A A “lamúria de pessoa detida” e a audiência de custódia – Crônica de uma morte anunciada

21/07/2015

Por Rômulo de Andrade Moreira - 21/07/2015

Acabei de ler, estupefato, artigo escrito por um Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Livre-docente em Direito Penal, Doutor e Mestre em Processo Penal pela PUC-SP, além de autor de diversos livros na área de Direito Penal e Processual Penal (incluindo Execução Penal), em que consta, dentre outras afirmações, o seguinte:

"A audiência de custódia, com a devida vênia, é um modismo, trazendo vários mitos para serem explorados. Alguns argumentam que ela é a concretização do próprio instrumento do habeas corpus (toma o corpo). Perfeito. Neste importante instituto, há previsão legal para que o juiz/desembargador convoque o preso à sua frente. Nunca soube disso. Se alguém o fez, entra para a estatística mínima, quase desaparecida. Em suma: a) durante 23 anos, o texto da Convenção Americana sobre Direitos Humanos é o mesmo; somente agora, alguns descobriram que o Brasil o descumpre seguidamente; b) se é um direito humano fundamental, em todos os lugares onde não há audiência de custódia, os flagrantes devem ser imediatamente relaxados, pouco importando o caso concreto; c) se juízes precisam conversar com o réu para dar-lhe algum benefício, devemos transportar o interrogatório novamente para o início da ação penal; d) o projeto-piloto em S. Paulo (é interessante um experimento com direito humano fundamental indisponível…) vale-se do DIPO (Departamento de Inquéritos Policiais), onde os juízes são designados e removíveis a qualquer tempo; e) o sistema no Brasil não consegue transportar réus para as audiências, mas certamente haverá um imenso número de agentes (policiais?) para levá-los todos os dias à frente do juiz; f) a audiência de custódia, se tão importante, deveria estender-se ao Tribunal, para que também o desembargador/ministro possa conversar com o réu e sensibilizar-se; g) se a avaliação da autoridade policial não vale nada, visto que o preso precisa ir à frente do juiz, o destino dos delegados vai mudar completamente; passarão a sair às ruas para investigar e, prendendo, leva-se direto ao juiz; o auto de prisão em flagrante é inútil; h) os defensores, hoje, da audiência de custódia, como um direito fundamental, demoraram a acordar para isso (apenas 23 anos); mas já que o fizeram e estão despertos, convém levar logo ao STJ e ao STF a questão, por meio do habeas corpus para padronizar para todo o Brasil se sim ou se não a audiência de custódia; h) não há essa previsão no CPP; o STF tem a tendência de equiparar tratados a lei federal; de todo modo, mesmo que se considere a referida Convenção acima de qualquer lei, segundo nos parece, quem deve legislar sobre o procedimento nacional a ser adotado para a audiência de custódia é o Poder Legislativo e não o CNJ, nem qualquer Tribunal Regional ou Estadual. A isto se chama legalidade, que vem sendo vilipendiada por um número excessivo de portarias, resoluções, provimentos e similares, originários dos mais diversos órgãos, sem o menor apego à função do legislador em matéria de direito criminal. Enfim, o mito dessa audiência é que ela é essencial para tirar presos provisórios do seu calvário. Aliás, a moderna Constituição de 1988 (a Constituição-cidadã) nem percebeu que estava olvidando a audiência de custódia no art. 5o. Outra ironia do destino. De minha parte, continuarei a ler atentamente as peças escritas de habeas corpus e soltar quem considero merecer, seja pela ilegalidade da prisão, seja porque faz jus à liberdade provisória. E se for esta a vontade do STF, ouvirei sem problema o preso, mas continuarei mantendo a prisão cautelar ou concedendo liberdade provisória, de acordo com a lei – e não com lamúria de pessoa detida, por vezes, autora de crime grave."[1]

Qual o motivo do meu assombro? Pela absurda e inacreditável inobservância do Controle Jurisdicional de Convencionalidade, solenemente ignorado pelo Magistrado na decisão referida no artigo acima transcrito.

Vejamos o que nos impõe, como norma supralegal, o art. 7º., 5, do Pacto de São Jose da Costa Rica ou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos:

"Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo."

Igualmente, o art. 9º., 3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York:

"Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença."

Tais normas internacionais estão incorporadas em nosso ordenamento jurídico desde o ano de 1992.

Evidentemente, não há falar-se em suposta inconstitucionalidade da iniciativa do Conselho Nacional de Justiça, pois não se fere, em absoluto, o princípio constitucional da reserva legal previsto no texto constitucional, visto que não se está legislando sobre matéria processual, não havendo invasão de reserva constitucional atribuída, com exclusividade, ao Poder Legislativo da União, fonte única de normas processuais. Muito pelo contrário, aqui estamos diante de um "controle concentrado de convencionalidade". (A propósito, conferir o excelente trabalho de Valerio de Oliveira Mazzuoli).[2]

Ao contrário do Desembargador paulista, o Juiz de Direito catarinense, Professor Alexandre Morais da Rosa, atento às normas de Direito Processual Penal Internacional, afastou o crime de desacato do ordenamento jurídico penal brasileiro exatamente aplicando o Controle Concentrado de Convencionalidade, no julgamento dos autos n. 0067370-64.2012.8.24.0023, da Comarca da Capital de Santa Catarina – Florianópolis:

"(...) O controle de compatibilidade das leis não se trata de mera faculdade conferida ao julgador singular, mas sim de uma incumbência, considerado o princípio da supremacia da Constituição (http://www.conjur.com.br/2015-jan-02/limite-penal-temas-voce-saber-processo-penal-2015). Cabe ainda frisar que, no exercício de tal controle, deve o julgador tomar como parâmetro superior do juízo de compatibilidade vertical não só a Constituição da República (no que diz respeito, propriamente, ao controle de constitucionalidade difuso), mas também os diversos diplomas internacionais, notadamente no campo dos Direitos Humanos, subscritos pelo Brasil, os quais, por força do que dispõe o art. 5º, §§ 2º e 3º[1], da Constituição da República, moldam o conceito de “bloco de constitucionalidade” (parâmetro superior para o denominado controle de convencionalidade das disposições infraconstitucionais). Nesse sentido, como bem anota Flavia Piovesan: O Direito Internacional dos Direitos Humanos pode reforçar a imperatividade de direitos constitucionalmente garantidos – quando os instrumentos internacionais complementam dispositivos nacionais ou quando estes reproduzem preceitos enunciados na ordem internacional – ou ainda estender o elenco dos direitos constitucionalmente garantidos – quando os instrumentos internacionais adicionam direitos não previstos pela ordem jurídica interna. No que concerne especificamente ao chamado controle de convencionalidade das leis, inarredável a menção ao julgamento do Recurso Extraordinário 466.343, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, no qual ficou estabelecido o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal no que diz respeito à hierarquia das normas jurídicas no direito brasileiro. Assentou o STF que os tratados internacionais que versem sobre matéria relacionada a Direitos Humanos têm natureza infraconstitucional e supralegal – à exceção dos tratados aprovados em dois turnos de votação por três quintos dos membros de cada uma das casas do Congresso Nacional, os quais, a teor do art. 5º, §3º, CR, os quais possuem natureza constitucional. (...) Por conseguinte, cumpre ao julgador afastar a aplicação de normas jurídicas de caráter legal que contrariem tratados internacionais versando sobre Direitos Humanos, destacando-se, em especial, a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica), o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966 e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 (PIDESC), bem como as orientações expedidas pelos denominados “treaty bodies” – Comissão Internamericana de Direitos Humanos e Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, dentre outros – e a jurisprudência das instâncias judiciárias internacionais de âmbito americano e global – Corte Interamericana de Direitos Humanos e Tribunal Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas, respectivamente. (...) É certo que, paulatinamente, o entendimento emanado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos deverá repercutir na jurisprudência interna dos Estados americanos signatários do Pacto de São José da Costa Rica – sobretudo em Estados que, como o Brasil, são também signatários da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969, cujo art. 27 prescreve que “uma Parte não pode invocar as disposições do seu direito interno para justificar o descumprimento de um tratado.”[3]

Já esta decisão, li com entusiasmo, pois reflete um modo de ver o Direito Processual Penal de uma maneira consentânea com a Constituição Federal, com o Sistema Acusatório e com o Estado Democrático de Direito.

Sobre a audiência de custódia no Brasil, convém relembrar, a título descritivo, e especialmente para quem ainda não se deu conta, que o Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e o Ministério da Justiça lançarão no dia 6 de fevereiro deste ano de 2015 um projeto para garantir que presos em flagrante sejam apresentados a um Juiz de Direito, em 24 horas, no máximo.

Conforme a página do Supremo Tribunal Federal, o “Projeto Audiência de Custódia” consiste na criação de uma estrutura multidisciplinar nos Tribunais de Justiça que receberá presos em flagrante para uma primeira análise sobre o cabimento e a necessidade de manutenção dessa prisão ou a imposição de medidas alternativas ao cárcere.

O projeto teve seu termo de abertura iniciado no dia 15 de janeiro, após ser aprovado pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Ricardo Lewandowski.

O projeto conta ainda com a parceria do Presidência e da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que é presidido pelo Desembargador José Renato Nalini e tem como Corregedor-Geral da Justiça o desembargador Hamilton Elliot Akel, além do Ministério da Justiça.

O objetivo do projeto é garantir que, em até 24 horas, o preso seja apresentado e entrevistado pelo Magistrado, em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso. Durante a audiência, será analisada a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares, além de eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades.

Os detalhes finais de execução do projeto estão sendo fechados entre os três órgãos e o projeto-piloto será lançado no próximo dia 06 de fevereiro de 2015, em São Paulo, com a assinatura de um termo de cooperação. O projeto-piloto será desenvolvido no Fórum Ministro Mário Guimarães, no bairro da Barra Funda, local para onde são encaminhados todos os autos de prisão em flagrante delito lavrados na capital paulista, e realizado pelo Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária. A previsão é que as primeiras audiências de custódia sejam realizadas a partir do dia 23 de fevereiro.

Com efeito, a implementação das audiências de custódia está prevista em pactos e tratados internacionais assinados pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose da Costa Rica e já é utilizada em muitos países da América Latina e na Europa, onde a estrutura responsável pelas audiências de custódia recebe o nome de “Juizados de Garantias”.

Além das audiências, o projeto prevê a estruturação de centrais de alternativas penais, centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação penal, responsáveis por representar ao juiz opções ao encarceramento provisório.

No dia 6 de fevereiro de 2015, o Ministro Ricardo Lewandowski participou, em São Paulo, do lançamento do Projeto Audiência de Custódia, oportunidade em que afirmou que pretende levar a iniciativa a outras capitais e comarcas do País, após o desenvolvimento do projeto-piloto no Fórum Criminal da Barra Funda: “Essa é uma meta prioritária do CNJ e São Paulo mais uma vez sai na frente como um importante parceiro. Uma experiência que, se for exitosa – e tenho certeza que será – será depois levada para outras capitais e comarcas do País”, afirmando que o Brasil tem hoje cerca de 600 mil presos, sendo que 40% deles são presos provisórios. “São aqueles que ainda não têm a culpa formada. São presos que não tiveram ainda a chance de se confrontar com o juiz e têm a sua liberdade de ir e vir limitada, contrariando a presunção de inocência”.

O objetivo do projeto é enfrentar esse problema, garantindo a rápida apresentação do preso a um juiz nos casos de prisões em flagrante. A ideia é que o acusado seja apresentado e entrevistado pelo juiz, em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso.Durante a audiência, o juiz poderá analisar a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. “O juiz decide vendo a pessoa à sua frente e não com base em um amontoado de papéis dentro dos autos de um processo”, explicou o Ministro. Inicialmente, o projeto terá como alvo os autos de prisão em flagrante delito lavrados apenas em dois distritos policiais da cidade de São Paulo. Progressivamente, outros distritos policiais serão incorporados ao projeto, segundo o governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, que também esteve presente à cerimônia.

A iniciativa prevê ainda a estruturação de centrais de alternativas penais, centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação penal, que serão responsáveis por apresentar ao juiz opções ao encarceramento provisório. “Infelizmente hoje a única resposta que a sociedade tem para quem errou é a prisão. A prisão é um mal necessário, entretanto o sistema carcerário, da forma como nós o mantemos, é um fator criminógeno. Quem ingressa sem necessidade sai revoltado, ressentido, pronto para se vingar da sociedade que o trancafiou”, afirmou o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Desembargador José Renato Nalini. Para o governador Geraldo Alckmin, o lançamento do projeto representa um avanço significativo na luta pela garantia dos direitos fundamentais: “O projeto permitirá a manutenção da prisão nos casos mais graves e uma análise mais cuidadosa das situações consideradas menos graves”. Para o Presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcos da Costa, o projeto representa um marco na história da defesa dos direitos humanos no País. Também participaram da cerimônia o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, o corregedor-geral de Justiça de São Paulo, desembargador Hamilton Elliot Akel, o procurador-geral de Justiça do estado, Márcio Elias Rosa, o diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Renato Campos De Vitto, e membros da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), entre outras autoridades. Fonte: CNJ.

Aliás, a propósito, tramita no Congresso o Projeto de Lei do Senado nº. 554/2011, dando a seguinte redação ao art. 306 do Código de Processo Penal:

"(...) "§ 1º No prazo máximo de vinte e quatro horas após a prisão em flagrante, o preso será conduzido à presença do juiz para ser ouvido, com vistas às medidas previstas no art. 310 e para que se verifique se estão sendo respeitados seus direitos fundamentais, devendo a autoridade judicial tomar as medidas cabíveis para preservá-los e para apurar eventual violação. § 2º Na audiência de custódia de que trata o parágrafo 1º, o Juiz ouvirá o Ministério Público, que poderá, caso entenda necessária, requerer a prisão preventiva ou outra medida cautelar alternativa à prisão, em seguida ouvirá o preso e, após manifestação da defesa técnica, decidirá fundamentadamente, nos termos art. 310. § 3º A oitiva a que se refere parágrafo anterior será registrada em autos apartados, não poderá ser utilizada como meio de prova contra o depoente e versará, exclusivamente, sobre a legalidade e necessidade da prisão; a prevenção da ocorrência de tortura ou de maus-tratos; e os direitos assegurados ao preso e ao acusado. § 4º A apresentação do preso em juízo deverá ser acompanhada do auto de prisão em flagrante e da nota de culpa que lhe foi entregue, mediante recibo, assinada pela autoridade policial, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os nomes das testemunhas. § 5º A oitiva do preso em juízo sempre se dará na presença de seu advogado, ou, se não o tiver ou não o indicar, na de Defensor Público, e na do membro do Ministério Público, que poderão inquirir o preso sobre os temas previstos no parágrafo 3º, bem como se manifestar previamente à decisão judicial de que trata o art. 310 deste Código.”

