A morte de Marisa Letícia e o ódio nas redes sociais – Por Fernanda Mambrini Rudolfo

05/02/2017

Desde as primeiras notícias de que Dona Marisa teria sofrido um AVC, incontáveis comentários maldosos inundaram as redes sociais. Chegou ao ponto de o site “sensacionalista” publicar matéria com o objetivo de provar que “a internet está doente”.

Depois de ser declarada sua morte cerebral, nem mesmo as teorias conspiratórias (há aqueles que afirmam que tudo era/é uma farsa, para a retomada da força de um partido) diminuíram. Pelo contrário, observaram-se ainda mais colocações desrespeitosas e movidas pelo ódio.

Gostaria de descobrir a fonte de tanto desamor, do regozijo com a dor alheia. Sem entrar no mérito da personalidade de Marisa Letícia, que certamente tinha qualidades e defeitos, ninguém merece esse tratamento. Nenhuma família merece ter seu luto desrespeitado desse modo. O que faz alguém sentir prazer ao ter ciência da morte de outrem? Ou ao descobrir, por exemplo, que Eike Batista é careca? A que ponto chegou a sociedade para que a felicidade humana dependa da desgraça alheia?

E isso, para a minha tristeza, se verifica com muita frequência no dia-a-dia. Há aquelas figuras que não obtêm sucesso e simplesmente torcem pelo fracasso dos demais. Há quem não consiga ser feliz sem diminuir o outro. Essa é a nossa triste realidade. Não só a internet está doente, mas todo o mundo. Estamos doentes, sofrendo de carência de empatia, padecendo de deficiência de humanidade.

É um ódio exacerbado e injustificado que demonstra a falência de um modelo competitivo de sociedade. As explicações, que quase sempre admitem a inadequação dos comentários, e vêm seguidas de um “mas...” só comprovam que não vivemos em uma comunidade, mas em um ambiente hostil, em um espaço onde cada um vive só por si e nada mais.

Uma sociedade em que as pessoas são cada vez mais frustradas por serem impostos “sonhos” incompatíveis com a realidade de cada um, que legitima “kits flagrante”, que admite invasões de domicílio baseadas no exercício de futurologia, que considera crime o porte de maconha, mas tolera o consumo de whisky e rivotril... frustração, falta de empatia e hipocrisia, ingredientes perfeitos para se obter o resultado ódio incondicionado.

Muitos dizem ver humanos, mas não ver humanidade. Não vou tão longe. Embora ache estar se esvaindo boa parte do caráter humano da nossa sociedade, ainda vejo humanidade e muita. Porque podemos escolher ver só os comentários maldosos e desrespeitosos, mas podemos também optar por enxergar aqueles inúmeros comentários que não só enviaram mensagens de carinho e solidariedade à família de Marisa Letícia, como ainda a defenderam dos muitos ataques sofridos. Não foram poucos, ainda, os artigos e textos nas redes sociais, repudiando as atitudes retrógradas e desumanas. Isso me faz acreditar. Porque há muitos deles, mas também há muit@s de nós.

Pode parecer clichê, mas ainda tenho esperança que o amor vença o ódio e acredito que só dependa dos nossos atos. Depende não só de não agirmos do modo que reprovamos, mas também (talvez especialmente) de não nos calarmos diante das atrocidades que vemos diariamente. O silêncio permitirá que o mal se instale e isso não podemos admitir. Já dizia Martin Luther King: o que preocupa é o silêncio dos bons.


 

Imagem Ilustrativa do Post: The hope // Foto de: Mustafa Khayat // Sem alterações

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