Os/as Promotores de Justiça, Procuradores/as da República e Procuradores/as do Trabalho abaixo nominados/as, integrantes do Ministério Público brasileiro, imbuídos da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos fundamentais, individuais e coletivos, previstos na Constituição Federal de 1988, vêm a público externar sua profunda preocupação com a dimensão de acontecimentos recentes na quadra política brasileira, e que, na impressão dos/as subscritores/as, merecem uma reflexão crítica, para que não retrocedamos em conquistas obtidas após anos de ditadura, com perseguições políticas, sequestros, desaparecimentos, torturas e mortes.
- É ponto incontroverso que a corrupção é deletéria para o processo de desenvolvimento político, social, econômico e jurídico de nosso país, e todos os participantes de cadeias criminosas engendradas para a apropriação e dilapidação do patrimônio público, aí incluídos agentes públicos e privados, devem ser criteriosamente investigados, legalmente processados e, comprovada sua culpa, responsabilizados.
- Mostra-se fundamental que as instituições que compõem o sistema de justiça não compactuem com práticas abusivas travestidas de legalidade, próprias de regimes autoritários, especialmente em um momento em que a institucionalidade democrática parece ter suas bases abaladas por uma polarização política agressiva, alimentada por parte das forças insatisfeitas com a condução do país nos últimos tempos, as quais, presentes tanto no âmbito político quanto em órgãos estatais e na mídia, optam por posturas sem legitimidade na soberania popular para fazer prevalecer sua vontade.
- A banalização da prisão preventiva - aplicada, no mais das vezes, sem qualquer natureza cautelar - e de outras medidas de restrição da liberdade vai de encontro a princípios caros ao Estado Democrático de Direito. Em primeiro lugar, porque o indivíduo a quem se imputa crime somente pode ser preso para cumprir pena após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (CF, art. 5º, LVII). Em segundo, porque a prisão preventiva somente pode ser decretada nas hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal, sob pena de violação ao devido processo legal (CF, art. 5º, LIV).
- Operações midiáticas e espetaculares, muitas vezes baseadas no vazamento seletivo de dados sigilosos de investigações em andamento, podem revelar a relação obscura entre autoridades estatais e imprensa. Afora isso, a cobertura televisiva do cumprimento de mandados de prisão, de busca e apreensão e de condução coercitiva – também utilizada indiscriminada e abusivamente, ao arrepio do art. 260 do Código de Processo Penal – redunda em pré-julgamento de investigados, além de violar seus direitos à intimidade, à privacidade e à imagem, também de matriz constitucional (CF, art. 5º, X). Não se trata de proteger possíveis criminosos da ação estatal, mas de respeitar as liberdades que foram duramente conquistadas para a consolidação de um Estado Democrático de Direito.
- A história já demonstrou que o recrudescimento do direito penal e a relativização de garantias não previnem o cometimento de crimes. Basta notar que já somos o quarto país que mais encarcera no mundo, com mais de 600 mil presos, com índices de criminalidade que teimam em subir, ano após ano. É certo também que a esmagadora maioria dos atingidos pelo sistema penal ainda é proveniente das classes mais desfavorecidas da sociedade, as quais sofrerão, ainda mais, os efeitos perversos do desrespeito ao sistema de garantias fundamentais.
- Neste contexto de risco à democracia, deve-se ser intransigente com a preservação das conquistas alcançadas, a fim de buscarmos a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Em suma, como instituição incumbida da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, o Ministério Público brasileiro não há de compactuar com medidas contrárias a esses valores, independentemente de quem sejam seus destinatários, públicos ou anônimos, integrantes de quaisquer organizações, segmentos econômicos e partidos políticos.
Adriane Reis de Araújo – MPT
Afonso Henrique de Miranda Teixeira - MPMG
Afrânio Silva Jardim – MPRJ (Procurador de Justiça aposentado)
Alexander Martins Matias - MPSP
Antonio Alberto Machado – MPSP
Antonio Visconti – MPSP (Procurador de Justiça aposentado)
Arthur Pinto Filho - MPSP
Bettina Estanislau Guedes – MPPE
Cristiane de Gusmão Medeiros - MPPE
Daniela Maria Ferreira Brasileiro - MPPE
Daniel Serra Azul Guimarães – MPSP
Domingos Sávio Dresh da Silveira - MPF
Eduardo Dias de Souza Ferreira - MPSP
Eduardo Maciel Crespilho – MPSP
Eugênia Augusta Gonzaga – MPF
Elmir Ducler Ramalho - MPBA
Fabiano Holz Beserra - MPT
Fernanda Peixoto Cassiano – MPSP
Francisco Sales de Albuquerque – MPPE
Gilson Roberto Barbosa - MPPE
Gustavo Roberto Costa – MPSP
Helio José de Carvalho Xavier – MPPE
Inês do Amaral Buschel – MPSP
Jackson Zilio - MPPR
Janaína Pagan - MPRJ
João Porto Silvério Júnior – MPGO
José Roberto Antonini – MPSP (Procurador de Justiça aposentado)
Júlia Silva Jardim - MPRJ
Júlio José Araújo Junior – MPF
Jecqueline Guilherme Aymar – MPPE
João Bosco Araújo Junior - MPF
José Godoy Bezerra de Souza – MPF
Laís Coelho Teixeira Cavalcanti - MPPE
Maísa Melo – MPPE
Marcelo Pedroso Goulart – MPSP
Márcio Soares Berclaz - MPPR
Margaret Matos de Carvalho - MPT
Maria Ivana Botelho Vieira da Silva – MPPE
Maria Izabel do Amaral Sampaio Castro – MPSP
Nívia Mônica Silva - MPMG
Osório Silva Barbosa Sobrinho – MPF
Paulo Busato - MPPR
Plínio Antonio Britto Gentil - MPSP
Raphael Luis Pereira Bevilaqua – MPF
Renan Bernardi Kalil – MPT
Renan Severo Teixeira da Cunha – MPSP
Roberto Brayner Sampaio - MPPE
Rômulo de Andrade Moreira – MPBA
Sérgio de Abritta - MPMG
Silvia Amélia de Oliveira - MPPE
Sueli Riviera – MPSP
Thiago Alves de Oliveira - MPSP
Thiago Rodrigues Cardin - MPSP
Tiago Joffily – MPRJ
Tadeu Salgado Ivahy Badaró – MPSP
Taís Vasconcelos Sepulveda - MPSP
Westei Conde Y Martin Junior - MPPE
Imagem Ilustrativa do Post: Estátua da Justiça // Foto de: Thiago Melo // Sem alterações
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