Não esqueçamos, outrossim, do Projeto de Lei nº 156, de 2009, em tramitação no Senado Federal que prevê a figura do Juiz das Garantias. De acordo com o texto projetado seria ele o "responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário", competindo-lhe:

"I – receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil; II – receber o auto da prisão em flagrante, para efeito do disposto no art. 553; III – zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido a sua presença; IV – ser informado da abertura de qualquer inquérito policial; V – decidir sobre o pedido de prisão provisória ou outra medida cautelar; VI – prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como substituí-las ou revogá-las; VII – decidir sobre o pedido de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla defesa; VIII – prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso, em vista das razões apresentadas pelo delegado de polícia e observado o disposto no parágrafo único deste artigo; IX – determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento; X – requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação; XI – decidir sobre os pedidos de: a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática ou de outras formas de comunicação; b) quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico; c) busca e apreensão domiciliar; d) acesso a informações sigilosas; e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos fundamentais do investigado. XII – julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia; XIII – determinar a realização de exame médico de sanidade mental, nos termos do art. 447, §1º; XIV – arquivar o inquérito policial; XV – outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste artigo." (grifo nosso).

Esta campanha liderada por órgãos do Judiciário para possibilitar a apresentação dos presos em flagrante a um juiz em até 24 horas depois da prisão começa a surtir efeito. A 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro determinou a soltura de um homem por ele não ter sido submetido à audiência de custódia no prazo previsto. A determinação foi proferida pelo desembargador Luiz Noronha Dantas no pedido de Habeas Corpus proposto pela Defensoria Pública em favor do réu, cujo processo tramita na 3ª Vara Criminal de São Gonçalo. A decisão reconhece a necessidade da audiência de custódia, na qual deve ser aferida a legalidade e a necessidade da prisão, assim como se o preso sofreu tortura ou violação à integridade por parte de autoridades públicas. Segundo a decisão, a ausência de previsão no Código de Processo Penal não pode impedir a audiência de custódia, assim como eventuais dificuldades na sua implementação não podem servir de justificativa para a omissão estatal. Fonte: Assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (http://www.conjur.com.br/2015-jan-26/tj-rj-solta-preso-nao-foi-apresentado-juiz-24-horas).

A propósito, o Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, Ministro Ricardo Lewandowski, o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, Augusto de Arruda Botelho, assinaram no dia 09 de abril de 2015 três acordos de cooperação técnica para facilitar a implantação do projeto “Audiência de Custódia” em todo o Brasil e para viabilizar a aplicação de medidas alternativas cautelares, como o uso de tornozeleiras eletrônicas. Durante a cerimônia, o Presidente do Supremo Tribunal Federal disse que um dos principais objetivos desses acordos é acabar com a cultura do encarceramento existente no país, assegurando a todos as garantias fundamentais previstas na Constituição Federal e nos pactos de Direitos Humanos assinados pelo país. O Ministro revelou que o Brasil tem hoje cerca de 600 mil presos, dos quais 40% são presos provisórios – o segundo país que mais encarcera cidadãos em todo o mundo. Segundo o Ministro, não existem estabelecimentos adequados e nem suficientes para abrigar essa superpopulação de presos, que cresce em escala geométrica, revelou Lewandowski. De acordo com o Ministro José Eduardo Cardozo, as audiências de custódia podem reduzir o número de detentos encarcerados, o que, no seu entender, contribui para resolver o problema do sistema penitenciário brasileiro, que é deficiente, anacrônico, gerador de violência e de violação de direitos humanos, segundo afirmou o Ministro. Algumas unidades prisionais podem ser comparadas a "masmorras medievais, verdadeiras escolas do crime", concluiu o Ministro da Justiça. O primeiro acordo visa incrementar o programa de audiências de custódia. A ideia é que qualquer pessoa presa em flagrante seja apresentada imediatamente a um juiz. O programa já está em fase de implantação na capital do estado de São Paulo e deve, até o meio do ano, começar a funcionar nas capitais de outros 14 entes da Federação. O segundo acordo assinado, explicou o Ministro Lewandowski, visa tornar viáveis as medidas alternativas à prisão preventiva, que é aquela feita em casos excepcionais, quando o detido representa algum perigo para a sociedade. O Código de Processo Penal já prevê essas medidas alternativas, que podem ser as tornozeleiras eletrônicas, o comparecimento periódico em juízo, a proibição de acesso a determinados lugares ou de contato com pessoas indicadas, a proibição de ausentar-se da comarca, entre outras.O último acordo assinado visa à construção de centros de monitoramento eletrônico para difusão do uso das tornozeleiras eletrônicas. Hoje, os juízes não podem aplicar essa medida alternativa de controle porque ainda não existe esse equipamento nem meios para controlar a deambulação dos presos, conforme ressaltou o ministro Lewandowski. Pelo acordo, o Ministério da Justiça fica responsável, em parceira com os Estados, pela compra das tornozeleiras e pela montagem dos centros.

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil entrou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5240, tendo como relator o Ministro Luiz Fux, sustentando que a audiência de custódia é uma inovação no ordenamento jurídico paulista, não prevista no Código de Processo Penal, e somente poderia ter sido criada por lei federal e jamais por intermédio de tal provimento autônomo, já que o poder de legislar sobre a matéria é do Congresso Nacional. Além disso, segundo a entidade, a norma repercutiu diretamente nos interesses institucionais dos Delegados de Polícia, cujas atribuições são determinadas pela Constituição (artigo 144, parágrafos 4º e 6º): “Este [Provimento Conjunto nº3/2015], sim, foi inovador no ordenamento jurídico, entretanto, muito embora possa parecer um ato legítimo em sua aparência, é ilegítimo no exame de fundo. Trata-se, na espécie, inequivocamente, de ato normativo editado que configura uma inconstitucionalidade direta, imediata e formal, com abuso de poder”, afirma-se na Ação.

Segundo notícia veiculada pela imprensa, "a Justiça paulista deu início no dia 24 de fevereiro de 2015 às audiências de custódia, O projeto piloto começou no Fórum Ministro Mário Guimarães, no bairro paulistano da Barra Funda, com presos encaminhados por duas delegacias seccionais. Nas 25 audiências promovidas, 17 pessoas foram liberadas. A revista Consultor Jurídico apurou que Elias Rosa e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estudam entrar com medidas judiciais contra as audiências de custódia. A Defensoria Pública deve atuar na grande maioria dos casos — nesta terça, só um preso contou com advogado. A instituição é favorável à nova iniciativa. Defensores apontam que o Brasil já havia se comprometido em tratados internacionais a evitar que o preso demore a ser ouvido. Além disso, entendem que o contato entre o preso e o juiz torna o processo “mais vivo”, permitindo a análise de informações e a apuração de problemas, como acusações de tortura.Já o MP avalia que reunir tantos representantes com o juiz transforma um momento pré-processual em uma fase de prova. Um representante do órgão afirma que a polícia já era obrigada a informar prisões em flagrante em 24 horas, e a validade dessas medidas já era analisada por todos os órgãos nos gabinetes, sem a obrigação do encontro pessoal.Enquanto, pela manhã, havia circulação de pessoas e câmeras por todos os lados, no período da tarde as salas de audiências estavam mais tranquilas. A ConJur acompanhou o caso de um suspeito de tráfico de drogas, em uma das seis salas localizadas nos fundos do último andar do fórum. Servidores não sabiam informar se o público externo poderia participar, mas a juíza responsável pelo caso autorizou a entrada das quatro pessoas que bateram à porta.Negro e com 29 anos, o homem chegou algemado e ficou numa cadeira, entre um defensor público e uma promotora de Justiça e à frente de um policial militar. A juíza disse que o preso poderia ficar em silêncio, mas ele concordou em falar. O homem foi questionado se já tinha passagem na polícia, se toma alguma medicação, onde mora, se é casado e tem filhos, por exemplo. No final, a magistrada atendeu solicitação do MP e converteu a prisão em flagrante em preventiva, pois o homem já tinha duas condenações anteriores e poderia trazer risco à ordem pública. A audiência durou 30 minutos e foi gravada em vídeo. O homem foi ouvido em menos de dez, e boa parte do tempo restante foi gasto com problemas de quem ainda está se adaptando, como uma impressora sem configuração que impediu a impressão de documentos. No total, foram destacados dez juízes do Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária (Dipo) e dois promotores para atuar nas audiências de custódia, enquanto a Defensoria separou sete defensores por dia para trabalhar especificamente com esses casos.O CNJ divulgou que o horário de funcionamento será de 9 às 19 horas, de segunda a sexta-feira. Ao menos na estreia, servidores informaram que a polícia poderia entrar no fórum até as 16h30. Meia hora antes, porém, já foi avisado que as audiências do dia haviam terminado." Fonte: http://www.conjur.com.br/2015-fev-24/audiencia-custodia-comeca-resistencia-ministerio-publico, acessado dia 25 de fevereiro de 2015.

A 3ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região determinou que um Juiz de Mato Grosso ouça dois homens presos em flagrante sob a suspeita de roubar uma agência dos Correios, sob o argumento de que já entraram no ordenamento jurídico brasileiro as normas de tratados internacionais em que o país compromete-se a impedir a demora na análise da situação de presos. Esse foi o entendimento da Desembargadora Federal Mônica Sifuentes. A decisão contraria entendimento anterior da própria 3ª. Turma e atende pedido da Defensoria Pública da União. A Defensoria alegou que esse direito foi fixado em ao menos dois tratados assinados pelo Brasil: a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, inseridos na legislação por decretos.

Ao analisar o caso, a relatora apontou que a 3ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região já considerou que as audiências de custódia não estão contempladas no nosso ordenamento jurídico. Em 2014, o colegiado avaliou que “nenhum dispositivo prevê a apresentação pessoal do preso ao juiz como um dos requisitos para a legalidade da prisão”. Segundo o acórdão, a lei brasileira determina apenas que autos de prisão em flagrante sejam levados sem demora ao juiz competente.

Mesmo assim, a Desembargadora afirmou que deixaria de considerar essa tese porque o Conselho Nacional de Justiça fixou como “meta prioritária” universalizar o uso dessas audiências. Ela apontou que o Pacto de San José foi formalmente reconhecido pelo Brasil em 1992, com o Decreto 678, e determinou que os suspeitos sejam ouvidos “o quanto antes”. (Processo 0006708-76.2015.4.01.0000).

Interessante esta decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:

"Direito processual penal. Prisão em flagrante. Audiência de custódia. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Hierarquia constitucional dos Tratados sobre Direitos Humanos. 6.ª Câm. Crim. HC 0064910-46.2014.8.19.0000 j. 25.01.2015 – public. 03.02.2015. Solicitadas informações, veio a ser nestas esclarecido que o pedido defensivo vertido nos autos principais e que aqui anima o universo impetracional foi finalmente apreciado e indeferido, nos seguintes termos: “Quanto ao requerimento de relaxamento da prisão, com fundamento na audiência de custódia, não assiste a razão à defesa ante ausência de previsão no CPP e na lei especial. Ressalte-se que o Pacto São José da Costa Rica exige que o preso seja apresentado à autoridade judicial sem qualquer fixação de prazo para esta ocorrência. Ademais, o mencionado Pacto não dispõe acerca de qualquer ilegalidade relativa a não apresentação do preso no momento pretendido pela defesa, o que se coaduna com a realidade, eis que absolutamente inviável a realização da audiência imediatamente após a prisão de cada réu. Por todo o exposto, indefiro o pedido de relaxamento da prisão preventiva dos acusados Ueslei e Rafael”. Concessa maxima venia, ressoa absurdo e teratológico o decisum em questão. Em primeiro lugar, porque a ausência de expressa previsão legal deste imprescindível ato procedimental no C.P.P. não pode ser manejado para inviabilizar a sua ocorrência, uma vez que, figurando o Brasil como signatário destes acordos e tendo ratificado, por seu Legislativo, os respectivos conteúdos, as normas daí advindas não são inexistentes, como quer fazer crer a nobre Autoridade coatora, mas sim, presentes e de hierarquia equivalente a dos primados constitucionais. Aliás e a esse respeito, mas seguindo o equivocado raciocínio desenvolvido pelo Juízo de piso, caberia a lembrança de que vários são os princípios constitucionais que não receberam assento formal no Código de Processo Penal e, nem por isso, a existência ou eficácia destes pode ser discutida ou questionada. Pois, no caso vertente, acontece exatamente a mesma coisa!!! Em segundo lugar, ofende a sensatez e a razoabilidade a argumentação sustentada pelo Juízo de piso a partir da qual não foi realizada a Audiência de Custódia porque inexiste prazo fixado para tanto. Relembre-se que tanto a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 7°, 5) — “Toda a pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo”, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 9°, 3) - “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgado em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá ser condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença”, estabelecem que tal imprescindível iniciativa para se assegurar o resguardo à integridade física e psíquica do preso determinam que isto se dê sem demora, a significar, de imediato, ou seja, num prazo de até 24 (vinte e quatro) horas, já que qualquer outra metrificação de tempo ofenderá a mens legis. Outro não é o entendimento contido no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (item 44) que trata especificamente da necessidade de realização da audiência de custódia: “Criação da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro para garantia da apresentação pessoal do preso à autoridade judiciária em até 24 horas após o ato da prisão em flagrante, em consonância com o artigo 7° da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José de Costa Rica), à qual o Brasil se vinculou em 1992”. Também seguiu este norte o Projeto de Lei n° 554/2011 do Senado Federal, que trata de alteração ao texto vigente do art. 306 do C.P.P., visando combater e prevenir a tortura e outros tratamentos cruéis, quando alinha que: “...O Pacto de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos trazem obrigações internacionais para o Estado brasileiro, de reconhecimento, respeito e proteção às garantias dos cidadãos, que podem invoca-las a qualquer instante. Seja qual for o motivo de uma prisão, há o direto da pessoa presa exigir ser levada à presença de um juiz, ou de uma autoridade judicial ‘sem demora’ (...) O estabelecimento de 24 (vinte e quatro) horas para apresentar ao Juiz competente a pessoa privada de liberdade constitui prazo razoável, considerando que a própria lei processual penal já determina que o auto de prisão em flagrante seja enviado à autoridade judicial dentro deste espaço de tempo, após a efetivação da prisão... “E como se tudo isto não bastasse, ainda consta do Boletim Informativo Eletrônico da Diretoria-Geral de Comunicação e de Difusão de Conhecimento deste Pretório, Edição n° 07 deste ano, do dia 16.01.2015, na sua principal matéria de destaque que: “O Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça de São Paulo e o Ministério da Justiça lançarão no dia 6 de fevereiro um projeto para garantir que presos em flagrante sejam apresentados a um juiz num prazo máximo de 24 horas. O ‘Projeto Audiência de Custódia’ consiste na criação de uma estrutura multidisciplinar nos Tribunais de Justiça que receberá presos em flagrante para uma primeira análise sobre o cabimento e a necessidade de manutenção desta prisão ou a imposição de medidas alternativas ao cárcere. O projeto teve o seu termo de abertura iniciado na quinta-feira (15), após ser aprovado pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, Ministro Ricardo Lewandowski”. Em terceiro lugar e que também não pode ser chancelada está a mais do que absurda linha argumentativa, desenvolvida pelo Juízo de piso, segundo a qual “o mencionado Pacto não dispõe acerca de qualquer ilegalidade relativa a não apresentação do preso no momento pretendido pela defesa” (???!!!). Ora, o descumprimento de um primado afeto à garantia dos direitos humanos, contido em acordo internacional e cujo teor foi ratificado pelo Brasil, repise-se, ostenta hierarquia equivalente àquela concernente aos princípios constitucionais, parecendo incabível ingenuidade crer-se que o seu descumprimento restará impune e sem gerar consequências processuais imediatas. Por último, mas não menos importante, cabe descartar o argumento final e metajurídico, sustentado pelo primitivo Juízo, a partir do qual, considerou que a realização deste imprescindível ato não “se coaduna com a realidade, eis que absolutamente inviável a realização da audiência imediatamente após a prisão de cada réu” (???!!!). Este, permissa venia, é o absurdo dos absurdos!!! Isto porque não só não pode um Magistrado deixar de aplicar uma norma de status constitucional porque não tem meios materiais para tanto - como, por exemplo, seguir no julgamento de um feito, sem realizar a Instrução deste, porque, simplesmente, não possui meios de transportar réus presos e/ou intimar e requisitar a apresentação de testemunhas - como também tal avaliação não é da sua competência, mas sim, da Administração Superior deste Tribunal de Justiça, cabendo ao Juiz cumprir a lei e os primados constitucionais próprios, e, caso não possua condições concretas de realizar o seu mister, que acione a Colenda Presidência e a Egrégia Corregedoria-Geral deste Pretório, solicitando ajuda e demonstrando a imprescindibilidade da medida que precisa ser adotada. Por derradeiro e para sepultar o impróprio, indevido e equivocado juízo de infactibilidade material de condições à realização da Audiência de Custódia, segue-se na transcrição de outros dois parágrafos daquela matéria contida no Boletim Informativo Eletrônico deste Pretório, mencionado quatro parágrafos acima: “...O objetivo do projeto é garantir que, em até 24 horas, o preso seja apresentado e entrevistado pelo juiz, em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público e da Defensoria Pública ou do advogado do preso. Durante a audiência, o juiz analisará a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. O juiz poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades...”.Assim e diante da mais do que flagrante ilegalidade advinda da opção de ignorar e de negar a validade e necessidade da realização da Audiência de Custódia, DEFIRO a liminar pretendida e determino a expedição de Alvará de Soltura condicionado em favor do Paciente, U. H. A.. Deixo de impor aos mesmos o cumprimento das cautelares alternativas à prisional, em face da ilegalidade ora sanada na medida segregacional. Comunique-se o inteiro teor da presente ao Juízo originário. Após, à douta Procuradoria de Justiça. Luiz Noronha Dantas - Relator."

