Tribunal de Justiça de São Paulo mantém condenação por danos morais em razão de assédio sexual ocorrido dentro de vagão de metrô

16/09/2016

Por Redação- 16/09/2016

Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos da Apelação n° 1012929-20.2015.8.26.0100, manteve sentença que condenou o Metrô de SP em virtude de assédio sofrido por uma passageira dentro de um dos vagões da companhia.

De acordo com o processo a mulher viajava em um dos vagões da empresa quando foi assediada por um homem. Na análise do recurso de apelação pela 14.ª Camara de Direito Civil, o desembargador Carlos Abrão afirmou que ficou configurada a falha na prestação do serviço e, portanto, cabível a indenização.

Confira a decisão

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Registro: 2016.0000634880

ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1012929-20.2015.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes D.G..A.M.(JUSTIÇA GRATUITA) e COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SÃO PAULO METRÔ.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Por maioria de votos negaram provimento aos recursos. Declara voto vencido o 2º juiz., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores MAURÍCIO PESSOA (Presidente), THIAGO DE SIQUEIRA, LÍGIA ARAÚJO BISOGNI E MELO COLOMBI.

São Paulo, 1º de setembro de 2016.

Carlos Abrão Relator Assinatura Eletrônica

VOTO Nº 22757

Apelação nº 1012929-20.2015.8.26.0100

Comarca: São Paulo (30ª Vara Cível do Foro Central Cível) Apelantes e Apelados: D.G.A.M (JUSTIÇA GRATUITA), e COMPANHIA DO METROPOLITANO DE SÃO PAULO METRÔ

Juiz sentenciante: Daniela Dejuste de Paula

1 - APELAÇÃO (METRÔ) - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - IMPORTUNAÇÃO OFENSIVA AO PUDOR EM VAGÃO DO METROPOLITANO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECURSO - NEGATIVA DE OCORRENCIA DO FATOS - ONUS DA PROVA - ARTIGO 373 INCISO II DO CPC - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - FATO DE TERCEIRO QUE NÃO ILIDE A RESPONSABILIDADE - DANO MORAL CARACTERIZADO - VALOR QUE RESPEITA AOS PRINCIPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDE - MINORAÇÃO DO VALOR CONDENATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO

2- APELAÇÃO (AUTORA) - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - IMPORTUNAÇÃO OFENSIVA AO PUDOR EM VAGÃO DO METROPOLITANO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA - RECURSO - MAJORAÇÃO DA SOMA CONDENATÓRIA A TITULO DE DANOS MORAIS - IMPOSSIBILIDADE - VALOR QUE ATENTA AOS PRINCIPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE BEM COMO AO CADERNO PROCESSUAL DESENHADO - INDENIZAÇÃO DE 300 VEZES O VALOR DA PASSAGEM - DESCABIMENTO - VERBA HONORÁRIA - DECAIMENTO RECIPROCO - SENTENÇA MANTIDA

3 - RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS

Cuidam-se de apelos tirados contra a r. sentença de fls. 169/172, “... Diante do exposto, na forma do art. 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial para condenar a ré na indenização por dano moral no valor de R$15.000,00 (quinze mil reais), acrescida de juros e correção monetária a partir do arbitramento. Reciprocamente sucumbentes, custas e despesas processuais igualmente repartidas entre os litigantes que suportarão os honorários advocatícios de seus respectivos advogados. Ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com efeitos infringentes lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil. P.R.I.”, de relatório adotado.

Apela a autora, requerendo a majoração do montante fixado a titulo de danos morais, cita jurisprudência favorável a sua tese, pede condenação do requerido em verba honorária que deve ser fixada em 20% do valor condenatório, debate-se com a indenização de 300 vezes do valor da passagem paga, pede total procedência, aguarda provimento (fls. 180/190).

Apela à empresa de transporte, alega não comprovação dos fatos, culpa de terceiro, atuação do corpo de segurança no caso, e que tomou todas as adequadas e cabíveis medidas para o tratamento do caso, uma vez ocorrido, ausência de nexo causal, uma vez que há culpa exclusiva de terceiro e verdadeiro fortuito externo, não há como se prever o imprevisível, nem impedir o inevitável, diante do transporte diário de 5 milhões de passageiros, ainda que tivesse um segurança para cada usuário, alternativamente requer a redução do montante fixado a titulo de danos morais, pede total reforma com consequente improcedência, aguarda provimento (fls. 191/201).

Recursos tempestivos e preparado o do Metropolitano (fls. 202).

Recebido no duplo efeito (fls. 203).

Contrarrazões da autora às fls. 206/217 e do réu às fls. 218/225.

Apelação distribuída a 7º Câmara de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça, que pelo venerando acordão de fls. 231/233, não conheceram do recurso determinando a sua redistribuição a Segunda Seção do Direito Privado. Houve Remessa.

É O RELATÓRIO.

Os recursos não prosperam. Analiso o recurso da ré. Com efeito, busca a autora indenização por danos materiais e morais diante do não cumprimento do contrato de transporte, uma vez que fora assediada sexualmente dentro da composição que a transportava. fls. 5

A autora compareceu a Delegacia do Metropolitano onde fora lavrado o Boletim de ocorrência nº 900229/2014, acostado às fls. 26/27. Conforme se extrai dos autos, patente a configuração dos danos morais experimentados pela Autora, em virtude dos transtornos emocionais ocasionados por terceiro ao efetuar a importunação ofensiva ao seu pudor.

Restou presente à falha na prestação do serviço, decorrente da ausência de segurança, fato de terceiro que não exclui a sua responsabilidade, uma vez que não cumprido o dever de incolumidade dos passageiros.

