição à máxima da liberdade, decorrente do oitocentos (CRUZ; BODNAR, 2011, p. 75-83).

As necessidades do ser humano tornaram-se cada dia mais amplas e imediatas e os impactos decorrentes da satisfação dessas necessidades também se ampliaram atingindo patamares críticos, assim a sustentabilidade foi dividida em cinco importantes pilares: social, ambiental, territorial, econômico e político. (SACHS, 2008, p. 15-16)

Pela lavra Staffen (2013), importa reconhecer que a construção de um conceito e, por via de regra, sua concretização, necessariamente transdisciplinar, como a sustentabilidade, é um objetivo de larga envergadura em constante processo de construção e alinhamento. Afinal, “trata-se de uma idealidade, algo a ser constantemente buscado e construído como o próprio conceito de Justiça”.

Tanto Bosselmann (2008) quanto Leff (2006, p.399), em obras distintas acreditam que o futuro sustentável é uma construção social que surge a partir da tensão produtiva do encontro de seres e do diálogo de saberes, que questiona o império de uma racionalidade coisificadora e objetivadora, a mercantilização da natureza e a economização do mundo.

De fato a relação economia-sujeitos-natureza é complexa. Os estudiosos, aliados a movimentos e mobilizações espalhadas pelo globo, têm se esforçado em desenvolver suporte teórico que possa contribuir para a conciliação do modelo político-econômico vigente, marcado pelo excesso e pela agressividade, com os propósitos de preservação da vida no planeta. Essa tentativa, inevitavelmente, passará pela administração pública e pela regulação das atividades econômicas em sociedade. A presença do Estado nessa articulação será fundamental. Por conta disso é que o método da governança pública, pensada a partir da lógica da sustentabilidade, oferece um potencial singular a ser explorado não somente em nível especulativo, mas também em nível prático.

Resta cristalino o caminho para a sustentabilidade e consequente preservação da humanidade: adotar esses princípios como normas e trabalhar em cima deles na busca do desenvolvimento da humanidade com equilíbrio econômico, ecológico e social. Essa deve ser a obrigação dos governantes em todos os níveis. Promovendo uma gestão sustentável e utilizando a máquina pública para alcançar os objetivos.


Notas e Referências:

[1] No artigo 2.1 se vaticina a pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deveria ser participante ativo e beneficiário do direito ao desenvolvimento.

[2] Relatório O Nosso Futuro Comum também conhecido como Relatório Brundtland.


Sem título-11 Antonio Marcos Gavazzoni é mestre e doutor em Direito Público. Foi professor na UNOESC, na Escola Superior da Magistratura de Santa Catarina e na Universidade Paranaense. Em janeiro de 2013 assumiu pela segunda vez a Secretaria de Estado da Fazenda do Estado de Santa Catarina, cargo que ocupa até o momento. Email: contatogavazzoni@gmail.com                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         


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