A propósito, e apesar de longo, vale transcrever o artigo de Cláudio do Prado Amaral ("Da audiência de custódia em São Paulo"), publicado no Boletim - 269 – ABRIL/2015 do INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS:

"Na primeira página do Diário da Justiça de 27.01.2015 foi publicado o Provimento conjunto 03/2015, da Presidência e da Corregedoria do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). O provimento determina a implementação gradativa da audiência de custódia, em todo o Estado de São Paulo, conforme cronograma. Assim, com 23 anos de atraso, finalmente o Brasil começa a dar efetividade ao disposto no art. 7.º, item 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH ou Pacto de San Jose da Costa Rica), o qual determina que “toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”. Embora já estivesse sedimentado na doutrina e na jurisprudência do STF(1) que a CADH é direito interno, de grau supralegal e infraconstitucional, o art. 7.º, item 5 jamais foi aplicado no solo brasileiro em caráter vinculante. Nunca foram anuladas as prisões preventivas originárias de prisão em flagrante cujo preso não foi apresentado sem demora ao juiz para audiência de custódia. Ante a iniciativa do TJSP, surgem justas expectativas de avanços e dúvidas naturais. Direitos Humanos e Direito Processual Penal dialogam estreitamente entre si e são extremamente sensíveis um ao outro, tendo em vista as consequências recíprocas de seus âmbitos de ação. Diversos direitos humanos afirmados em tratados internacionais dos quais o Brasil faz parte, todavia, ainda carecem de efetividade. Quando esses direitos carentes de efetividade se imbricam com o processo penal, o resultado é a falta de efetividade do próprio direito processual. Logo, a palavra de ordem na atualidade é efetividade. A fase afirmativa de direitos humanos já se encontra consideravelmente consolidada. Não é por outra razão que os movimentos sociais têm se interessado mais pela efetividade que pela afirmação desses direitos, em busca de mecanismos que possibilitem a almejada concretude. O Provimento 03/2015 surge como mola propulsora para a efetivação de promessas que existiam apenas no papel e nas mentes mais bem intencionadas. A inversão hierárquica pode causar surpresa: embora a CADH já fosse direito interno, foi necessária a edição de uma norma jurídica de nível hierárquico muito inferior (uma portaria), para dar vida à audiência de apresentação prevista no Pacto de San Jose. Apesar da inversão, o fenômeno espelha uma situação que não é rara. Muitos países, como o Brasil, aderem e assinam, com relativa facilidade, diversos acordos ou tratados internacionais, nos quais reconhecem e afirmam direitos humanos. Todavia, o fazem já sabendo que a efetivação desses direitos representa um demorado e custoso processo social de concretização. Por vezes essa concretização é alcançada por meio de mecanismos que representam argumentos de autoridade. Isso já ocorreu, entre nós por exemplo, em tema de execução penal, quando em 2007 a presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) promulgou a Resolução 47, obrigando ao juízes de execução penal a cumprir o art. 66, VII, da LEP.O argumento de autoridade admite uso pragmático. Nesses casos, funciona como um dispositivo de estratégia de “redução de complexidade”, economizando tempo e esforço para a efetivação de uma verdade que os movimentos sociais não conseguiriam realizar sozinhos ou somente ao custo de muito tempo e esforço. A apresentação do imputado preso diante de um magistrado é um procedimento reconhecido em diversos ordenamentos jurídicos. Chamada de first appearence no direito estadunidense, tem como principais finalidades informar ao preso sobre a acusação que lhe é feita, sobre seu direito ao aconselhamento/assistência por um profissional, bem como o exame sobre a possibilidade de fixação de fiança ou outros vínculos que possibilitem o imputado responder ao processo em liberdade. Seguindo a regra de que essa audiência deve ocorrer “sem demora” (without unnecessary delay), não costuma demorar mais que 72 horas. No direito italiano está prevista a udienza di convalida; na hipótese de prisão em flagrante, a polícia coloca o preso à disposição do Ministério Público, em até 24 horas. Este, por sua vez, caso entenda que a prisão em flagrante é devida, pede ao juiz a sua convalidação. Tal pedido deve ser feito no prazo de 48 horas a partir do momento da efetiva privação de liberdade da pessoa. Segue-se o dever de o juiz realizar a audiência de convalidação em até 48 horas, tendo por fins verificar: (a) a “legitimidade” da prisão em flagrante; e (b) a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. Na Alemanha, todo aquele que for detido por iniciativa da polícia deve ser levado à presença do juiz no máximo um dia após o encarceramento. O provimento do TJSP fixa o prazo de 24 horas, contado desde o momento da prisão em flagrante, para a autoridade policial apresentar o preso – juntamente com cópia do auto de prisão em flagrante – perante o juiz, para participar da audiência denominada “de custódia” (arts. 1.º e 3.º). A apresentação do preso em 24 horas, contudo, nem sempre ocorrerá. Estão previstas exceções transitórias, pois válidas somente até melhor estruturação das rotinas de transferências de presos. Assim, inicialmente, não se realizará audiência de custódia aos sábados, domingos, feriados, nos dias úteis (fora do expediente forense normal), nem aos finais de semana que incidirem no período de recesso, que vai de 20 de dezembro a 6 de janeiro. Embora o Provimento 03/2015 nada mencione, é evidente que o horário da apresentação do preso em juízo deverá ser certificado nos autos. A normativa também não diz qual é o prazo para a realização da audiência após a apresentação do preso. Cumprindo-se a letra e o espírito da CADH, referida audiência deverá ser realizada “sem demora”. Isso significa que deverá receber encaixe na pauta de audiência do mesmo dia da apresentação. Pode ocorrer que um auto de prisão em flagrante seja realizado pela manhã, às 11 horas, sendo a audiência realizada no mesmo dia, às 16 horas. Caso essa audiência seja anulada (por exemplo, por não ter se assegurado que o preso se entrevistasse com seu defensor previamente), a audiência poderá ser renovada, desde que até as 11 horas do dia seguinte, respeitando-se, assim, o prazo de 24 horas para a apresentação em juízo. E se tais marcos temporais não forem cumpridos? A normativa também não diz qual é a consequência. Todavia, outra não pode ser, senão a colocação do preso em liberdade.(5) De um lado ocorre violação da garantia da necessidade de ordem motivada do juiz para o aprisionamento. De outro lado, desrespeita-se o princípio da duração razoável do processo (rectius do aprisionamento pré-cautelar), por constrangimento ilegal decorrente de excesso de prazo. A audiência de custódia é um ato pré-processual, judicializado, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa estabelecido em favor do preso. Trata-se, portanto, de uma garantia do cidadão contra o Estado. Em diversos julgados, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) afirmou que a apresentação sem demora do preso ao juiz para audiência “é essencial para a proteção do direito à liberdade pessoal (...) e a outros direitos, como a vida e a integridade pessoal”, “evitar capturas arbitrárias ou ilegais”, bem como para autorizar a adoção de medidas cautelares diversas da prisão, a fim de que a prisão provisória somente seja aplicada “quando for estritamente necessária”, “objetivando-se de modo geral que o imputado seja tratado de modo condizente com a presunção de inocência”. Podem ser extraídas quatro finalidades do Provimento 03/2015, que são ao mesmo tempo técnicas e de política criminal, todas adequadas à CADH e às orientações da CIDH. A primeira é garantir que o preso se entreviste com seu defensor “por tempo razoável” antes da audiência. A segunda consiste em reforçar a obrigação que cabe a todo magistrado de exercer a função de garantidor do processo penal constitucional, examinando detidamente o contexto do aprisionamento, e, assim, relaxando a prisão em flagrante ilegal, ou caso seja legal, velando pelo princípio da excepcionalidade da prisão preventiva, seja pelo zelo no exame da possibilidade de concessão de liberdade provisória destrelada de qualquer medida cautelar, ou não sendo isso possível, concedendo liberdade provisória atrelada às medidas cautelares que forem suficientes e necessárias. Também é claro o objetivo do provimento consistente em reafirmar o dever judicial de primeiro guardião dos direitos humanos do preso. Por isso, consta do art. 7.º que, diante das informações colhidas na audiência de custódia, caberá ao magistrado requisitar os exames clínico e de corpo de delito da pessoa presa, caso conclua sejam necessários para “apurar possível abuso cometido durante a prisão em flagrante, ou a lavratura do auto”, “determinar o encaminhamento assistencial, que repute devido”, sem prejuízo de outras medidas para a apuração de violação e de resguardo dos direitos humanos do detido. A quarta finalidade do provimento citado, extraída de seus consideranda, consiste em contribuir de modo significativo para a redução da quantidade de presos provisórios no sistema prisional paulista, e, consequentemente, cooperar para diminuir a hiperlotação nas unidades prisionais. A audiência de custódia realiza-se somente após assegurado o direito de o preso se entrevistar com seu advogado ou defensor público por tempo razoável, isto é, que lhe permita adequadamente expor o que ocorreu e ser devidamente orientado. Uma vez iniciada a audiência, o juiz informará o detido sobre seu direito de se manter em silêncio e não responder às perguntas que lhe forem feitas. Caso o preso se mantenha em silêncio, nenhum prejuízo deverá sofrer, pois se trata de um direito fundamental estabelecido na Constituição Federal em favor do indivíduo e contra o Estado. A seguir, o juiz o indagará sobre sua qualificação, condições pessoais, “tais como estado civil, grau de alfabetização, meios de vida ou profissão, local da residência, lugar onde exerce sua atividade, e, ainda, sobre as circunstâncias objetivas da sua prisão”. Não estão previstas reperguntas por parte do Ministério Público (MP) ou da defesa. Todavia, nada impede, antes é salutar, que sejam permitidas. Finalizada a entrevista, o juiz ouvirá o MP, o advogado ou o Defensor Público, sobre a legalidade da prisão e sobre a cautelaridade, devendo decidir nos termos do art. 310 do CPP.Na hipótese extrema de prisão preventiva, o juiz deverá (não é uma faculdade) examinar se cabe o disposto no art. 318 do CPP, a fim de substituí-la pela prisão domiciliar. A audiência de custódia será gravada em mídia. Deve ser lavrado termo escrito e sucinto contendo “o inteiro teor da decisão proferida pelo juiz”. Todavia, faculta-se ao juiz determinar que tudo o que se passou na audiência seja integralmente reduzido a escrito, explicitando-se todos os atos praticados. De todo modo, “a gravação original será depositada na unidade judicial e uma cópia instruirá o auto de prisão em flagrante”. Portanto, trata-se de ato permeado pelo direitos constitucionais à informação, ao silêncio, à ampla defesa, ao contraditório e à publicidade. A violação a quaisquer desses direitos acarretará a anulação do ato, e caso sua renovação não seja possível no mesmo dia ou após 24 horas contadas desde a detenção efetiva, o preso deverá ser colocado em liberdade. O disposto na parte final do caput do art. 6.º e do § 1.º merece especial atenção, pois impõe interditos cognitivos. Desse modo, em suas perguntas, o juiz limitar-se-á a indagar sobre “as circunstâncias objetivas da sua prisão”, sendo que “não serão feitas ou admitidas perguntas que antecipem instrução própria de eventual processo de conhecimento”. Tais limites são devidos porque o momento processual é de cognição limitada à verificação da legalidade da prisão em flagrante e à empenhada tentativa de concessão de liberdade provisória. Qualquer outra consideração implicaria indevida antecipação de elementos de convicção sobre o mérito, e, dessa forma, acarretaria a contaminação psicológica do julgador, o qual se tornaria debilitado em equidistância, imparcialidade e equilíbrio para apreciar o caso em momentos futuros de maior espaço cognitivo. Não se trata de um “interrogatório”, mas, sim, de uma “entrevista”. Por isso, o julgador não deve fazer perguntas ao preso sobre ter ele cometido ou não o fato. E se o fizer MP e defesa deverão protestar. Não se busca saber quem foi o autor do fato, mas, sim, de que modo foi feita a prisão do suposto autor. É vedado indagar: “o sr. praticou o crime?”. Em lugar disso, deve-se perguntar: “como, onde e quando o sr. foi preso?”. Certamente, haverá casos nos quais forçosamente serão examinados aspectos objetivos tendentes ao mérito, porque indissociáveis do exame da legalidade do estado de flagrância. Assim, por exemplo, será difícil não ocorrer alguma cognição mais ampla nos casos de flagrante presumido, pois cabe ao juiz examinar situações cuja legalidade está vinculada à proposição de que a pessoa presa foi perseguida ou encontrada em um contexto que a fizesse presumidamente autora da infração (art. 302, III e IV, do CPP). Em tais casos, a prudência deve ser redobrada, a fim de que não se promova um interrogatório antecipado. E ademais, o julgador e as partes deverão ter sempre em mente que: (a) a entrevista feita na audiência de custódia existe para preservar direitos do preso e não para prejudicá-lo; e (b) o âmbito de cognição sobre a “presunção de autoria” é sumário e limitado ao exame de aspectos objetivos óbvios, cristalinos e evidentes, os quais permitam presumir com a mesma tranquilidade que se presume que durante o dia há claridade. O advento formal da audiência de custódia revela verdadeiro e louvável esforço institucional do TJSP para dar efetividade a um processo penal orientado por princípios constitucionais. O fato de se criar um momento no qual a pessoa recém detida e o juiz colocam-se frente a frente dá ensejo a um ato processual que permite o aguçamento dos sentidos e da humanidade do julgador. A medida, contudo, depende em sua maior parte da direção que os magistrados darão ao procedimento, ou dito de outro modo, dependerá da política criminal que cada juiz vier a aplicar ao velho-novo instituto."

