A aplicabilidade da Tutela de Evidência em ações promovidas contra a Fazenda Pública, com o fito de garantir a compensação antecipada do crédito tributário em face do trânsito em julgado meritório da ação

28/08/2018

Coluna O Novo Processo Civil Brasileiro / Coordenador Gilberto Bruschi 

1. Introdução

O tema ora analisado enseja grandes divergências de posicionamento entre Estado e contribuintes, tanto na perspectiva doutrinária, quanto jurisprudencial. Assim como a larga maioria dos temas em matéria tributária, há entendimentos exarados pró-Fisco e entendimentos exarados pró-contribuinte. Especificamente no tocante ao tema epigrafado (o qual não foge à regra, impende asseverar), é de sabença que a sociedade jurídica se encontra em uma fase de construção e consolidação da jurisprudência, de modo que ainda não há um entendimento inteiramente sedimentado a respeito do tema.

Trata-se da possibilidade de compensação antecipada de um crédito tributário sub judice, quando da incontroversa presença do trânsito em julgado material/meritório da ação. E é justamente esta a problematização que o presente artigo propõe: a articulação da doutrina e da jurisprudência no tocante ao referido tema, sob a égide do CTN (Lei nº 5.172/1966) e do novel codex processual civil (Lei nº 13.105/2015), mais precisamente sob a égide do instituto da Tutela Provisória de Evidência.

No mundo fático, muitas vezes as ações de natureza tributária (evidentemente ajuizadas em face da Fazenda Pública) possuem por desiderato a garantia, in fine, da possibilidade de compensação de um crédito tributário pelo contribuinte (quando este se consagra vencedor da contenda), pela via administrativa, à luz dos ditames regulamentadores preconizados pelo Fisco – a exemplo da Receita Federal do Brasil (RFB), ou das secretarias da Fazenda Estadual e Municipal.

Sob o prisma constitucional, contudo, o Fisco carrega a função precípua de recorrer a toda e qualquer decisão desfavorável ao erário. Trata-se do famigerado recurso ex-officio, da remessa necessária, inclusive evocando-se aqui, ainda que de forma meramente tangenciada, importantes conceitos do Direito Administrativo, como o caro princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

De qualquer sorte, fato é que, muitas vezes, o contribuinte (seja pessoa física ou jurídica) sabe que sua tese encontra forte respaldo jurídico – estando ela muitas vezes pautada em precedentes judiciais, como é o caso, por exemplo, dos Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas, ou até mesmo nos casos de decisões julgadas sob o regime da repercussão geral, cada vez mais presente em nosso Supremo Tribunal Federal (STF) e consentâneo com aquilo que preconiza o NCPC.

Não obstante, muitas vezes o contribuinte vê-se tolhido de seu direito de compensar o crédito tributário que intenciona (ainda que este esteja claramente e incontestavelmente constituído), até que haja o regular trânsito em julgado total da lide, seja em estrito cumprimento e observância à rigorosa letra da lei por parte das procuradorias, seja pelo curioso fato de se notar, em muitos casos, a interposição de recursos claramente protelatórios, ainda que a questão de fundo, meritória, já reste sob o manto protetivo do trânsito em julgado material (seja por versar sobre matéria incontroversa, seja por haver alguma espécie preclusão recursal. Ambas as situações são vistas com frequência no caso concreto).

Ainda que de razões e naturezas casuísticas, não se pode negar que o Fisco detém em suas mãos o poder de arrastar, muitas vezes por anos, a duração de uma ação judicial que trata de matéria tributária. Isto afasta inclusive outro ponto que vem sendo perseguido de maneira bastante contundente pelo NCPC, qual seja, a duração razoável do processo. O questionamento que resta é: até que ponto este cenário é benéfico à sociedade e ao erário, e até que ponto este cenário é tão somente prejudicial aos contribuintes?

Considerando a provocação acima suscitada, bem como os seus impactos no mundo fático, insta trazer à baila que o NCPC inovou a matéria da tutela provisória, ao prever a possibilidade de concessão de uma medida protetiva sob a rubrica de “Tutela de Evidência”, a qual possui o desiderato de, digamos, distribuir de maneira mais adequada o ônus do tempo processual[1], garantindo à parte que assiste razão a antecipação dos efeitos da tutela, através de medidas de segurança de caráter liminar, inaudita altera parte) e de cognição sumária e não exauriente.

