Coluna Espaço do Estudante
A evolução constante das sociedades, perfazendo-se no advento do Estado Democrático de Direito, trouxe consigo ideais que, em última instância, deveriam possibilitar um expressivo aperfeiçoamento de questões-chave componentes de qualquer grupo social que almeja ser bem desenvolvido, precipuamente no que concerne ao respeito aos direitos humanos e às garantias fundamentais. O conceito de pluralismo deveria nortear os mais variados tipos de relações e a esfera da liberdade individual deveria encontrar-se cada vez mais agasalhada pelos sistemas normativos. Da mesma forma, os direitos atinentes às minorias deveriam passar a ser mais bem observados e reconhecidos em sua integridade.
Não se pode negar que houve progresso, principalmente quando se compara o panorama atual com o dos modelos governamentais antecedentes. No entanto, a identificação de um modesto avanço não pode ocultar a necessidade criada pelo paradigma contemporâneo do Estado Democrático de Direito de alcançar padrões imensamente superiores no que atine à igualdade de tratamentos e ao direito de ser diferente. Essa ideia é tratada de modo brilhante pelo Prof.º Álvaro Ricardo de Souza Cruz em sua obra “O Direito à Diferença”, o que é elucidado no seguinte trecho: “(...) o pluralismo eleva-se à condição de princípio indissociável da ideia de dignidade humana, exigindo do Estado e da Sociedade a proteção de todos os ‘outros’, diferentes de nós (...)” (CRUZ, 2009, p. 12).
É nesse sentido que se torna inadmissível o fato de que, no Brasil, país famoso por sua diversidade, fiquem configuradas 44% das mortes do mundo de integrantes da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) no ano de 2013, de acordo com pesquisa estatística da International Lesbian and Gay Association (ILGA). Essa situação elucida a magnitude e a tortuosidade assumida pelo caminho da busca do real respeito à diferença, o que torna essencial a intervenção de Entidades e Organizações de grande ingerência social. A despeito da atuação omissa e desinteressada de muitas Instituições nacionais, algumas se destacam positivamente por se mostrarem conscientes e solidárias aos objetivos relevantes da nação, dentre os quais o desenvolvimento de uma sociedade plural, em que a diversidade é apreciada e benquista. São atitudes como as que serão apresentadas a seguir que impedem o falecimento precoce da esperança popular quanto ao Brasil, em sentido estrito, e quanto à própria humanidade, amplamente considerada.
No dia 30 de março de 2015, a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais editou portaria 021/2015 a partir da qual será permitido e reconhecido o uso do nome social de transexuais e travestis no âmbito acadêmico. Notória por seu caráter humanitário e inclusivo, a PUC Minas, tal como já havia sido feito em outras unidades, deu mais uma prova de que tem ciência de seu papel social enquanto instituição produtora de conhecimentos e valores e de que está engajada com o acolhimento dos “outros” em seus belíssimos “campus” e espaços dialógicos e discursivos de ensino, pesquisa e extensão.
De modo similar e não menos importante, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) vem se posicionando no sentido de também permitir o uso do nome social pelos advogados e advogadas travestis e transexuais. Na data do dia 18 de setembro de 2015, em Teresina (PI), o Colégio de Presidentes de Seccionais da Ordem deliberou nesse sentido, e encaminhará a questão para que o Conselho Federal a regulamente. É inconteste a significativa relevância de uma ação com esse teor por parte de uma Instituição com a dimensão e a pujança da Ordem dos Advogados.
Dessarte, infere-se que, muito embora alguma evolução seja percebida, o Estado Democrático de Direito, com sua configuração formal, exige um significativo exaurimento nesse desenvolvimento intelectual de aceitação do considerado diferente. É impensável que, na atual conjuntura constitucional, subsistam movimentos segregacionistas, por serem eles intrinsecamente incompatíveis com o modelo estatal vigente. É por isso que o Estado, orientado pela Carta Política de 1988, deve garantir ao povo, de quem provém seu poder de fato, a igualdade de tratamento e a possibilidade de uma existência digna, independentemente de características pessoais. A atuação afirmativa de Instituições importantes como a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e a Ordem dos Advogados do Brasil deve servir de exemplo para a incessante evolução rumo ao alcance do objetivo paradigmático do Estado Democrático de Direito. Por fim, e para não deixar de citar novamente o portentoso Prof.º Álvaro Ricardo de Souza Cruz, “O papel do Direito é ser instrumento de transformação social para o resgate de direitos ainda hoje não realizados.” (CRUZ, 2009, p. 15).
Notas e Referências:
BRASIL. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Portaria nº 021/2015, de 30 de março de 2015. Disciplina a adoção do nome social por integrantes da comunidade acadêmica da PUC Minas que o solicitarem. <www.pucminas.br/imagedb/documento/DOC_DSC_NOME_ARQUI20150408160853.pdf>. Acesso em: 30 de setembro de 2015.
CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. O direito à diferença. Belo Horizonte: Arraes, 2009.
MELLO, Alessandra. Brasil amarga o preço da intolerância e lidera ranking de violência contra homossexuais. Jornal Estado de Minas, Belo Horizonte, 2014. Disponível em: < http://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2014/09/22/interna_nacional,571621/brasil-amarga-o-preco-da-intolerancia-e-lidera-ranking-de-violencia-contra-homossexuais.shtml>. Acesso em: 30 de setembro de 2015.
. . Nacle Safar Aziz Antônio é graduando do 6º período do Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. . .
. . Yuri César de Almeida Silva é graduando do 6º período do Curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. . .
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