Lembre-nos que há lei, aliás "supra-lei" a autorizar a audiência de custódia! Oxalá, a iniciativa espalhe-se pelos demais Tribunais de Justiça do País, assegurando-se a integridade física do presos em flagrante, ora "flagrantemente" ignorada, inclusive pelo Ministério Público, órgão responsável pelo controle externo da atividade policial. Ou não?

O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil assinaram termo de cooperação técnica no dia 27 de abril de 2015 para estimular a instalação das chamadas audiências de custódia pelo país. A proposta é fazer com que presos em flagrante sejam ouvidos em 24 horas por juízes, em encontros presenciais com a participação de defensores e de membros do Ministério Público. A Ordem dos Advogados do Brasil comprometeu-se a criar núcleos voluntários de advocacia para atuar em comarcas onde a Defensoria Pública não atue, assumindo a defesa quando o preso estiver sem representante particular. Também planeja criar diretrizes para suas seccionais orientarem e capacitarem advogados sobre como participar da iniciativa. O Conselho Nacional de Justiça, por sua vez, diz que vai dar suporte aos tribunais de Justiça e tribunais regionais federais que adotarem as audiências de custódia, além de incentivar que as cortes escalem número suficiente de magistrados e servidores para trabalhar no projeto. A assinatura foi feita durante a abertura da VI Conferência Internacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, em Belém (PA). Em até 30 dias, o Conselho Nacional de Justiça e a Ordem devem apresentar um plano de trabalho para implementar as ações previstas no termo.

Em outra oportunidade, o então Presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski, reuniu-se com presidentes de Tribunais de Justiça de todo o País (dia 05 de maio de 2015) para incentivar o combate à cultura do encarceramento por meio da concretização do projeto Audiências de Custódia. A reunião ocorreu momentos antes do lançamento do projeto Cidadania nos Presídios, em Brasília. Com referência especial aos dirigentes de tribunais que já foram visitados pela equipe do Conselho Nacional de Justiça e tiveram conhecimento do projeto, o Ministro Lewandowski ganhou o apoio de mais estados e obteve o compromisso de novas execuções do projeto até o final do primeiro semestre de 2015. Lançado experimentalmente em São Paulo em fevereiro, o programa já reduziu em 45% o número de prisões provisórias no estado desde então. “Ao desenvolvermos esse projeto, vamos conseguir mudar completamente a realidade horrorosa das prisões no Brasil. Faço um apelo para partirmos na frente, mostrando que o Judiciário tem condições de fazer coisas novas”, disse o Ministro. Segundo Lewandowski, a proposta de apresentar os presos ao juiz no prazo de 24 horas dá um tratamento revolucionário e eficaz às determinações do Pacto de San Jose da Costa Rica, internalizado pelo Brasil em 1992. Ele destacou que os 600 mil presos do Brasil representam a quarta maior população carcerária no mundo. “Hoje a situação está insustentável”, ponderou. O ministro incentivou os presidentes a fortalecerem as discussões nos grupos de trabalho constituídos para a implementação do projeto, dialogando com os respectivos magistrados e com os demais atores do Judiciário e dos Executivos estaduais. Segundo o ministro, mesmo com os eventuais desafios, a transformação da realidade carcerária interessa a todos. Além da redução no número de prisões provisórias desnecessárias, o Ministro Lewandowski destacou que o projeto coíbe a prática de tortura policial e acaba facilitando o trabalho de todos os atores de Justiça com a antecipação de fases processuais, reforçando a pauta dos direitos individuais no processo penal. “Precisamos nos conscientizar sobre a importância da audiência de custódia, pois resolver o problema da superlotação é dever de todos e isso não é algo conquistado do dia para a noite. É importante que façamos esse esforço para que nos tornemos exemplo para o mundo”, apontou o Ministro. O êxito do projeto foi confirmado pelos Presidentes dos tribunais do Maranhão, Cleonice Freire, e de Minas Gerais, Pedro Bitencourt Marcondes. Com exceção do Maranhão, que já vem praticando um modelo local das audiências de custódia, Minas Gerais, Amazonas, Tocantins, Mato Grosso, Paraíba, Piauí, Ceará, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e Distrito Federal estão em vias de institucionalização do projeto. Em São Paulo, as audiências de custódia estão em vigor desde fevereiro de 2015. O presidente do CNJ e do STF sugeriu que detalhes sobre o programa Audiências de Custódia sejam discutidos nas próximas reuniões do Colégio de Presidentes das cortes estaduais. “A ideia é que a experiência de cada tribunal possa aperfeiçoar o projeto”, concluiu.

Desde fevereiro do ano de 2015, quando teve início o projeto piloto de audiência de custódia em São Paulo, as alternativas penais têm sido apontadas como uma importante estratégia para combater a superlotação dos presídios. Com o argumento de dar alternativas para que o juiz não mantenha encarcerada toda pessoa presa em flagrante, o modelo do projeto piloto previu que seriam criadas estruturas para a aplicação de alternativas penais. Apesar de órgãos como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen/MJ) falarem cada vez mais em alternativas penais, este é um tema ainda pouco compreendido e bastante carente da produção de dados que comprovem o potencial de as alternativas previstas realmente enfrentarem o cenário de presídios superlotados. Nesse sentido, a iniciativa do Depen e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) de pesquisar a aplicação e a execução das penas e medidas alternativas pelo sistema de justiça brasileiro foi muito bem recebida pela sociedade civil interessada no fortalecimento de políticas públicas que enfrentem a alta taxa de encarceramento atual. A pesquisa foi iniciada em 2011 e elaborou diagnósticos de natureza quantitativa e qualitativa sobre o fluxo da justiça criminal, incluiu a observação de audiências e a realização de entrevistas com magistrados e funcionários do sistema de justiça criminal. Parte dos resultados dessa pesquisa veio a público no dia 26 de novembro de 2014, durante o Seminário Nacional de Alternativas Penais, realizado em Brasília pelo Depen/MJ. Na ocasião, foi distribuído o sumário executivo da pesquisa e realizada uma mesa de debate sobre os resultados, da qual o ITTC participou. No dia 25 de março, a versão completa do relatório finalmente foi divulgada. De modo geral, as conclusões mais contundentes da pesquisa desvelam os mecanismos pelos quais opera nosso massivo sistema de aprisionamento. Em primeiro lugar, temos que a principal porta de entrada no sistema penitenciário é a prisão em flagrante. De acordo com o IPEA, 59,2% das denúncias criminais recebidas pelos tribunais referiam-se a inquéritos policiais abertos somente depois da prisão em flagrante, isto é, que não se baseavam em investigações prévias. Essa problemática da desvinculação entre prisão e investigação prévia é reforçada pelo fato de a maioria dos inquéritos instaurados e concluídos terem sido conduzidos por delegacias circunscricionais (77,3%), responsáveis por determinada região, e não por delegacias especializadas. Ou seja, em geral os inquéritos foram feitos por delegacias cuja competência abrange um número muito grande de responsabilidades, nas quais, em função da escassez de efetivos e de recursos, o trabalho é essencialmente reativo às ocorrências relatadas pela população. Nessas unidades, boa parte do que é feito consiste na busca das pessoas já conhecidas dos policiais. A predominância do chamado “policiamento por suspeição” é ainda fundamental para problematizar os dados sobre reincidência, geralmente divulgados com bastante alarde para denunciar o fracasso da missão ressocializadora do sistema prisional. Sendo a maioria dos inquéritos conduzidos por delegacias para as quais investigação é sinônimo de relacionar as ocorrências relatadas às pessoas com registros criminais, não é difícil concluir que o fato de uma pessoa (ou um familiar seu) já ter tido contato com o sistema de justiça a torna uma fortíssima candidata a passar por novo processo penal, independentemente de sua conduta individual. Assim, essa pesquisa do IPEA sugere que elevadas taxas de reincidência dizem menos sobre a capacidade de a prisão modificar comportamentos e muito mais sobre as engrenagens viciadas do sistema de justiça criminal. A prisão em flagrante é tão explicativa sobre o funcionamento da justiça criminal pelo motivo de a postura dominante do Judiciário ser a de chancelar a atuação da polícia, convertendo em prisão preventiva as prisões feitas em flagrante. Apesar de muitos juízes alegarem que têm soltado acusados por crimes apenados com penas baixas, a análise dos processos criminais feita pela equipe do IPEA revelou que há processos envolvendo furtos de valores insignificantes cometidos por réus primários em que se manteve a prisão preventiva, principalmente quando o réu estava em situação de rua. A atuação seletiva da justiça criminal que privilegia o ponto de vista da repressão policial foi notada pelos pesquisadores do IPEA também em razão da presença massiva de policiais como testemunhas nas mais diferentes localidades. Para os juízes, os policiais, tanto civis quanto militares, devem ser ouvidos porque são os profissionais que estão na ponta enquanto que os juízes, na “linha de produção” da justiça criminal, se veem como a última parte da esteira. A prisão como pena move-se pela lógica da comprovação jurídica de que uma pessoa é responsável por um determinado crime, ao passo que a prisão cautelar dirige-se principalmente à proteção de uma ordem pública abstrata, para a qual as figuras mais ameaçadoras são pessoas jovens, negras ou pardas, e socialmente vulneráveis. O modo como o Judiciário apenas carimba a escolha política da polícia sobre quem reprimir é nítido nos dados do IPEA que demonstram que a conduta de praticamente quatro em cada dez pessoas mantidas presas cautelarmente não foi considerada passível de receber uma condenação à prisão ao final do processo. Projetando este número para a quantidade de presos provisórios em dezembro de 2013 (Infopen), isso significa dizer que são cerca de 90 mil homens e mulheres mantidos encarcerados apesar de até mesmo um Judiciário conservador ser capaz de concluir que falta fundamento para aplicar pena de prisão para essas pessoas. A despeito do sucesso para demonstrar a forma abusiva como a prisão cautelar vem sendo aplicada, os resultados da pesquisa são insuficientes para problematizar especificamente o desenvolvimento da política nacional de alternativas penais. Ao contrário da pesquisa realizada pelo Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente (ILANUD) em 2006, os dados produzidos pelo IPEA partiram do pressuposto da validade da ampliação do recurso às alternativas penais, deixando de lado o questionamento sobre a aptidão das alternativas para reduzir as taxas de encarceramento. Para o ITTC, a defesa das alternativas penais como ferramenta de política criminal está condicionada à sua capacidade de reduzir o encarceramento sem, por meio disso, gerar expansão de outros mecanismos de controle penal. Fonte: http://canalcienciascriminais.com.br/artigo/as-engrenagens-do-carcere/

O Conselho Nacional de Justiça arquivou no dia 05 de maio de 2015manifestação da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) que criticava a implantação das audiências de custódia. A entidade apontava várias dificuldades para efetivar do projeto. Para a associação de magistrados, a iniciativa pode afetar a segurança pública, sob a alegação que a medida iria "retirar policiais das ruas e delegacias". Também iria aumentar a judicialização e encargos administrativos dos juízes e o número de reclamações disciplinares advindas dos advogados contra juízes que decidirem manter a custódia, além de fazer com que o preso se sinta forçado a negar agressões sofridas entre o momento da detenção e sua apresentação ao juiz. Conselheiro Fabiano Silveira aponta que projeto tem o condão de inibir a prática de tortura e tratamento cruel aos presos. O conselheiro do CNJ Fabiano Silveira, relator do caso, afirmou que as argumentações da Anamages não prosperam. Para ele, o atual sistema — sem as audiências de custódia — não assegura a adequada proteção aos presos, o que é mostrado nos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de aperfeiçoar a questão. Segundo Silveira, as audiências de custódia vão ao encontro das convenções internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que ressalta que o controle judicial imediato é meio para evitar prisões arbitrárias e ilegais. “Nessa linha, o artigo 306 do Código do Processo Penal, que estabelece apenas a imediata comunicação ao juiz de que alguém foi detido, bem como a posterior remessa do auto de prisão em flagrante para homologação ou relaxamento, não é suficiente para dar conta do nível de exigência estabelecido nas convenções internacionais”, diz o relatório do conselheiro. No que tange ao argumento de que os presos poderiam ser constrangidos a negar maus-tratos e violências, Silveira é categórico em afirmar que o projeto é um “marco no sentido da evolução civilizatória do processo penal brasileiro e humanização do sistema jurídico-penal”. “Ao contrário do mencionado pelo Requerente no ponto 7 da petição inicial, a referida audiência tem, sim, o condão de inibir a prática de atos de tortura, tratamento cruel, desumano e degradante”, completa. Outras questões apontadas pela Anamages são as dificuldades logísticas e geográficas que podem ocorrer em comarcar do interior de cada estado e da região Norte do país. O relator refutou tal argumentação, alegando que o projeto está em fase piloto. “A adoção do projeto é progressiva e escalonada, e leva em consideração a necessidade de disponibilização de recursos humanos e estrutura física necessária para sua implantação”, afirmou Silveira. Fonte: http://www.conjur.com.br/2015-mai-06/cnj-arquiva-manifestacao-anamages-audiencia-custodia

Só uma pessoa, de um total de 77 que foram autuadas, teve relaxamento de prisão no primeiro fim de semana de funcionamento do programa Audiência de Custódia no Espírito Santo. A prisão preventiva foi decretada para 32 pessoas. Outras 26 receberam a liberdade provisória sem o monitoramento eletrônico e 18 liberados, mas com a determinação de usar a tornozeleira eletrônica. Segundo a coordenadora do programa no estado, juíza Gisele Souza de Oliveira, a maior parte dos registros foram de roubo e comercialização de drogas, mas foram registrados também delitos referentes à Lei Maria da Penha, acidentes de trânsito e furto. “O movimento foi maior do que o esperado, sendo que na sexta-feira um número maior de prisões é registrado devido ao alto consumo de álcool e drogas”, disse. “Neste primeiro momento, estamos analisando o programa. Vamos realizar mudanças em algumas rotinas e avaliar o que funcionou e o que não deu certo, para ajustarmos”, acrescentou a juíza. O Judiciário do Espírito Santo começou a promover na sexta-feira (22/5) as audiências, que fixam prazo de 24 horas para juízes ouvirem presos em flagrante. O modelo foi desenhado pelo Conselho Nacional de Justiça. A ideia é que o juiz avalie se pode conceder liberdade ou aplicar medidas cautelares. A avaliação é feita no centro de triagem do Complexo Penitenciário de Viana, que recebe todas as pessoas autuadas em delito na Grande Vitória. O Espírito Santo é a segunda unidade da Federação a adotar o projeto, que funciona em São Paulo desde fevereiro deste ano. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-ES. http://www.conjur.com.br/2015-mai-25/estreia-audiencias-custodia-es-mantem-41-prisoes

