Haddad, o Uber é legal! Legalize o táxi!

05/10/2015

Por Charles M. Machado - 05/10/2015

Na semana em que o Prefeito da maior Cidade do Brasil, Fernando Haddad, decide se veta ou não a Lei que proíbe o uso do aplicativo UBER e de seus serviços em São Paulo, vou utilizar esse espaço para reforçar alguns pontos.

Sempre é bom lembrar, que as novas tecnologias servem para baratear, e estão protegidas nas cláusulas Constitucionais que protegem a Livre Iniciativa e o Direito do Trabalho.

O que estamos assistindo é apenas o começo de uma longa batalha, lutar contra o novo, melhor e mais barato é perda de tempo, aqui mesmo na América do Sul a Cidade do México já regulou o Serviço do Uber criando a ele até um novo tributo.

É evidente que o UBER é apenas o início disso, outros softwares vão surgir, pelo simples fato desse mercado ser gigantesco, os novos surgirão com novas funcionalidades, por vezes com menor custo. Prova disso é que o concorrente chinês, a China sempre a China, levantou US$ 2 bilhões no mercado de capitais numa rodada de capitação de recursos. O DIDI como é chamado o concorrente do UBER, tem em caixa US$3,5 bilhões para essa briga e já é avaliado no mercado em US$ 15 bilhões, ou seja, RS$ 48,9 bilhões, o que faz com que se ele fosse uma empresa brasileira estaria entre as vinte de maior valor de mercado, espantoso né, mas senta aí que lá vem mais, afinal ele foi criado apenas em fevereiro.

A Competência Constitucional do Município.

A Constituição Federal faz atribui como competência dos Municípios “Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local;" veja que o Direito de ir e vir é de todos os habitantes de um mundo livre, e no caso brasileiro criar vedações ou limitações com o pretexto de tratar do interesse local estaria vedado pela Constituição, o interesse local não serve de pretexto para essas medidas restritivas de Direito do Trabalho, serve apenas para regulamentar esse exercício funcional, qualquer proibição em favor de outro serviço análogo já nasce com o DNA da inconstitucionalidade.

A competência Legislativa do Município é também de “Art30, II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”. Logo suplementar é antes de mais nada preencher lacunas onde couber, sem com isso pretender inovar nas restrições da livre iniciativa.

Alguns pretendem estender o transporte de pessoal por meio privado como decorrência da redação do art. 30, V onde se lê: “organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial”.

Ora vejamos o transporte coletivo é sempre aquele prestado por ônibus ou outro meio similar sendo que a legislação federal já tratou de defini-lo não permitindo assim medidas elásticas e forçosas de interpretação.

Entende-se como transporte coletivo, previsão da Lei Nacional de Mobilidade Urbana "VI - transporte público coletivo: serviço público de transporte de passageiros acessível a toda a população mediante pagamento individualizado, com itinerários e preços fixados pelo poder público.” Logo nem Uber nem táxi estariam dentro dessa definição conceitual da Lei 12.587 de 2012.

Cabe aqui a lembrança da previsão Constitucional do “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IV - livre concorrência;.. VIII - busca do pleno emprego”. Logo a livre concorrência e a busca do pleno emprego são cláusulas fundantes da nossa Ordem econômica, pois limitar através da proteção injustificada de setores fere a Norma Constitucional.

O serviço de táxi

A regulamentação do serviço de taxista, através da lei 12.469 de 2011, em momento algum gerou proibição ao serviço do UBER, apenas tratou de assegurar direitos e definições daquela profissão não pretendendo no seu objetivo criar a reserva de mercado para o transporte privado de passageiros.

A norma reconheceu em seu primeiro artigo a profissão de taxista, assim conceituando em seu dispositivo: ”Art. 2o É atividade privativa dos profissionais taxistas a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiros”.

