A IMPORTÂNCIA DO ADVOGADO NA TRANSAÇÃO IMOBILIÁRIA DE COMPRA E VENDA

25/10/2018

Coluna Direito Empresarial e Análise Econômica / Coordenador João Carlos Adalberto Zolandeck

            O contrato de compra e venda de imóvel se caracteriza por ser bilateral, no qual uma das partes (a vendedora) transfere o domínio do bem à outra (a compradora), mediante o pagamento por esta de uma contraprestação.

            É neste sentido a redação do artigo 481 do Código Civil, ao conceituar contrato de compra e venda: “Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro”.

            Maria Helena Diniz esclarece que a compra e venda pode ser definida como “[...] o contrato em que uma pessoa (vendedor) se obriga a transferir a outra (comprador) a propriedade de uma coisa corpórea, mediante o pagamento de certo preço em dinheiro ou valor fiduciário correspondente”[i].

            Como se observa, trata-se de um contrato de natureza obrigacional, em que os contratantes se obrigam reciprocamente, um a transferir o domínio e o outro a pagar o preço avençado.  

            Assim, considerando-se a natureza obrigacional recíproca e o caráter tipicamente oneroso da transação, inclusive, muitas vezes, em valores vultosos, dar segurança jurídica passa a ser preponderante para o momento da tomada da decisão pela efetivação ou não do negócio jurídico.   

            É justamente neste contexto que reside o ponto chave sobre o qual pretende-se refletir neste texto.  

Segundo entendimento de J. J. Canotilho, a ideia de segurança jurídica surge da necessidade humana da estabilidade, sem muitas alterações ou mudanças no decorrer do tempo, a fim de se organizar a vida social de forma equilibrada[ii].

            No campo imobiliário a estabilidade é fundamental para garantir às partes tranquilidade e confiança, evitando-se surpresas desagradáveis no decorrer do tempo, diante da falta de cautela ou atenção no momento da realização do negócio, onde as partes, invariavelmente, estão tomadas pela emoção e demais reações de cunho psicológico e  natureza subjetiva.  

            Por isso a necessidade de diligência na operação; que significa interesse, cuidado, atenção e zelo na execução de uma tarefa[iii].

            Nesta linha de raciocínio, pode-se considerar que parte essencial deste cuidado na realização da operação imobiliária passa pela presença de um advogado. O profissional, neste caso, que detém capacidade para trazer ao negócio jurídico a segurança e a confiabilidade que todos almejam.

            Deve-se trazer a evidência de que a compra e venda está isenta de vícios, irregularidades ou impedimentos que possam acarretar transtornos futuros, o que garantirá  segurança jurídica para a concretização da operação, mesmo dentro de um conceito de relativização, diante do complexo dos fatos e fenômenos jurídicos.

            Como observa Guilherme Machado Casali, em artigo publicado no CONPEDI: “Assim, tem-se outro elemento essencial para a compreensão da segurança jurídica, qual seja, a certeza”[iv].

            O papel do advogado, neste contexto, passa não apenas pela criteriosa análise documental das partes (legitimidade, propriedade, matrícula imobiliária, certidões exigíveis, débitos, eventuais impedimentos, entre outros), mas também pela elaboração, verificação ou correção dos instrumentos jurídicos ligados à transação, como o contrato particular e a minuta da escritura pública de compra e venda, construindo cláusulas, estabelecendo garantias e condições resolutivas ou não, atribuindo transparência plena para a negociação.

            Em que pese a lei exigir a escritura pública (art. 108, Código Civil) e o registro (art. 1.245, Código Civil), muitas vezes há orientação jurídica para a celebração antecedente do contrato particular, com o objetivo de regular situações pendentes de solução, como por exemplo, impedimentos ou vícios sanáveis, além de viabilizar, com maior riqueza de detalhes, o ajuste prévio sobre o exercício da posse, a entrega de chaves, os bens móveis integrativos da negociação, as condições resolutivas e as não resolutivas, entre outras questões relevantes de ordem prática e com repercussão jurídica.