O Poder Judiciário do Rio Grande do Sul pretende implantar ainda em 2015 as audiências de custódia. A previsão foi anunciada pelo presidente da seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcelo Bertoluci, depois de se reunir com o presidente do TJ-RS, desembargador José Aquino Flôres de Camargo, e com o corregedor do tribunal, desembargador Tasso Delabary. O presidente do TJ-RS afirmou que já vem debatendo o assunto com representantes da Defensoria Pública e do Ministério Público. Camargo anunciou o início da elaboração do Termo de Cooperação que irá viabilizar a implantação das audiências no estado. “As audiências de custódia asseguram a disposição constitucional que preserva e dignidade da pessoa humana. Nesse quesito, vai diretamente ao encontro do que é sustentado pela seccional gaúcha, na medida em que preserva e assegura os direitos humanos”, apontou o presidente da OAB-RS. Segundo Bertoluci, a iniciativa também vai abrir o campo de atuação para os advogados. O debate decorre de convênio firmado, no final de abril, entre o Conselho Federal da OAB e o CNJ para estimular o projeto em todos os estados. O conselho adota como justificativa um acordo firmado pelo Brasil em 1992, quando assinou a Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica. Segundo o CNJ, já manifestaram interesse em fazer parte da iniciativa os judiciários de Minas Gerais, Amazonas, Tocantins, Mato Grosso, Paraíba, Piauí, Ceará, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e Distrito Federal. Um projeto de lei sobre o tema (PL 554) tramita desde 2011 no Senado. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB-RS e do TJ-RS. (Revista Consultor Jurídico, 7 de junho de 2015, 7h33 - http://www.conjur.com.br/2015-jun-07/rs-planeja-implantar-audiencias-custodia-antes-fim-ano)

Por fim, atente-se que tramita no Senado o Projeto de Lei nº. 554 de 2011, de autoria do Senador Antonio Carlos Valadares que visa a alterar o § 1º do art. 306 do Código de Processo Penal, para determinar o prazo de vinte e quatro horas para a apresentação do preso à autoridade judicial, após efetivada sua prisão em flagrante.

Comentando este projeto de lei, Caio Paiva afirma:

"O Projeto de Lei do Senado nº 156/2009, responsável por estatuir o novo Código de Processo Penal brasileiro, foi aprovado naquela Casa no dia 08/12/2010, sendo posteriormente encaminhado à Câmara dos Deputados para revisão, em conformidade com o que dispõe o art. 65, caput, da Constituição Federal: “O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o rejeitar”. O art. 14, caput, do texto aprovado no Senado prevê o denominado “juiz das garantias”, responsável “pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder Judiciário”, competindo-lhe, entre outras funções, a de “zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido a sua presença” (inciso III). Tal dispositivo atende aos fins da CADH? Obviamente que não, pois, além de estabelecer que a condução do preso à presença da autoridade judicial consistirá numa faculdade do “juiz das garantias”, o Projeto do NCPP (Novo Código de Processo Penal) mantém o sistema cartorial quando regula o procedimento da análise do auto de prisão em flagrante. Vejamos: “Art. 553. Observado o disposto no art. 545, em até 24 (vinte e quatro) horas depois da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas.1º Cópia integral do auto de prisão em flagrante será encaminhada à Defensoria Pública no mesmo prazo de 24 (vinte e quatro) horas, salvo se o advogado ou defensor público que acompanhou o interrogatório já a tiver recebido.2º Também no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pelo delegado de polícia, com o motivo da prisão, o nome do condutor e o das testemunhas. Art. 554. Na ausência de autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à da comarca mais próxima. Art. 555. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, deverá:I – relaxar a prisão ilegal; ou II – converter, fundamentadamente, a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os seus pressupostos legais; ou III – arbitrar fiança ou aplicar outras medidas cautelares mais adequadas às circunstâncias do caso;IV – conceder liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. A concessão de liberdade provisória na forma do inciso IV do caput deste artigo somente será permitida se o preso for pobre e não tiver condições de efetuar o pagamento da fiança”.O NCPP não avança, portanto, em nada na matéria, mantendo a legislação processual penal do Brasil refratária aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos. A possibilidade/faculdade de o juiz determinar que o preso lhe seja apresentado não veicula nenhuma novidade, pois, além de tal expediente decorrer – de forma implícita – do CPP de 1941, a Lei nº 7960/89, que dispõe sobre a prisão temporária, já estabelece há bastante tempo que “O Juiz poderá, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público e do Advogado, determinar que o preso lhe seja apresentado, solicitar informações e esclarecimentos da autoridade policial e submetê-lo a exame de corpo de delito” (art. 2º, § 3º).Importante ressaltar, porém, que a realização da audiência de custódia foi objeto de debate (e rejeição) quando da tramitação do PLS 156/2009. Vejamos as duas emendas apresentadas pelo então Senador José Sarney a respeito do tema: “Emenda nº 170Dá-se a seguinte redação ao art. 551:Art. 551. Observado o disposto no art. 533, dentro em 24 (vinte e quatro) horas depois da prisão, será apresentado ao juiz competente o preso em flagrante, juntamente com o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas. Parágrafo único. Nas comarcas em que a autoridade judiciária não estiver presente todos os dias, o preso será apresentado na primeira oportunidade em que o juiz comparecer na comarca”. A justificativa apresentada pelo Senador: “Há mais de uma década, desde a ratificação e promulgação internas, pelo Brasil, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque, existe, em nosso ordenamento legal, o dever das autoridades policias rapidamente apresentarem a um juiz de direito, o preso em flagrante. Não é sem motivo que essa disposição consta dos diplomas internacionais, tratando-se de importantíssimo instrumento de combate à tortura policial. Além disso, o novo Código de Processo Penal deverá estar em sintonia com os referidos Diplomas Internacionais”. E a segunda emenda, de nº 171: “Dê-se a seguinte redação ao art. 553, que passa a ter a seguinte redação: Art. 553. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz, na presença do preso e após ouvi-lo, deverá:(…)A justificativa: “Em consonância com o artigo 9º.3 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e com o artigo 7º.5, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque[4], deve o juiz (no caso do projeto, o ‘juiz das garantias’) decidir na presença do acusado, de seu defensor e do membro do Ministério Público sobre o relaxamento ou não do flagrante (na hipótese de haver nulidade), a sua manutenção ou revogação com a concessão de liberdade provisória mediante fiança ou sem fiança, ou ainda sobre a imposição de outra medida cautelar pessoal que seja substitutiva da prisão, que não somente o monitoramento eletrônico, mas qualquer outra medida menos intensa e invasiva”. Ambas as emendas apresentadas pelo então Senador José Sarney foram rejeitadas no relatório final do Senador (relator) Renato Casagrande, que assim se manifestou: “Não vemos em que a redação do art. 551 do projeto do novo CPP possa ferir tratados internacionais de que o Brasil é signatário. São as próprias normativas internacionais citadas na justificativa que abrem a possibilidade de que o preso seja conduzido à presença de ‘outra autoridade habilitada/autorizada por lei a exercer funções judiciais’, papel que em nosso ordenamento é exercido pelo delegado de polícia judiciária”. O citado relatório/parecer foi aprovado pelo Plenário do Senado Federal em 08/12/2010, rejeitando-se de vez, então, as emendas 170 e 171 propostas por José Sarney. A fundamentação utilizada pelo relator, no sentido de considerar o delegado de polícia “autoridade judicial” para fins de cumprimento da normativa internacional prevista na CADH, conforme já adverti aqui nesta Série, no texto “A quem o preso deve ser apresentado?”, é claramente equivocada e contradiz a jurisprudência da Corte Interamericana. Para que a audiência de custódia seja garantida no NCPP, resta aguardarmos que a Câmara dos Deputados suscite novamente a matéria." Fonte: http://justificando.com/2015/05/14/na-serie-de-audiencia-de-custodia-a-primeira-tentativa-no-novo-cpp/

Nada obstante a clareza solar da questão ora analisada, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu:

"PRISÃO EM FLAGRANTE. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO IMEDIATA DO PRESO AO MAGISTRADO. OFENSA AO Pacto de São José da Costa Rica e ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. DESCABIMENTO. A OBRIGAÇÃO CONSTITUCIONAL CINGE-SE À COMUNICAÇÃO DA PRISÃO E DO LOCAL ONDE A PESSOA SE ENCONTRE PARA FINS DE ANÁLISE DA LEGALIDADE, NORMA ESSA DE EFICÁCIA PLENA, DE EFEITO IMEDIATO E ILIMITADO (CR, ART. 5º, INCISO LXII). CORRESPONDÊNCIA COM A DISPOSIÇÃO CONTIDA NO ARTIGO 306 DO CPP. ORDEM DENEGADA (TJSP – HC n. 2198503-45.2014.8.26.0000-São Paulo, 2ª Câmara de Direito Criminal, Rel. Des. Diniz Fernando, em 26/01/15). “Quanto à afirmada ilegalidade da prisão em flagrante, ante a ausência de imediata apresentação dos pacientes ao Juiz de Direito, entendo inexistir qualquer ofensa aos tratados internacionais de Direitos Humanos. Isto porque, conforme dispõe o art. 7º, 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos, toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais. No cenário jurídico brasileiro, embora o Delegado de Polícia não integre o Poder Judiciário, é certo que a Lei atribui a. Esta autoridade a função de receber e ratificar a ordem de prisão em flagrante. Assim, In concreto, os pacientes foram devidamente apresentados ao Delegado, não se havendo falar em relaxamento da prisão. Não bastasse, em 24 horas, o juiz analisa o auto de prisão em flagrante” (TJSP – HC n. 2016152-70.2015.8.26.0000- Rel. Guilherme de Souza Nucci, em 12.05.2015)."

Comentando a decisão, André Nicolitt, Bruno Cleuder de Melo e Gustavo Rodrigues Ribeiro, afirmaram que o "acórdão é fruto de uma má compreensão dos tratados e do sistema de direitos fundamentais instituído pela CRF/888.A Constituição do Brasil possui um sistema aberto de direitos fundamentais, como se extrai do art. 5.º, § 2.º, da CF/1988. A abertura de nosso sistema está definida com a seguinte redação: (§ 2.º) “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. A Constituição do Brasil, ao sair do catálogo, remeteu-nos à própria Constituição (regime e princípios por elas adotados) e aos tratados internacionais. Quanto aos tratados internacionais, embora o Texto Constitucional tenha se referido apenas a “tratados”, não há razão para interpretação restritiva da qual decorreria a exclusão das convenções e dos pactos. A doutrina se inclina a reconhecer na expressão “tratado” um gênero que abriga diversas espécies, como os pactos e as convenções. Os direitos fundamentais previstos tanto em tratados quanto em pactos e convenções internacionais podem enunciar direitos fundamentais, nos termos do art. 5.º, § 2.º, da CF/1988.Ilustra-se muito nesta categoria o direito de recorrer da sentença, o chamado duplo grau de jurisdição (art. 8.º, item 2, h, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica de 1969 e art. 14, item 5 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966). Pode-se falar, ainda, do direito do preso de ser apresentado “sem demora” à autoridade judicial, constante do art. 7.º, item 5 do Pacto de São José da Costa Rica e de igual maneira no art. 9º, 3 do Pacto internacional sobre direitos civis e políticos. No que tange aos direitos fundamentais previstos em “tratados”, há uma discussão interessante, relativamente ao status jurídico do ingresso destes direitos no ordenamento jurídico, notadamente em razão do § 3.º do art. 5.º da CF/1988. Indaga-se: os direitos fundamentais previstos em tratados internacionais estão na mesma posição hierárquica da norma Constitucional, inclusive se beneficiando de proteção como cláusula pétrea e servem de referência para o controle de constitucionalidade, ou estão no mesmo nível das leis infraconstitucionais, ou ainda estariam entre a Constituição e as leis? Comungamos do entendimento no sentido de que os direitos fundamentais previstos em tratados internacionais ingressam no ordenamento jurídico se aglutinando à Constituição material e com status equivalente, por força do art. 5.º, § 2.º, da CF/1988.Este porém não é o entendimento do STF que, embora não unânime, insiste em negar a natureza constitucional destas normas, afirmando estarem os tratados abaixo da Constituição e acima das leis conforme se extrai do RE 349.703. Assim, seriam eles infraconstitucionais e supralegais. Contudo, o Min. Celso de Mello esposa entendimento no sentido de que os tratados são formalmente constitucionais ut HC 90.450.Não obstante, não há dúvida de que os tratados e convenções sobre direitos humanos ingressaram no Brasil e possuem posição hierárquica superior a das leis infraconstitucionais, seja na nossa perspectiva seja na do STF.Portanto, a exigência da audiência de custódia está acima das leis ordinárias, devendo a aplicação do CPP e sua interpretação ser conforme os tratados, não podendo ser incompatíveis com os mesmos. É preciso entender que a garantia da audiência de custódia situa-se nos tratados como mecanismo que visa assegurar o direito de liberdade. A ideia reside exatamente em levar o preso a presença de autoridade capaz de restabelecer o direito de liberdade.Com efeito, a apresentação sem demora possibilita ao juiz verificar não apenas a legalidade da prisão, como também sua necessidade, garantindo também o exercício do contraditório, o que o CPP, na dicção dos art. 306 e 310 não asseguram. Note-se que, a autoridade prevista em lei deve ter o poder de restabelecer a liberdade. O delegado de polícia não possui em nosso sistema tal poder. O máximo que pode é conceder a fiança nos crimes cuja pena seja de até 04 anos. Nos demais casos (leia-se: nos crimes cuja pena seja superior a 04 anos; e até mesmo nos de pena até 04 anos, quando o agente não prestar a fiança arbitrada pelo delegado), mesmo entendendo desnecessária a custódia (por entender ausentes os requisitos da prisão preventiva), encaminhará o ser humano para o cárcere e aguardará a decisão do juiz. Bom seria que o delegado tivesse este poder, vez que quanto mais agentes públicos pudessem tutelar a liberdade melhor. Mas no quadro atual, o delegado não tem poder de tutelar a liberdade para além das hipóteses de crimes punidos com pena de até 04 anos (e até mesmo nesses, quando o agente não prestar a fiança arbitrada).Na verdade, antes do ato jurídico do delegado que lavra o flagrante não temos verdadeiramente prisão, temos apenas captura. A custódia só existe a partir da lavratura do APF. Neste sentido, a exigência é de que o custodiado seja apresentado e não o capturado. Até porque não é da tradição “prender” (capturar) e não levar ao delegado para tornar jurídico o ato. Do contrário o que haveria era sequestro, desaparecimento forçado, etc. Assim, não há dúvidas de que o Delegado de Polícia nos termos da atual legislação não atende aos fins colimados nos tratados quando exigem a audiência de custódia. O que o acórdão pretende é dar uma interpretação que cria um garantidor para inglês ver, pois o preso é apresentado para alguém que não tem o pleno poder de soltar. Portanto, analisando de forma crítica a proposição delineada pelo Des. Nucci, de que na atual conjectura legal do processo penal brasileiro teria a atribuição de garantia irrestrita de liberdade, ter-se-ia, na esteira da clássica definição do filósofo alemão Jünger Habermas uma contradição performativa, eis que a própria proposição não se coaduna com os pressupostos pragmáticos do ato de fala que a incorpora. Neste sentido, em termos mais claros, de nada adianta atribuir ao Delegado de Polícia função de garantia que não pode cumprir por ausência de disposição legal, ou, ainda, no mais simples jargão popular, “dar com uma mão e tomar com outra”, eis que a Autoridade responsável pela tutela da liberdade não poderá concedê-la. Lendo o voto do Des. Nucci, o que se extrai dos fatos é que o indivíduo foi preso em 19 de janeiro de 2015 e como o voto é de 12 de maio de 2015, imaginamos que o HC não restou prejudicado, isto é, continua preso e sem ter sido apresentado ao magistrado há quase 05 meses. Consta também do voto informação de que se tratava de acusado primário e com bons antecedentes acusados de tráfico o que por si só indica a desproporcionalidade da medida, vez que em tese admite-se no caso a substituição da pena definitiva em se seguindo a orientação pacífica do STF. Não obstante, o fundamento da prisão é a garantia da ordem pública o que já reputamos inconstitucional em outros escritos. De nossa parte entendemos o seguinte: a prisão lavrada pelo delegado pode ser legal. Comunica ao Juiz em 24 horas. Este a converte e passa ser a autoridade que mantém a custódia. Uma vez convertida deve designar audiência de custódia para apresentação do preso sem demora. Configurada a demora na audiência, há ilegalidade superveniente e a prisão deve ser relaxada. Em resumo, a decisão que converte a prisão após a comunicação desta pelo Delegado de Polícia não afasta o dever do juiz de garantir ao preso o direito de ser levado “sem demora” até a autoridade que tem o poder de conceder-lhe a liberdade. Não autoriza o juiz a manter a prisão por meses até que se realize a AIJ ocasião em que o preso vai ser interrogado. As normas do CPP (art. 306 e 310) e dos tratados internacionais, no que tangem a audiência de custódia, convivem tranquilamente. Há que se destacar que o tema da audiência de custódia ganhou força em razão da pressão internacional que recai sobre o Brasil por descumprimento dos tratados, pelas violações de direitos humanos destacadamente pelo alarmante número de presos provisórios. A toda evidência o grande responsável por isso é o judiciário. Daqui há pouco vão querer dizer também que outras autoridades é que são os responsáveis por todos os problemas decorrentes do encarceramento e massa e tudo que daí decorre. Definitivamente não! No sistema constitucional em vigor é o juiz que prende e o juiz que solta e ele o responsável por todos os problemas que decorrem de sua atividade. Vislumbramos profundo equívoco do acórdão ao tentar ver no Delegado autoridade capaz de atender aos fins previstos no Pacto de São José e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. Trata-se na verdade de uma contradição performática na qual se afirma proteger a liberdade restringindo-a na medida em que institui como garantidor alguém que não tem o pleno poder de libertar." Fonte: http://emporiododireito.com.br/analise-critica-do-voto-do-des-guilherme-de-souza-nucci-tjsp-o-delegado-de-policia-nao-faz-audiencia-de-custodia-por-andre-nicolitt-bruno-cleuder-de-melo-e-gustavo-rodrigues-ribeiro/

