A publicidade do tratamento de fertilização nos sites da internet – Por Carla Froener Ferreira

10/02/2017

Coordenador: Marcos Catalan

Na atual sociedade de consumo, a fertilização não é mais vista apenas como um tratamento para a saúde reprodutiva. Sem dúvida, tornou-se um negócio extremamente rentável. Para conquistar clientes e expandirem-se no mercado, as clínicas aliam conhecimento médico às técnicas comerciais, como a publicidade.

Apesar de os meios de comunicação em massa tradicionais como o rádio, a televisão e a imprensa escrita serem, ainda, importantes mecanismos de difusão da publicidade, é inegável o papel de destaque ocupado pela internet. Para que a publicidade seja capaz de atingir sua finalidade, é necessário que tenha uma alta capacidade de persuadir o receptor a consumir determinado produto ou serviço. Por este motivo, muitas vezes é utilizada de forma apelativa e manipuladora.

Baseado em estudos médicos que concluíram pela existência de regiões no cérebro que compelem o corpo humano a imitar, involuntariamente, a forma com que os outros agem, Martin Lindstrom[1] (autor que estuda a influência do marketing nos consumidores), afirma que aquilo que é visto repetitivamente, ainda que não cause um interesse imediato, pode se tornar desejável. Percebe-se, assim, a importância da publicidade, que estimula a imitação do comportamento de consumo alheio.

Baudrillard[2] entende que um dos principais mecanismos da publicidade é a capacidade de mostrar que o fornecedor está disposto a dar atenção aos anseios do receptor da mensagem. Este recurso demonstra que o objeto oferecido não é qualquer objeto, mas justamente aquele que o consumidor precisa, adaptado às suas necessidades personalíssimas.

Sabedores do poder da publicidade, os sites de clínicas de fertilização exploram, demasiadamente, o uso de imagens e frases de modo a persuadir os clientes/pacientes a consumirem o que eles vendem como a tão sonhada fórmula para a felicidade: “ter filhos”. Partindo desta lógica, grande parte das clínicas apresenta imagens de pessoas ou famílias felizes com seus bebês, incutindo a ideia de que o ser humano só será completo com filhos.

É comum nos sites a apresentação de imagens de pessoas alegres e se divertindo com crianças, com essa atitude as clínicas pretendem que os receptores se projetem para a situação vista, imaginando como poderiam ser felizes com filhos. Também é comum a exposição de fetos em exames de ecografia, transmitindo a sensação de prazer em acompanhar a formação e o desenvolvimento do bebê. Aplica-se aqui os estudos de Lindstrom acima referidos, situação em que as clínicas apresentam comportamentos que pretendem que sejam seguidos para adquirirem novos clientes.

Neste contexto, não basta apenas a imagem de uma criança, ela precisa ser sorridente ou demonstrar que traz alegria ao cenário. Não basta um fundo neutro, é importante que se ajuste uma paisagem bonita com natureza, dias ensolarados ou algo que remeta para a satisfação pessoal. Logo, simples imagens tornam-se motivações eficientes para um comportamento hipnótico[3]. Outra observação que merece registro é que os sites costumam retratar apenas crianças brancas, normalmente loiras e de olhos claros, como se este fosse um padrão de beleza.

Para intensificar ainda mais a apelação emocional presente nas imagens publicitárias, as clínicas de reprodução costumam utilizar frases persuasivas como “A família constitui um dos principais pilares da felicidade”[4], “Algumas sensações na vida não podem ser descritas, você precisa viver”. Novamente, direciona-se para a ideia de que ter filhos é uma concretização da vida. Como se fosse um objetivo que deva ser alcançado. Como se apenas as pessoas que têm filhos provassem uma felicidade completa, o que acaba por desrespeitar o direito das pessoas que optam por não ter filhos.

Algumas clínicas possuem links que trazem depoimentos dos pacientes, com frases apelativas, principalmente para quem busca implementar um projeto de parentalidade. Pode-se encontrar declarações comoventes e sedutoras: “Anjos que entraram na minha vida e me ajudaram a trazer ao mundo meu grande amor!”; “Local aonde conseguimos concretizar o nosso sonho de constituir uma família.” É interessante ressaltar que não são encontrados depoimentos negativos sobre as técnicas ou que criticassem o estabelecimento que prestou o serviço médico, o que pode levar à conclusão de que as empresas manipulam ou, pelo menos, selecionam, as declarações que lhes são convenientes e favoráveis.

Todos os sites trazem campos específicos com informações sobre as técnicas de reprodução assistida, tipos de tratamento e esclarecimento de dúvidas. Todavia, a informação é utilizada como forma de induzir o público a adquirir o produto que satisfará suas necessidades. A tecnologia dos procedimentos e a aparelhagem empregada são apresentadas como forma de demonstrar segurança e capacidade para realizar o tratamento. Em alguns sites também é possível consultar fotos dos bebês frutos dos tratamentos oferecidos, demonstrando a concretização do serviço médico ofertado, ou seja, o produto final oferecido (os bebês) como meio de transmitir credibilidade e atingir o principal objetivo da sociedade de consumo: fazer as pessoas consumirem.


Notas e Referências:

[1] LINDSTROM, Martin.  A lógica do consumo: verdades e mentiras sobre por que compramos. Trad. Marcello Lino. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

[2] BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 2011.

[3] DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Trad. Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.

[4] As frases transcritas são casos reais. Com o objetivo de preservar a identidade das clínicas consultadas, optou-se por manter o anonimato.


 

Imagem Ilustrativa do Post: Baby // Foto de: Mysudbury.ca Ouisudbury.ca // Sem alterações

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