A seguir, veremos uma breve e perfunctória conceituação do referido (e já amplamente conhecido) instituto e, na sequência, a sua aplicação no que tange a possibilidade de compensação antecipada do crédito tributário, quando da existência do trânsito em julgado meritório de uma ação judicial.

2. A Tutela Provisória de Evidência no Novo Código de Processo Civil

O instituto em análise é consagrado pelo artigo 331 do NCPC. Funda-se não no fato da situação geradora do perigo de dano, mas, sim, no fato de a pretensão de tutela imediata (em caráter liminar) se apoiar em comprovação suficiente do direito material da parte, quando da presença de elementos que sejam bastantes para que haja o juízo de mérito em favor de uma das partes.

Ainda que abstraindo do risco de dano material imediato (periculum in mora), a tutela de evidência parte do princípio de que a duração do processo não deve redundar em maior prejuízo à parte que, satisfatoriamente, já demonstrou ser melhor detentora de um direito dentro do litígio material.

Trata-se, como demonstrado alhures, de espécie do gênero “tutela provisória” consagrada pelo NCPC, sendo medida incidental (também chamada de endoprocessual) de antecipação da prestação jurisdicional satisfativa; técnica esta que, face à veemente probabilidade do direito de uma das partes (como, por exemplo, um contribuinte, como no caso em tela), permite que o ônus do tempo do processo seja distribuído de maneira mais adequada e justa, posto que “afigura-se completamente irracional obrigar o autor a sofrer com a demora do processo quando os fatos constitutivos de seu direito já restam amplamente incontroversos” (MARINONI, Luiz Guilherme, p. 194).

Assim, tem-se que a tutela de evidência pressupõe, por sua própria natureza, uma demanda principal já ajuizada, para que se possa aferir, avaliar, a evidência do direito daquela parte sobre o qual a medida liminar irá recair, podendo ser evocada a qualquer momento do curso do processo, cumpre salientar.

Nota-se que em quaisquer das hipóteses previstas no artigo 311 do NCPC (supra), há como traço comum a necessidade da presença de um elemento que permita ao julgador reconhecer a comprovação do quadro fático que seja suficiente para sustentar a pretensão da parte autora. É necessário, em outras palavras, que o direito a ser tutelado em juízo encontre-se comprovado de tal maneira que não mais se vislumbre como a parte contrária poderia contestá-lo. No estágio em que se evoca a tutela de evidência, as provas produzidas e/ou as decisões nas quais se consubstancia o pleito da parte autora devem ser mais do que suficientes (e convincentes) para a demonstração de um claro direito ao juízo.

Chama-nos a atenção, mais precisamente, o disposto no inciso II do aludido artigo 311, de modo que se faz mister abordarmos de forma mais minuciosa a sua aplicabilidade no caso concreto por força da proposta do presente artigo. Senão vejamos.

Quando a matéria não mais comporta dilação probatória (tendo já ocorrido nos autos o trânsito em julgado de sua questão meritória), nasce a possibilidade para que as alegações de fato sejam, portanto, comprovadas “apenas documentalmente”. Em igual sentido, quando os fundamentos de direito do pleito encontram forte respaldo e alicerce em “tese firmada em julgamento de casos repetitivos”, resta incontroversa a necessidade de as cortes observarem estes precedentes, de modo a uniformizarem as suas decisões – sendo este, inclusive, mais um ponto que se mostra em linha com a filosofia de precedentes bastante perseguida pelo NCPC (“os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente[2]).

Nesta senda, sempre que a matéria não mais comportar a produção de provas (por exemplo, quando tiver ocorrido a preclusão de que trata o art. 507 do NCPC[3], seja temporal, lógica ou consumativa), ou quando houver precedente ao qual o juízo deve se ater, restar-se-ão comprovados os elementos essenciais e necessários à concessão da Tutela Provisória de Evidência, inclusive em caráter liminar.