O programa Audiência de Custódia, em funcionamento no Espírito Santo desde 22 de maio de 2015, recebeu apoio de um importante agente em defesa dos direitos humanos, a Organização Não Governamental Human Rights Watch. Junto com uma delegação de especialistas da universidade americana de Yale na área do Direito Criminal, o grupo reuniu-se com o presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski, para manifestar apoio ao projeto. Coordenadora do Audiência de Custódia no Espírito Santo, a juíza Gisele Souza de Oliveira recebeu a notícia com muita satisfação. “O apoio dessa entidade, que é uma das mais respeitadas do mundo na área de direitos humanos, confere um elevado respaldo político e jurídico ao projeto, e nos encoraja e incentiva a ampliá-lo com vistas a incluir outras Comarcas que ainda não fazem parte dele. O Audiência de Custódia é um trabalho coletivo, em que um grupo de juízes trabalha diuturnamente, inclusive nos finais de semana. Essa é uma vitória de todos”, pontuou a Magistrada. No Espírito Santo, da implantação do programa até o dia 11 de junho de 2015, foram 410 apresentações ao juiz plantonista que resultaram na realização de 337 audiências. Deste total, 185 prisões em flagrante foram convertidas em prisão preventiva. Ao todo, foram expedidos 224 alvarás de soltura: em 10 casos houve relaxamento da prisão; em 25 foi deferida liberdade provisória sem fiança; em outros 14 foi concedida liberdade provisória com fiança (porém um dos custodiados não pagou o valor estipulado); em outros 172 julgamentos houve deferimento de liberdade provisória sem fiança e com medida cautelar. Por fim, em outros quatro casos foi deferida a liberdade provisória com fiança e medida cautelar. Além das citadas decisões, 159 custodiados foram encaminhados para atendimento psicossocial. Em entrevista, o Ministro Ricardo Lewandowski reforçou a necessidade de se mudar a “cultura do encarceramento” e pediu o apoio dos governantes na execução do projeto. No Espírito Santo, o Tribunal de Justiça conta com o auxílio da Secretaria de Estado de Justiça (Sejus), Defensoria Pública e Ministério Público: “Quando virem que nós estamos limpando as prisões e criando espaço para os presos realmente perigosos eles vão colaborar. É o que está acontecendo no Espírito Santo.” Também em declaração para a imprensa do CNJ, o representante da ONG Human Rights Watch para as Américas, Daniel Wilkinson, afirmou que o Audiência de Custódia é um dos mais importantes avanços para a área de Direitos Humanos em atividade no Brasil. O ativista reforçou que a comunidade internacional está acompanhando o projeto e já verifica que algo prático acontece por meio de uma grande força-tarefa. (Disponível em http://www.tjes.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13319:ong-internacional-elogia-audiencia-de-custodia&catid=3:ultimasnoticias).

O Conselho Nacional de Justiça, o Poder Judiciário do Maranhão e o Governo do Estado assinaram no dia 22 de junho de 2015, em São Luís (MA), um termo de compromisso destinado à reestruturação do sistema carcerário e de execução penal do estado, considerado um dos mais problemáticos do país. As medidas previstas no termo de compromisso representam também uma resposta do Estado brasileiro às cobranças de organismos internacionais por providências que impeçam mortes e violações de direitos humanos no sistema penitenciário do estado, principalmente no Complexo de Pedrinhas. Em dezembro de 2013, relatório produzido pelo CNJ apontou a morte de 60 presos dentro do Complexo de Pedrinhas e de outras unidades prisionais do estado. O documento apontou ainda outras violações dos direitos humanos, como a superlotação e a falta de segurança para detentos e parentes de presos – algumas das quais seriam submetidas a estupros, segundo denúncias de detentos. As mortes e violações aos direitos humanos em Pedrinhas levaram a Organização das Nações Unidas e a Organização dos Estados Americanos a cobrar do governo brasileiro uma solução para o problema. O termo assinado nesta segunda-feira traz mais de 20 compromissos assumidos pelo governo maranhense e pelos órgãos do Judiciário para a adequação do sistema prisional do estado. As medidas são direcionadas a três objetivos: a reestruturação do sistema carcerário, o aprimoramento da rotina de execução penal e a consolidação das audiências de custódia no estado, com adequação do programa ao projeto do CNJ. “Esse convênio significa um esforço de colaboração de várias entidades. Não apenas do CNJ, do TJ-MA, mas também do Ministério da Justiça, do governo do estado, da Defensoria Pública, do Ministério Público e da OAB. Com isso, não apenas resolvemos um aspecto de natureza prática, material, como também damos esperança para aqueles que estão presos”, afirmou o Ministro Lewandowski. O acordo prevê a adesão dos órgãos locais ao projeto Audiência de Custódia, do CNJ. O estado foi o primeiro a implementar as audiências de custódia no país, em outubro de 2014, mas a iniciativa desenvolvida no estado é diferente do projeto nacional, implementado pelo CNJ em São Paulo e no Espírito Santo. Uma das principais diferenças entre os dois projetos diz respeito ao chamado “escopo restaurativo”, contido na proposta do CNJ, que prevê a criação ou fortalecimento de centrais integradas de alternativas penais, centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação penal. Essas centrais serão responsáveis por apresentar ao juiz opções ao encarceramento provisório. Além disso, o projeto do CNJ estabelece prazo máximo de 24 horas para a apresentação do preso em flagrante ao juiz, o que ainda não acontece no Maranhão. “Com as audiências de custódia, o encarceramento provisório no estado vem diminuindo”, afirmou a Desembargadora Cleonice Silva Freire. A ideia é que o alinhamento do estado ao projeto nacional resulte na ampliação e no fortalecimento das audiências de custódia no estado, com a criação ou fortalecimento das estruturas voltadas às penas alternativas, implantação do atendimento aos finais de semana e interiorização da iniciativa. Atualmente as audiências são realizadas apenas na Central de Inquéritos de São Luís. O termo de compromisso estabelece ainda medidas direcionadas à saúde e à reintegração social de egressos do sistema prisional, como a aproximação com as entidades do "sistema S" (Senai, Senac, Senar, Sesi, etc) para a capacitação e colocação profissional de ex-detentos e a criação de ambientes próprios para oficinas de trabalho, aulas e cursos profissionalizantes nas unidades prisionais. Outro ponto importante do acordo é a conclusão de quatro presídios no interior do estado e um na capital, totalizando um investimento de ao menos R$ 35,6 milhões na criação de 1.134 novas vagas (veja detalhes na tabela abaixo). O governo se compromete ainda a concluir a reforma e ampliação dos presídios dos municípios de Balsas, Pedreiras, Açailândia e Codó, com a criação de outras 564 vagas. As novas vagas servirão para que presos que cumprem pena na capital sejam transferidos para presídios no interior, próximos a sua família. “Esse termo permitirá avançar ainda mais na modernização do sistema penitenciário maranhense, na medida em que poderemos estruturar melhor o sistema penitenciário, seja com medidas quantitativas, ou seja, mais vagas, seja com medidas qualitativas, uma melhor gestão”, afirmou o governador Flávio Dino, durante a cerimônia de assinatura realizada na sede do governo. Segundo o governador, o número de mortes e fugas no sistema penitenciário maranhense diminuiu 60% nos últimos cinco meses. Fonte: CNJ. No Direito Comparado conferir o art. 132 do Código Procesal Penal do Chile, o art. 505 da Ley de Enjuiciamento Criminal da Espanha, art. 128 do Código de Processo Penal alemão (StPO) e o art. 266 do Peru.

A Justiça do Espírito Santo ouviu 630 presos em flagrante desde o dia 22 de maio de 2015, quando implantou projeto que obriga audiências de custódia em 24 horas. Desse total, 317 foram soltos até o dia 22 de junho de 2015, o que equivale a 50,63%, de acordo com balanço divulgado no dia 26 de junho. E 2,76% das pessoas liberadas voltaram a cometer algum crime. Do total de presos indiciados, 311 tiveram a prisão provisória convertida em preventiva. Quinze conseguiram relaxamento da prisão, e outros 254 tiveram a liberdade provisória decretada sem o pagamento de fiança, mas com aplicação de medida cautelar. Foi concedida liberdade provisória sem pagamento de fiança a 26 presos e com pagamento de fiança a outros 19. Em cinco casos foi decretada a liberdade provisória do preso mediante o pagamento de fiança e a imposição de medida cautelar. O levantamento aponta também que 227 presos foram encaminhados a algum tipo de atendimento assistencial oferecido pelo estado, como o acesso a cursos profissionalizantes e o encaminhamento a atendimento psiquiátrico ou a órgãos voltados ao tratamento de usuários de drogas. Os autos de prisão foram recebidos no Centro de Triagem do Complexo Penitenciário, que concentra os flagrantes registrados nos municípios de Vitória, Serra, Cariacica, Vila Velha e Viana. Pela regra do TJ-ES, o juiz deve questionar o perfil de cada pessoa (nível de escolaridade, profissão e local onde mora, por exemplo) e as circunstâncias da prisão, sem antecipar o mérito. É obrigatória a presença de um promotor e de um defensor público ou advogado. “Além de humanizar o atendimento, economizamos recursos para o estado”, afirma o presidente do TJ-ES, desembargador Sérgio Bizzotto Pessoa de Mendonça. Ele calcula que, no primeiro mês de funcionamento, o projeto economizou cerca de R$ 1 milhão para o estado, caso tivesse de bancar os custos dos custodiados. “A metodologia desenhada para o desenvolvimento das ações compreendidas pelas audiências de custódia apresenta-se como um modelo para o país, sobretudo no que respeita à aplicação de medidas cautelares com enfoque restaurativo e inclusivo”, afirma Luís Geraldo Sant'Ana Lanfredi, coordenador do departamento do CNJ responsável pelo sistema carcerário. Com informações da Agência CNJ de Notícias. Fonte: Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2015, 20h16 (Disponível em http://www.conjur.com.br/2015-jun-26/mes-audiencias-custodia-es-soltam-50-presos).

O Conselho Nacional de Justiça prevê que até outubro de 2015 mais 14 estados implantem as audiências de custódia. A Justiça Federal também deve fazer a adesão em um projeto piloto no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Os termos devem ser assinados nas capitais de Minas Gerais, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Paraná ainda neste mês. Em agosto será a vez do estados do Amazonas, Tocantins, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Ceará, Santa Catarina e Bahia. Já Goiás e Roraima indicaram que devem implantar as audiências de custódia, porém ainda não há confirmação da data em que acordo será firmado. (http://www.conjur.com.br/2015-jul-10/14-estados-aderir-audiencias-custodia-outubro).

