Entrevista com Sandro Kozikoski, coordenador científico do Simpósio Brasileiro de Processo Civil

27/02/2017

A Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst) e o Instituto Brasileiro de Direito Processual estão organizando o Simpósio Brasileiro de Processo Civil. O evento será nos dias 16 e 17 de março, no Teatro Positivo – Grande Auditório, em Curitiba/PR. Trinta palestrantes de diversas regiões do Brasil e diferentes áreas do Direito irão debater o primeiro ano de vigência do Novo Código de Processo Civil. Saiba mais a respeito na entrevista com o coordenador científico do evento, Sandro Kozikoski.

Qual a importância do Novo Código do Processo Civil que completa um ano agora em março?

Esta lei tem uma importância fundamental porque regulamenta todo o trâmite dos processos judiciais. É ela que estipula os prazos para os atos processuais, que regulamenta os procedimentos adotados, os direitos e deveres dos jurisdicionados. Por isso, a lei processual acaba tendo uma conexão direta com os interesses de cada pessoa que venha a demandar no Judiciário. Trata-se de uma legislação com a qual toda a comunidade jurídica terá que interagir, compreender e aplicar suas novidades.

Qual a amplitude do impacto desta lei?

Ela impacta fundamentalmente a vida de todos aqueles que precisem do Judiciário. Diferentemente do Código Civil que afeta o nosso cotidiano, mas não necessariamente se relaciona com aqueles que demandam em Juízo, a lei processual é diferente porque ela funciona como a “regra do jogo” para aqueles que eventualmente se envolvam em uma demanda judicial, sejam porque buscaram o Judiciário ou porque foram chamados a responder a uma determinada ação. Ou seja, essas pessoas terão que atuar de acordo com os procedimentos dispostos no CPC.

Houve muitas mudanças no teor da legislação?

Creio que a comunidade jurídica ainda está compreendendo o alcance dessas mudanças. Hoje existe um consenso de que ocorreram muitas alterações, mas ainda não se estabeleceu o quão significativas elas são. É como se estivéssemos enxergando a ponta do iceberg, não entendemos ainda toda a complexidade da lei processual. E uma pergunta que normalmente se faz é se o novo Código é melhor ou pior que o antigo: posso dizer que não há consenso absoluto a respeito, embora particularmente acredito que as inovações são positivas.

Quais os impactos na sociedade desde a sua vigência?

Um dos motes das comissões legislativas, quando o Projeto do Código estava em gestação, foi a ideia de que era necessário acelerar o tempo da resposta judicial. De fato, em alguns aspectos, o Novo Código buscou essa aceleração da prestação jurisdicional. Um dos principais impactos para a sociedade é que há todo um esforço de responder esse anseio - de que a Justiça é demorada - de fazer com que a prestação jurisdicional se dê em um espaço de tempo menor, com decisões mais qualitativas.

Outro ponto bastante relevante é que se buscou evitar que direitos iguais venham a ser tratados de formas diversas. Em certas situações, uma determinada lei era interpretada de uma forma perante um determinado órgão jurisdicional e interpretada de maneira distinta em outro órgão jurisdicional. Com o novo Código, foram concebidas técnicas de tentar garantir maior isonomia. É muito difícil explicar a duas pessoas que estão passando por situações idênticas, porque uma delas teve êxito em uma determinada pretensão e a outra acabou tendo uma resposta negativa. Há uma preocupação efetiva nesse Novo Código de tentar garantir isonomia em termos de respostas dadas ao jurisdicionado, a partir de uma maior estabilidade e integridade da jurisprudência.

Resumindo, há uma preocupação com esse Código de acelerar a prestação jurisdicional, garantir maior isonomia em termos de assegurar respostas equitativas e garantir a previsibilidade.

De que forma isso pode ocorrer?

O NCPC prevê técnicas de coletivização, de modo que os tribunais possam reconhecer a existência de certas teses que, depois, servirão de referência para todos os demais que estão em uma situação idêntica.

