Juiz concede Habeas Corpus Preventivo resguardando o direito à manifestação pacífica em Florianópolis

06/09/2016

Por Redação- 06/09/2016

Foi concedido Salvo conduto,  pelo juízo da 3.ª Vara Criminal da Capital,  nos autos do Habes Corpus n.º0309978-54.2016. 8.24. 0023,  impetrado  por Alexandre Botelho, Eliziane Vezintana, Roberto Wolhke e Luzia Maria Cabreira em favor “da União Catarinense dos Estudantes (UCE) e demais manifestantes que se encontram na iminência de serem presos em razão do exercício do direito de reunião”, resguardando a participação de pessoas na manifestação marcada para a data de hoje no trapiche da Avenida Beira-Mar Norte, em Florianópolis-SC.

A decisão menciona que fica vedada a restrição da liberdade dos manifestantes que não se encontrarem em situação de flagrante delito e que os limites geográficos da manifestação ficam sujeitos ao que foi previamente comunicado pelos manifestantes às autoridades competentes, cientes que é dever da polícia assegurar a livre circulação das demais pessoas, seja para impedir a obstrução de vias que impeçam de modo absoluto tal circulação (caso das pontes), seja para buscar meios alternativos.

Confira a decisão

DECISÃO

1. Trata-se de Habeas Corpus preventivo impetrado por Alexandre Botelho, Eliziane Vezintana, Roberto Wolhke e Luzia Maria Cabreira em favor “da União Catarinense dos Estudantes (UCE) e demais manifestantes que se encontram na iminência de serem presos em razão do exercício do direito de reunião”, ao argumento de que estão ameaçados de sofrer constrangimento ilegal por parte do Comandante Geral da Polícia Militar de Santa Catarina, do Delegado-Geral de Polícia Civil do Estado de Santa Catarina e do Comandante da Guarda Municipal de Florianópolis/SC. A tanto, aduzem os impetrantes:

a) que os pacientes pretendem reunir-se pacificamente, sem armas, no trapiche da Avenida Beira Mar norte, por volta das 18 horas do dia de hoje (06/09/2016);

b) que as autoridades policiais estão reprimindo referido movimento, de forma violenta e arbitrária;

c) que a atuação dos agentes de segurança configura flagrante ilegalidade e afronta ao direito de reunião.

É o breve relato.

Decido.

2. A despeito da ausência de previsão legal expressa, conheço do Habeas Corpus na forma como impetrado (em favor de um grupo de pessoas indeterminadas), de modo a assegurar a todos o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, eis que não há vedação legal e a situação similar dos pacientes permite a análise.

O Habeas Corpus preventivo foi concebido pelo ordenamento jurídico pátrio como instrumento de garantia ante iminente ameaça de violência ou coação a liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Em outras palavras, é o remédio constitucional que visa à concessão de salvo-conduto em favor do paciente, atuando como verdadeira garantia ao direito de ir e vir.

Busca-se com a impetração garantir a liberdade de locomoção dos pacientes, que se manifestará no caso concreto pelo direito de reunião, assegurado no art. 5º, XVI, da Constituição Federal: "todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente".

Tal direito configura-se como "um dos princípios basilares de um Estado Democrático, sendo um direito público subjetivo de grande abrangência, pois não se compreenderia a liberdade de reuniões sem que os participantes pudessem discutir, tendo que limitar-se apenas ao direito de ouvir, quando se sabe que o direito de reunião compreende não só o direito de organizá-la e convocá-la, como também o de total participação ativa" (Moraes, Alexandre. Constituição do Brasil interpretada. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 258).

No entanto, não se trata de direito absoluto. Assim como nenhum direito o é (nem mesmo o direito a vida). A própria Constituição traçou limites expressos ao direito de reunião: a) de tempo (deve ter duração limitada, em virtude de seu caráter temporário); b) de finalidade (lícita, pacífica e sem armas); e c) de lugar (a reunião deverá ser realizada em local delimitado, em área certa, mesmo que seja um percurso móvel)(op. cit, p. 259).

No caso em apreço, os impetrantes alegam que pretendem reunir-se de forma pacífica no trapiche da Avenida Beira-Mar norte. Embora aleguem ter cientificado as autoridades competentes, não há provas nesse sentido. Mas tomando como verdadeira a alegação, saliento que o direito de reunião pode ser exercido nos limites da prévia comunicação (que, ao que parece, cinge-se ao trapiche da Avenida Beira-Mar norte). Na ausência de prévia comunicação, tal direito subordina-se aos limites traçados pela autoridade competente.

De uma forma ou de outra, é preciso dizer que referido direito não se legitima quando subtrai, de maneira absoluta, o direito de ir e vir das pessoas que não participam da reunião. Daí por que, no caso em análise, qualquer tentativa de obstrução das pontes que ligam ilha-continente se mostra ilegal e autoriza a intervenção policial, inclusive com o uso da força, se preciso for. Da mesma forma, a atividade policial não pode ser tida por ilegal quando visa buscar meios alternativos ao deslocamento daqueles que, como dito, não participam da manifestação.

Assim, nestas hipóteses, não vislumbro ilegalidade (condição necessária à concessão do writ) na atuação das forças de segurança pública. Saliento que as imagens apresentadas pelos impetrantes não revelam em que condições se deu a atuação policial nas manifestações anteriores. Pode haver excessos dos dois lados (e os meios de comunicação demonstraram ter havido), que devem ser contidos (e analisada a respectiva responsabilidade) caso a caso.

3. Ante o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE A LIMINAR, para conceder SALVO-CONDUTO às pessoas que, de forma pacífica e sem armas, participem da manifestação marcada para hoje, às 18:00hs, no trapiche da Avenida beira-mar norte, ficando vedada a restrição da liberdade dos manifestantes que não se encontrarem em situação de flagrante delito.

Os limites geográficos da manifestação ficam sujeitos ao que foi previamente comunicado pelos manifestantes às autoridades competentes, cientes que é dever da polícia assegurar a livre circulação das demais pessoas, seja para impedir a obstrução de vias que impeçam de modo absoluto tal circulação (caso das pontes), seja para buscar meios alternativos. No mais, não conheço dos pedidos acessórios (3.2, 3.3 e 3.4), pois não guardam pertinência com o direito (de locomoção) que se visa resguardar nesta ação constitucional.

Intimem-se. Notifiquem-s as Autoridades impetradas para que prestem as informações, no prazo de 5 (cinco) dias. Após, abra-se vista ao Ministério Público.

Florianópolis (SC), 06 de setembro de 2016.

Rafael Brüning

Juiz de Direito

Para conhecer o pedido de Habeas Corpus clique aqui HC Multitudinário 2016

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Fonte: TJSC .

Imagem Ilustrativa do Post: Debate Candidatos + Ato Fora Temer Cinelandia - Alerj 1/09// Foto de: Marcelo Freixo // Sem alterações

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