A corrupção corroendo a moral e os bons costumes: até quando? – Por Jonathan Cardoso Régis

04/02/2016

Esta é uma breve reflexão acerca da corrupção e de como ela está inserida em nosso cotidiano.

Na verdade, o que proponho é uma reflexão acerca de nossas atitudes diárias que, a nosso ver, diante da constante evolução da sociedade humana, é, por natureza corruptível, senão vejamos.

Sei que já pensamos e/ou viemos pensando a respeito desse comportamento imoral e sem fim que nosso país vem passando nos últimos anos: agentes públicos, cidadãos, empresários, conglomerados, governadores, prefeitos, deputados, vereadores (como recentemente ocorreu nos municípios de Tijucas/SC e Centralina/MG, em que representantes do legislativo foram presos, no primeiro caso, por suspeita de desvio de dinheiro público, os quais recebiam e autorizavam pagamento de diárias, assim como outros custos para a realização de cursos no Estado do Paraná, voltados para a administração pública, só que com um detalhe: não frequentavam as aulas, segundo apontam as investigações e informações veiculadas nos órgãos de imprensa.

No segundo caso, uma cidade com pouco mais de dez mil habitantes no interior de Minas Gerais, todos, isso mesmo, todos os vereadores foram presos por suspeita de corrupção e uma conduta semelhante a destacada acima, fraude de notas fiscais que justificavam o pagamento/recebimento de diárias de viagens que, em verdade, nunca eram realizadas.

Somado a isso, recente pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (aqui) apontou que a maior preocupação do brasileiro (diga-se de passagem, tal perspectiva modificou nos últimos anos), não é a segurança pública, saúde, educação, tráfico de drogas ou a violência, mais sim, a corrupção escancarada vivenciada diariamente e exposta aos quatro cantos do Brasil e do mundo, considerada o mais gravoso dos problemas, registrando que 06 (seis) em cada 10 (dez) brasileiros consideram a corrupção como o pior problema do Brasil.

Segundo a CNI, 65% dos brasileiros consideram a corrupção uma questão extremamente grave no Brasil, seguida das drogas (61%) e da violência (57%). Na pesquisa, feita em 2012, os três principais problemas citados pela população eram drogas (72%), violência (65%) e saúde (62%). A corrupção aparecia em quarto lugar (58%). Já em 2014, drogas (67%), violência (64%) e corrupção (62%) foram colocados como problemas extremamente graves[1].

Tem-se a corrupção, como sendo um desvio de conduta, de caráter, adotando-se comportamento em desconformidade com a moral, os bons costumes, gerando reflexo e prejuízos nas relações sociais.

Cumpre ressaltar que a corrupção ultrapassou os limites da política, atingindo as instituições e como já asseverado, tornando-se um problema social.

Notadamente, a corrupção pública cresceu vertiginosamente e esta não é projetada horizontalmente, “em termos quantitativos, mas na verticalização de qualidade, em decorrência de uma prática reiterada que se torna habitual e ‘natural’”[2].

Há no ordenamento jurídico brasileiro, a criminalização dessa conduta, como podemos verificar nos crimes de corrupção passiva e ativa, concussão, prevaricação e peculato, sendo a maior parte dessas práticas delitivas e por que não dizer, desonestas, responsabilizando, em especial, o agente público, mas sem esquecermos o desvirtuamento de conduta por parte do cidadão, seja tal conduta comissiva ou omissiva na obtenção de benefícios, privilégios, oportunidades ou interesses, sejam estes políticos, pecuniários, sociais, para si ou outrem.

Jorge Eitken[3], assim leciona:

Por este camino, la sociedad civil, sin proponérselo, llega a convivir con esas prácticas. A veces se argumenta que "es el menor de los males", otras se dice que "todo sistema es imperfecto" o bien que esa inmoralidad es propia de "un modelo en construcción". Con estos argumentos, que son un disfraz del poder, es posible que lo inmoral se justifique, que se mantenga a sí mismo, y sea parte normal del aparato estatal. Por este camino entramos en la inmoralidad estructural y cultural.

Corrupto é aquele que fura a fila ou anda pelo acostamento durante um engarrafamento no trânsito. Corrupto é aquele que jogo lixo no chão, que atravessa a rua fora da faixa de pedestre, que ultrapassa com seu veículo o sinal vermelho, que conduz o veículo sem habilitação, falando no telefone celular ou a motocicleta sem capacete. É corrupto aquele que transporta seu filho fora da cadeira de segurança. Também aquele que “leva para casa” o lápis ou o brinquedo do amiguinho da escola. Corrupto é ainda aquele que se vende (por muito ou por pouco), quando da prestação de serviço público, na execução de obras públicas, na execução do serviço, que deixa de agir dentro da legalidade ou é conivente com irregularidades/ilegalidades, para beneficiar a si ou a terceiros, ou simplesmente para não exercer corretamente suas funções. É corrupto o “espertalhão” que fura a fila (seja qual for) e ainda se fazendo de desentendido.