Esse exercício é sempre feito por meio de licença e cabe aqui reforçar algumas diferenças, conceituas sobre esses dois serviços:

1) O motorista que dirige um carro credenciado junto ao aplicativo UBER, efetua uma atividade profissional que já está prevista na OCB, nas mais diversas categorias de profissões, logo é reconhecida por Lei Federal;

2) Os valores pagos por esse serviço estão sujeitos à tributação, logo incidem sobre a operadora do serviço UBER, COFINS, PIS, IRPJ e sobre a receita repassada ao motorista IRPF e ISS já previsto na lista de serviços.

3) Todos os veículos adquiridos pelos motoristas do UBER, ao contrário dos motoristas de TÁXI, pagaram IPI e ICMS, na aquisição dos seus veículos o que representa mais de 30% do valor de aquisição dos mesmos, logo é uma falácia, dizer que o serviço não paga impostos.

4) O serviço do UBER, não está sujeito a ato administrativo permissionário emitido pelo Município, ao contrário do Táxi, que é uma Permissão de Serviço Público Regulada por lei, logo sujeita a licitação.

5) Por serem permissionários, os Táxis, gozam de inúmeros privilégios, como corredores de uso exclusivo nas vias, pontos de parada próprios, liberação de tráfego em todos os dias e horas da semana entre outros.

6) Um dos fatores que levam ao encarecimento do táxi é a revenda da placa (transferência irregular da permissão), em alguns lugares a mesma é vendida a mais de R$ 1 milhão de reais, logo esse custo é repassado para o adquirente do serviço, por isso se paga de Guarulhos ao centro de São Paulo um valor maior do que algumas passagens de avião, nos Estados Unidos uma licença das famosas placas amarelas de NYC chegaram a valer US$ 4 milhões, o que dá uma ideia do que está por trás de todo esse embate.

7) Em muitas cidades do Brasil o ISS incidente sobre o Táxi é cobrado com valores irrisórios representando muito pouco ou quase nada na arrecadação municipal, sendo que em sua maioria a alíquota é de 2%., não representando valor significativo, pois os recibos de táxi dado pelos motorista, na maioria das vezes não identificam o contribuinte.

8) A Lista de Serviços do ISS, faz previsão ao serviço de transporte de pessoas, por qualquer meio, dentro do território do Município é tributada (em São Paulo) com a alíquota de 5%, ou seja, maior que de Táxi.

9) A profissão de taxista já regulamentada por Lei Federal prevê como deveres dos taxistas; “Art. 5o São deveres dos profissionais taxistas: I - atender ao cliente com presteza e polidez; II - trajar-se adequadamente para a função; III - manter o veículo em boas condições de funcionamento e higiene; IV - manter em dia a documentação do veículo exigida pelas autoridades competentes;” sendo esses os principais deveres funcionais, sobre o qual a municipalidade deve sempre fiscalizar.

A lei de mobilidade urbana

A Lei de mobilidade urbana atinge a todo transporte, seja ele de cargas ou passageiro, e caracteriza os serviços como coletivo ou individual, sendo quanto a sua natureza público ou privado.

O artigo 4° da referida Lei faz assim suas conceituações:  "VI - transporte público coletivo: serviço público de transporte de passageiros acessível a toda a população mediante pagamento individualizado, com itinerários e preços fixados pelo poder público". Esse é o caso dos serviços de ônibus, que devem ser licitado sempre que possível na modalidade de concessão.

O mesmo artigo conceitua assim o serviço do UBER “Art. 4°, X - transporte motorizado privado: meio motorizado de transporte de passageiros utilizado para a realização de viagens individualizadas por intermédio de veículos particulares;“

Logo o serviço previsto pelo UBER, já possui previsão legal na Lei Nacional de Mobilidade Urbana, por isso pretender tipifica-lo com ilegal não encontra guarida no nosso sistema positivado.

A Política Nacional de Mobilidade Urbana, está hoje fundamentada nos seguintes princípios “Art. 5° I - acessibilidade universal; IV - eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços de transporte urbano”. Logo a acessibilidade universal e eficiência e eficácia só podem ser atingidos quando o Estado fomenta a criação de diversos modais logísticos democratizando a oferta de meios de transporte dos mais variados ao cidadão.

