Por redação - 20/08/2015
A Terceira Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos autos da Apelação Criminal n . 70060878055, da Comarca de Passo Fundo, relator o Des. Nereu Giacomolli, manteve a condenação do acusado I. M. de S. O marido, não mais convivendo com a mulher, coloca soda cáustica em sua calcinha. A mulher, após tomar banho, veste-a e sai para trabalhar. O que se iniciou como uma ardência torna-se queimadura. Hospitalizada verificam-se lesões corporais. O acusado é condenado por lesão corporal no ambiente familiar. A violência do ex-cônjuge assusta e é objeto de reprovação penal.
Confira a decisão na íntegra, conforme dados do site do TJRS (www.tjrs.jus.br).
APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. lesão corporal grave. PENA MANTIDA. IMPUTADO QUE COLOCA SODA CÁUSTICA NA CALCINHA DA VÍTIMA, LESIONANDO-A NAS PARTES ÍNTIMAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. REGIME INICIAL PARA CUMPRIMENTO DA PENA ALTERADO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade deram parcial provimento ao recurso defensivo fixando o regime inicial para cumprimento da pena o aberto. Retifique-se o PEC.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. João Batista Marques Tovo e Des. Diógenes Vicente Hassan Ribeiro.
Porto Alegre, 02 de outubro de 2014.
DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)
O Ministério Público ofereceu denúncia contra I. M. S. como incurso nas sanções do art. 129, parágrafo 1º, inciso I c/c art. 61, inciso II, alínea d, ambos do CP, na forma do art. 5º, inciso III e do art. 7º, inciso I e II ambos da lei 11.340/06, pelo seguinte fato delituoso:
No dia 08 de janeiro de 2014, por volta das 18h, na Rua xxxxxs, nº xxx, bairro XXX XXX, na cidade de Passo Fundo, RS, o denunciado I. M. de S. ofendeu a integridade corporal e a saúde da vítima S. xxxx, sua ex-companheira, causando-lhe lesão corporal de natureza grave, a citar “lesões e cicatrizes em períneo e faces internas das coxas”, conforme auto de exame de corpo de delito de fl. Do inquérito, que resultou em incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias, consoante exame complementar, fl do inquérito.
Por ocasião dos fatos, o denunciado, aproveitando-se do fato de S. não estar em casa, ingressou na residência da ofendida, localizada no endereço acima mencionado, e colocou soda cáustica nas calcinhas da vítima. Por volta das 18h, S. regressou para casa, tomou banho e colocou uma das calcinhas que continha a soda cáustica (arrecadada, fl. do inquérito). Em seguida, saiu para trabalhar ocasião em que passou a sentir uma ardência na região genital, tendo procurado socorro médico, sendo contatado que a vítima apresentava queimaduras por soda cáustica em região vaginal, faces internas de ambas as coxas e região perineal, conforme atestado médico e auto de exame de corpo de delito de fls. Do inquérito.
As lesões foram produzidas por meio insidioso e cruel, conforme auto de exame de corpo e delito (fl. do inquérito).
As agressões ocorreram no âmbito das relações domésticas de convivência, tendo causado sofrimento físico e psicológico em face da violência empreendida, prevalecendo-se, o denunciado, das relações íntimas de afeto que mantinha com a vítima, sua ex-companheira.
A denúncia foi recebida em 06.05.2014.
Encerrada a instrução processual, sobreveio sentença que condenou o réu à pena de 03 anos e 04 meses de reclusão em regime inicial semiaberto.
A defesa apresentou, tempestivamente, recurso de apelação pedindo a reforma da sentença.
É o relatório.
VOTOS
Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)
Eminentes colegas:
Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa, pois inconformada com a decisão de primeira instância, que condenou o réu a pena de 03 anos e 04 meses de reclusão. Pede em suas razões, preliminarmente o direito de recorrer em liberdade, a absolvição com fundamento no art. 386, IV, V e VII do CPP e subsidiariamente, o afastamento da agravante com a fixação da pena no mínimo legal, o afastamento da majorante e a substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos.
A materialidade do delito consta substanciado no boletim de ocorrência (fls. 09/10), no auto de arrecadação (fl. 12), pelos atestados médicos (fls. 13/15), pelos termos de declarações (fls. 17/18 e 15), pela cópia do prontuário médico (fls. 43/45), pelos autos de exame de corpo de delito (fls. 48/49) e pelo laudo pericial (fl. 59).
Quanto à autoria, analisando os depoimentos colhidos, não resta dúvidas de que o réu concorreu para a infração penal.
Ao ser interrogado, o réu alegou que não agiu de forma intencional, que comprou um quilo de soda para fazer a limpeza dos canos da residência e acabou encostando às calcinhas da vítima o produto químico. Ao ser perguntado o motivo pelo qual não informou a vítima do acidente, ele simplesmente alegou que sua ex-companheira havia chegado tarde e que já estava aos fundos da casa onde dormia.
