- A ideia genial de uma decisão histórica
- A impetração de habeas corpus em favor de LULA, por Wadih Damous, Paulo Pimenta e Paulo Teixeira, foi uma ideia genial, fundada em argumentos jurídicos: a) a decisão de execução provisória da pena não tem fundamentação legal, necessária pela atual jurisprudência do STF; b) a negação do direito de execução da pena próxima ao meio social e familiar, permitida pelo art. 103, da LEP, impôs rigor desnecessário à privação da liberdade; c) a violação da garantia constitucional de pré-Candidato à Presidência da República, de livre manifestação do pensamento (5º, IV, CF), de livre expressão da atividade intelectual e de comunicação (5º, IX, CF) e de garantia do acesso à informação (5º, XIV, CF).
- A decisão do Desembargador Federal ROGÉRIO FAVRETO, em regime de plantão no TRF-4, de expedir alvará de soltura de LULA em medida liminar, foi um acontecimento brilhante que recuperou, por alguns momentos heroicos, a dignidade da justiça criminal brasileira: desafiou o poder, a ideologia dominante, as conveniências burocráticas da jurisdição. Foi um brilho intenso enquanto durou, mas de efeitos importantes na história da Justiça: primeiro, porque denuncia a ilegalidade da prisão de LULA por falta de fundamentação, como determina o art. 93, IX da CF e exige a jurisprudência do STF; segundo, porque o mandado de prisão de LULA foi expedido de modo automático após condenação em 2º grau, contrariando posição do STF que condiciona a prisão à verificação concreta das hipóteses do art. 312, CPP; terceiro, porque existem embargos de declaração pendentes de julgamento, impedindo o exaurimento da jurisdição de 2º grau e excluindo a expedição do mandado de prisão contra LULA.
- Mas a decisão desse grande magistrado teve outro fundamento: o fato novo da condição de LULA como Pré-Candidato à Presidência da República pelo Partido dos Trabalhadores - fundamento que exclui qualquer conflito com a decisão da Suprema Corte no HC 152.752/PR, que não trata da Pré-Candidatura de LULA. Esse fato novo, de natureza notória e objeto de manifestação pessoal de LULA, projeta-se no processo eleitoral em curso, fundado no princípio da igualdade de condições entre os concorrentes. Mas o princípio da isonomia eleitoral estaria sendo violado por negativas judiciais do direito constitucional de expressão e de comunicação com rádios, jornais e TVs (5º, IX, CF), que fraudam a participação popular nas decisões democráticas sobre o futuro do País e infringem o direito de imagem garantido aos cidadãos (5º, X, CF) - somente excluídos com decisão condenatória transitada em julgado e, portanto, vigentes durante a execução provisória da pena.
- A decisão judicial de concessão do habeas corpus de LULA exprime a mais rigorosa lógica jurídica: o direito do cidadão de figurar como Pré-Candidato implica o exercício da livre expressão da atividade intelectual e de comunicação de ideias políticas, que pressupõem a liberdade de locomoção do Pré-Candidato, como condição elementar do exercício de direitos constitucionais assegurados a todo cidadão. A decisão judicial refere a impossibilidade de antecipação satisfativa da pena na execução provisória, fala da plausibilidade jurídica das teses dos recursos aos Tribunais superiores, que garantem o direito individual de julgamento em liberdade de LULA, além do reconhecimento do direito político do povo de participar de processo eleitoral isonômico e democrático. Até aqui, o Direito como discurso fundado na lógica jurídica.
- A reação ilegal de juízes políticos
- Agora, começa o espetáculo de um contra direito judicial, instituído no País pela obsessão punitiva da Operação Lava Jato, promovida pela Força Tarefa do MPF, sob a tutela do Juiz Moro. A liminar de suspensão da prisão de LULA, deferida por magistrado no regular exercício de competência jurisdicional exclusiva, teve o efeito de afetar as emoções do Juiz Moro, em férias no Primeiro Mundo. A reação do Juiz Moro, o maior inimigo público de LULA, foi sintomática: inconformado com a liminar concedida, pediu instruções ao Presidente do TRF-4 sobre o que fazer, apesar de não poder pedir instruções e de não ter o que fazer; o Presidente recomendou consultar o Relator do Caso Tríplex, apesar de não ter que recomendar nada; o Relator sugeriu descrever a situação e pedir orientação, apesar de não dever sugerir, nem orientar coisa alguma, segundo regras universais de jurisdição.