Justamente nesta esteira, o insigne jurista Cássio Scarpinella Bueno aduz que: “Nos casos indicados nas letras (b) e (c) [leia-se: incisos II e III do art. 311], a concessão pode ser liminar, isto é, antes da oitiva do réu.”[4]

Ao seu turno, o eminente jurista Alexandre Freitas Câmara[5] também discorre sobre a importância e a necessidade de se conhecer uma garantia de tutela de evidência em caráter liminar. Ao versar sobre a duração razoável do processo e a técnica jurídica da tutela de evidência, aduz, verbis:

“É, pois, uma técnica de antecipação dos efeitos da tutela perfeitamente compatível com a garantia constitucional de duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da Constituição da República). É que há casos – e todo profissional habituado à prática forense já viu algum – em que, proposta uma demanda, o réu apresenta uma defesa que não é séria (...). É, também, o que se dá naqueles casos em que o réu apresenta defesa que contraria fatos notórios, ou se baseia em lei já declarada inconstitucional pelo STF. Considera-se, também, abusiva a defesa da Administração Pública quando contrariar um entendimento firmado, com eficácia vinculante (...)”. (Grifamos)

Quanto aos precedentes e enunciados de súmulas vinculantes, como abordado alhures, estes baseiam-se no estabelecimento de padrões decisórios, capazes de permitir que casos análogos sejam tratados de maneira equânime (to treat like cases alike).

Não é este, contudo, o momento de se analisar o sistema precedencialista do Processo Civil pátrio – por óbvias razões. Ainda assim, destaca-se mais uma vez a sua importância no Direito contemporâneo brasileiro e afirma-se desde logo que a aplicação do disposto no art. 311 do NCPC, mais precisamente no enfoque de seu inciso II, é forma de estar em linha com os ditames do novo código e de perseguir a segurança jurídica de maneira mais contundente, com o fito de dar à prestação da tutela jurisdicional maior celeridade[6]. Oras, nos casos em que reste demonstrado o direito líquido e certo e exista precedentes que caminhem ao encontro do referido direito, justifica-se a concessão da Tutela de Evidência. Inclusive de forma contrária à Administração Pública.

3. A aplicabilidade da Tutela Provisória de Evidência em ações promovidas contra a fazenda pública no tocante à possibilidade de compensação antecipada do crédito tributário, ante o trânsito em julgado meritório da ação

Ainda sob o enfoque do disposto no art. 311 do NCPC, insta salientar que o juízo pode determinar que houve o trânsito em julgado material (inclusive com a competente expedição de certidão) sempre que a situação na qual o processo se encontra se mostrar “apta a atestar, prima facie, a viabilidade da pretensão da demandante[7]”.

Ao seu turno, o próprio codex processual civil autoriza expressamente as decisões parciais no curso de um processo, as quais, inclusive, podem ser objeto de execução, consoante disposto no art. 356 do aludido diploma legal[8].

Assim, é nítida a possibilidade de existência do trânsito em julgado meritório (material), o que dá ensejo inclusive à execução dos efeitos da decisão já prolatada em instâncias anteriores ou até mesmo na própria instância na qual se encontra o processo.

Nestes termos, dispõe o art. 502 do NCPC: “Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso”. Este dispositivo, coadunado com o já trazido art. 507 do mesmo diploma legal, tem por desiderato de atestar a existência de um trânsito em julgado meritório, seja por força de precedentes, seja por força da preclusão, sempre que se estiver diante de matérias que, por quaisquer dos motivos, não mais comportem análise meritória.

Em igual sentido, o enunciado da Súmula 514, do STF, deixa claro que há a possibilidade de coisa julgada sem que todos os recursos tenham se esgotado. Isto se enquadra, inclusive, na Teoria dos Capítulos da Sentença, segundo o qual pode haver coisa julgada em diversos momentos do processo, não sendo necessário o esgotamento de todos os recursos. Em outras palavras, toda sentença apresenta-se composta por capítulos, cuja autonomia mostra grande influência, sobretudo, na formação da coisa julgada e na execução da sentença (JÚNIOR H. T., 2010).

Na esfera tributária, seja administrativa ou judicialmente, o presente assunto orbita ao redor da compensação do crédito tributário.

Há tempos já se entende por incontroversa a possibilidade de compensação de crédito tributário pela via administrativa, através de sua homologação junto ao ente fazendário responsável[9].

No âmbito legal, ao seu turno, o próprio Código Tributário Nacional, diploma recepcionado com força de Lei Complementar, em sua Seção III, artigos 165 e ss., mais precisamente em seu artigo 170, positiva e regulamenta a possibilidade de compensação de indébitos tributários, quando, por exemplo, do pagamento indevido a maior de um determinado tributo.

Hugo de Brito Machado, ilustre tributarista brasileiro, ensina que “a compensação é um modo de extinção das obrigações, pela contraposição de uma à outra a ela equivalente[10]”. Este entendimento visa excluir o crédito tributário superveniente, mediante os efeitos da compensação (Maria Helena Diniz chama de “meio especial de extinção de obrigações[11]), direito este que é assegurado aos contribuintes.