A propósito da audiência de custódia, Aury Lopes Jr e Alexandre Morais da Rosa escreveram o seguinte:

"Não raras vezes a notícia de um crime nos assusta e joga com o nosso imaginário. Se somos humanos, ao lermos um auto de prisão em flagrante ou uma denúncia descrevendo, por exemplo, a conduta de Paulo K., consistente em ter entrado numa casa, pela madrugada, para o fim de subtrair bens e, no seu percurso, ter sido flagrado pela moradora, senhora idosa, a qual desferiu dois tiros, sem que tivesse morrido, fugindo, na sequência do local do crime e, depois, preso pela polícia, teríamos que preencher as lacunas. Não lembraríamos de um rosto doce, respeitador, educado, mas sim de um sujeito que congrega em si os atributos do mal. Essa conduta humana (preencher os espaços desprovidos de informação) cria o que se denomina de efeito priming, ou seja, o efeito que a rede de associações de significantes opera individualmente sem que nos demos conta, fundados naquilo que acabamos de perceber, mesmo na ausência de informações do caso. Daí que a simples leitura da peça acusatória ou do auto de prisão em flagrante gera, aos metidos em processo penal, a antecipação de sentido. Aí reside o primeiro passo fundamental para o acolhimento da audiência de custódia. Não se tratará mais do “criminoso” que imaginamos, mas sim do sujeito de carne e osso, com nome, sobrenome, idade e rosto. O impacto humano proporcionado pelo agente, em suas primeiras manifestações, poderá modificar a compreensão imaginária dos envolvidos no Processo Penal. As decisões, portanto, poderão ser tomadas com maiores informações sobre o agente, a conduta e a motivação. Lembre-se que a prisão cautelar é sempre processual, isto é, não servem para antecipar a pena, devendo-se fundamentar a excepcionalidade da contenção cautelar, crítica que já fizemos anteriormente. Daí ganhar importância o dispositivo estatal para análise das razões da prisão cautelar face-to-face. Respeito às regras do jogo processual. Essa invectiva é lançada por nós faz anos em textos, assim como de boa parte dos juristas preocupados em estabelecer um padrão mínimo de normas processuais aptas a garantia do devido processo legal substancial. Recentemente discorremos sobre a importância de se conhecer as Convenções de Direitos Humanos, plenamente em vigor no Brasil, indicando o livro de Nereu Giacomolli. A partir disso, o controle de compatibilidade das leis não se trata de mera faculdade conferida ao julgador singular, mas sim de uma incumbência, considerado o princípio da supremacia da Constituição. No exercício de tal controle deve o julgador tomar como parâmetro superior do juízo de compatibilidade vertical não só a Constituição da República (no que diz respeito, propriamente, ao controle de constitucionalidade difuso), mas também os diversos diplomas internacionais, notadamente no campo dos Direitos Humanos, subscritos pelo Brasil, os quais, por força do que dispõe o artigo 5º, parágrafos 2º e 3º[1], da Constituição Federal, moldam o conceito de "bloco de constitucionalidade" (parâmetro superior para o denominado controle de convencionalidade das disposições infraconstitucionais).No que concerne especificamente ao chamado controle de convencionalidade das leis, inarredável a menção ao julgamento do Recurso Extraordinário 466.343, da relatoria do ministro Gilmar Mendes, no qual ficou estabelecido o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal no que diz respeito à hierarquia das normas jurídicas no direito brasileiro. Assentou o Supremo Tribunal Federal que os tratados internacionais que versem sobre matéria relacionada a Direitos Humanos têm natureza infraconstitucional e supralegal — à exceção dos tratados aprovados em dois turnos de votação por três quintos dos membros de cada uma das casas do Congresso Nacional, os quais, a teor do art. 5º, §3º, CR, os quais possuem natureza constitucional: “PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL EM FACE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INTERPRETAÇÃO DA PARTE FINAL DO INCISO LXVII DO ART. 5O DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. POSIÇÃO HIERÁRQUICO-NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código Civil de 1916 e com o Decreto-Lei n° 911/69, assim como em relação ao art. 652 do Novo Código Civil (Lei n° 10.406/2002). [...] (RE 349703. Relator: Min. Carlos Ayres Britto).Logo, cumpre ao julgador afastar a aplicação de normas jurídicas de caráter legal que contrariem tratados internacionais versando sobre Direitos Humanos, destacando-se, em especial, a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica), o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966 e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 (PIDESC), bem como as orientações expedidas pelos denominados "treaty bodies" – Comissão Interamericana de Direitos Humanos e Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, dentre outros – e a jurisprudência das instâncias judiciárias internacionais de âmbito americano e global – Corte Interamericana de Direitos Humanos e Tribunal Internacional de Justiça da Organização das Nações Unidas, respectivamente. E o direito do acusado ser apresentado perante um Juiz, no prazo de 24 horas, portanto, não é nenhuma novidade legislativa. Simplesmente não era aplicado, mas é regra válida do jogo processual. O Conselho Nacional de Justiça, assim, ao apontar pela efetivação da audiência de custódia, não inventou nada: “O objetivo do projeto é garantir que, em até 24 horas, o preso seja apresentado e entrevistado pelo juiz, em uma audiência em que serão ouvidas também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso. Durante a audiência, o juiz analisará a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e adequação da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medidas cautelares. O juiz poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades. ”Entretanto, longe de condenarmos os que estão contra a realização da audiência de custódia, apenas sublinhamos que o viés do status quo é a máxima entoada por boa parte deles. Novidades, alterações, modificações no padrão de ação significam a necessidade de desgastes, novas rotinas, enfim, a revisão do que estão fazendo há anos. A ideia de manter as coisas como estão (bem ou mal) e demasiadamente humana. O imobilismo de sempre fazer o mesmo acaba tomando o lugar do cumprimento da lei. Podemos, assim, dizer que desde a incorporação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos ao ordenamento brasileiro, ausente audiência de custódia (artigo 7º, 5), todas as prisões são ilegais, conforme decidiu recentemente, em Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública do RJ (defensor Eduardo Newton), o desembargador Luiz Noronha Dantas. Evidentemente que existirão questões de adequação e certo tempo para implementação efetiva, como, aliás, acontece em diversos países latinos e inclusive nos Estados Unidos. Em todos eles a audiência de custódia se realiza e, nela, mediante razões em contraditório, decide-se sobre a manutenção ou não da custódia e de eventuais medidas cautelares. Aliás, a iniciativa reconhece a necessidade de evolução paulatina, partindo das seguintes premissas: “a) as apresentações dos autuados têm que ser ininterruptas (inclusive aos sábados, domingos, feriados, e recesso), b) deve haver estrutura séria e factível, facilitada pelo executivo, em condições de oferecer opções reais e concretas ao encarceramento provisório, c) o monitoramento constante e permanente dos resultados da experiência é condição essencial para corrigir eventuais desvios da experiência que se estará realizando, em tempo real e d) necessidade de prévia capacitação conceitual e instrumental de todos os envolvidos com a novel rotina processual garantista."No caso narrado acima, o subscritor Alexandre, designou uma audiência para analisar a prisão do agente, tendo se verificado que seria impossível, pelas características do conduzido e, também, pela forma como foi preso, ser o autor da infração. Depois a absolvição foi confirmada em sentença, sem recurso da acusação. Mas a leitura do auto de prisão em flagrante fez com que o acusado ficasse preso até ao que hoje chamamos de audiência de custódia. Teria ficado até a instrução se fosse jogar apenas com o imaginário preenchimento de lacunas. Teremos, por certo, problemas. A informática e a videoconferência poderão nos ajudar. O que devemos ter, gostemos ou não, é respeito pelas regras do jogo. E nelas, a audiência de custódia é condição de possibilidade à prisão cautelar. A magistratura precisa cumprir as leis. Concordem ou não, já que não há inconstitucionalidade. Evidentemente que a cultura encarceradora não se muda por mágica, nem pela audiência de custódia, mas podemos, ao menos, mitigar a ausência de impacto humano." (http://www.conjur.com.br/2015-fev-13/limite-penal-afinal-quem-medo-audiencia-custodia-parte).

E continuam os mesmos autores:

"Dando continuidade à nossa análise acerca da audiência de custódia, vamos tratar hoje do Projeto implantando em São Paulo através do Provimento Conjunto 3/2015, da presidência do Tribunal de Justiça do estado, em conjunto com o Conselho Nacional de Justiça e do Ministério da Justiça. A iniciativa é muito importante e alinha-se com a necessária convencionalidade que deve guardar o processo penal brasileiro, adequando-se ao disposto no artigo 7.5 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) que determina: “Toda pessoa presa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em um prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo. ”Em diversos precedentes a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) tem destacado que o controle judicial imediato — que proporciona a audiência de custódia — é um meio idôneo para evitar prisões arbitrárias e ilegais, pois corresponde ao julgador “garantir os direitos do detido, autorizar a adoção de medidas cautelares ou de coerção quando seja estritamente necessária, e procurar, em geral, que se trate o cidadão de maneira coerente com a presunção de inocência”, conforme julgado no caso Acosta Calderón contra Equador. A Corte Interamericana entendeu que a mera comunicação da prisão ao juiz é insuficiente, na medida em que “o simples conhecimento por parte de um juiz de que uma pessoa está detida não satisfaz essa garantia, já que o detido deve comparecer pessoalmente e render sua declaração ante ao juiz ou autoridade competente”. Nesta linha, o artigo 306 do Código do Processo Penal que estabelece apenas a imediata comunicação ao juiz de que alguém foi detido, bem como a posterior remessa do auto de prisão em flagrante para homologação ou relaxamento, não são suficientes para dar conta do nível de exigência convencional. No Caso Bayarri contra Argentina, a CIDH afirmou que “o juiz deve ouvir pessoalmente o detido e valorar todas as explicações que este lhe proporcione, para decidir se procede a liberação ou manutenção da privação da liberdade” sob pena de “despojar de toda efetividade o controle judicial disposto no artigo 7.5. da Convenção”. Mas outras duas questões podem ser discutidas à luz do artigo 7.5. A primeira é: o que se entende por “outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais”? A intervenção da autoridade policial, do delegado, daria conta dessa exigência? Entendemos que não. Primeiro porque o delegado de polícia, no modelo brasileiro, não tem propriamente ‘funções judiciais’. É uma autoridade administrativa despida de poder jurisdicional ou função judicial. Em segundo lugar a própria CIDH já decidiu, em vários casos, que tal expressão deve ser interpretada em conjunto com o disposto no artigo 8.1 da CADH, que determina que “toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial”. Com isso, descarta-se, de vez, a suficiência convencional da atuação do Delegado de Polícia no Brasil. O segundo ponto que poderia suscitar alguma discussão diz respeito a expressão “sem demora”. A apresentação do detido ao juiz deve ocorrer em quanto tempo? A CIDH já reconheceu a violação dessa garantia quando o detido foi apresentado quatro dias após a prisão (Caso Chaparro Alvarez contra Equador) ou cinco dias após (Caso Cabrera Garcia y Montiel Flores contra México). No Brasil, a tendência (inclusive no PLS 554/2011) é seguir a tradição das 24 horas já consolidada no regramento legal da prisão em flagrante. No projeto de São Paulo, o artigo 3º determina que “a autoridade policial providenciará a apresentação da pessoa detida, até 24 horas após a sua prisão, ao juiz competente, para participar da audiência de custódia”, bem como que “o auto de prisão em flagrante será encaminhado, na forma do artigo 306, § 1º, do CPP, juntamente com a pessoa detida”. Uma vez apresentado o preso ao juiz, ele será informado do direito de silêncio e assegurada a entrevista prévia com defensor (particular ou público). Nesta ‘entrevista’ (não é um interrogatório, portanto), o artigo 6º, § 1º determina expressamente que “não serão feitas ou admitidas perguntas que antecipem instrução própria de eventual processo de conhecimento.” Eis um ponto crucial da audiência de custódia: o contato pessoal do juiz com o detido. Uma medida fundamental em que, ao mesmo tempo, humaniza-se o ritual judiciário e criam-se as condições de possibilidade de uma análise acerca do periculum libertatis, bem como da suficiência e adequação das medidas cautelares diversas do artigo 319 do CPP.Essa entrevista não deve se prestar para análise do mérito (leia-se, autoria e materialidade), reservada para o interrogatório de eventual processo de conhecimento. A rigor, limita-se a verificar a legalidade da prisão em flagrante e a presença ou não dos requisitos da prisão preventiva, bem como permitir uma melhor análise da(s) medida(s) cautelar(es) diversa(s) adequada(s) ao caso, dando plenas condições de eficácia do artigo 319 do CPP, atualmente restrito, na prática, a fiança. Infelizmente, como regra, os juízes não utilizam todo o potencial contido no artigo 319 do CPP, muitas vezes até por falta de informação e conhecimento das circunstâncias do fato e do autor. Contudo, em alguns casos, essa entrevista vai situar-se numa tênue distinção entre forma e conteúdo. O problema surge quando o preso alegar a falta de fumus commissi delicti, ou seja, negar autoria ou existência do fato (inclusive atipicidade). Neste caso, suma cautela deverá ter o juiz para não invadir a seara reservada para o julgamento. Também pensamos que eventual contradição entre a versão apresentada pelo preso neste momento e aquela que futuramente venha utilizar no interrogatório processual, não pode ser utilizada em seu prejuízo. Em outras palavras, o ideal é que essa entrevista sequer viesse a integrar os autos do processo, para evitar uma errônea (des)valoração. Neste sentido, melhor andou o PLS 554/2011 ao dispor que “a oitiva a que se refere o parágrafo anterior será registrada em autos apartados, não poderá ser utilizada como meio de prova contra o depoente e versará, exclusivamente, sobre a legalidade e necessidade da prisão; a prevenção da ocorrência de tortura ou de maus-tratos; e os direitos assegurados ao preso e ao acusado. ”Uma vez ouvido o preso, o juiz dará a palavra ao advogado ou ao defensor público para manifestação, e decidirá, na audiência fundamentadamente, nos termos do artigo 310 do CPP, acerca da homologação do flagrante ou relaxamento da prisão e, após, sobre eventual pedido de prisão preventiva ou medida cautelar diversa. Aqui é importante sublinhar, uma vez mais, que a prisão preventiva somente poderá ser decretada mediante pedido do Ministério Público (presente na audiência de custódia), jamais de ofício pelo juiz (até por vedação expressa do artigo 311 do CPP. A tal ‘conversão de ofício’ da prisão em flagrante em preventiva é uma burla de etiquetas, uma fraude processual, que viola frontalmente o artigo 311 do CPP (e tudo o que se sabe sobre sistema acusatório e imparcialidade), e aqui acaba sendo (felizmente) sepultada, na medida em que o Ministério Público está na audiência. Se ele não pedir a prisão preventiva, jamais poderá o juiz decretá-la de ofício, por elementar. A audiência de custódia representa um grande passo no sentido da evolução civilizatória do processo penal brasileiro e já chega com muito atraso, mas ainda assim sofre críticas injustas e infundadas. Voltando para o projeto de São Paulo, infelizmente, ele apresenta dois pontos perigosos:— Possibilidade de dispensa da apresentação do preso: o artigo 3º, § 2º do Provimento estabelece que ‘fica dispensada a apresentação do preso, na forma do parágrafo 1º, quando circunstâncias pessoais, descritas pela autoridade policial no auto de prisão em flagrante, assim justificarem;— Não realização durante o plantão: segundo o artigo 10, não será realizada a audiência de custódia durante o plantão judiciário ordinário (artigo 1.127, I, NSCGJ) e os finais de semana do plantão judiciário especial (artigo 1127, II, NSCGJ).São medidas que podem esvaziar completamente a finalidade da audiência de custódia, mantendo o estado atual da arte, em que basta a simples remessa do auto de prisão em flagrante e a burocrática e distanciada decisão do juiz. Outra situação muito preocupante (agora em relação ao PLS 554/2011) está contida na Emenda Substitutiva do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que permite substituir a apresentação pessoal do preso ao juiz pelo sistema de videoconferência. Tal medida exige uma leitura mais ampla, para compreender-se que mata o caráter antropológico e humanista da audiência de custódia. Substituir a apresentação pessoal por uma oitiva por videoconferência é coisificar o preso e inseri-lo no regime asséptico, artificial e distanciado do online, matando ainda a possibilidade de controle dos eventuais abusos praticados no momento da prisão ou da lavratura do auto. Não é preciso maior esforço para verificar que tal emenda substitutiva vem para atender os interesses de esvaziamento do instituto, para que se dê conta, apenas formalmente (e ilusoriamente), da exigência convencional, estando ainda em completa discordância com os julgados da Corte Interamericana de Direitos Humanos anteriormente citados. Não rejeitamos a hipótese excepcional da videoconferência, sem que seja a regra. Enfim, não há porque temer a audiência de custódia, ela vem para humanizar o processo penal e representa uma importantíssima evolução, além de ser uma imposição da Convenção Americana de Direitos Humanos que ao Brasil não é dado o poder de desprezar." (http://www.conjur.com.br/2015-fev-20/limite-penal-afinal-quem-continua-medo-audiencia-custodia-parte2).