            Todavia é importante ressaltar que, ainda que se realize o contrato particular, com direitos e obrigações, “a transferência do domínio, porém, só se opera (...) pelo registro do título translativo, se for imóvel (art. 1.245)”[v].

            Sobre o tema que envolve a segurança nas transações de imóveis, destaque deve ser dado para a recente alteração legislativa, promovida pela Lei n. 13.097/2015, que instituiu a concentração dos atos na matrícula do imóvel, objetivando dar maior segurança aos negócios imobiliários, nos termos do conteúdo do artigo 54:

“Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações:         (Vigência)

I – registro de citação de ações reais ou pessoais reipersecutórias;

II – averbação, por solicitação do interessado, de constrição judicial, do ajuizamento de ação de execução ou de fase de cumprimento de sentença, procedendo-se nos termos previstos do art. 615-A da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil;

III – averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo de direitos registrados, de indisponibilidade ou de outros ônus quando previstos em lei; e

IV – averbação, mediante decisão judicial, da existência de outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso II do art. 593 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.

Parágrafo único.  Não poderão ser opostas situações jurídicas não constantes da matrícula no Registro de Imóveis, inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel, ressalvados o disposto nos arts. 129 e 130 da Lei no 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, e as hipóteses de aquisição e extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel”.

 

            Trata-se do chamado princípio da concentração, segundo o qual todas as informações sobre o imóvel devem-se concentrar em uma única fonte, qual seja: a matrícula imobiliária do Registro de Imóveis onde se localiza o bem.

            Isto significa que, a princípio, de acordo com o novo regime instituído pela referida lei, só poderão ser opostos, ao adquirente de boa-fé, os atos jurídicos que tiverem averbação ou registro precedente na matrícula imobiliária, o que dispensaria supostamente a obtenção de algumas certidões negativas, por exemplo. 

            Entretanto, mesmo com a concentração dos atos na matrícula em vigor, há situações que devem ser analisadas com cautela, pois podem trazer riscos para os negócios.

Como exemplo, podemos citar o art. 185 do Código Tributário Nacional, que presume fraudulenta a alienação de bens por sujeito passivo em débito com a Fazenda Pública. Nesta situação hipotética, pela aplicação da Lei n. 13.097/2015, se não houvesse averbação da existência da dívida fiscal na matrícula, o imóvel poderia ser alienado, sem maiores problemas, pelo respeito ao princípio da concentração. Já pela aplicabilidade do Código Tributário Nacional, ainda que não averbada a ação à margem da matrícula imobiliária, poder-se-ia suscitar presunção de fraude.

Portanto, nesta linha de raciocínio, cada vez mais se justifica a presença de uma consultoria jurídica nas transações imobiliárias, justamente para que esta, diante de situações como a destacada, possa orientar, dirigir e indicar o caminho mais seguro e correto, evitando-se futuros dissabores.

Não bastasse isso, o advogado poderá, igualmente, dependendo das peculiaridades da transação, orientar e construir cláusulas de proteção e equilíbrio, que visem afastar a maior parte possível da incompletude contratual, invariavelmente presente nos contratos de compra e venda de imóveis, além de evitar a futura judicialização da questão, o que aumentaria consideravelmente os custos de transação.

Conclui-se, assim, no contexto abordado, que o advogado tem um papel importantíssimo nas transações imobiliárias, a fim de garantir estabilidade, preservar a segurança e dar a humana certeza de um bom negócio. Até porque, segundo o sábio ditado popular: “é melhor prevenir do que remediar”.   

 

Notas e Referências

[i] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro, volume 3: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 21.ed. rev. e atual. de acordo com o Novo Código Civil e o Projeto de Lei 6960/2002. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 178.

[ii] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2002. p. 258.

[iii] Disponível em: https://www.dicio.com.br/diligencia/. Acesso em: 23/10/2018.

[iv] CASALI, Guilherme Machado. Sobre o conceito de segurança jurídica. Disponível em: < http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/bh/guilherme_machado_casali.pdf>.  Acessado em: 22/10/2018.

[v] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. V: direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 273.

 

 

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