Ora, se uma determinada matéria não pode mais ser atacada por qualquer recurso, por já ter havido preclusão no processo, ou por estar ela pautada em precedentes judiciais vinculantes (e.g.: enunciados de Súmulas ou decisões proferidas em sede de repercussão geral), ainda em homenagem à Teoria dos Capítulos da Sentença (a qual atribui independência e executoriedade a partes distintas de uma mesma decisão); não há que se falar em impeditivos para a imediata compensação do crédito tributário.

Na prática, muitas vezes esta postergação traz prejuízos imensuráveis ao contribuinte (vencedor da questão material da lide).

Ainda que o objetivo deste artigo não seja esmiuçar a parte tributária da questão, fez-se imperioso elucidar ainda que brevemente, em apertada síntese, o instituto da compensação do crédito tributário.

Por depender de homologação do ente tributante, a compensação muitas vezes fica sujeita a arbitrariedades (ou recursos meramente protelatórios, como já asseverado), trazendo prejuízos aos contribuintes. E aí aqui que as matérias se enfeixam: justamente com vistas a distribuir de forma mais harmoniosa, adequada e justa o ônus do processo, é que se tem visto inúmeros contribuintes pleiteando a concessão das Tutelas Provisórias de Evidência em ações contra a fazenda pública, para ver garantido o seu direito à compensação imediata (antecipada) do crédito tributário.

Neste sentido, cumpre destaque às decisões abaixo transcritas, entendimentos exarados pelos Tribunais Regionais Federais (TRF) da 1ª, 2ª e 3ª Regiões, em linha com o exposto no presente artigo acadêmico. Senão vejamos:

“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA (...) INAPLICABILIDADE DO ART. 170-A DO CTN. (...) tendo em vista que a matéria (...) encontra-se, atualmente, pacificada nos colendos STF e STJ, não se mostra razoável aguardar-se o trânsito em julgado de decisum para a efetivação da compensação do indébito tributário em referência, quando inexistente qualquer possibilidade de alteração da situação jurídica já reconhecida, nos autos. Ademais, segundo a inteligência do art. 557, caput e respectivo §1º, do CPC, o relator negará seguimento a recurso manifestamente em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, ou ainda, estando a decisão recorrida em manifesta contrariedade à súmula ou à jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento, de pronto, ao recurso, pelo que se verifica, assim, a inaplicabilidade do art. 170-A, do CTN, na espécie, diante da perfeita harmonia do acórdão desta 8ª Turma com o entendimento jurisprudencial consolidado nos colendos STF e STJ nesta matéria, a possibilitar a eficácia plena e imediata da garantia fundamental da razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII e respectivo §1º) na materialização instrumental do processo justo”. (Grifamos)

(TRF-1 Apelação 0014773-57.2010.4.01.3000. 8ª Turma. Relatoria: Des. Souza Prudente. Sessão: 30/09/2011)

“(...) DA COMPENSAÇÃO PLEITEADA. Embora o artigo 170-A do CTN não permita a compensação de créditos tributários antes do trânsito em julgado da decisão que a tiver determinado (Súmula 212/STJ) nada impede que decisão judicial possa afastar eventuais óbices ilegais e/ou abusivos do fisco, que impeçam o contribuinte de pleitear a compensação administrativamente, conforme prevê a legislação tributária. No caso, a decisão judicial não extingue o crédito tributário, nos termos do artigo 156, II, do CTN, a qual ainda dependerá de valoração da autoridade fiscal no âmbito administrativo, mas declarará sua compensabilidade (na mesma linha da Súmula 213/STJ). Assim, entendo possível a declaração de possibilidade de compensação, antes mesmo do trânsito em julgado, dos valores recolhidos indevidamente com débitos vincendos de quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, nos termos da Instrução Normativa RFB 1.300/2012, a qual regulamentou o disposto no artigo 74 da Lei 9.430/1996 (...) Não faria o mínimo sentido afastar a exigibilidade do PIS e da COFINS (parcialmente) e não permitir que o contribuinte compensasse seus indébitos com tributos da mesma natureza e espécie. (...) ANTE O EXPOSTO, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela para AFASTAR da base de cálculo do PIS e da COFINS os valores referentes ao imposto estadual ICMS suportado pela AUTORA (...). DECLARO provisoriamente ainda o direito de a AUTORA compensar os valores que recolheu a mais a tal título, desde os últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, com quaisquer tributos arrecadados pela SRFB (...), nos termos dos artigos 74 da Lei 9.430/1996, (...), súmulas 212 e 213 do STJ; bem como artigo 39, parágrafo 4º, da Lei 9.250/95. Intimem-se”. (Grifamos)