Ou seja, tais condutas negativas, simples ou complexas, geram gravíssimas preocupações em todos os cantos do planeta, levando, inclusive, a ser deliberada a Convenção Interamericana contra a Corrupção[4] (clique aqui) no ano de 1996, sendo o primeiro instrumento internacional de combate á corrupção, vindo ser recepcionada pelo Brasil através do Decreto nº 4.410[5], de 07 de outubro de 2002, estabelecendo sua execução e cumprimento integral, salvo o disposto no art. XI, parágrafo 1º , inciso "c", o qual estabelece que, visando “impulsionar o desenvolvimento e a harmonização das legislações nacionais e a consecução dos objetivos desta Convenção”, aqueles Estados que considerem conveniente a tipificação de determinadas condutas em suas legislações,

[...] toda ação ou omissão realizada por qualquer pessoa que, por si mesma ou por interposta pessoa, ou atuando como intermediária, procure a adoção, por parte da autoridade pública, de uma decisão em virtude da qual obtenha ilicitamente, para si ou para outrem, qualquer benefício ou proveito, haja ou não prejuízo para o patrimônio do Estado

A mencionada Convenção traz, dentre outros aspectos de que a “corrupção solapa a legitimidade das instituições públicas e atenta contra a sociedade, a ordem moral e a justiça, bem como contra o desenvolvimento integral dos povos”, assim como também, para a convivência harmônica e do desenvolvimento da paz e da democracia representativa, há a necessidade de se combater toda e qualquer “forma de corrupção no exercício das funções públicas e aos atos de corrupção especificamente vinculados a seu exercício”, uma vez que acredita-se que “o combate à corrupção reforça as instituições democráticas e evita distorções na economia, vícios na gestão pública e deterioração da moral social”, somado ao fato de que a “corrupção é um dos instrumentos de que se serve o crime organizado para concretizar os seus fins”, bem como busca-se pela conscientização da sociedade quanto a “gravidade desse problema e da necessidade de reforçar a participação da sociedade civil na prevenção e na luta contra a corrupção”, o qual tais atos transnacionais, exigem ações de  respeito dos bens públicos.

Ademais, a Convenção em questão destaca a soma de esforços visando ações preventivas, de identificação, punição/responsabilização e erradicação da corrupção da administração pública e de “atos de corrupção especificamente vinculados a seu exercício”.

Convenção Interamericana contra a Corrupção trata essa conduta da seguinte forma, disposta em seu art. VI:

1. Esta Convenção é aplicável aos seguintes atos de corrupção:

a. a solicitação ou a aceitação, direta ou indiretamente, por um funcionário público ou pessoa que exerça funções públicas, de qualquer objeto de valor pecuniário ou de outros benefícios como dádivas, favores, promessas ou vantagens para si mesmo ou para outra pessoa ou entidade em troca da realização ou omissão de qualquer ato no exercício de suas funções públicas;

b. a oferta ou outorga, direta ou indiretamente, a um funcionário público ou pessoa que exerça funções públicas, de qualquer objeto de valor pecuniário ou de outros benefícios como dádivas, favores, promessas ou vantagens a esse funcionário público ou outra pessoa ou entidade em troca da realização ou omissão de qualquer ato no exercício de suas funções públicas;

c. a realização, por parte de um funcionário público ou pessoa que exerça funções públicas, de qualquer ato ou omissão no exercício de suas funções, a fim de obter ilicitamente benefícios para si mesmo ou para um terceiro;

d. o aproveitamento doloso ou a ocultação de bens provenientes de qualquer dos atos a que se refere este artigo; e

e. a participação, como autor, co-autor, instigador, cúmplice, acobertador ou mediante qualquer outro modo na perpetração, na tentativa de perpetração ou na associação ou confabulação para perpetrar qualquer dos atos a que se refere este artigo.

2. Esta Convenção também é aplicável por acordo mútuo entre dois ou mais Estados Partes com referência a quaisquer outros atos de corrupção que a própria Convenção não defina.

Em resumo, a corrupção foi absorvida e integra a sociedade em sua convivência diária, o que torna cada vez mais frágil a realidade na busca por “mecanismos de controle do exercício público e na inversão da função estatal de cumprir e fazer cumprir a legislação[6]”.

Enfim, quase toda ação humana no convívio em sociedade, em um país sem educação (no sentido literal da palavra), que tem por hábito/costume, sempre busca se beneficiar de alguma forma em detrimento dos demais, é corrupto, uma vez que age quebrando a confiança, os bons costumes, a convivência pacífica em sociedade, sendo que permanecemos inertes a tudo o que presenciamos e vivenciamos, tratando essas e tantas outras situações como naturais e habituais.

Assim, enquanto não adotarmos uma postura de agir dentro da legalidade em todos os nossos atos (dos mais simples aos mais complexos), de uma consciência crítica, de não exigirmos daqueles que nos representam uma conduta sustentada pela ética, moral, bons costumes e exemplos excepcionais (o que em verdade, a nosso ver, deve ser hábito e não dever), de se ter uma responsabilização efetiva daqueles que se corrompem, continuaremos na atual realidade, senão em situação ainda mais gravosa.

Pense nisso!


Notas e Referências:

[1] Empresa Brasil de Comunicação S/A – EBC. População já relaciona corrupção à má qualidade do serviço público, diz pesquisa. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-01/populacao-ja-relaciona-corrupcao-ma-qualidade-do-servico-publico-diz-pesquisa>. Acesso em: 29 jan. 2016.

[2] FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Corrupção no poder público: peculato, concussão, corrupção passiva e prevaricação. São Paulo: Atlas, 2002, p. 31.

[3] EITKEN, Jorge. La doble moral de las organizaciones: los sistemas perversos y la corrupción institucional. Madri: McGraw Hill, 1994.

[4] Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 29 de março de 1996.

[5] BRASIL, Decreto nº 4.410, de 07 de outubro de 2002. Promulga a Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 29 de março de 1996, com reserva para o art. XI, parágrafo 1o, inciso "c". Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4410a.htm>. Acesso em: 01 fev. 2016.

[6] FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Corrupção no poder público: peculato, concussão, corrupção passiva e prevaricação, p. 31.


 

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