Tratamos, no texto anterior, da importância da ocorrência da certificação do fato modificativo (alteração de estado de fato ou de direito) por uma autoridade competente, v.g., o Poder Judiciário provocado por meio do ingresso da ação modificatória. A conclusão firmada anteriormente, nos leva, ainda que de modo superficial, a traçar os aspectos procedimentais da aludida ação. Eis o tema do presente texto.
Além do debate acerca da prescindibilidade da expedição do comando mandamental pelo Poder Judiciário para sustação da eficácia futura da decisão judicial transitada em julgado (tema já tratado), é possível encontrar discussão acerca do procedimento que deve ser utilizado. Destaca-se, neste caso, o surgimento de posicionamentos jurisprudenciais fixadores do entendimento de que a ação (ou pelo menos o pedido) de modificação ocorra nos próprios autos da ação anterior[1]. No exemplo, o procedimento de reconhecimento do fato modificativo seria semelhante ao de cumprimento de sentença, isto é, formulando nos próprios autos do processo em que se busca a sustação da eficácia futura da decisão judicial transitada em julgado.
Tal entendimento, equivocado em si mesmo, possivelmente deve-se ao fato de o art. 505, I, CPC[2] (art. 471, I, CPC, ao tempo da decisão geradora do precedente), não dispor expressamente qual o procedimento para trâmite da ação de modificação. Algo análogo dá-se com a ação do art. 15 da Lei n° 5.478/1968[3], o qual não fez expressa referência sobre a aplicação do procedimento especial da ação de alimentos às ações modificatórias (“ações revisionais”).
A omissão, todavia, não autoriza a interpretação tendente a construção de um procedimento especial sem respaldo legislativo. Deve-se solucionar o problema interpretando o caso como (se fosse) uma opção legislativa pela utilização do procedimento comum previsto no CPC (art. 318 e segs.).
Aliás, corroborando com o posicionamento ora apresentando, no sentido de que o procedimento especial precisa estar expresso na legislação, o art. 10, parágrafo único, da Lei n° 13.300/2016[4], dispôs sobre a aplicação do procedimento especial da lei (mandado de injunção), ressalvado os casos de incompatibilidade, para ação de modificação ajuizada com o escopo de atestar a modificação nas circunstâncias de fato ou de direito da decisão proferida no mandado de injunção.
Portanto, ressalvada as situações disciplinadas na legislação especial, a ação de modificação deve seguir o procedimento comum estabelecido no CPC.
Ademais, em crítica ao posicionamento contrário, a ação modificatória, diferentemente do cumprimento de sentença (da ação referente a ele, em rigor), não é uma ação sucessiva, porque nada tem a ver com o implemento eficacial da ação anterior, algo, como é notório, da ação de cumprimento e da execução que lhe pode seguir. Pelo contrário, trata-se de ação que vai contra a força da ação anterior, cuja atualização se deu na decisão impugnável. Portanto, ao invés da hipótese de ação posterior juntar forças à anterior, a modificatória é caso de ação posterior que (ex)surge para destruir a que lhe antecedeu.
No próximo texto, trataremos do problema da competência para o processamento ação modificatória.
Notas e Referências
[1] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº 651.260. Relator Min. Gilson Dipp. DJ: 29/05/2006. Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 28/01/2011. “O art. 471, inciso I do Código de Processo Civil permite o rejulgamento da lide nos mesmos autos, se se tratar de relação jurídica continuada - como na hipótese dos autores - e houver sido modificado o estado de direito - no caso, a liminar na ADIN nº 1.434 proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em face do novo regime jurídico instituído pela Constituição Paulista.”
[2] Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo: I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença; II - nos demais casos prescritos em lei.
[3] Art. 15. A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados.
[4] Art. 10. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá ser revista, a pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das circunstâncias de fato ou de direito. Parágrafo único. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento estabelecido nesta Lei.
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