No caso, embora o dano decorra inegavelmente de ato de terceiro, não é menos certo que apenas a ré era capaz de impedi-lo, na medida em que somente ela controla o fluxo de passageiros e exerce a vigilância em suas estações e composições. fls. 6.

É por demais consabido que a Companhia Metropolitana de São Paulo não proporciona transporte à altura da tarifa cobrada, além das plataformas repletas, muitas vezes, nos horários de pico, os embarques são conturbados. Existissem mais composições ou o contingenciamento do público e aumento da supervisão e fiscalização, por certo o infortúnio não teria acontecido.

A teoria da incolumidade obriga o transportador a levar o passageiro da origem até o destino, sem quaisquer sobressaltos. Não se pode descortinar fato de terceiro, fortuito ou força maior, quando a responsabilidade tem natureza objetiva e a empresa transportadora não oferece meios para minimizar a massa de passageiros, sem correlação entre os trens e o número transportado.

Assim, é inegável que tais assédios constituem risco criado pela própria atividade e, como tal, sua prática representa evidente violação daqueles deveres decorrentes da cláusula de incolumidade ínsita ao contrato de transporte. O retrato que se tem, de conotação estatística, diz respeito a uma população transportada de quase 5.000.000 de passageiros por dia, o que por si só evidencia a sua superlotação e impossibilidade de atender à demanda com a oferta inerente à relação de consumo.

Neste Sentido:

RESPONSABILIDADE CIVIL. Ataque sexual em vagão do Metrô. Dano moral. CONFIGURAÇÃO: Falha na prestação do serviço de transporte, que deve ser seguro e de qualidade. Responsabilidade objetiva do fornecedor, que não é elidida por culpa de terceiro, cabendo ação regressiva. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. (Apelação 1061231-17.2014, Rel. Israel Góes dos Anjos, j. 10/02/2015)

“Dano moral - Transporte coletivo - Assédio sexual - Prova convincente - Culpa e responsabilidade objetiva do transportador - Inteligência do art. 734 do CC - Indenização - Valor bem equacionado - Ratificação dos fundamentos da sentença, a qual se encontra bem fundamentada - Aplicação do disposto no artigo 252, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Ação parcialmente procedente - Decisão mantida.” (Apelação 109059886201 - Relator Des. Sebastião Junqueira - julgado em 14/12/2015)

“DANO MORAL Ocorrência Prática de “ato obsceno” por passageiro em vagão de transporte ferroviário Indenização arbitrada em R$-20.000,00 Adequação, tendo em vista as particularidades do caso concreto Decisão que deu parcial provimento às apelações mantida Agravos regimentais improvidos.” (Agravo regimental nº 1061205-19.2014.8.26.0100, Des. Relator José Tarcisio Beraldo, julgado em 05/07/2016)

Dessa forma, estando configurado o nexo causal, o dano moral ocorrido restou demonstrando, uma vez que os fatos acometidos a autora não pode traduzir mero dissabor ou coisa rotineira, mas sim culpa exclusiva da empresa ré. O valor fixado a titulo de danos morais em R$ 15.000,00 se mostra equilibrado e respeita aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como ao caderno processual desenhado, não cabendo redução.

Desenhada assim a questão, o dano moral não pode representar enriquecimento, mas também deve incutir o sentimento de melhoria do serviço e aglutinar resultado pragmático ao comportamento da empresa de transporte, deixando claro que mais vale a pena investir no transporte de qualidade, do que efetuar pagamento de indenizações pela má-prestação do serviço como no caso presente.

Não se observa qualquer elemento a título de prequestionamento, reconhecendo-se, sem sombra de dúvida, pelo nexo causal, o dano extrapatrimonial.

Analiso o recurso da autora, não merece prosperar.

No tocante ao dano material, 300 vezes o valor do bilhete na época, não há qualquer parâmetro para a sua fixação ou circunstância capaz de permitir o liame, a representar significado inócuo.

Nesse sentido, decisões deste E. Tribunal:

“É de se afastar o pedido de condenação da ré ao pagamento do equivalente a 300 vezes o valor da passagem, tendo em vista que a previsão legal do artigo 733 do Código Civil, refere-se ao transporte cumulativo, hipótese diversa a dos autos, em que se trata de transporte de pessoas, hipótese que se aplica o artigo 734 do mesmo Diploma legal.” (Apelação nº 0006201-22.2011.8.26.0002, 13ª Câmara de Direito Privado, Rel. Heraldo de Oliveira, j. 5 de dezembro de 2012).

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO Acidente com passageirade ônibus Pretensão de indenização pelo descumprimento do contrato de transporte Inadmissibilidade, já que inaplicável, in casu, o disposto no artigo 733, § 1º, do Código Civil (Apelação nº PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação nº 1031306-76.2014.8.26.0002 - Voto nº 26560 - 0062695-38.2010.8.26.0002, 14ª Câmara de Direito Privado, Rel. Pedro Ablas, j. 31/10/2012).”

O valor fixado a titulo de danos morais em R$ 15.000,00 se mostra equilibrado e respeita aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como ao caderno processual desenhado, não cabendo sua majoração como quer a apelante. Quanto à sucumbência experimentada não há como carrear a verba honorária a ré, diante do decaimento reciproco das partes, motivo pelo qual os ônus sucumbenciais fica mantido. Ausente qualquer elemento a abalar a r.sentença guerreada, de rigor a sua manutenção, uma vez que se mostrou incensurável. fls. 12.

Isto posto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO aos recursos.

CARLOS HENRIQUE ABRÃO

Relator

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Confira o voto completo e o voto vencido aqui  (1012929-20-2015-8-26-0100)

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Imagem Ilustrativa do Post: CAF "H Series" Subway Train// Foto de: Diego Torres Silvestre // Sem alterações Disponível em: https://www.flickr.com/photos/3336/5397931086/ Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/2.0/legalcode

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