Para eles, "o regime da Constituição e do Código de Processo Penal reserva ao delegado de polícia a função de lavrar o flagrante, transformando em autos a narrativa dos condutores. Além disso, na sequência, poderá conceder fiança nas hipóteses legais. Não cabe à autoridade policial deferir liberdade provisória ou medidas cautelares diferentes do previsto no artigo 319 do Código de Processo Civil. Para isso há reserva de Jurisdição. A polícia judiciária não é órgão do Poder Judiciário (é um paradoxo, mas é uma polícia judiciária não subordinada ao Poder Judiciário), mas do Executivo. Daí que a alegação de que o Delegado de Polícia seria a outra autoridade referida pela Convenção não se sustenta. A audiência de custódia deve ser presidida por autoridade munida das competências capazes de controlar a legalidade da prisão — o delegado lavra e o juiz controla. Além disso, já nessa fase, tanto Ministério Público como defesa devem sustentar as razões pelas quais a constrição cautelar deve ou não ser mantida. Há reserva de Jurisdição. Logo, além do Juiz, devem participar Ministério Público e defesa. Qual o objeto da audiência de custódia? A audiência de custódia não é uma audiência para fins de colheita de prova. É o espaço democrático em que a oralidade é garantida. Seu objeto é restrito, ou seja, não há interrogatório, nem produção antecipada de provas. Há uma prisão decorrente do flagrante e a necessidade de controle jurisdicional. O ato que era praticado exclusivamente pelo magistrado, sem participação dos jogadores processuais (Ministério Público e Defesa), agora muda completamente sua morfologia. Com isso, se dá também efetividade ao disposto no art. 282, $ 3º, do CPP, no sentido de que o contraditório legitima o ato decisório, uma vez que pode acolher e rejeitar os argumentos, conta com a efetiva participação dos agentes processuais. Quais os passos da audiência de custódia? Na audiência de custódia deve-se seguir os seguintes passos:1) A prisão é legal, isto é, era hipótese de flagrante?2) Se não, relaxa-se; 2.1.) Relaxada a prisão o Ministério Público pode requerer a prisão preventiva ou a aplicação de medidas cautelares; 3) Sustentando-se as razões do flagrante; 3.1) O Ministério Público se manifesta pelo requerimento da prisão preventiva ou aplicação de cautelares ou acolhe as razões formuladas eventualmente pela autoridade policial; 3.2) A defesa se manifesta sobre os pedidos formulados pelo Ministério Público. Se não houve pedido por parte do Ministério Público, o juiz não pode decretá-lo de ofício, já que não existe processo (CPP, artigo 311, vale conferir a redação).4) O magistrado decide — fundamentadamente — sobre a aplicação das medidas cautelares diversas ou, sendo elas insuficientes e inadequadas, pela excepcional decretação da prisão preventiva. Podem ser juntados documentos e ouvidas testemunhas? Os agentes processuais podem juntar documentos para lastrear os respectivos pleitos. Não cabe a oitiva de testemunhas nessa fase. A audiência é com objeto restrito. Pode a audiência ter continuidade? Pode a audiência ter continuidade? Entendemos que sim, especialmente nos casos de violência doméstica. É muito comum que nos casos de ação penal privada ou condicionada à representação a vítima seja instada a participar do ato. Nessa situação a Delegacia de Polícia já deve deixar a vítima ciente do ato judicial. Alguns juizados de violência doméstica já estipularam horários diários para apresentação do preso e orientam a autoridade policial que intime a vítima para comparecer no mesmo horário. Como a conduta recém aconteceu, em alguns casos, a vítima está sob efeito de forte emoção e solicita um prazo maior para decidir sobre a continuidade da ação penal. Claro que sabemos da decisão do Supremo Tribunal Federal no caso de lesões corporais, mas as condutas não se restringem a ela. Daí ser possível que ausente, por exemplo, comprovação da residência ou de vínculo certo do conduzido, possa-se redesignar a audiência. Em todos os casos, todavia, a decisão sobre a custódia e eventuais medidas cautelares deve ser tomada. Cabe usar videoconferência? Em alguns estados americanos a audiência de custódia é feita por vídeo conferência. Essa modalidade encontra ainda certa desconfiança dadas as condições de pressão que podem ocasionar no estabelecimento penal. Existe a possibilidade de um Defensor permanecer no local de custódia e participar conjuntamente do ato ou mesmo de um estar com o conduzido e outro na sala de audiências. Não podemos dizer que sempre será possível. Entretanto, com as devidas garantias, parece-nos possível. Assim, cai por terra a histeria de que muitos policiais serão obrigados a se deslocar no transporte do conduzido ao juízo. Em prisões acontecidas fora do estado de origem do conduzido ou mesmo quando deseje contratar um Defensor que não tenha domicílio no mesmo Estado ou comarca, o uso da tecnologia poderá garantir que a escolha por profissional de sua confiança se efetive. Daí a importância da tecnologia, usada sem receios e cuidados, em diversos locais do mundo, garantida a entrevista prévia com o defensor. Reconhecemos, também, que deve ser exceção e justificada, nos mesmos moldes do artigo 185, parágrafo 2º, do CPP. É que o impacto humano do contato pessoal pode modificar a compreensão. Não podemos é banalizar o uso da videoconferência sob pena de matar um dos principais fundamentos da audiência de custódia: o caráter humanitário do ato, a oportunidade do contato pessoal do preso com o seu juiz. Controle sobre a integridade física do conduzido. Se o conduzido estiver machucado ou reclamar de tortura, por mais que as lesões possam ser decorrentes do próprio ato de prisão, a leniência do Poder Público resta mitigada e será possível, ao menos, apurar a sua existência. Aliás, como temos insistido, a utilização de aparato de câmeras por parte dos agentes públicos nas suas operações evitaria tanto a alegação de autolesões praticadas pelos conduzidos, bem assim as perpetradas por agentes estatais. E a tecnologia está plenamente disponível. Existem diversos vídeos na internet que demonstram ser a filmagem uma garantia de todos, policiais e conduzidos, mas há gente que não gosta de controle, e se passa. O que se busca é transparência da ação. O futuro da audiência de custódia. A base normativa é aplicável no Brasil e a audiência de custódia já é uma realidade em diversos Tribunais. A resistência de alguns é mais do que esperada. Também precisamos de um tempo para acomodação das condições materiais. Entretanto, a audiência de custódia é um caminho sem volta. Efetiva o contraditório, a transparência e o controle efetivo de todos os atos, garantindo-se todos os envolvidos. Terminamos com a história da Nasrudin que um dia procurou o médico e disse: “— Doutor, todo meu corpo dói. Quando toco a cabeça com o dedo, me dói. Quando me todo aqui, no estômago, o mesmo. Quando me toco o joelho, aparece a dor. Quando toco o pé, me dói. Que devo fazer? Como posso aliviar a dor?” O médico examina e diz: “— Teu corpo está bom. Porém tens o dedo quebrado...” (http://www.conjur.com.br/2015-fev-27/limite-penal-afinal-quem-medo-audiencia-custodia-parte).

E concluem:

"Dê uma chance de pensar a questão da audiência de custódia por outro caminho. Quando você vai a um restaurante chique e pede um prato diferente e caro, mesmo que não goste, come até o final ou pede outro? A maioria das pessoas reclama e continua comendo. O mesmo acontece quando vamos a um cinema e relutamos em nos levantar e ir embora porque o filme é ruim. Caímos na armadilha dos custos afundados (sunk cost). Pessoas que sempre investiram na poupança, mesmo que hoje ela não reponha sequer a inflação, mantém o dinheiro perdendo mensalmente. Sempre fizeram isso e mudar parece algo perigoso. Esta tendência de aversão a mudanças pode nos servir para compreender o motivo de tanta resistência à audiência de custódia. A audiência de custódia é uma etapa do alinhamento do Processo Penal brasileiro com as Declarações de Direitos Humanos. Talvez por isso seja tão complicado falar dela para quem mantém a mentalidade autoritária. A convenção se aplica ao Brasil e era ignorada, como, aliás, boa parte da normativa de Direitos Humanos. Nenhuma novidade, dirão. E a posição que defendemos em artigos anteriores e agora aprofundada no livro Processo Penal no Limite, publicado esta semana, é mantida, com um toque a mais. Participamos, paralelamente, de diversos encontros discutindo o tema com magistrados, membros do Ministério Público, defensores, advogados, Delegados de Polícia, Policiais Militares, estudantes, enfim, com vários intervenientes, sendo que a maioria era contra sem ao menos se informar. Não sabiam do que era, nem de como funcionava, mas estufavam o peito e diziam: sou contra. É uma infantil resistência ao novo, ao diferente, do estilo “não sei, não conheço, mas não gosto’. A desinformação sobre o conteúdo, o lugar e a função da audiência de custódia, beira à birra adolescente. Praticada em diversos países, tanto da Europa como da América Latina, parece, para alguns ter sido inventada pelo Conselho Nacional de Justiça. A história do CNJ não ajuda, pois elaborou diversas Resoluções de duvidosa constitucionalidade, propagou o medo na magistratura e com suas metas gerou o pânico por qualquer iniciativa. Falar de CNJ passou a ser proibido e colhe os efeitos de atuações recentes desastrosas.Com a atual conformação, especialmente presidência e corregedoria, em vez de perseguições às bruxas, buscou-se implementar a normativa internacional, algumas políticas anteriores foram modificadas e, acima de tudo, há uma mudança qualitativa. Preocupa-se, agora, também, com as grandes diretrizes do Poder Judiciário, ouve a base, sem que necessariamente fale o que desejam. Dentre as iniciativas corajosas está a de enfrentar o encarceramento verificado nos últimos anos e os custos do sistema penal. A questão é que estamos prendendo mal. Faltam recursos para implementação de meios abertos, monitoramento eletrônico, programas de egressos, etc. E aí reside o equívoco. Para que tenhamos uma ideia aproximada, em Santa Catarina, cada condenação por cinco anos de prisão significa um custo anual de R$ 48 mil, que, multiplicado pelo total, significaria R$ 240 mil. Basta multiplicarmos para ficarmos assustados. A previsão é que se gaste, em 2015, cerca de R$ 800 milhões. E o custo de um preso mensal, inclusive cautelar, implica em R$ 4 mil. A conta de cada prisão cautelar é arcada por toda a sociedade. Por isso não levar em conta isso no encarceramento em massa ou é ingenuidade ou má-fé, muitas vezes financiada pelas empresas de presídio privados nunca lucraram tanto. Já pensou que maravilha ter um hotel lotado e com mais demanda? Mark Twain escreveu que “Se a única ferramenta é o martelo, todos os seus problemas serão pregos.” Se a única ferramenta é a prisão (cautelar), não restaria outra opção. Daí que houve a reforma de 2012, inserindo-se cautelares diversas da prisão (CPP, artigo 319), os quais apresentam indicam modelos múltiplos de garantia do processo e não de antecipação de pena. Mas a mentalidade que somente procura pregos, não consegue compreender que está nos levando à falência com os custos do sistema que abastece. Quem prende cada vez mais, por qualquer motivo, mesmo cabendo medidas cautelares, no fundo, por não sentir o dinheiro de seu bolso, cai na armadilha da Tragédia dos Comuns, já que nos obriga, como Estado, a arcar com mais recursos para prender gente. Pode-se dizer que sofrem da deformação do especialista, pois como são agentes vinculados ao sistema penal, respondem, quase sempre, com pena. E nos levam à falência. A audiência de custódia acaba com o conforto da decisão imaginada pelo flagrante, exige contato humano, com o impacto que proporciona, fazendo com que se possa prender melhor, a partir das razões que forem apresentadas. Nos estados em que já está sendo implementada, muitos opositores se renderam à qualidade do ato, até porque sustenta o lugar de garante do Juiz, tanto pelos flagrantes, prendendo quando for o caso, bem assim evitando que pessoas fiquem presas para além do necessário. Controla-se, por fim, os casos de tortura reais ou inventadas. A potencialização do caráter antropológico do ritual judiciário é um valor inestimável da audiência de custódia, pois fortalece o contato pessoal, o olho no olho, a responsabilidade pela palavra dada, seja por parte do imputado (que ali assume um compromisso com o juiz pela liberdade concedida), seja por parte do juiz. É ainda um ato ético, alinhado com a ética da alteridade. Na dimensão processual, fortalecemos a estrutura dialética, pela presença do Ministério Público (que pedirá ou não a prisão preventiva, acabando com a absurda ‘conversão do flagrante em preventiva sem pedido’), e também da defesa (permitindo o real contraditório neste ato tão importante). Tudo em contraditório (e salve Fazzalari), com oralidade e contato direto e pessoal com o juiz. Isso é democracia processual diria Bettiol. Sempre fizemos do mesmo jeito, mas talvez possamos olhar para o futuro e ver o que há de bom na legislação em vigor no Brasil e procurarmos aplicar. Não podemos ser como o sujeito que está numa relação (amorosa, de emprego etc.) ruim e simplesmente não possui coragem de mudar porque já investiu muito tempo e dinheiro nela. Talvez sejamos românticos demais, até porque muitos preferem uma vida tacanha com medo do futuro e do desconhecido. A implementação da audiência de custódia, que não salvará o mundo, mas poderá alinhar o regime de cautelar brasileiro ao modelo internacional é para quem tem coragem, não para quem tem medo do desconhecido." (http://www.conjur.com.br/2015-jul-10/limite-penal-nao-sei-nao-conheco-nao-gosto-audiencia-custodia).


Notas e Referências:

[1] http://genjuridico.com.br/2015/07/17/os-mitos-da-audiencia-de-custodia/

[2] https://www.academia.edu/11691877/MAZZUOLI_Valerio_de_Oliveira._O_controle_jurisdicional_da_convencionalidade_das_leis._2._ed._rev._atual._e_ampl._S%C3%A3o_Paulo_Ed._RT_2011_%C3%8Dntegra_

[3] http://emporiododireito.com.br/desacato-nao-e-crime-diz-juiz-em-controle-de-convencionalidade/


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Rômulo Moreira

Rômulo de Andrade Moreira é Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor de Direito Processual Penal da UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela UNIFACS.                                                                                   


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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