A regulação sobre startups no Brasil, em comparação com o Chile, o México e os Estados Unidos: experiências com as quais aprender

22/03/2018

Cada vez mais, o Brasil vem se tornando um espaço propício para o empreendedorismo, com crescentes negócios inovadores. Contudo, segundo dados da Expert Market, uma startup texana, apesar de o brasileiro ser o 5º colocado no ranking de determinação do empresário para empreender, ainda é extremamente difícil tal idealização no País, especialmente devido à dificuldade de conseguir começar um 1º. negócio[1].

Em comparação com outras nações, a criação e manutenção de negócios marcados pela inovação têm como principais obstáculos a rigidez para a abertura de empresas e a extrema dificuldade dessas startups em captar recursos.

Em 2014, estimava-se, em média, 104 dias para abrir uma empresa no Brasil, considerando-se, apenas, o trâmite e os procedimentos nas Juntas Comerciais, sem  levar em conta a regularização da empresa perante os órgãos municipais e estaduais, com o objetivo de assegurar a regularidade tributária[2].

No Chile, por outro lado, desde janeiro de 2013, é possível a abertura de empresas em apenas um dia. A chamada Ley de empresa en 1 día simplificou em muito a burocracia no país para o início de negócios. Agora é possível que tudo seja realizado online e sem nenhum custo.

Quando falamos em inovação, também é possível falar de legislação inovadora. De fato é essa a percepção sobre a mencionada lei chilena que se aplica apenas a pessoas jurídicas, porém contempla todas as espécies societárias comumente conhecidas: sociedades limitadas, sociedades anônimas e sociedades em comandita, bem como a empresa individual de responsabilidade limitada.

Eliminar a burocracia é dinamizar o ecossistema empreendedor de um país, reduzindo-se os custos de transação. Aliás, sobre estes (custos de transação) o empreendedor deve submeter o seu negócio a uma criteriosa análise, apoiando-se na análise econômica do direito. Facilitar a vida daqueles que desejam constituir um novo negócio é, basicamente, incentivar as pessoas a exprimirem sua criatividade e explorarem novas possibilidades, tendo em vista a facilidade que possuem.

O modelo chileno serviu de inspiração para o México, sendo este, atualmente, um dos Estados mais dinâmicos na América Latina para se empreender e desenvolver startups.  Em fevereiro de 2016, foi aprovada uma reforma na Ley General de Sociedades Mercantiles, na qual foi introduzida a figura da Sociedade por Acciones Simples, que pode ser criada em um dia, a custo zero. Em comparação, antes da reforma, o custo poderia variar entre 6,000 e 30,000 pesos mexicanos, além de demorar até 72 dias[3].

A facilidade de abertura de empresas nesses países é evidente, quando se compara  com o Brasil. O Chile e o México são, respectivamente, o 65º e 90º no ranking mundial de Estados em que os empreendedores encontram maior facilidade em começar um novo negócio[4]; o Brasil, em comparação, é o 176º colocado, dentre um total de 190 Estados, segundo informações do Banco Mundial de 2017[5].

Não é apenas quanto à agilidade nos procedimentos burocráticos que o Brasil tem a aprender, contudo outro grande empecilho que muitas startups encontram no início de suas vidas é a captação de recursos, o que está diretamente relacionado ao grau de confiança do País, quesito em que o Brasil não vai bem.

Como se sabe, pela própria natureza da startup, o negócio é de risco, no qual o empreendedor terá o desafio de lançar seu projeto no mercado, de forma que seja atrativo a investidores e, ao mesmo tempo, não apenas apresente potencial de retorno do capital investido,  mas que o remunere.

O impulso inicial pode ser dado de diversas formas, além de aporte financeiro imediato, por meio, por exemplo, da via networking, parcerias com empresas já desenvolvidas e patrocínios, que podem levar startups a atrair recursos para alavancar seu negócio, além de recorrer a créditos bancários ou ajuda de familiares.

Legalmente falando, desde julho de 2017, empresários podem se valer do disposto na Instrução nº 588 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Essa normativa veio para regular o chamado crowdfunding de investimento que, segundo o artigo 2º, I da instrução, refere-se à captação de recursos por meio de oferta pública de distribuição de valores mobiliários dispensada de registro, realizada por emissores considerados sociedades empresárias de pequeno porte nos termos desta Instrução, e distribuída exclusivamente por meio de plataforma eletrônica de investimento participativo, sendo os destinatários da oferta uma pluralidade de investidores que fornecem financiamento nos limites previstos nesta Instrução.

