Decorrido o prazo de suspensão condicional do processo, extinta está a punibilidade, diz TJRS

18/09/2015

Por Redação - 18/09/2015

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul proferiu decisão nos autos do processo n. 0182386-37.2013.8.21.7000, em que deu provimento ao recurso proposto pelo acusado e declarou a extinção da punibilidade.

Após o oferecimento da denúncia pelo órgão ministerial, foi proposta, em audiência, a suspensão condicional do processo ao acusado por 02 (dois) anos mediante o cumprimento de uma série de obrigações, dentre elas, o comparecimento mensal em juízo. Findo o prazo da suspensão e das prorrogações sem qualquer requerimento de revogação, a defesa do acusado ingressou com pedido de extinção da punibilidade.

Verificado o descumprimento reiterado da obrigação de comparecimento em juízo, o Juízo inicial não somente indeferiu o pedido de extinção da punibilidade, como também revogou o benefício de suspensão condicional do processo.

A decisão foi reformada pela Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, a qual destacou a impossibilidade de revogação da suspensão condicional do processo após o período de prova, inexistindo prévio requerimento.

Conforme ressaltado na ementa do acórdão,

É dever do Estado, no mínimo, dar início à apuração de fatos e circunstâncias revocatórias da suspensão condicional do processo antes do término do lapso temporal da suspensão. A inércia ou omissão do Estado poderia ensejar a dilação infinita do processo, prejudicial à estabilidade jurisdicional, contrariamente à duração razoável do processo. 2. Cabe ao Estado, detentor da potestade punitiva, durante o prazo de suspensão, ser diligente e fiscalizar não só o cumprimento das condições, mas também eventuais causas de revogação. 3. Findo o prazo da suspensão, possíveis situações que acarretariam a revogação, estão consolidadas e superadas pela dinâmica processual e temporal.

Confira abaixo a íntegra do Acórdão!


ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Comarca de Lajeado

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Recurso em Sentido Estrito

Terceira Câmara Criminal

Nº 70054577598 (N° CNJ: 0182386-37.2013.8.21.7000)

Recorrente: J.W. da S.C.

Recorrido: Ministério Público

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RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. REVOGAÇÃO APÓS O PERÍODO DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE.

1. Decorrido o período de prova sem pedido de revogação da suspensão condicional do processo, é de ser extinta a punibilidade do imputado, conforme expressa determinação do artigo 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95. É dever do Estado, no mínimo, dar início à apuração de fatos e circunstâncias revocatórias da suspensão condicional do processo antes do término do lapso temporal da suspensão. A inércia ou omissão do Estado poderia ensejar a dilação infinita do processo, prejudicial à estabilidade jurisdicional, contrariamente à duração razoável do processo.

2. Cabe ao Estado, detentor da potestade punitiva, durante o prazo de suspensão, ser diligente e fiscalizar não só o cumprimento das condições, mas também eventuais causas de revogação.

3. Findo o prazo da suspensão, possíveis situações que acarretariam a revogação, estão consolidadas e superadas pela dinâmica processual e temporal.

RECURSO PROVIDO.

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Acórdão

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Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento do recurso em sentido estrito para declarar extinta a punibilidade do recorrente, com base no artigo 89, § 5º, da Lei 9099/95.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. João Batista Marques Tovo e Des. Diógenes Vicente Hassan Ribeiro.

Porto Alegre, 19 de setembro de 2013.

DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI,

Relator

Relatório

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

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O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra J.W. da S.C., dando-o como incurso no artigo 306 da Lei 9.503/97, pelo seguinte fato delituoso:

“No dia 21 de fevereiro de 2009, por volta das 02h25min, na BR 386, KM 346, em Lajeado/RS, o denunciado conduziu o veículo marca F., modelo F., placas XXX 9999, sob a influência de substância etílica, conforme resultado do teste de bafômetro para verificação de embriaguez alcoólica da fl. 07.

Na ocasião, o policial militar D.L.D. e outros colegas estavam realizando abordagens referente à “operação carnaval”, momento em que abordaram e flagraram o denunciado.

Ao ser abordado, o denunciado foi submetido a teste de etilômetro, o qual apresentou resultado de 0,50mg de álcool por litro de sangue (fl. 07/ip).