(TRF-2 Processo 0030990-09.2017.4.02.5101. 28ª Vara. Juiz Federal: Rogério Tobias de Carvalho. 31/07/2017)

“(...) ante o julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça do Recurso Especial nº 1.230.957-RS, submetido à sistemática prevista pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, entendo possível a imediata compensação dos valores referentes à contribuição previdenciária (...). Da mesma forma, considero possível a imediata compensação dos valores correspondentes à contribuição previdenciária patronal incidente sobre as quantias pagas aos empregados a título de auxílio-creche (...). Pelo todo exposto, defiro a tutela de evidência pleiteada para assegurar o direito da autora de compensar imediatamente os valores indevidamente recolhidos a título de contribuição previdenciária (...)” (Grifamos)

(TRF-3, Processo 5007628-70.2017.4.03.6100, 5ª Vara, Seção Judiciária do Estado de SP. Data: 15/08/2017)

4. Conclusão

Ante todo o aparato normativo e jurisprudencial exposto acima, o que se infere é que existe a possibilidade de se reconhecer o direito à compensação antecipada do crédito tributário em ações movidas contra a fazenda pública quando da presença do trânsito em julgado material (meritório) no feito, por força do disposto no art. 311 do NCPC, dispositivo legal que consagra o instituto da Tutela Provisória de Evidência.

Consoante se depreende dos julgados supratranscritos, muitos Tribunais já vêm, acertadamente, entendendo pela desnecessidade de se aguardar o trânsito em julgado total da ação para se garantir a devida compensação do indébito tributário, em casos nos quais inexistente qualquer possibilidade de alteração da situação jurídica já reconhecida, seja pela existência da preclusão ou por estarem estes casos adstritos a casos análogos e cujas decisões estejam calcada em precedentes judiciais.

Restou demonstrado que, muitas vezes, o contribuinte já sabe de antemão qual será o resultado da decisão no seu processo específico. Assim sendo, pode se pugnar pela flexibilização do art. 170-A do CTN, entendimento este que deve ser acolhido pelo juízo quando presentes os requisitos intrínsecos, conforme resta claro e evidente no posicionamento jurisprudencial que, cada vez mais, ganha força em nossos tribunais.

Assim, na prática, resta que o contribuinte peticione ao juízo competente requerendo a expedição de uma certidão de trânsito em julgado material, para que, em seguida, o seu crédito possa ser homologado junto ao ente fazendário competente e, desta forma, o contribuinte veja satisfeito seu direito de compensar antecipadamente o crédito.

 

Notas e Referências

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[1] Conforme sugere a doutrina de Arruda Alvim, para quem a tutela antecipada de evidência “está, tanto quanto a tutela antecipada de urgência, fundada na necessidade de redistribuição justa do ônus do tempo no processo”. (Manual de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 17ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 735).

[2] Art. 926 do Código de Processo Civil.

[3]Art. 507: É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão”.

[4] BUENO, Cássio Scarpinella. “Novo Código de Processo Civil Anotado”. Saraiva, 2015, 1ª Ed., p. 25.

[5] CÂMARA, Alexandre Freitas. “O Novo Processo Civil Brasileiro”. Atlas, São Paulo, 2015, 1ª Ed., p. 171.  

[6] DE PINHO, Humberto Dalla Bernardina. Direito Processual Civil Contemporâneo. SaraivaJur. São Paulo, 2017, 4ª ed., p. 77.

[7] BODART, Bruno Vinícius da Rós. Simplificação e Adaptabilidade no Anteprojeto do Novo CPC. In: FUX, Luiz (coord.). O Novo Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Ed. Forense, 2011, p. 81.

[8]Art. 356: O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles: I - Mostrar-se incontroverso; II - Estiver em condições de imediato julgamento (...).

  • 2o A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto. § 3o Na hipótese do § 2o, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva. (...)”

[9] A exemplo do disposto na Lei nº 9.430/1996 (art. 74) e regulamentado em sede administrativa pela Instrução Normativa da Receita Federal (IN-RFB) nº 1.717/2017.

[10] MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo, Atlas, 2005, p. 475

[11] DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico, Saraiva, 1998, São Paulo, p. 692.

 

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