Coordenador: Ricardo Calcini
O art. 5o-D, da Lei n. 6.019/74, incluído pela Lei n. 13.467/17, prevê que o empregado que for demitido da empresa contratante não poderá a esta retornar na qualidade de terceirizado antes do lapso de dezoito meses, contados a partir de sua demissão. Positivou-se no ordenamento jurídico uma restrição temporária à terceirização, com o objetivo de evitar que o empregado tivesse seu contrato extinto com posterior “recontratação” via terceirização.
A atecnia legislativa revela-se patente quando o novel artigo prevê o verbo demitir, única e exclusivamente. Isso porque é assente na doutrina trabalhista[1] que demissão ocorre quando o empregado requer o desligamento do empregador ao qual se vincula. Assim, fere a lógica entender que o dispositivo pretendeu proteger da “recontratação” via terceirização apenas o empregado que pede demissão, ou seja, que requer sua saída da empresa.
Analisando o artigo à luz da interpretação extensiva, possível concluir que a ratio legis é outra, eis que o próprio ordenamento jurídico brasileiro admite o uso da referida figura, revelada no art. 32, do Código de Processo Penal[2].
Com suporte em Ferrara, o mestre Rubens Limongi França ensina que na interpretação extensiva se reconstrói a vontade pré-existente do legislador, que por imprecisa definição parece, prima facie, excluída[3]. A extensão permite ampliar o sentido da compreensão obtida da literalidade do texto legal, tendo por escopo o alcance da mens legis.
Nessa medida, a interpretação extensiva corrige a previsão limitada do texto legal, permitindo ao intérprete torná-lo mais vago/aberto, em vista da imprecisão semântica adotada pelo legislador[4]. Em outras palavras, o pressuposto para a utilização da figura retrocitada é a identificação de que o legislador disse menos do que queria dizer, incumbindo à doutrina interpretar o conteúdo normativo do texto legal, estendendo seu conteúdo para além do significado meramente gramatical.
Dentro desse contexto, o escopo da previsão normativa estampada no art. 5o-D, supracitado, foi proteger o trabalhador de posterior prestação de labor ao seu ex-empregador através da terceirização, após a dispensa sem justa causa. O amparo legislativo se justifica, pois mencionada dispensa emerge como faculdade patronal estampada no art. 7o, inciso I, da CF, nada podendo fazer o trabalhador para evitá-la.
Inexoravelmente, a consagração dos termos “demitidos” e “demissão” gerará cizânia na doutrina e jurisprudência acerca do seu real alcance protetivo.
Não obstante, entendo que num primeiro momento deve ser concedida interpretação extensiva aos termos retrocitados para alcançar toda espécie de cessação contratual, seja ela determinada pelo alcance de seu termo final ou mesmo proveniente de resilição ou resolução, força maior, fato do príncipe, bem como, a partir de 11.11.2017, a nova figura da extinção do contrato de trabalho por comum acordo.
[1] Curso de Direito do Trabalho / Maurício Godinho Delgado – 15a edição – São Paulo: LTr, 2016. Páginas 1259 a 1261.
[2] Art. 3o A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.
[3] Hermenêutica jurídica / R. Limongi França – 2a edição – São Paulo: Saraiva, 1988. Página 64.
[4] Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação / Tercio Sampaio Ferraz Junior. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
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