Para se valer das possibilidades criadas pela CVM, deve a sociedade empresária se classificar como de pequeno porte que, segundo seu artigo 2º, II, deve possuir renda bruta de até R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais). Essas sociedades, por sua vez, podem lançar mão de valores mobiliários para captar recursos, sendo dispensado o seu registro na CVM.

Foi estabelecido, contudo, limite de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) para a captação de recursos, que deve ocorrer no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, sendo necessário que a empresa espere, pelo menos, 120 (cento e vinte) dias para se valer desse sistema novamente.

A norma brasileira parece ter sido inspirada pelo modelo de crowdfunding estadunidense. Lá, em abril de 2012, foi aprovado o Jumpstart Our Business Startups Act (JOBS Act), cujo objetivo era o incentivo a pequenos empreendedores, visando facilitar sua inserção no mercado e o início de suas atividades.

Ao contrário do que a CVM determinou, as empresas que podem se valer das normas desse act são as com renda anual de até U$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de dólares). Ademais, ao contrário do que foi feito no Brasil, apenas se impôs um limite ao valor que uma pessoa pode investir por ano, não impondo limitações temporais de quanto as empresas podem receber. Porém, da mesma forma que ficou estabelecido aqui, essas empresas podem emitir valores mobiliários próprios, com o intuito de atrair investidores para si[6].

Outra facilidade que essa lei trouxe foi quanto à inscrição perante a Securities and Exchange Comission (equivalente americana da CVM), reduzindo consideravelmente a burocracia para empresas com capital social de até $ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de dólares) se inscreverem[7].

Além dos Estados Unidos, podemos novamente olhar para o México como inspiração. Lá, em março de 2018, a Câmara dos Deputados aprovou a Ley para Regular las Instituciones de Tecnología Financiera (também conhecida como Ley Fintech), ainda pendente de sanção presidencial.

Dentre as novidades que a lei trouxe, estão: a regulamentação do uso de criptomoedas e outros ativos virtuais, após aprovação pelo Banco do México; o fortalecimento da governança corporativa dessas empresas e previsão de sanções administrativas e penais quando do descumprimento de suas previsões[8].

Como motivos da exposição legislativa, pretendeu-se, em suma, diminuir a corrupção existente na administração de empresas daquele país, bem como criar um ecossistema empreendedor mais favorável para novos empresários.

Com base nesses dois pilares: maior agilidade na abertura de empresas e facilidade de captação de investidores e recursos, é possível concluir que o Brasil precisa avançar muito e rápido, objetivando dar um ambiente de maior confiança e competitividade, capaz de propiciar o desenvolvimento de novas startups e manter o espírito empreendedor do brasileiro. Sobre essa maneira de fazer, muito há que se aproveitar dos modelos já implantados no Chile, nos Estados Unidos e no México, para arejar e fomentar a atividade empresária no País.

 

Notas e Referências

[1] Disponível em<https://www.expertmarket.com/focus/research/most-determined-entrepreneurs>. Acesso em 21/03/2018.

[2] Disponível em<https://exame.abril.com.br/pme/quanto-tempo-demora-para-abrir-uma-empresa-no-brasil/>. Acesso em 21/03/2018.

[3] Disponível em<https://www.forbes.com.mx/crear-empresas-en-un-dia-pros-y-contras/>. Acesso em 21/03/2018.

[4] Disponível em<http://portugues.doingbusiness.org/rankings>. Acesso em 21/03/2018.

[5] Disponível em<http://portugues.doingbusiness.org/data/exploreeconomies/brazil>. Acesso em 21/03/2018.

[6] Disponível em<https://investmentbank.com/summary-of-jobs-bill-and-update/>. Acesso em 21/03/2018.

[7]Disponível em <https://www.csmonitor.com/USA/Politics/2012/0308/What-does-the-JOBS-Act-actually-do-Six-questions-answered/What-s-in-the-JOBS-Act>. Acesso em 21/03/2018.

[8]Disponível em<http://www.elfinanciero.com.mx/empresas/diez-puntos-para-entender-la-nueva-ley-fintech>. Acesso em 21/03/2018.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Talk with the Best Consultancy for Startups- Corporate Uncle // Foto de: rajnish singh // Sem alterações

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