O denunciado foi preso em flagrante (fl. 11) e liberado mediante o pagamento de fiança de R$ 600,00 (fl. 26).”

Em audiência foi proposta a suspensão condicional do processo ao réu, pelo prazo de dois anos, mediante o cumprimento de determinadas obrigações, e aceita pelo acusado. Ficou suspenso o processo pelo prazo de dois anos mediante o cumprimento das condições (fl. 21)

A defesa interpôs pedido de extinção da punibilidade do acusado, tendo em vista já ter findado o prazo inicial e o das prorrogações sem que houvesse revogação do benefício (fl. 22)

O juízo a quo revogou o benefício da suspensão condicional do processo, pelo descumprimento da condição “A” (Comparecimento mensal, obrigatório em juízo para justificar/comprovar suas atividades) (fl. 23)

Em face dessa decisão, a defesa interpôs, tempestivamente, recurso em sentido estrito (fl. 02 a 04). Nas razões recursais, requereu a concessão de liminar para suspender o prosseguimento do feito até a decisão do mérito do recurso. Quanto ao mérito, pugnou a reforma da decisão para extinguir a punibilidade do acusado. Alegou ter o Magistrado descumprido o artigo 89, §4º da Lei 9.099/95 ao indeferir o pedido de extinção da punibilidade. Postulou que a interpretação extensiva e analógica não pode prejudicar o réu. Neste sentido colacionou doutrinas e jurisprudências (fls. 05 a 13).

Com as contrarrazões (fls. 15 a 16), subiram os autos.

Nesta instância, o digno Procurador de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso defensivo (fls. 25 e 26).

É o relatório.

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Votos

Des. Nereu José Giacomolli (RELATOR)

Eminentes colegas:

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto pela defesa, em face de decisão que, após o período de prova do sursis processual, indeferiu pedido de declaração de extinção da punibilidade e revogou a suspensão condicional do processo, por ter o acusado descumprido uma das condições impostas.

Compulsando os autos, verifico ter o recorrente aceito as condições impostas para a suspensão do processo (comparecimento mensal em juízo, proibição de se afastar da comarca por período superior a trinta dias, perda do valor depositado a título de fiança, comprovação de acompanhamento junto a grupo de apoio ou atendimento psicológico em relação ao alcoolismo) em 08.09.2009 (fl. 21).

Ainda conforme as razões recursais da defesa, o período de prova, inicialmente fixado em dois anos, foi prorrogado por duas vezes, a primeira por dez meses e a segunda por quatro meses, totalizando um prazo de 03 anos e 02 meses, o qual se encerrou, contado da última prorrogação, em 09.01.2013 (fl. 22).

Da decisão recorrida depreende-se que as duas prorrogações de prazo referidas pelo recorrente foram estabelecidas em razão do reiterado descumprimento de duas das condições impostas, quais sejam, a obrigação de comparecer mensalmente em juízo para justificar suas atividades e a frequência a grupos de apoio ou a acompanhamento psicológico. Em razão disso o juízo a quo revogou a suspensão condicional do processo em 21.03.2013 (fl. 104).

Pois bem, limita-se o objeto da inconformidade recursal à questão da possibilidade ou não de a suspensão condicional do processo ser revogada depois de finalizado o período de prova, ou seja, o prazo para cumprimento das condições.

Não desconheço o entendimento predominante no âmbito dos Tribunais Superiores acerca da questão, mas, no caso concreto, entendo deva ser reformada a decisão e declarada extinta a punibilidade do acusado.

Com efeito, verifico que por mais de uma vez o acusado deixou de comparecer em juízo para informar suas atividades, tendo sido intimado a justificar sua falta, o que fez, tanto que o período de prova foi prorrogado por mais de uma vez. Na prorrogação, novamente descumpriu condições, conforme se depreende da fundamentação da decisão recorrida, motivo pelo qual, então, foi revogado o benefício, mas somente depois de concluído o período de prova.

Da situação processual concreta depreende-se que era perfeitamente possível a revogação da suspensão condicional do processo no curso do período de prova. A autoridade judicial e o Ministério Público tinham plena ciência do descumprimento das condições impostas, mas, ainda assim, não foi decretada a revogação no devido tempo.