Outro objetivo da Política Nacional de Mobilidade Urbana, “Art. 5°, IX - eficiência, eficácia e efetividade na circulação urbana” o que também só pode ser atingido com a maior oferta de modelos e tipos de transporte.

Os serviços de Táxi, estão também previstos e definidos no Art. 12. Da Referida Lei de Mobilidade Urbana “Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas".

Logo sempre que estivermos falando em política tarifária estaremos diante de uma fixação valorativa de preço máximo, permitindo a livre concorrência para obtenção de preço mínimo.

A outorga nos serviços de táxi

O serviço de táxi, é por definição uma outorga, o que só pode ocorrer pelas seguintes formas concessão, permissão ou autorização, logo deve ter um valor e o processo licitatório pode muito bem ofertar essas atribuições por meio de licitação de melhor preço.

As cidades quando abrem mão dessa receita, ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal, afinal nos termos da Constituição a Administração Pública, seja ele Direta ou Indireta, é e sempre será regida pelo princípio da eficiência.

A obtenção dessas outorgas deve ser paga, e jamais gratuita, como vem ocorrendo na maioria absoluta das cidades, e seu valor deve ser de conhecimento público efetuado em licitação, por respeito ao Princípio da Eficiência que rege a Administração Pública Municipal, e em respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.

O valor da outorga é reconhecido também pelo legislador infraconstitucional na medida que atribui a mesma possibilidade de revenda, conforme está previsto no diploma normativo na Lei 12.865 de 2013 onde se lê; “Art. 12-A.  O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.” Logo outorga é e sempre será onerosa.

O mesmo diploma regulou uma prática de mercado, que era da revenda milionária dessas outorgas (licenças) o que não existe no UBER, por não tratar-se de outorga, ”§ 1o É permitida a transferência da outorga a terceiros que atendam aos requisitos exigidos em legislação municipal.”

A receita advinda da revenda de outorga, quando a sua aquisição não foi onerosa, está sujeita ao Importo de Renda das Pessoas Físicas, pois existiu ali um ganho de capital, afinal revender algo adquirido a custo zero, sujeita o valor a incidência plena do IRPF.

O citado diploma acima foi além quando instituiu o direito de herança da outorga, o que ao meu ver é inconstitucional, pois transfere a terceiro licença administrativa sem o processo licitatório, que é e deve ser sempre a regra.

O direito à herança de outorga é mais uma forma de atribuir valor a esse benefício, e logo também está sujeito ao IRPF, pois a mesma deve estar presente na declaração do de cujus.

A previsão ao Direito de herança de outorga da licença de táxi está assim previstas “§ 2o Em caso de falecimento do outorgado, o direito à exploração do serviço será transferido a seus sucessores legítimos, nos termos dos arts. 1.829 e seguintes do Título II do Livro V da Parte Especial da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).  (Incluído pela Lei nº 12.865, de 2013).”

Tais transferência sempre ocorrerão obedecendo o prazo de outorga, ou seja, as licenças para o Táxi devem sempre ter prazo limitado.

O transferido deve sempre preencher os requisitos do edital, o que se conclui do dispositivo legal “§ 3o As transferências de que tratam os §§ 1o e 2o dar-se-ão pelo prazo da outorga e são condicionadas à prévia anuência do poder público municipal e ao atendimento dos requisitos fixados para a outorga. (Incluído pela Lei nº 12.865, de 2013)”.

A política de Mobilidade Urbana sempre estará visando o combate do transporte irregular de passageiros, o que não é o caso do UBER, por tudo dito acima.

A municipalidade deve sim regulamentar os requisitos do serviço prestado pelo UBER e seus assemelhados, regrando as condições de conforto, segurança e transparência na prestação de serviço.

Ir além disso é ferir a Magna Carta, que definiu exatamente qual é a competência do Município enquanto ente federativo para essa matéria.

A integração do modelo público com o privado é objetivo conceitual na Lei de Mobilidade Urbana, e eles sempre serão complementares.

A obtenção dessas outorgas deve ser paga, e jamais gratuita, como vem ocorrendo na maioria absoluta das cidades, afinal é público o aferimento de inúmeras vantagens financeiras na revenda dessas outorgas.

O valor da outorga é reconhecido também pelo legislador infraconstitucional na medida que atribui a mesma possibilidade de revenda, conforme está previsto no diploma normativo na Lei 12.865 de 2013 onde se lê; “Art. 12-A.  O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local”. Logo outorga é e sempre será onerosa.

Dessa maneira o que antes era irregular passou a ser legalizado como conduta, ou seja, a revenda de outorga, desde que atendido os requisitos da lei é legal, claro que quando comparado ao UBER, não se pode falar de outorga.

O citado diploma assim prevê:”§ 1o  É permitida a transferência da outorga a terceiros que atendam aos requisitos exigidos em legislação municipal.” Deve-se se destacar que a lei federal é omissa para os casos onde a lei municipal não fizer previsão a referida transferência, logo a transferência de outorgas anteriores a publicação da lei Federal não prevista a possibilidade de transferência na licitação não pode ser entendida como autoaplicável.

Com isso o diploma normativo estabeleceu categorias distintas de outorga:

1) Quando o processo licitatório fez previsão ao direito de transferência estabelecendo os critérios e requisitos da transferência e do transferido;

2) Quando a licitação mesmo sendo nova não faz previsão à transferência;

3) Quando outorga é anterior ao diploma normativo que regulamenta a profissão.

Deve-se salientar que a receita advinda da revenda de outorga, quando a sua aquisição não foi onerosa, está sujeita ao Importo de Renda das Pessoas Físicas, pois existiu ali um ganho de capital, afinal revender algo adquirido a custo zero, sujeita o valor a incidência plena do IRPF.

A anuência, da Municipalidade é e sempre será manifestação de conformidade legal, no momento da transferência, com a comprovação dos requisitos previstos em lei, sempre em lei.

O legislador municipal pode corrigir na regulamentação inúmeras distorções, basta ter vontade política.

A Municipalidade nesse momento precisa sim rever todas as outorgas de TÁXI, para ver se passam na lupa da legalidade, e se nesse momento atendem ao interesse da coletividade.

A legalidade no exercício dos taxistas

Antes de pretender proibir o UBER, a Municipalidade, seja ela de São Paulo ou de qualquer outra cidade, precisa sim fiscalizar o exercício regular da profissão de taxista e do regular uso das outorgas.

Nesse momento em que o caixa das prefeituras é apertado a concessão de licenças (outorgas) gratuitas, fere o bom senso e não respeita os ditames Constitucionais, principalmente quando publicamente é sabido que as mesmas são revendidas por cifras milionárias.

A condução do táxi por terceiro, só pode ser feito de forma regular, ou seja, com a devida assinatura da carteira de trabalho, bem como com o recolhimento de todos os direitos desses trabalhadores, tais como hora extra, adicional noturno e adicional de periculosidade para os que trabalham à noite.

O direito constitucional de veto

O exercício ao Direito de veto pela autoridade municipal é prerrogativa do Prefeito e como tal e pelas razões expostas deve ser exercida, seja pela inconstitucionalidade da lei Municipal que fere o Direito ao Trabalho e da Livre Iniciativa.

Seja pela absoluta falta de motivação da norma que cria restrição ao Direito de escolha da forma de ir e vir pelo modal que o cidadão preferir.

Logo Prezado Prefeito, o UBER é legal e o que deve ser feito é dar legalidade aos serviços prestados pelos táxis dessa cidade.


Charles M. Machado é advogado formado pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, consultor jurídico no Brasil e no Exterior, nas áreas de Direito Tributário e Mercado de Capitais. Foi professor nos Cursos de Pós Graduação e Extensão no IBET, nas disciplinas de Tributação Internacional e Imposto de Renda. Pós Graduado em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Salamanca na Espanha. Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários, onde também é palestrante. Autor de Diversas Obras de Direito. Email: charles@dantinoadvogados.com.br


Imagem Ilustrativa do Post: Das letzte Taxi // Foto de: Emanuele // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/zakmc/6290725551

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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