- O Juiz Moro, sem competência para interferir no caso, prolatou despacho/decisão, dizendo o seguinte:
- a) determinou a prisão de LULA em cumprimento de ordem do TRF-4, que decidiu sobre a execução provisória da pena e, assim, não é autoridade coatora;
- b) informa que a decisão monocrática do habeas corpus se fundamenta no direito de participar de campanha eleitoral;
- c) confessa não ter poderes jurisdicionais para ordenar a prisão nem para autorizar a soltura de LULA;
- d) afirma que o Desembargador Federal plantonista é absolutamente incompetente para desafiar decisão da 8ª Turma ou do plenário do STF;
- e) alega um dilema pessoal: se cumprir decisão de autoridade incompetente, estará descumprindo ordem de prisão da 8ª Turma;
- f) define a situação como impasse jurídico e determina à Secretaria remeter cópia do despacho ao Relator;
- g) determina notificação da autoridade policial para não descumprir a ordem de prisão do TRF-4.
- Análise dos argumentos do Juiz Moro.
O Juiz Moro somente poderia se manifestar se o Magistrado do habeas corpus solicitasse informações sobre a prisão: se nenhuma informação foi solicitada, então o ativismo judicial do Juiz Moro é ilegal e tumultuário. Sobre o que diz:
a’) se a prisão de LULA foi determinada sem fundamentação da decisão, então a prisão de LULA é ilegal, independente da origem da ordem de prisão;
b’) se o Juiz Moro reconhece o fato novo do direito de participar de campanha eleitoral como fundamento da decisão, então improcede o argumento de decisão monocrática contrária ao colegiado da 8ª Turma ou ao Plenário do STH, que não decidiram sobre esse fato novo;
c’) se o Juiz Moro não tem poderes para ordenar a prisão ou determinar a soltura de LULA, não se segue que o Magistrado de plantão não teria poderes para determinar a soltura de LULA, em decisão de habeas corpus apresentado no plantão judiciário;
d’) a incompetência para confrontar decisão do colegiado do TRF-4 ou do Plenário do STF é reconhecida pelo Desembargador Federal de plantão, mas a competência jurisdicional para conceder liminar fundado em fato novo decorre da lei e não da vontade do Juiz Moro;
e’) o dilema do Juiz Moro entre cumprir ordem de autoridade incompetente ou cumprir ordem de órgão colegiado do TRF-4 é um falso dilema, porque o Desembargador Federal plantonista é autoridade competente para decidir habeas corpus fundado em fato novo - e assim não existe contradição com decisão de colegiado fundada em fato antigo;
f’) a definição da situação como “impasse jurídico” é criação idiossincrática do psiquismo político-partidário do Juiz Moro, sem relação com conflitos jurídicos do mundo real;
g’) a ilegal notificação do Juiz Moro à autoridade policial para não descumprir ordem de prisão do Tribunal - ou seja, a notificação para não cumprir o mandado judicial de soltura de LULA -, pode constituir desobediência a ordem legal de funcionário público (art. 330, CP), ou mesmo prevaricação, por retardar ato de ofício para satisfazer interesse ou sentimento pessoal (art. 319, CP).
- Um epílogo digno de tribunais de exceção
Não obstante, a invocação do poder burocrático da ditadura judiciária pelo Juiz Moro, produziu o estrago sabido: o Relator do Caso Tríplex, invadiu a esfera de competência do Desembargador de plantão, proibiu qualquer mudança na decisão sobre a prisão de LULA e avocou os autos do habeas corpus para o seu gabinete.
E nós ficamos com esta reflexão incômoda: o conhecido sentimento de imunidade do Juiz Moro, comprovado na prática de crimes graves (como quebrar segredo de justiça, divulgando o conteúdo de interceptação telefônica), é uma agressão à consciência democrática do povo, que envergonha a Magistratura nacional e demanda ação disciplinar dos órgãos competentes, antes que o compulsivo ativismo político-partidário desse magistrado destrua a imagem da justiça criminal brasileira.
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