Vingança

16/03/2018

Coluna Não nos Renderemos / Coordenadores: Daniela Villani Bonaccorsi Rodrigues e Leonardo Monteiro Rodrigues

“A vingança é um prato que se come frio”.

Quem nunca ouviu esta expressão?

Diariamente nos deparamos com notícias, informações e fatos que nos trazem o sentimento de que algo precisa ser feito, de que alguém deve ser vingado. Em muitas dessas vezes nos colocamos no lugar da vítima. É um sentimento que vem crescente, uma mistura de impotência e de dor.

O V de vítima se transforma no V de vingança. E assim queremos causar ao outro o mal que este causou. De uma forma igual ou maior. Aquele que matou, deve morrer, o que roubou deve ter as mãos cortadas...

Ai também está a ideia de retribuição como função da pena.

A Teoria Retributiva da Pena parte do pressuposto que a pena é a vingança imposta pelo Estado. É o mal justo frente a um mal injusto. (SANTOS, 2010, P.421). Para Kant, a justiça retributiva é um imperativo categórico, devendo o indivíduo ser punido para que a pena não recaia na própria sociedade. 

 “Mesmo se a comunidade de cidadãos, com a concordância de todos os membros, se dissolvesse, o último assassino encontrado na prisão deveria ser previamente executado, para que cada um receba o valor de seu fato e a culpa do sangue não pese sobre o povo que não insistiu na punição.” (SANTOS, 2010, P.422). 

A crítica que costuma ser feita a esta teoria é a de que a pena pode ser vista como um mal necessário. A pena será a imposição de um mal, vez que existiu um mal anterior. Portanto a pena é um mal necessário imposto pelo Estado.

Uma vez que o objetivo do Direito Penal é a proteção dos bens jurídicos mais essenciais à vida em sociedade, e que não conseguem ser protegidos de outra forma (intervenção mínima), não pode a pena, que tem como finalidade essa proteção, ser instrumento de vingança. “Retribuição é fazer o mal pelo mal”. (GRECO; MARTINS, 2012, P.271)

Tal ideia de retribuição também está presente desde a Lei de Talião. A tal proporcionalidade. Causa-se um mal aquele que o mal causou.

Porém tal proporcionalidade deve ser controlada pela razoabilidade. Isto porque o Estado tomou para si o ius puniendi. Ou seja, o seu direito de punir. E, em um Estado Democrático de Direito, no qual o seu pilar está na dignidade da pessoa humana, até para se punir, deve-se punir com dignidade. A busca do Estado é o exemplo e a melhoria do ser humano que infligiu a norma ou, como diria Binding, fez exatamente o que a norma previa, devendo sofrer a consequência prevista também na norma.

E não venha se falar que preso não tem Direitos Humanos. Afinal os Direitos Humanos servem justamente para aqueles que estão tendo seus direitos básicos violados. Deficientes, pobres, negros, presos, mulheres, homoafetivos... Enfim. É como dizer que a presunção de inocência não serve para quem responde a um processo criminal! Ora! Se não serve para quem responde a um processo criminal, servirá para quem?

O condenado em um processo voltará, um dia, ao convívio social. Mas ele só terá alguma chance de voltar melhor ao convívio social se for tratado com dignidade. Não como são os presídios nos dias de hoje. Isso que a Constituição veda penas cruéis e degradantes. Mas pelo “estado inconstitucional das coisas” fechamos os olhos e aceitamos mais esta violação às garantias constitucionais. Afinal, para que serve aquele livrinho lá?

O que precisamos lembrar é que não somos vítimas dos fatos que ocorrem na sociedade. Seremos apenas naqueles que conosco ocorrem. Se formos nos colocar no lugar de todos aqueles que são vítimas de crimes diariamente, devemos também nos colocar no lugar daqueles que cometem crimes diariamente.

Quem nunca bebeu e dirigiu? Quem nunca entrou no território brasileiro com mais de U$ 500,00 em mercadoria? Quem nunca se apropriou de coisa alheia? Sabe aquele objeto que você pegou emprestado, depois de anos achou, e não devolveu? Talvez por achar que não tinha importância. Então, apropriação indébita! Crime. Sabe a expressão “achado não é roubado”? Crime! Art. 169, II, CP, apropriação de coisa achada. Sabe o CD pirata? Crime. Enfim, são centenas de condutas tipificadas penalmente, você vai me dizer que nunca praticou nenhuma delas? “Çei” ....

Como, num país em que a esmagadora maioria da população professa alguma religião, vai em templos, igrejas, etc, as pessoas podem querer tanto o mal de um ser humano que praticou um crime? As religiões não se baseiam em amor e PERDÃO? Compaixão? Como é possível que estas pessoas rezem mas sejam as primeiras a “jogar pedras”? Não aprenderam nada?

 

Imagem Ilustrativa do Post: Mutirão carcerário do CNJ começa nesta quarta-feira - Pernambuco 16-08-2011. // Foto de: Conselho Nacional de Justiça - CNJ // Sem alterações

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