No Brasil há muitas dinâmicas de relações de consumo, questões tributárias, previdenciárias, entre outras. São temas de interesse geral da sociedade, ainda que não sejam temas processuais. Posso citar como exemplo a Reforma da Previdência, que está sendo cogitada. Esta reforma, que venha a reconhecer ou criar novos regimes, possivelmente terá questionamentos judiciais.  Não faz sentido que milhões de aposentados demandem isoladamente o reconhecimento do seu direito. O NCPC, ainda que seja algo pouco distante do cotidiano das pessoas, quando elas precisam do reconhecimento de determinados direitos no Judiciário, acaba sendo a ferramenta de trabalho que pode resultar numa decisão qualitativamente melhor e mais rápida.

Não faz sentido que cada pessoa busque seus direitos e isso impacte em milhões de processos nos tribunais. O que faz sentido é que nós tenhamos algumas demandas selecionadas, com os argumentos postos, bem colocados. Ao invés de julgarem milhares de processos semelhantes, o ideal é que aquelas questões sejam bem analisadas por uma determinada corte e se desenhe os parâmetros de uma decisão judicial coerente. Creio que esta é a resposta desejada pela sociedade brasileira.

Qual o objetivo do I Simpósio Brasileiro de Processo Civil?

Pensamos neste evento na perspectiva de fazer uma espécie de balanço. Quando o Código entrou em vigência em março do ano passado, existiam muitas dúvidas, então imaginamos um evento acadêmico que pudesse congregar representantes da comunidade jurídica, ligados à Advocacia, ao Judiciário, aos Tribunais; de modo que eles possam refletir sobre os avanços, as conquistas que resultaram positivas e aqueles pontos que se mostraram sensíveis.

É uma proposta de reflexão do que se sucederam nos últimos 12 meses. É claro que é uma amostragem de tempo considerada curta no Judiciário, pois ele lida, às vezes, com tradições que remontam décadas.

Mas não deixa de ser simbólico, também, ao invés de simplesmente comemorar a passagem do Novo Código, buscar essa congregação da comunidade científica, da academia, dos operadores e tentar fazer esse encontro de percepções. O objetivo foi com que cada um dos conferencistas e dos participantes possa dar a sua impressão e visão do que sucedeu neste último ano. Quais foram os avanços e o que demanda maior atenção.

Quais os critérios de escolha dos palestrantes?

O evento é organizado pela ABDConst em parceria com o Instituto Brasileiro de Direito Processual. São duas grandes instituições, cada uma na sua área de atuação, consideradas referências no meio acadêmico. Tivemos o cuidado de convidar representantes egressos da Magistratura, da Advocacia, do Ministério Público e da comunidade acadêmica em geral. Buscamos uma escolha de nomes que tenham afinidades com os temas selecionados. É certo que muitos outros colegas e profissionais poderiam estar dialogando conosco. Como o evento é programado para dois dias, tivemos que selecionar 30 nomes que foram escolhidos dentro da perspectiva de representarem instituições diferentes e também de terem o reconhecimento acadêmico naqueles temas selecionados.

Procuramos, de uma forma plural e democrática, buscar participantes dos mais diferentes Estados. Foram convidados juristas e professores de Minas Gerais, Espírito Santo, Maranhão, Rio Grande do Sul, do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e assim por diante. Procuramos garantir um mosaico de nomes de diferentes regiões brasileiras justamente para que cada um possa trazer um pouco da sua experiência, sua percepção e de como eles estão vendo as questões locais.

E com relação aos temas?

Escolhemos temas que julgamos de maior impacto para o público acadêmico e para o operador do Direito. Posso citar, como exemplo, o painel que irá falar sobre os avanços do NCPC na advocacia pública e também na advocacia privada. Ou ainda o painel que é voltado à análise do sistema de precedentes, conforme mencionado, com o propósito de garantir mais estabilidade e integridade ao Direito.

Infelizmente não é possível trabalhar cada um dos institutos do Novo Código, portanto resolvemos agrupá-los por temas mais gerais e, ligados aos mesmos, os painéis e palestras dos convidados.

 

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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