Tribunal Supremo da Espanha - Interceptação Telefônica e investigação policial: requisitos

25/03/2015

Por redação - 25/03/2015

Na Espanha, para que o produto da interceptação telefônica obtenha eficácia probatória e, via de consequência, possa funcionar como elemento apto a vulnerar o princípio da presunção da inocência, rígido protocolo deve ser seguido de forma a afastar o possível reconhecimento pelo órgão julgador da imprestabilidade de todo o conteúdo do material colhido.

Em decisão proferida pelo Tribunal Supremo da Espanha[1], firmou-se o entendimento de que a intercepção telefônica é meio excepcional de investigação, insculpido e regulamentado pelo artigo 579 da Lei Processual espanhola[2], o qual, inclusive, já foi alvo de severas críticas tecidas pela Corte Europeia de Direitos Humanos, em especial, nos casos Prado Bugallo vs. Espanha e Abdulkader vs. Espanha.

Nesse passo, sempre que o Tribunal Supremo se depara com a alegação de que a interceptação telefônica violou o artigo 18.3 da Constituição espanhola[3], o tema é enfrentado com o intuito de que possa ser claramente delineado o nível de controle jurisdicional exercido sobre a medida restritiva de direito fundamental. Com isso, o Tribunal visa a esclarecer se a interceptação pode funcionar no caso concreto como fonte de prova, ou seja, como meio de investigação, ou funcionar como prova direta.

Assim, para que a interceptação telefônica possa funcionar como fonte de prova ou meio de investigação policial, claras exigências quanto à legalidade constitucional da medida devem ser respeitadas, mormente a exigência de que a interceptação seja sempre judicializada.

Com efeito, decorrência direta da necessidade de judicialização, o Tribunal Supremo fixou alguns requisitos[4] para que a interceptação telefônica, quando utilizada como meio de investigação policial, validamente possa produzir efeitos:

a) apenas a autoridade judicial competente pode vulnerar o direito fundamental à intimidade e decretar a interceptação telefônica.

b) que a vulneração da intimidade tenha como finalidade exclusiva a investigação de um delito concreto, exigência que rechaça investigações pre-delitivas ou de prospecção. O princípio da especialidade da investigação deve reger o tema.

c) a interceptação telefônica apenas poderá ocorrer junto a autos em andamento. Rechaça-se e afasta-se, portanto, a técnica de diligências indeterminadas.

d) por se tratar de medida judicial, o pedido de interceptação deve, formalmente, constituir um auto de interceptação e, materialmente, possuir motivação suficiente para a sua adoção. O conteúdo da solicitação policial deve ser revestido de racionalidade quanto ao fato delitivo a ponto de comprovar a possibilidade de sua existência, assim como indicar a pessoa alvo da medida e o seu telefone. De acordo com a terminologia empregada pela Corte Europeia de Direitos do Homem nos casos Lüdi - 5 de junho de 1997 - e Klass - 6 de setembro de 1998, os dados policiais devem possuir "boas razões" ou "fortes presunções". Os dados apresentados pela polícia devem, consequentemente, possuir objetividade suficiente para diferenciá-los da mera intuição, da conjectura, bem como possuir objetividade no sentido de viabilizar o amplo e irrestrito acesso do magistrado aos dados apresentados para que, só assim, ele possa decretar, ou não, a interceptação. A objetividade, linhas gerais, visa a permitir o total controle do magistrado em relação às medidas já adotadas ou àquelas que ainda serão adotadas pela polícia.

e) a interceptação telefônica obrigatoriamente se trata de uma medida temporal, conforme estabelecido no artigo 579.3 da lei processual espanhola[5].

f) a fundamentação da medida não deve ocorrer apenas no momento da primeira decretação. Possíveis prorrogações também devem ser fundamentadas. A fundamentação da prorrogação pode ocorrer por meio da reiteração, todavia, nunca pela simples juntada do requerimento policial aos autos, sob pena de violação do artigo 18.2 da Constituição espanhola[6], afinal, cabe ao órgão judicial devidamente motivar decisão acerca da decretação, ou não, da interceptação telefônica.[7]


 Notas e Referências

[1] STS 155/2007

[2] Artículo 579

1- Podrá el Juez acordar la detención de la correspondencia privada, postal y telegráfica que el procesado remitiere o recibiere y su apertura y examen, si hubiere indicios de obtener por estos medios el descubrimiento o la comprobación de algún hecho o circunstancia importante de la causa.

2- Asimismo, el Juez podrá acordar, en resolución motivada, la intervención de las comunicaciones telefónicas del procesado, si hubiere indicios de obtener por estos medios el descubrimiento o la comprobación de algún hecho o circunstancia importante de la causa.

3 - De igual forma, el Juez podrá acordar, en resolución motivada, por un plazo de hasta tres meses, prorrogable por iguales períodos, la observación de las comunicaciones postales, telegráficas o telefónicas de las personas sobre las que existan indicios de responsabilidad criminal, así como de las comunicaciones de las que se sirvan para la realización de sus fines delictivos.

4 -En caso de urgencia, cuando las investigaciones se realicen para la averiguación de delitos relacionados con la actuación de bandas armadas o elementos terroristas o rebeldes, la medida prevista en el número 3 de este artículo podrá ordenarla el Ministro del Interior o, en su defecto, el Director de la Seguridad del Estado, comunicándolo inmediatamente por escrito motivado al Juez competente, quien, también de forma motivada, revocará o confirmará tal resolución en un plazo máximo de setenta y dos horas desde que fue ordenada la observación.

[3] Artículo 18

[...]

Se garantiza el secreto de las comunicaciones y, en especial, de las postales, telegráficas y telefónicas, salvo resolución judicial.

[4] STS 5200/2014

[5] Artículo 579

3 - De igual forma, el Juez podrá acordar, en resolución motivada, por un plazo de hasta tres meses, prorrogable por iguales períodos, la observación de las comunicaciones postales, telegráficas o telefónicas de las personas sobre las que existan indicios de responsabilidad criminal, así como de las comunicaciones de las que se sirvan para la realización de sus fines delictivos.

[6] Artículo 18

[...]

3 - Se garantiza el secreto de las comunicaciones y, en especial, de las postales, telegráficas y telefónicas, salvo resolución judicial.

[7] Tribunal Constitucional Espanhol: STC 239/99; SSTS 5-7-93 , 11-10-94 , 31-10-94 , 11-12-95 , 26-10-96 , 27-2-97 , 20-2-98 , 31-10-98 , 20-2-99 , y 5-12-2006, nº 1258/2006


Imagem Ilustrativa do Post: Ionic capital, (...)  // Foto de: Orangeaurochs // Sem alterações Disponível em: https://www.flickr.com/photos/orangeaurochs/5794532176 Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura