6ª Turma do STJ afasta a interpretação no sentido de que qualquer crime de estupro de vulnerável seria de ação penal pública incondicionada. (Informativo nº 553)

29/12/2015

Por Jardiel Oliveira da Silva - 20/02/2015

Como já é notória, a Lei nº 12.015 de 2009 trouxe nova roupagem ao regramento dado à natureza da ação penal nos crimes sexuais com o novo verbete do artigo 225, do Código Penal Brasileiro. Com isso, a nova regra agora passa a ser, nos moldes do artigo 225, “caput”, CP, a ação penal pública condicionada à representação.

A partir de então, por nenhuma razão será hipótese de ação penal privada exclusiva, somente subsistindo a possibilidade de ação penal privada subsidiária da pública em casos de inércia do Ministério Público, por força de justificativa normativa-constitucional e de regras ordinárias (artigo , LIX, CF/88, artigo 100, § 3º, Código Penal c/c artigo 29, CPP).

O Parágrafo Único do artigo 225, CP, estabelece as exceções em que a ação penal será pública incondicionada: quando a vítima for menor de 18 anos; ou quando a vítima for “pessoa vulnerável”.

Indaga-se: a vulnerabilidade a que se refere o parágrafo único do art. 225 do CPB é em relação apenas à vítima possuidora de incapacidade PERMANENTE de oferecer resistência à prática dos atos libidinosos (art. 217-A, § 1º CP) ou também em se tratando de pessoa incapaz de oferecer resistência APENAS NA OCASIÃO da ocorrência dos atos libidinosos? Referida vulnerabilidade esculpida no parágrafo único do art. 225, CP, é o mesmo conceito de “vulnerável” do art. 217-A do CP? Essa questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça, por meio do Habeas Corpus (HC) 276.510-RJ. Entenda o caso.

“TÍCIA”, plenamente capaz, do sexo feminino, maior de 18 anos, e extremamente lúcida, foi vítima de estupro praticado por “MÉVIO”, após este aplicá-la um golpe que a fez desmaiar. Em razão de estar desmaiada, “TÍCIA” não ofereceu qualquer resistência NA OCASIÃO da prática do ato libidinoso. Infelizmente a vítima não ofereceu representação contra MÉVIO.

O Ministério Público, certo de que se tratava de estupro de vulnerável (Art. 217-A, § 1º) ofereceu denúncia em desfavor de MÉVIO.

Na fase instrutória, realizada a mais de seis meses após a autoria ter sido descoberta, MÉVIO resolveu confessar a prática do delito. Em memoriais, o Parquet pediu a condenação de MÉVIO.

A defesa do acusado sustentou a tese de que o delito praticado pelo réu é crime de ação penal pública CONDICIONADA à representação (art. 225 do CP). Como não houve representação no prazo de 6 meses (Lapso temporal do art. 38 do CPP), houve decadência. O que isso causa? Extinção da punibilidade (art. 107, IV, do CP).

Assim o juiz fez. Julgou extinta a punibilidade. O Ministério Público recorreu alegando que o estupro de vulnerável (art. 217-A) é sempre crime de ação penal pública INCONDICIONADA em razão do que prescreve o parágrafo único do art. 225 do CP.

No julgamento do HC 276.510-RJ, o Relator Min. Sebastião Reis Júnior, deu razão a tese da defesa. Vejamos.

(...) “observa-se que, embora a suposta vítima tenha sido considerada incapaz de oferecer resistência na ocasião da prática dos atos libidinosos, esta não é considerada pessoa vulnerável, a ponto de ensejar a modificação da ação penal. Ou seja, a vulnerabilidade pôde ser configurada apenas na ocasião da ocorrência do crime. Assim, a ação penal para o processamento do crime é pública condicionada à representação. “(...) a vulnerabilidade detectada apenas nos instantes em que ocorreram os atos libidinosos não é capaz, por si só, de atrair a incidência do dispositivo legal em questão (art. 225, parágrafo único, do CP)”. (nossos destaques).

Com isso, afirma o Ministro, “afasta-se a interpretação no sentido de que qualquer crime de estupro de vulnerável seria de ação penal pública incondicionada, preservando-se o sentido da redação do caput do art. 225 do Código Penal (Fls. 11).” (nossos destaques).

Embora o presente julgado vá de encontro o que a maior parte da doutrina preconiza, a 6ª Turma do STJ considerou o caso concreto (vítima desmaiada no momento da prática do ato libidinoso, não podendo oferecer, por tal razão, resistência), sendo prudente não confirmar que talvez seja o posicionamento adotado pelo próprio Colendo Tribunal da Cidadania.

Conclui-se: vítima desmaiada, embora incapaz de oferecer resistência no momento da prática do ato libidinoso, não se enquadra no conceito de “vulnerável” para os fins do § único do art. 225 do CPB. Por tal razão, a natureza da ação penal é CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO.

FONTE: STJ Informativo 553. HC 276.510-RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 11/11/2014, DJe 1º/12/2014.

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Jardiel   Jardiel Oliveira da Silva é Especialista em Direito Público pela UFRN. Membro da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/RN. Advogado Criminalista. __________________________________________________________________________________________________________________ Imagem Ilustrativa do Post: Otoño en El Retiro // Foto de: Juanedc // Sem alterações Disponível em: https://www.flickr.com/photos/juanedc/8107920577/in/photostream/ Licença de uso disponível em: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

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