Por certo que, em se tratando de revogação facultativa, foi acertada a postura do juízo a quo de intimar o acusado para explicar o descumprimento e, com a explicação, prorrogar o período de prova. No entanto, descumpridas novamente as condições, a revogação deveria ter sido decretada imediatamente, e não somente depois de expirado o prazo.

O artigo 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95, é claro ao estabelecer que expirado o prazo sem revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade. Assim, a revogação da suspensão condicional do processo, ainda que não cumpridas todas as condições, não pode ocorrer depois de expirado o período de prova, de modo que, transcorrido o período de dois anos (e sua consequente prorrogação) sem pedido de revogação, impõe-se à extinção da punibilidade do réu.

Nesse sentido, já me manifestei sobre o assunto:

Findo o prazo de suspensão, sem revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade do imputado. Como não houve aplicação de uma pena advinda de um juízo condenatório, extingue-se a “pretensão punitiva”, e não a “pretensão executória”, isto é, extinguem-se todos os efeitos do processo criminal (antecedentes, perda de bens ou numerário, v.g.). Eventual cumprimento parcial das condições impostas não implica extinção da punibilidade ou impossibilidade de revogação do benefício, pois o cumprimento extintivo do ius puniendi há de ser integral. Entretanto, situações excepcionais, no plano concreto, poderão autorizar o magistrado a antecipar a extinção da punibilidade.

As hipóteses impeditivas da extinção da punibilidade (revogação obrigatória e facultativa) são verificáveis durante o lapso temporal da suspensão. A extinção da punibilidade do imputado, com o término do prazo, sem pedido de revogação, demonstrado em circunstâncias fáticas e jurídicas (fundamentado), insere-se no rol dos direitos e garantias fundamentais do imputado. Cabe ao Estado, detentor do ius puniendi, durante o prazo de suspensão, ser diligente, fiscalizar não só o cumprimento das condições, mas também eventuais causas de revogação. Findo o prazo da suspensão, possíveis situações que acarretariam a revogação, estão consolidadas e superadas pela dinâmica processual e temporal (GIACOMOLLI, Nereu José. Juizados Especiais Criminais: Lei 9.099/95: abordagem crítica. 3. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 232 e 233).

Destaco, ainda, precedente de minha relatoria:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. recurso em sentido estrito. suspensão condicional do processo. extinção da punibilidade.

1. Decorrido o período de prova sem pedido de revogação da suspensão condicional do processo, é de ser extinta a punibilidade do imputado, conforme expressa determinação do artigo 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95. É dever do Estado, no mínimo, dar início à apuração de fatos e circunstâncias revocatórias da suspensão condicional do processo antes do término do lapso temporal da suspensão. A inércia ou omissão do Estado poderia ensejar a dilação infinita do processo, prejudicial à estabilidade jurisdicional, contrariamente à duração razoável do processo.

2. Cabe ao Estado, detentor da potestade punitiva, durante o prazo de suspensão, ser diligente e fiscalizar não só o cumprimento das condições, mas também eventuais causas de revogação.

3. Findo o prazo da suspensão, possíveis situações que acarretariam a revogação, estão consolidadas e superadas pela dinâmica processual e temporal.

RECURSO DESPROVIDO.

(Recurso em Sentido Estrito Nº 70038110193, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 09/09/2010)

No caso, reitero, mesmo diante de reiterados descumprimentos não houve requerimento do Ministério Público no sentido da revogação da suspensão condicional do processo, ao menos não pelo que se depreende das peças processuais trasladadas. Assim, entendo implementado o direito à extinção da punibilidade pelo transcurso do período de prova, e impositivo o seu reconhecimento.

Ante o exposto, voto pelo provimento do recurso em sentido estrito para declarar extinta a punibilidade do recorrente, com base no artigo 89, § 5º, da Lei 9099/95.

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DES. JOÃO BATISTA MARQUES TOVO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. DIÓGENES VICENTE HASSAN RIBEIRO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. NEREU JOSÉ GIACOMOLLI - Presidente - Recurso em Sentido Estrito nº 70054577598, Comarca de Lajeado: "'À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PARA DECLARAR EXTINTA A PUNIBILIDADE DO RECORRENTE, COM BASE NO ARTIGO 89, § 5º, DA LEI 9099/95."

Julgador(a) de 1º Grau: CASSIO BENVENUTTI DE CASTRO


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