Regras e exceções

17/06/2018

O mundo jurídico, e científico, em geral, estuda regras de comportamento e suas respectivas exceções, o que vale tanto para os movimentos humanos como para os fenômenos físicos da natureza. A ciência é o conhecimento da regularidade dos acontecimentos, no sentido de definir sua previsibilidade, para que então possamos nos preparar para determinados eventos importantes, e até mesmo, sendo possível, controlá-los, alterando-os em nosso favor.

A partir do conhecimento das regras sobre o funcionamento das coisas podem ser desenvolvidos instrumentos, físicos ou psíquicos e simbólicos, que nos ajudam a lidar com os acontecimentos e a produzir eventos no mundo.

As regras, de outro lado, no estado científico atual, possuem natureza rebus sic stantibus, expressão que pode ser traduzida como “estando assim as coisas”, na medida em que uma regra que é definitiva, absoluta, depende do conhecimento do Ser, da unidade eterna dos fenômenos, ainda não alcançada pela ciência humana, em cujos preceitos se incluem o que seriam exceções, que na verdade são a própria regra sob outra perspectiva.

Nesse sentido, o milagre é o conceito não de algo de contraria as leis da natureza, mas o evento abrangido por uma lei mais profunda, além do que conhecemos atualmente da natureza.

As autênticas regras trazem em si, ínsitas, as normas de suas próprias variações, variações que são tidas por exceções, como algo diferente da regra, mas que são a própria realização da regra em sua plenitude, conhecida ou não. Esse tema está ligado  ao das categorias filosóficas do uno e do múltiplo, dos universais e dos singulares, ou particulares.

O conhecimento absoluto, que inclui a regra e as exceções, a plenitude do universal e dos particulares, é o conhecimento do próprio Deus, o Logos ou Razão absoluta, e somente podemos avançar nessa Ciência aumentando a intimidade ou proximidade com o Altíssimo, o Espírito Absoluto, que exige o abandono absoluto Nele, pela Fé absoluta, que é espiritual.

Portanto, materialmente o conhecimento absoluto é impossível para nós, uma vez que do ponto de vista da relatividade (Einstein) não há absoluto, porque essa perspectiva de mundo é relacional, e os relacionamentos materiais são limitados à velocidade da luz. Pela relatividade, apenas a velocidade da luz é absoluta, e para a luz não há tempo, ou, portanto, espaço, sendo tudo instantâneo.

A relatividade é, outrossim, apenas parte da regra, podendo ser considerada uma exceção, exigindo-se um conceito mais amplo, aquela regra que tem em si a relatividade como uma de suas variações.

Por isso, conceitualmente, é valida a proposta de David Bohm de definir o holomovimento, que é, por natureza, indefinível e incomensurável, como o fundamento da realidade, esta regida, destarte, pela holonomia, a lei da totalidade indivisível, que inclui todas as exceções ou variações possíveis.

O holomovimento é um conceito, como todo conceito, imaterial, e imaterial é a regra absoluta. Os conceitos são formulados a partir das experiências, das sensações e dos pensamentos, formando uma unidade ideal ou espiritual, para restaurar essa unidade perdida.

Se a totalidade é indivisível, a divisão material já é, por si só, uma alienação da realidade, pelo que ainda que a matéria integre a realidade, limitar o mundo aos fenômenos sensoriais é negar a realidade, é rejeitar a regra, permanecendo na exceção. A matéria, nesse sentido, será sempre parcial, e por isso os conceitos restritos à materialidade, ou à redução dos fenômenos às suas partes, não têm como alcançar a integralidade filosófica. O próprio Einstein sabia disso e não conseguiu formular uma teoria mais ampla dos campos.

A integridade da formulação científica atual exige a inserção do conceito de não localidade, que inclui uma materialidade mais sutil que a relatividade, uma realidade com fenômenos instantâneos, que não são restritos ao espaço-tempo relativístico, cujo regramento não aceita essa concepção, que pode ser tida como uma exceção às regras da relatividade, ou um milagre.

Voltando, pois, ao conceito de milagre, e citando o exemplo de Jesus Cristo, O Cientista, que conheceu a Lei Absoluta, agindo segundo uma natureza mais profunda do que aquela que conhecemos, chegou a dizer: “Em verdade vos digo: se tiverdes fé, sem duvidar, fareis não só o que fiz com a figueira, mas até mesmo se disserdes a esta montanha: 'Ergue-te e lança-te ao mar', isso acontecerá. E tudo o que pedirdes com fé, em oração, vós o recebereis” (Mt 21, 21-22).

Traduzindo fé por fidelidade, pode-se entender que Jesus afirmou que se nos comportarmos firmemente segundo a Holonomia, conforme a realidade total indivisível e imaterial, com sua moralidade integral, teremos conhecimento e condição de movimentar os estratos mais profundos da natureza, ainda desconhecidos da ciência e da tecnologia humanas.

Pode-se dizer que o elo perdido, buscado pela ciência, é imaterial, é o próprio Deus, e é necessário para distinguir a regra e a exceção, a normalidade da anormalidade, a sanidade da loucura, a previsibilidade do imprevisível. As regras mais profundas não são compreendidas sem esse elo imaterial, e por isso a ciência tenta, sem sucesso, entender as exceções, pelo reducionismo científico. A Holonomia inclui, assim, o conhecimento da loucura, e por isso Jesus expulsava demônios, por sua Sabedoria, “pois a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus” (1Cor 3, 19).

Quando exceções passam a se tornar incompatíveis com as regras conhecidas, estas devem ser reformuladas ou abandonadas, pela chamada mudança de paradigma científico, o que ocorre quando se chega a uma formulação teórica ou conceitual mais ou menos coerente das exceções em um contexto inteligível.

Ainda assim, pode-se dizer que basta uma violação da regra para invalidá-la, ou é suficiente uma exceção suficientemente contundente para a mudança de paradigma. No âmbito religioso, essas exceções são os milagres que servem para convencer determinadas pessoas importantes sobre a realidade mais profunda, como ocorreu com Noé, Abraão, Moisés, os profetas e, finalmente, com Jesus Cristo, por sua ressurreição, cuja força foi suficiente para remoldar o mundo, definindo o tempo histórico entre antes e depois de sua Vida.

A alternativa à visão religiosa de mundo, o cientificismo, a qual sucedeu uma religiosidade parcial do período medieval, e que vem se desenvolvendo nos últimos séculos, fracassou, sendo os exemplos mais evidentes as guerras que dominam os últimos cem anos. Portanto, para completar a mudança de paradigma, como já previsto na Holonomia, a Regra Absoluta de Deus, um evento excepcional ocorrerá durante a guerra contra Israel, que servirá de estímulo psicológico para convencer a humanidade sobre a realidade última do autêntico Cristianismo, que significa o governo oculto de Deus sobre a História, o qual já está revelado, mesmo que parcialmente, nas Escrituras, e estas, enfim, e definitivamente, voltarão a ser tratadas, doravante segundo sua interpretação autêntica, como o fundamento das regras do comportamento humano.

Se esse evento imprevisível foi previsto, incluindo fenômenos da natureza, essa imprevisibilidade é, na realidade mais profunda, algo já integrante da regra mais ampla, e mais ligada à Holonomia.

 

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