A vítima relatou que chegou em casa após o trabalho, e com pressa tomou banho para dirigir-se ao seu emprego noturno. No caminho para o trabalho, no ônibus, sentiu muita ardência, levando em torno de 15 minutos para chegar ao seu destino, quando chegou, arrancou a roupa na frente de suas colegas. Descreveu que ao arrancar a roupa sua pele saiu junto, então, dirigiu-se até o hospital, onde o médico constatou tratar-se de soda cáustica na sua roupa.
C. xxxxxx, irmã do acusado disse estar afastada da convivência do casal há muito tempo, e ficou sabendo do fato através da mídia, mas não acredita que seu irmão tenha praticado o crime, mas também não acredita que a vítima tenha colocado soda cáustica em sua própria vagina.
E. xxxxx, vizinha do casal, mencionou que o réu sempre foi um senhor reservado, não costumava sair muito de casa, ainda, destacou que sempre houve brigas entre o casal.
Portanto, diante do depoimento do réu, que admitiu ter manuseado soda cáustica no dia do fato, resta estranho o fato deste não ter avisado a vítima sobre o incidente, ou separado as roupas contaminadas, deixando-as ao livre uso da vítima, o que leva a crer ter sido premeditado o crime.
O juiz a quo assim dosou a pena:
O réu atuou com culpabilidade, visto que mesmo tendo consciência da ilicitude do fato, agiu de forma contrária ao direito, sendo lhe exigível que tivesse conduta diversa. O réu não possui antecedentes criminais (fls. 124/124v). Conduta social e personalidade sem elementos para apreciação. As conseqüências são graves. A circunstância é desfavorável, pois a lesão, nos moldes em que realizada, não esconde o escopo de opressão, e opressão, na espécie, pautada na questão sexual; além disso, o acusado tinha em mente que a ofendida acabara de sofrer a retirada do útero e dos ovários, circunstância que certamente colaborou para o agravamento do quadro de saúde dela. As conseqüências, embora algumas ainda imensuráveis, como, por exemplo, os reflexos que as lesões terão na vida sexual, são graves, pois a vítima enfrenta problemas fisiológicos e digestivos, a citar, dificuldades em urinar e impossibilidade de ingestão regular de líquidos, uma vez que sua bexiga foi queimada pelo produto químico utilizado. Os motivos são desconhecidos. A vítima não contribuiu para a prática do crime.
Diante da análise das circunstâncias do artigo 59, do Código Penal, fixo a pena-base em 02 (dois) anos de reclusão.
Aponto a presença da agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea d, do Código penal, qual seja, o réu ter valido de meio insidioso e cruel para praticar o delito (soda cáustica em contato com roupa íntima da ofendida). Em razão disso, aumento a pena em 06 (seis) meses, tornando-a provisória em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão.
Incide, na espécie, a majorante do parágrafo dez do artigo 129 do Código Penal, visto que as lesões foram praticadas contra companheira do réu na época do fato, fazendo com que a pena seja aumentada em um terço. Portanto, fixo a pena, definitivamente em 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.
O regime inicial de cumprimento da pena é o semiaberto, em razão da quantidade de pena imposta e da apreciação das circunstâncias judiciais elencadas no artigo 59 do Código Penal, no caso, desfavoráveis.
Ao verificar a pena imposta pelo magistrado de primeira instância, entendo acertada, tendo em vista que a pena-base ficou no mínimo legal, sendo aumentada pela agravante do art. 61, II, alínea d, do código penal, e na terceira fase, aumentada pela majorante do art. 129, parágrafo 10 do Código Penal.
Postula a defesa o afastamento da agravante e da majorante, restando à pena em seu mínimo – legal. Como já exposto anteriormente, compreendo adequadas as aplicações da agravante e majorante.
Quanto à agravante, no contexto probatório dos autos, foi possível chegar à conclusão de que o réu utilizou-se de meio insidioso e cruel, pois injetou na roupa íntima da acusada soda cáustica, conforme demonstrados no exame de corpo de delito e na perícia realizada.
Ainda, no que tange a majorante do art. 129, parágrafo 10, do Código penal, deve ser mantida, pois o crime ocorreu no âmbito familiar, entre ex-companheiros.
Diante do exposto, voto por manter a condenação do réu em 03 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, mas em regime aberto, em face de a pena não ser superior a quatro anos, não justificando as circunstâncias do art. 59 um regime mais gravoso da limitação legal.
Des. João Batista Marques Tovo (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Diógenes Vicente Hassan Ribeiro - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI - Presidente - Apelação Crime nº 70060878055, Comarca de Passo Fundo: "À UNANIMIDADE DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DEFENSIVO FIXANDO O REGIME INICIAL PARA CUMPRIMENTO DA PENA O ABERTO. RETIFIQUE-SE O PEC" Julgador(a) de 1º Grau: ORLANDO FACCINI NETOImagem Ilustrativa do Post: Alcatraz Jails // Foto de: Joseph Kranak // Sem alterações
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